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O Destino de Andressa

Ela pensou tanto que acabou adormecendo novamente. A cama era macia e aconchegante, e o ar era fresco. Ambos eram convidativos para um sono. Ela acordou sobressaltada, sabendo que havia alguém mais naquele quarto. Ela sentou-se na cama e olhando para os lados viu Andrey encostado na porta com uma calça bege e camisa esportiva a fitando sério com as duas mãos enfiadas no bolso.

_ Eu... Acabou que não consegui lhe agradecer por tudo que...

_ Não. – Ele disse a interrompendo. – Não fiz nada daquilo de graça, ou por piedade.

_ Não? – Andressa perguntou como uma tola.

_ Quantos anos você tem?

_ Dezesseis anos. – Ela respondeu ainda querendo saber onde ele queria chegar. Com certeza lhe falaria de seu preço por ter ajudado ela e sua mãe.

Ele passeou os olhos pelo corpo mal coberto dela e isso a deixou constrangida. Sentiu-se um pedaço de carne no açougue. Finalmente ele a encarou nos olhos.

_ O que você sabe sobre o que aconteceu com seu irmão e sobre o que foi combinado com sua mãe? – Ele perguntou ainda sério.

_ Na verdade não sei nada.

Ele balançou afirmativamente a cabeça.

_ Andressa, seu irmão adquiriu uma dívida muito grande comigo há três anos atrás. E ele me prometeu pagar essa dívida dentro de exatos três anos, me dando algo em garantia.

_ O que ele lhe deu? De quanto era dívida?

_ A dívida era de sete mil reais.

Andressa colocou a mão na cabeça. Onde iria conseguir mais de trinta mil reais para pagar o chefão?

_ Sim. – Ele disse quando a viu colocar a mão na cabeça. – A dívida cresceu.

_ Como poderei pagar essa dívida? – Ela perguntou com a voz embargada.

_ Primeiro vou lhe contar a respeito de seu irmão. Ele fez esse acordo comigo, mas sabia que eu não lhe emprestaria mais dinheiro e muito menos venderia drogas. Então ele começou a atravessar a linha de trem para comprar com aquela facção. E durante um tempo deu certo. Ele jogava bem e sempre ganhava o suficiente para pagar suas dívidas. Conseguia comprar roupas caras e eu sempre estive com meu olho voltado para ele. Sempre pensei que ele era o cara mais filha da puta que eu já conheci. Ele podia ter quitado a dívida dele comigo e resgatado a garantia. Poderia ter dado a você e sua mãe, uma chance de trabalhar para alcançar o próprio crescimento, mas ele deixou vocês no escuro e continuou as explorando. Acontece que a sorte sempre muda com o vento... E ele parou de ganhar no jogo, e recorreu a eles para ter dinheiro para drogas e roupas. Eles ajudaram, mas nos últimos meses cansaram-se dele e começaram as ameaças para que ele pagasse o que lhe eram devido. Sem ter de onde tirar, ele contou tudo para sua mãe.

Andressa que já estava de estomago embrulhado com toda aquela história, e o escutava envergonhada e de cabeça baixa, ergueu a cabeça para encara-lo perplexa. Até sua mãe estava enrolada com toda aquela sujeira?

_ Sim. Sua mãe sempre soube de toda verdade. E ela veio até mim, me implorar que pagasse aquela dívida com a mesma garantia que ele havia me dado anos atrás. Mas o que ele me prometeu já era meu. Então recusei. Na verdade achei um investimento muito caro, sete mil reais e disse isso a sua mãe. Mal sabia eu que ela não havia vindo de mãos vazias. Ela me mostrou a "garantia" e eu então, finalmente concordei em acertar as contas com a outra facção. Mas o idiota de seu irmão, não soube esperar e imediatamente correu para o outro lado para dizer que eu pagaria a dívida e eles ficaram furiosos, pois não aceitariam que eu pagasse a dívida. Isso é uma questão de honra entre nós. Eu também não aceitaria que o líder deles viesse me pagar uma dívida. Isso é humilhante. Eu enviaria o dinheiro por seu irmão, orientando ele a dizer que conseguiu com um agiota, mas ele não me deu tempo. Ele conseguiu alcançar nosso lado, depois de correr entre chuvas de balas. Quando atravessou a linha, minha facção que estava atenta aos tiros que vinha do outro lado, e sentiram que se aproximavam da linha, ficaram a postos. Quando seu irmão conseguiu atravessar, devia ter continuado correndo, mas parou e mandou um sinal de dedo para a outra facção. Ele foi cravejado. Enquanto eles miravam em seu irmão, minha facção conseguiu atingir alguns deles, mas isso não traria seu irmão estúpido de volta. E eu acabei ficando com uma despesa muito maior do que a combinada inicialmente.

_ O que meu irmão e minha mãe lhe deram como garantia?

_ Ainda não sabe mesmo? – Ele perguntou arqueando a sobrancelha.

Andressa estava enojada demais de seu irmão e de sua mãe, mas precisava ouvir dele.

_ Não posso imaginar.

Ele então pela primeira vez desde que entrou, deu um sorriso tranquilo.

_ Você, Andressa. – Ele disse e se aproximando tirou um papel do bolso e jogou para ela na cama.

Andressa pegou o papel dobrado e viu que se tratava de uma foto dela tirada a poucos dias atrás. Ela estava de pé encostada na parede do lado de fora da casa que dava para o pequeno quintal. Usava biquíni, pois estava pegando uma cor. E sorria alegre. Até seus olhos cinzas ficaram evidentes na foto. Ela estava mais bonita do que realmente se sentia quando se olhava no espelho. Então foi para isso que sua mãe se empenhou em tirar aquela foto. Lembrou que ela tirou várias e demorou para ficar satisfeita. Andressa se voltou para encarar Andrey e o fitou séria. Ele parecia estar aguardando sua reação.

_ E o que você pretende fazer comigo?

_ Use sua imaginação, Andressa. Eu tenho usado muito desde que vi essa foto.

Andressa ficou vermelha.

_ Eu sou de menor... – Andressa disse começando a pensar rápido para sair daquela situação.

Andrey riu.

_ Com dezesseis anos, morando aqui, você deve ter mais experiência que eu próprio. – Ele disse zombeteiro.

Andressa fechou a mão em um punho. Sua vontade era acertar o nariz perfeito dele. Mas se conteve. Talvez ela conseguisse negociar com Andrey. Por tudo que ele contou, era aberto a negociações.

_ Eu posso pagar pela dívida trabalhando aqui para você... Há de convir que minha vida não pertence a nenhum dos dois para que me vendessem. É uma injustiça que eu pague por coisas que eu nunca usei, jamais usufrui de nada deles.

_ É verdade... Ele disse olhando para o teto, mas depois voltou seus olhos para ela. – Mas não ficarei no prejuízo. Não desejando e sonhando em fazer coisas com você que nunca nenhuma outra mulher havia me inspirado. Vai trabalhar muito Andressa. Mas vai ser me servindo da forma e na hora como eu desejar, nesse quarto. Contudo, para não ser injusto de tudo, vou custear seus estudos. Assim, quando eu me cansar de você, terá uma profissão para sobreviver. Sua mãe me disse que você é adiantada na escola e que já tirou o ensino médio. Então, pense muito bem em uma profissão que lhe agrade. Uma chance como essa você não vai ter duas vezes na vida. Pesquise. – Ele disse apontando o computador.

_ Você vai me usar e depois me descartar e acredita que um diploma pode reparar o dano que vai me causar?

_ Não seja dramática. Vai viver no conforto. Não vai lhe faltar nada. – Muitas mulheres dariam o braço para estarem em seu lugar.

_ Pois eu trocaria com prazer. – Andressa disse desafiante e ele apenas sorriu brevemente.

_ Você pode andar pela casa agora. Só não pode sair da propriedade. – Ele disse e se retirou deixando a porta aberta.

Andressa foi até o banheiro e lavou o rosto. Depois saiu do quarto e foi explorar a casa. Desejava encontrar o quarto dele. Então foi abrindo porta por porta, mas nenhum parecia ter ocupantes. Encontrou o da mãe, o reconhecendo pelas sacolas que estavam em cima da cama. Sua ira aumentou. Então sua mãe também viveria do bom e do melhor as suas custas? Ela abriu todas as portas novamente e começou a abrir os guardas roupas. Os quartos todos seguiam a mesma decoração do seu. Ela contou onze quartos, todos com banheiro só no andar de cima. E descobriu que ele não ocupava nenhum deles. Decidida, ela desceu as escadas e começou a abrir as portas do andar de baixo. Havia uma sala ampla com sofás confortáveis e uma grande televisão na parede. O tapete era tão macio que seus pés afundavam neles assim que dava cada passo. Ela saiu da sala um pouco se obrigando, pois, sua vontade era ficar ali assistindo tv, comendo pipoca e bem aconchegada no sofá. Ela encontrou o escritório, também amplo e de muito bom gosto e saiu. Ela procurava pelo lado contrário ao da cozinha, onde já havia percebido que tinha alguns quartos menores, que deviam ser para os empregados, a cozinha, uma copa e a sala de jantar. Estava evitando aquele lado, pois sabia que encontraria movimento por lá. A última porta estava no fim do corredor. Andressa já estava começando a acreditar que ele não dormia ali. Desanimada abriu a última porta.

Sua surpresa foi tão grande que ela ficou paralisada diante da visão. Uma enorme cama, com lençóis de seda azuis, escondia um pouco do corpo de uma mulher que continuava seu sono tranquila, com aquelas coisas que as madames gostavam de colocar nos olhos para não serem incomodadas pela luz do dia. Finalmente Andressa entrou e abriu o maior guarda-roupas que ela já havia visto e viu as roupas dele. A maioria importada. Ela ficou um tempo olhando e pensando o que ele faria com ela se ela juntasse toda aquela roupa e fizesse uma fogueira. A imagem dela ajoelhada e levando um tiro na cabeça, passou por sua mente. Ela percebeu que o quarto era anormalmente grande demais. Tinha coisas de Andrey para todo lado. Era bem mobiliado também. Tinha até televisão no quarto. Ela se aproximou bem da cama e ficou parada observando a mulher adormecida. Estava com uma das pernas bem torneadas para o lado de fora do lençol. Seu cabelo era louro e devia ser muito bonita também. Se perguntou para que Andrey queria ela se tinha uma mulher daquela? Suas roupas estavam espalhadas pelo chão, junto com as de Andrey. Decidiu sair sem fazer barulho e foi até a cozinha onde recendia o cheiro de almoço. Ela se aproximou da mulher que sempre levava a bandeja para ela no quarto.

_ Como é seu nome? – Andressa perguntou sem rodeios.

_ Sou Carla. Lembro de você quando ainda era um bebê nos braços de seu pai. Ele tinha muito orgulho de você. Era sua única filha e saiu com todas as características dele. – Ela disse casualmente, mas muito educada.

_ Você conheceu meu pai?

_ Não querida. Eu conheço seu pai.

Andressa a fitou totalmente confusa.

_ Deve estar me confundindo, Carla. Meu pai morreu há muitos anos. Ele... Eu nem me lembro dele direito.

Carla a fitou com verdadeira compaixão e depois olhou para os lados e para as duas que ficavam com ela na cozinha. E pegou umas batatas numa cesta em cima da mesa e olhou para Andressa, de forma sugestiva.

_ Venha me ajudar a descascar essas batatas. Não é bom que fique o dia inteiro sem fazer nada. Pelo menos até começar seus estudos. Há uma mesa ali na varanda que é mais fresco e pode me contar que curso pretende fazer. – Ela disse e pegou duas facas e as batatas e foi saindo pela porta da cozinha.

Andressa viu que saíram para uma varanda muito bem organizada, com uma churrasqueira de tijolos e mesas em volta. Elas se sentaram em uma e Carla colocou as batas na mesa enquanto Andressa se lembrava que já havia passado por ali, mas não tinha prestado a atenção.

_ Acorda menina! – Carla disse quando viu que Andressa parecia estar em outro mundo.

Andressa pegou uma faca e uma batata e começou a trabalhar em silencio de cabeça baixa, pensativa.

_ Olha, o que eu iria te contar é uma coisa muito séria que poderia mudar coisas importantes em sua vida. Então se achar que não deve saber, eu me calo. Guardarei para mim, mas nem todos vão ter essa compaixão e você vai ficar sabendo mesmo sem querer, apesar de Andrey ter proibido qualquer um de falar nisso com você.

Andressa a fitou por um momento e voltou a cascar a batata.

_ Se ele proibiu, porque você arrisca a vida me contando? Não valho sua vida. Deixa como está.

_ Eu arrisco, porque conheço seu pai, e sei que ele gostaria que você soubesse, confio que você não me entregaria para Andrey, mas de qualquer forma, seria um risco que eu correria, não só por você, mas pelo seu pai.

_ Então me conte. Não prometo que não vou usar a informação, mas prometo que jamais Andrey, ou qualquer outra pessoa, ficará sabendo que soube por você.

_ Fico grata. Então vou contar desde o princípio. Há coisas que não posso revelar, mas você já vai ter algo para digerir com as coisas que vou lhe contar agora. _ Você deve ter percebido que sua alimentação que estava sendo servida no quarto, não era muito digestiva e nem satisfatória para aplacar a fome...

_ Sim. Porque fizeram isso? Querem que eu emagreça?

_ Não, você tem um peso ideal e um corpo invejável. Mas sua mãe não pensa o mesmo e nos chantageou para que só servíssemos o que ela desejava ou diria para Andrey que nós estávamos tentando lhe engordar para que ele perdesse o interesse por você.

_ Minha mãe, tem tanta influência sobre ele assim? Isso pode ser bom para mim, afinal.

_ Ela ainda não sabe que Andrey nos disse para não a deixar mais trancada e que devia explorar a casa, só não pode sair sozinha daqui da mansão. Dê a volta e vai lá atrás e veja como sua mãe está preocupada com seu isolamento no quarto. Ela não foi visita-la nenhuma vez né?

_ Não. Pensei que ela também estivesse sido mantida presa e fora solta hoje.

_ Não. Ela esteve o tempo todo livre, inclusive a ideia de deixa-la presa foi dela, mas convenci Andrey que isso estava modificando seu semblante e que logo você poderia desenvolver depressão. Vá lá atrás da mansão. Mas não deixe que ela lhe veja ainda. Surpreenda-a na hora do almoço.

Sem dizer mais nada, Andressa se levantou e foi até o lado de trás da mansão. Ela ficou escondida e viu a cena que a chocou de uma forma muito impressionante. Ela esperava ver tudo, menos aquilo. Uma empregada entregava uma toalha para sua mãe que saia da piscina, e depois lhe entregava uma bebida assim que ela se sentou na espreguiçadeira. Ela disse algo para a empregada e essa se retirou. Andressa não precisava ver mais nada além daquilo, mas ficou um tempo encostada na parede, seus pensamentos estavam mais agitados que nunca. O filho dela havia morrido há pouco tempo, ela estava curtindo uma piscina, como se nada de ruim houvesse acontecido? Sem pensar na filha presa e condenada a ser uma escrava sexual para sempre, presa num quarto? Andressa não sabia o que pensar além de que sua mãe no fundo sempre pensou nela mesma. Que tudo que lhe aconteceu até ali, foi uma escada preparada por ela, para viver uma vida confortável sem precisar trabalhar e se esforçar para isso. Começou a imaginar que devia ter partido dela a ideia de oferecer sua filha como pagamento da primeira dívida de Thiago. E tudo que estava passando por sua mente, estava a deixando furiosa. E resolveu voltar para Carla. Queria saber mais sobre seu passado. Depois confrontaria sua mãe. Talvez no almoço, como lhe aconselhou Carla.

Quando voltou para a mesa, Carla havia preparado um suco de laranja para elas, colocado uma cesta para que fosse colocada as cascas. Andressa se serviu de suco e fitou Carla que parecia esperar a explosão de fúria de Andressa, em silencio. Naquele momento, soube que Carla estava a testando, para saber se ela era capaz de controlar seus sentimentos.

_ O que minha mãe está bebendo? Você sabe?

_ Ela pediu para Josefa fazer um drink, com uns ingredientes. Ela a ensinou a fazer esse drink ontem à noite, para lhe ser servido hoje na piscina. Exigiu também que ficássemos atentos as necessidades dela, enquanto ela estivesse vivendo o luto na piscina. Experimentei do drink, realmente é muito bom, mas fico imaginando onde ela conseguiu essa receita. Os ingredientes são caros.

_ Ela tem uma forma muito... Distinta de viver um luto. – Andressa disse tranquila, sabendo que Carla estava observando suas atitudes e reações.

_ E você pretende fazer algo quanto a isso?

_ Na verdade não. Ela sempre foi muito pobre e um pouco de luxo pode estar trazendo paz a ela por ter perdido o filho. Não me agrada, e por dentro me revolto com muita ira, por ela estar se divertindo enquanto o filho está enterrado e pensa que a filha está trancada, comendo o que ela estava enviando, apenas para garantir a estadia dela aqui. E também me revolto por eu ter que pagar por erros deles, enquanto para ela é uma festa. Mas mesmo assim, a deixarei em paz.