5:50 AM - Ruas Vazias
Kazuhiko caminhava lentamente pelas ruas desertas da cidade, o ar frio da manhã formando uma névoa leve ao redor de seus passos. Apesar do silêncio exterior, sua mente era um caos. A voz persistente em sua cabeça não o deixava em paz, sussurrando com impaciência e exigência.
???: (Você perdeu uma oportunidade de ouro nesta madrugada, moleque. Aquela alma... seria perfeita para nossa jornada. Você me frustra além do limite.)
Kazuhiko suspirou, enfiando as mãos nos bolsos.
Kazuhiko: — E lá vem você de novo. Não acha que tenho o direito de tomar minhas próprias decisões? Aquela garota não merecia isso. Eu não vou simplesmente sair por aí matando pessoas inocentes só porque seria conveniente.
???: (Sua bondade... é repugnante. Um luxo que não podemos mais nos dar. Se continuar assim, não vai durar muito tempo neste jogo divino.)
Kazuhiko parou de andar por um momento, fitando o asfalto úmido. Ele havia ignorado essa voz desde que surgira, mas agora... uma curiosidade o corroía.
Kazuhiko: — A propósito... nunca perguntei isso antes, mas você tem um nome? Ou devo continuar chamando você de "a voz irritante na minha cabeça"?
Kokuei: (Finalmente se tocou? Tava cansado de ser o Sr. ???. Meu nome é Kokuei. Grave isso. E enquanto falamos disso, deixe-me esclarecer algo: eu não sou apenas uma voz na sua cabeça. Sou sua única chance de sobrevivência. Sem mim, você já estaria morto.)
Kazuhiko: — Certo, Kokuei. Então me diga: se você é tão poderoso, por que está preso dentro de mim?
Kokuei: (Uma longa história. Resumindo, usei quase toda minha força para criar uma dimensão própria dentro de você. Um espaço tão obscuro e único que nem mesmo Deus pode me detectar. E por isso, eles pensam que você é apenas uma reencarnação minha. Isso nos dá vantagem, mas não por muito tempo.)
Kazuhiko assentiu lentamente, absorvendo as informações.
Kazuhiko: — Interessante... mas espera aí, você mencionou "eles". Quem exatamente são esses "eles"?
Kokuei suspirou em exasperação antes de começar a explicar.
Kokuei: (Presta atenção porque só vou dizer isso uma vez. Existem três níveis de hierarquia angelical: o Reino Normal, o Reino Celestial e o Reino Divino...)
Reino Normal: Anjos, Arcanjos e Principados.
Reino Celestial: Dominações, Tronos e Querubins.
Reino Divino: Serafins e Deus.
Após a explicação, Kokuei finalizou com irritação.
Kokuei: (E é isso. Não me pergunte mais sobre isso, odeio lembrar da existência desses seres nojentos.)
Kazuhiko: — Tá bom, tá bom... mas só pra confirmar—
Kokuei: (N Ã O.)
Kazuhiko riu baixo, mas seu humor logo mudou quando Kokuei ficou em silêncio abruptamente.
Kokuei: (Cuidado... sinto que estamos sendo observados. Algo está errado.)
Kazuhiko parou imediatamente, sentindo um arrepio subir pela espinha. Antes que pudesse reagir, uma enorme espada caiu do céu, esmagando o chão a poucos metros dele e criando uma cratera massiva.
Kokuei: (DESVIA, AGORA!)
Instintivamente, Kazuhiko saltou para trás, evitando o golpe por um fio. Quando a poeira assentou, uma figura gigantesca pousou ao lado da espada.
???: — Hmph... parece que errei. Mas não importa.
A figura era colossal, sua presença esmagadora. Mesmo com 1,86m de altura, Kazuhiko se sentiu como uma criança diante dele.
???: — Finalmente encontrei você, o "monstro" que matou dois dos nossos anjos. Devo dizer... estou decepcionado.
Kazuhiko: — Quem diabos é você?!
???: — Eu? Sou Zadiel, o Arcanjo da Benevolência. Vim libertar sua alma suja e corrompida. Considere isso um ato de misericórdia.
Antes que Kazuhiko pudesse responder, Zadiel desapareceu em um piscar de olhos. No momento seguinte, uma dor lancinante tomou conta de seu corpo — seu braço havia sido decepado. Ele gritou, recuando enquanto segurava o ombro ensanguentado.
Zadiel: — Que frágil. Se soubesse que seria tão fácil, teria usado menos força.
Kazuhiko cerrou os dentes, tentando se recompor.
Kazuhiko: — Não me subestime, seu arcanjo de merda!
Empunhando uma espada de luz que conjurou, ele avançou com velocidade sobre-humana. Zadiel desviou facilmente, mas a lâmina de Kazuhiko fez uma curva inesperada, arranhando a armadura do arcanjo.
Zadiel: — Impressionante. Você realmente conseguiu se adaptar à forma angelical... mesmo sendo um anjo falso. Isso pode ser divertido.
A luta se intensificou. Zadiel atacava com socos e chutes, cada golpe devastador o suficiente para derrubar prédios inteiros. Kazuhiko, apesar de esquivar-se por pouco, sabia que estava em desvantagem.
Kazuhiko (pensando): (Não posso vencê-lo. Ele é um monstro... nem está usando a espada dele e já é mais forte do que tudo que já enfrentei!)
Kokuei: (Calma, moleque! Ele tem uma fraqueza. Concentre-se em precisão e ataque as lacunas da armadura dele. É sua única chance!)
Kazuhiko tentou um movimento desesperado, criando estacas de luz para limitar os movimentos de Zadiel, mas o arcanjo simplesmente riu.
Zadiel: — Que patético. Você não entende com quem está lidando.
Zadiel reapareceu atrás de Kazuhiko e desferiu um chute poderoso, lançando-o pelos ares e destruindo várias casas no impacto. Quando Kazuhiko finalmente parou, estava entre escombros, cuspindo sangue.
Kokuei: (CHEGA! SINTA A INVEJA, KAZUHIKO. TOME O QUE NÃO É SEU!)
Memórias inundaram a mente de Kazuhiko. Imagens de momentos de fraqueza, pessoas que ele não pôde salvar, olhares de desaprovação.
Kazuhiko (pensando): (Eu sou fraco... sempre fui. Não consigo cumprir essa missão. Não sou nada comparado a ele...)
Uma explosão de energia roxa emanou do corpo de Kazuhiko, lançando Zadiel para trás. A aura era densa, quase palpável. Quando a poeira baixou, Kazuhiko emergiu dos escombros. Seu corpo estava transformado — músculos maiores, olhos brilhando com energia roxa, e uma determinação sombria em seu olhar.
Zadiel (pensando): (O que... é isso? Não é magia. Isso é... algo profano.)
Kazuhiko: — És um pecado... és um nível. Que a fraqueza nos leve ao desespero, e que a inveja... mate.
Zadiel: — Então é verdade... o que sussurram sobre você. Aquele que desafia os Céus.
Em algum lugar no céu, numa sala de reuniões com uma mesa imponente cercada por sete cadeiras, uma delas vazia.
???: — Espero que Zadiel elimine aquela ameaça que o Senhor mencionou. Confesso que gostaria de descer e lidar com isso pessoalmente, mas ele insistiu em "poupar" ou ter "misericórdia" da alma dele... Sinceramente, misericórdia? Zadiel falando isso? Patético.
???(2): — HAHAHA! Zadiel, misericordioso? Essa é boa! Nunca vi ele agir com piedade em momento algum. Francamente, ele é uma piada ambulante, só fala mentiras.
???(3): — Ei, e se ele falhar? Não quero desmerecê-lo, mas a arrogância e a confiança exagerada dele podem acabar sendo seu maior inimigo.
???(4): — Ah, sério? Estão mesmo preocupados com ele? Eu não ligo pra quem vence ou perde. Só quero saber quando será minha vez de lutar de novo. Faz séculos que estou preso nesta cadeira!
???(5): — Acalmem-se, todos vocês. Por mais irritante que ele possa ser, Zadiel ainda é um Arcanjo e um dos mais fortes entre nós. Ele trabalhou duro para chegar onde está. Mostrem um pouco de respeito, certo, Líder?
???(6): — Hm... É verdade. Apesar de tudo, ele é um de nós. Mas não podemos apenas esperar o resultado dessa batalha. Ainda temos outros deveres a tratar. Agora, voltem ao trabalho. Esta reunião acabou!
Voltando à batalha nas ruas destruídas...
Kazuhiko: — Venha, Zadiel! Mostre se você é tudo isso que dizem!
Zadiel: — Não fique tão confiante só porque ganhou alguns músculos. Você ainda é inferior, um humano corrompido pela maldade!
Zadiel avança novamente com velocidade desumana, sua espada divina cortando o ar com ferocidade. Kazuhiko, ainda sem um braço, ergue sua espada de luz para bloquear o ataque. O impacto reverbera pelas ruínas ao redor, mas Kazuhiko resiste, sua força recém-descoberta brilhando intensamente.
Kazuhiko: — Parece que consegui prever seus movimentos... Você não é tão forte assim, hein?
Zadiel: — Como ousa?! Não é possível que um mero humano tenha bloqueado minha lâmina!
Kazuhiko: — Sua arrogância foi o maior erro, Zadiel. Agora vou te destruir!
Kazuhiko canaliza sua luz, criando um braço novo no lugar do que perdeu. Com um soco devastador, ele lança Zadiel contra um prédio, que desmorona sob o impacto. Antes que os escombros possam cair, Zadiel já surge, cuspindo sangue e avançando com fúria incontrolável. Ambos trocam socos violentos, gerando ondas de energia que destroem o que resta da rua.
Zadiel: — Admito que você ficou mais forte, mas ainda não está à altura de um Arcanjo! Agora vou mostrar minhas cartas na manga!
De sua armadura divina, vários raios de luz emergem, perfurando partes do corpo de Kazuhiko, forçando-o a recuar.
Kazuhiko: — Droga...!
Kazuhiko tenta manter distância, mas Zadiel não dá trégua, avançando incessantemente. Kazuhiko invoca estacas de luz do chão, mas Zadiel as evita com agilidade impressionante.
Zadiel: — Haha! Isso? Eu já enfrentei anjos que usavam truques melhores. Você não passa de um amador!
Zadiel ativa suas asas, brilhando intensamente, e dispara uma chuva de penas de luz contra Kazuhiko.
Kazuhiko: — Merda...!
Kokuei, a presença sombria dentro de Kazuhiko, fala em sua mente.
Kokuei: (Moleque! Use o ambiente a seu favor! Lembre-se: ele é forte, mas vocês são iguais. É uma questão de habilidade, não apenas força!)
Kazuhiko reflete a luz das janelas ao seu redor, criando vários raios que convergem para Zadiel.
Zadiel: — Hmm... Finalmente algo interessante! Mas ainda fácil de defender.
Zadiel ergue suas asas como escudos, bloqueando os ataques de luz de Kazuhiko.
Kazuhiko: — Ainda não acabou!
Kazuhiko invoca uma lança de luz que surge do chão, mirando o rosto de Zadiel. Embora Zadiel tente se desviar, o ataque corta seu rosto profundamente, cegando-o de um olho.
Zadiel: — SEU VERME! AGORA VOCÊ ME IRRITOU!!
Zadiel cobre seu corpo com luz, jogando Kazuhiko para o céu. Eles alcançam a mesosfera, onde Zadiel concentra toda sua energia, criando uma armadura de luz completa. Ele dispara uma barragem de raios em todas as direções, cobrindo o céu de amarelo. Kazuhiko desvia como pode, mas alguns raios o atingem, queimando sua carne.
Kazuhiko (pensando): (Não posso vencê-lo assim! O que eu faço?!)
Kokuei: (Fure a luz dele com algo mais forte! Concentre toda sua energia em um único ponto e ataque! É a única chance!)
Kazuhiko começa a carregar sua espada com toda a luz que consegue reunir, enquanto desvia dos ataques. Apesar da dor excruciante, ele se aproxima de Zadiel.
Zadiel: — HAHAHA! VOCÊ NÃO PODE ME ALCANÇAR!
Kazuhiko, em um último esforço, cospe sangue no olho restante de Zadiel, cegando-o momentaneamente.
Zadiel: — MEU OLHO! SEU MISERÁVEL!!
Kokuei grita dentro da mente de Kazuhiko.
Kokuei: (AGORA! É A SUA CHANCE!)
Kazuhiko, com toda sua força restante, enfia sua espada carregada de luz diretamente no coração de Zadiel, perfurando a armadura divina. Zadiel grita de dor enquanto sua armadura se desfaz.
Zadiel: — Eu sou um Arcanjo... Não vou morrer para você!!
Antes de cair, Zadiel lança Kazuhiko de volta à Terra. Enquanto Kazuhiko despenca, ainda segura a espada, explodindo-a dentro de Zadiel, que é estraçalhado por dentro.
Zadiel: — NÃO... EU NÃO VOU... MORRER!!
Ambos caem. Kazuhiko atinge o chão com força, criando uma cratera. Zadiel cai logo depois, inconsciente e gravemente ferido.
Kazuhiko (agonizando): — Eu... venci... Graças à sua arrogância... Eu venci.
Mas Zadiel ainda está vivo, mesmo que debilitado. Seu corpo começa a brilhar intensamente.
Zadiel: — Se não posso vencê-lo... Então vamos morrer juntos!
Kokuei grita desesperado.
Kokuei: (KAZUHIKO! ELE VAI SE AUTODESTRUIR! SAIA DAÍ AGORA!)
Antes que Kazuhiko possa reagir, Zadiel explode em uma luz devastadora. Todo o quarteirão é obliterado, mas, no último momento, uma figura misteriosa surge, resgatando Kazuhiko e desaparecendo antes que a explosão o consuma.
Horas depois, em uma caverna escura...
Um som de gotejamento ecoava no ambiente úmido e escuro. Kazuhiko acordava lentamente, sentindo o corpo em agonia e cada músculo gritando por descanso. Sua visão estava turva, mas ele conseguia distinguir o teto da caverna iluminado por uma luz fraca de uma tocha próxima.
Kazuhiko: — Ugh... Onde estou...?
???: — Finalmente acordou. Achei que tinha te perdido ali atrás.
Uma figura se aproximava da luz da tocha. Um homem alto, de cabelo longo e escuro preso em um rabo de cavalo, com roupas de viajante rasgadas e uma cicatriz atravessando o rosto. Seu olhar era sério, mas havia uma aura de tranquilidade ao redor dele.
Kazuhiko: — Quem... Quem é você?
???: — Meu nome não importa agora. O que importa é que você está vivo, ainda que só por pouco. Você tem sorte de eu estar passando por ali antes que aquela explosão te matasse.
Kazuhiko tentava se levantar, mas sua força o abandonava completamente, e ele caía de volta no improvisado leito de pedra.
Kazuhiko: — Zadiel... Ele... Está morto?
???: — Difícil dizer. Quando fui te tirar de lá, ele já não era nada além de pó de luz. Se ele morreu, o Senhor dele vai saber. Se não morreu, bem... Talvez você o veja de novo, se sobreviver ao estado em que está.
Kokuei aparecia em forma de uma silhueta de luz ao lado de Kazuhiko, sua expressão preocupada e severa.
Kokuei: — Muleque, você quase morreu lá atrás! O que diabos estava pensando, indo de frente contra um Arcanjo sem um plano de fuga?
Kazuhiko: — Eu... Improvisei. Funcionou, não foi?
Kokuei: — Funcionou por um milagre. Você precisa ser mais esperto da próxima vez. Zadiel era só o começo. Existem outros... Muito piores.
???: — Outros? — O homem olhava intrigado para Kazuhiko, como se soubesse que ele estava conversando com alguém invisível. — Quem quer que esteja aí, está certo. Zadiel é só um soldado. Existem forças muito maiores do que ele à espreita.
Kazuhiko: — E você sabe sobre elas?
???: — Sei o suficiente para entender que, se você continuar se jogando em batalhas suicidas como essa, não vai durar muito tempo.
Kazuhiko ficava em silêncio, absorvendo as palavras do homem. Ele sentia uma mistura de gratidão e irritação, mas sabia que o estranho tinha razão.
Kokuei: — Ele tem razão. Descanso é importante, mas você precisa aprender a usar sua cabeça e seu poder de forma mais estratégica. Essa batalha foi uma lição; agora é sua decisão aprender com ela.
O estranho se levantava, pegando uma espada simples que estava encostada na parede da caverna.
???: — Vou buscar algo para você comer. Se quiser sobreviver, vai precisar recuperar suas forças rápido. A guerra lá fora não espera por ninguém.
Ele desaparecia na escuridão da caverna, deixando Kazuhiko sozinho com seus pensamentos. A única luz vinha da tocha próxima, e a caverna parecia muito maior e mais fria do que antes.
Kazuhiko: — Zadiel... Um dos 7 Arcanjos. Se ele foi tão difícil de derrotar, como vou enfrentar os outros... Ou aquele que os comanda?
Kokuei: — Com inteligência, treino e paciência. Mas antes de pensar no próximo, aproveite que você sobreviveu. Use esse tempo para se tornar mais forte.
Kazuhiko fechava os olhos, tentando encontrar força dentro de si. Ele sabia que ainda havia um longo caminho a percorrer e que essa batalha era apenas o início.
No céu, a mesma sala de reunião com seis cadeiras ocupadas. Um dos Arcanjos, o mais velho entre eles, olhava para baixo com um semblante frio.
Arcanjo Líder: — Então... Zadiel falhou.
???(2): — HAHAHA! Eu sabia! Aquele idiota confiou demais no próprio ego. Agora ele está morto por causa disso.
???(5): — Silêncio. Mesmo na falha, ele era um de nós. E sua derrota deve servir como um lembrete: não subestimem essa ameaça.
???(4): — Finalmente, algo interessante. Talvez seja minha vez de descer e resolver isso.
Arcanjo Líder: — Não. Este humano mostrou um potencial além do esperado. Quero observá-lo por enquanto. Se ele se tornar um problema, enviaremos alguém mais adequado.
???(3): — Adequado? Quem seria? Eu espero que não seja aquele "especialista".
Arcanjo Líder: — A decisão será minha. Por enquanto, voltem aos seus deveres. Este humano... Kazuhiko... Ainda tem muito a mostrar.
Fim do Capítulo