Queria matar o passado, mas ele que me matou.
A chuva caía violentamente, em gotas grossas, machucando peles sensíveis como de crianças. O som do impacto dos pingos com o chão, o vento balançando as árvores ocultava o barulho do choro baixo e dolorido da garotinha sentada encolhida debaixo da videira que plantou com seu pai quando ainda era mais nova.
Estava frio, mas não se importava menos. Apenas queria morrer como ele e seu irmão, queria acabar com sua dor que eles tentaram resolver. Achava injusto ter ficado enquanto eles partiam, quando foi por ela que estavam mortos.
Se culpava por causa deles. E ninguém sabe se um dia se auto perdoaria.
Abraçou mais forte as pernas, escondendo o rosto nos joelhos, mordendo os procurando de alguma forma transformar sua dor em física. Tenta gritar, porém mais uma vez sua voz fica presa na garganta quando mais precisa.
Ninguém a entendia. Sua dor, sua culpa ultrapassava as barreiras impostas por outros. Ela chorava as perdas das pessoas que mais amava, ela chorava pela culpa que corria seu coração.
Enraivecida, a pequena garota acompanhar com o olhar quando o último carro de alguém que estava no velório vai embora, a única pessoa que não deveria ter vindo, a culpada de tudo aquilo. Desolada, encolhe-se mais quando ouve os passos da mãe aproximando-se, impedindo a que toque em seu rosto quando estende sua mão.
— Vamos entrar filha, ficará doente. — tenta toca-lhe mais uma vez, no entanto, com força sua mão e afastada. — Jade!
— Sai! — não se esforça em ser delicada. — Não quero ninguém, quero ficar sozinha. Que fique doente, quero morrer igual eles!
A mulher de fios escuros e curtos, segura o choro não querendo demostrar mais vulnerabilidade diante da filha. Pensa em tirara-la a força do chão e levá-la para dentro de casa, mas um apertão no seu ombro do homem atrás de si a faz desistir.
— A deixe, vá, falarei com ela. — o tom suave a convenceu e olhando uma última vez para filha se foi. — Jade...
A voz sempre imponente, que assustava homens, que demandava ordens, nunca soou tão leve e compassiva como agora, nem parecia pertencer ao dono do maior Império europeu. Não parecia ser Victor Richter, o terno continuava o mesmo alinhado de sempre, mas agora as gostas de chuva desfaziam sua beleza, como lavavam sua expressão séria, seus olhos verdes perderam o brilho, seu sorriso na maioria das vezes arrogante no momento tornou-se compreensivo, contudo Jade não via nada além do que sua dor permitia. Ela só enxergava mais um culpado pela partida do seu pai, mesmo esse homem tendo sido seu melhor amigo.
— Vai você também. — levanta os olhos para o homem mais poderoso do mundo, o encarando com asco. — Tudo isso e por culpa do maldito império que criou, espero que ele caía com todos vocês juntos. Eu odeio vocês!
Victor deu dois passos para trás assustado com o que viu na garota, não lembra de alguma vez na vida ter visto tanto ódio em uma criança, principalmente em Jade que sempre foi tão doce. Parece que a chuva lavou os traços da menininha de fios escuros encaracolados, olhar sonhador e sorriso doce, deixando para trás uma criança amargurada. Nada, nem o brilho azul dos seus olhos, existia mais.
— Foi uma fatalidade Jade.
— NÃO FOI, FOI POR CULPA DE VOCÊS — deixa o chão apontando o dedo para o homem que foi o melhor amigo do seu pai. — Eu vou destruir vocês, vou acabar com a Terceira Aliança. Um por um, vai cair. Não vou parar até acabar com tudo.