— Hm... Ele está bem? —
Misha Flott comentou, incrédula.No mesmo instante, Eina Tulle tirou os olhos do livro que estava lendo, curiosa com o que Misha estava apontando.
Com o turno prestes a terminar e a Guilda quase vazia, Eina permitia-se relaxar um pouco, mantendo sua mente no livro. Mas o olhar da colega capturou sua atenção.
— Ele parece um pouco cansado.
Comentou Eina, franzindo a testa ao reconhecer o aventureiro. Algo naquela cena a fez lembrar de um evento de semanas atrás.
Ela se recordou claramente daquele jovem que veio registrar sua entrada na Guilda. Insistente como sempre, Eina o alertou inúmeras vezes sobre o perigo de entrar na Dungeon sem estar afiliado a uma Família. Ele não tinha uma falna, o que significava que não tinha o apoio ou as bênçãos de um deus. Contra os monstros da Dungeon, isso era quase uma sentença de morte.
Ainda assim, ele entrou.
Naquela época, Eina não tinha muitas expectativas de que ele sobreviveria por muito tempo. Sem uma Família, sem experiência e com a temeridade dos que não conhecem o real terror da Dungeon, parecia uma questão de tempo até que ele fosse mais uma das vítimas silenciosas do subsolo. Mas, para sua surpresa, não só ele voltou como ninguém na Guilda havia reparado naquilo.
Eina sempre se esforçava para manter uma postura profissional, escondendo suas preocupações atrás de uma máscara de seriedade. No entanto, de tempos em tempos, não conseguia deixar de sentir falta dos aventureiros que ela orientou, aqueles que foram marcados pela Dungeon de formas irreversíveis.
Quando ela confirmou que o jovem aventureiro ainda estava vivo, não conseguiu evitar um pequeno sorriso de alívio. Aaron — era esse o nome dele. Um nome que, até aquele momento, ela não esperava recordar.
Levantando os óculos com um leve ajuste, ela o observou entrar na Guilda. Como era quase meia-noite, a Guilda estava praticamente vazia, o que permitiu que ela notasse com clareza o estado do rapaz.
Seus olhos se arregalaram por um breve momento.
— Saudações...
Ele disse com uma voz cansada e educada, mas firme.
—Eu, gostaria de trocar minhas pedras mágicas.
O rapaz estava com o braço esquerdo enfaixado dava pra ver que era recente pois o sangue ainda não havia secado direito, e um pequeno corte atravessava sua testa, de onde algumas gotas de sangue seco ainda estavam visíveis. Sua roupa estava marcada por arranhões e pequenas manchas de sangue.
Eina não conseguia esconder a preocupação. Havia algo naquele jovem que despertava sua curiosidade e apreensão ao mesmo tempo. Ela sabia que a Dungeon podia ser implacável, especialmente com aventureiros que não tinham apoio. E, mesmo assim, ele estava ali, como se tudo aquilo fosse problema de outra pessoa.
...
— Você realmente se superou dessa vez... O que pensa que está fazendo agindo dessa forma? —
Eina perguntou, seu tom carregado de desaprovação. Era claro que ela estava insatisfeita.
— Eu ficarei bem,
Eu respondi, tentando manter a calma.
A expressão de Eina se transformou em algo próximo de fúria ao ouvir minha resposta tão casual. Estávamos em uma sala separada na Guilda, longe dos olhos curiosos dos outros recepcionistas.
Apenas uma mesa nos separava, e eu tinha a sensação crescente de que ela era a única barreira física que impedia Eina de me estrangular por causa da minha aparente falta de cuidado.
Ela suspirou, visivelmente cansada, como se já tivesse desistido de lidar com alguém tão teimoso.
— Você realmente continuou a descer na masmorra mesmo sem uma falna, apesar de eu ter insistido diversas vezes para que não o fizesse.
Seus olhos estreitaram-se em frustração.
— Eu tenho sérias dúvidas sobre o que você está tentando provar. Você quer morrer?
— De forma alguma.
Respondi de forma sincera, eu odiava a dor mais que qualquer coisa, mas eu tambem odiava passar fome, e como não havia outro trabalho que eu soubesse fazer...
Mas enquanto a ela bem Eina Tulle... ela era realmente uma boa pessoa. Mesmo sem me conhecer bem, parecia genuinamente preocupada.
Seu jeito, embora rígido, era sempre guiado por uma vontade de proteger os aventureiros, mesmo os mais teimosos como eu.
— Você deveria cuidar mais de si mesmo. Já pensou no que faria se ficasse aleijado ou, pior, morto?
Suas palavras eram duras, mas carregavam uma preocupação genuina. Haa tenho inveja da pessoa que vai casar com ela, ou talvez não já que ela nunca vai parar de se preocupar.
— Claro que sim. Só preciso parar de imaginar, —
Respondi, um sorriso irônico se formando no meu rosto eu não era um tolo eu pensava bem antes de agir.
Enquanto isso a expressão de Eina se fechou numa carranca terrível. Caramba... agora eu a deixei realmente brava. Ela não disse mais nada.
"Socorro , ela quer me matar só com esse olhar"
Em vez disso, pegou seu diário de anotações e começou a registrar tudo o que eu tinha feito na Dungeon, como sempre fazia em cada encontro nosso. oh ela ativou o modo secretaria.
— Então, o que aconteceu dessa vez? — ela perguntou com um tom levemente irritado parecia que ela queria encerrar por ali.
Suspirei, começando a explicar o que ocorreu.
Eu fui até o 11º andar, como de costume. É o máximo que vou, já que minha força deve estar entre o meio do nível 1. Eu não enfrento os orcs diretamente; prefiro caçá-los à distância com meu arco. Só que, quando estava coletando as pedras mágicas de um, um orc me pegou desprevenido. O golpe foi forte o suficiente para me lançar longe e... bem, quebrei o braço na queda.
Eina me encarava com uma mistura de choque e exasperação, mas permaneceu em silêncio, apenas escrevendo enquanto eu continuava.
— Depois disso, tentei fugir de volta para a superfície. Mesmo sem um relógio de pulso, meu relógio biológico dizia que já estava tarde. Nos pisos superiores, as coisas ficaram complicadas. Os monstros começaram a me seguir, e logo fui cercado. Fui espancado, mas...
hesitei por um segundo, observando sua expressão se contorcer de incredulidade
— bem, eu acabei com eles.
Cada palavra parecia encher o rosto de Eina de mais descrença. Ela parou de escrever por um momento, levantando os olhos para mim como se estivesse tentando compreender como eu ainda estava ali, vivo e falando casualmente sobre algo tão absurdo.
— Você... — ela começou, mas parou, aparentemente sem palavras para descrever o quão insensato aquilo parecia para ela.
Eu dei de ombros, sem saber muito bem o que dizer para tranquilizá-la. Ela continuou me encarando, claramente descontente, mas, ao mesmo tempo, parecia aliviada que eu estava ali, inteiro ou pelo menos perto disso.
— Oh... Você se preocupa tanto assim comigo? — perguntei com um sorriso brincalhão.
Foi nesse momento que a expressão de Eina mudou completamente. O vermelho de sua raiva se misturou com um toque de vergonha, e antes que eu pudesse perceber o que estava acontecendo, ela pegou o livro que estava sobre a mesa e o jogou diretamente na minha direção.
Meus instintos me traíram. Tentei levantar o braço para me defender, mas como ele estava na tipoia, o movimento resultou em uma bagunça desastrosa. O livro me atingiu diretamente no nariz.
E a força foi tanta que o impacto me fez inclinar da cadeira caindo no chão
— Aghh!
exclamei, levando a outra mão ao rosto enquanto tentava conter a dor.
...
Do outro lado da Guilda, Misha Flott estava se preparando para sair quando viu a cena hilária se desenrolar à sua frente. Ela assistiu enquanto Aaron saía da sala às pressas, com o nariz sangrando, e logo atrás, Eina Tulle, com uma expressão que oscilava entre raiva e constrangimento. Seus olhos procuravam ao redor, como se estivesse prestes a explodir, mas sem notar a presença de Misha.
— Eu vou te matar, Aaron! — gritou Eina, sua voz carregada de frustração.
— Oh não, socorro! A senhorita elfa quer me matar!
Respondi, correndo e fazendo pouco caso, minha voz cheia de sarcasmo.
O tom zombeteiro só serviu para aumentar a raiva de Eina, que já parecia estar no limite. Se antes ela apenas estava irritada, agora realmente parecia querer me dar outra surra.
-Hahahaha...
E é claro eu estava rindo como um louco.
Misha, observando a confusão de longe, não pôde conter um sorriso.
Enquanto Aaron fugia com o nariz sangrando, e Eina tentava manter a compostura em meio ao caos que ela mesma tinha causado, Misha riu baixinho, apreciando o espetáculo.