LIZ
14 dias para o baile de inverno.
Meus parentes podem ser legais, mas dessa vez não consigo achar isso. Eles estão a todo tempo falando de Columbia e Yale, acho que é um complô que mamãe está montando contra mim.
Como se não bastasse minha irmã está falando sobre a sexualidade cada um dos nossos parentes que tem menos de 25 anos com uma de nossas primas, escutei meu nome sair em dado momento e logo sai de perto delas como medo de alguma pergunta que eu não conseguisse (ou quisesse) responder.
Deixando todos os parentes de lado, fui para o meu quarto irritada com tudo e sem ao menos saber especificamente porquê disso.
Rafa 🌵💖:
Passei para lembrar...
Estou te esperando para a parada
Por favor, Liz
Você tem que sair um pouco dessa cidade
Tenha coragem de fazer algo, garota
Te amo, branquela
Você desestabiliza minha cabeça toda
É um dom 🌚
Cala a boca
Isso não é legal
Assim você me deixa doida, Rafa
Eu faço essas coisas com as mulheres rsrs
Aham, deixá-las a ponto de surtar
*****
Milhares de coisas passavam na minha cabeça, algumas meio insanas... E a ideia que mais me assolou minha cabeça era a de ir ver Rafa em Nova Orleans e ficar uns dias fora de casa.
Estou respirando rápido depois de ter colocado várias roupas numa bolsa; determinada a sair de casa mesmo e nervosa com essa ideia.
— Liz?
A porta do meu quarto está apenas encostada, então a cabeça de Joana está ali no espaço aberto.
— Oi.
Minha prima entra no meu quarto e olha para minha bolsa que ainda está aberta. Ela me analisa por alguns segundos e pega meu nervosismo pelo ar.
— Para onde vai, blanquita? — Joana senta em minha cama de forma despreocupada. — Vai fugir de casa?
Minha prima ri com a própria sugestão, forço um sorriso e Joana me olha por tempo demais para meu desgosto.
— Oh... É... Não.
— Liz! — Joana se levanta e me encara, apesar de ver ela apenas a cada um ano, nós temos mais proximidade uma com a outra do que com o resto da família (mesmo assim não é grande coisa). — Você vai fugir? Me diga que você tem uma desculpa melhor que estar de castigo.
— Eu tenho.
Me limito a dizer isso, não tinha porque mentir para Joana; ela não tentaria me impedir de nada.
— Tem mesmo?
— Sim.
— Ok. — Ela suspira, sei que não confia 100% em mim, apesar de me achar madura sabe que de qualquer forma ainda sou apenas uma jovem (que é naturalmente inconsequente). Senta na cama e olha mais um vez para minha bolsa. — Você vai sozinha?
— Não, uma amiga minha vai comigo.
— Tem certeza que...
— Eu realmente preciso disso, Jo. — Quase suplico, ela olha em meus olhos e aposto que vê um pouco do meu desespero ali. — Não me faça desistir disso, por favor.
— Tudo bem, tudo bem... — Trata de falar apressada, ela fica alguns instantes em silencio antes de falar de novo. — Certo, me responda uma coisa... Sua amiga tem carro?
Estranho a pergunta e emendo com outra.
— Por quê?
— Bem... Seu carro está estragado, Scoot e eu fomos ao mercado e quando voltamos vimos que estava vazando óleo e estava difícil para pegar quando saímos.
O tom dela é um pouco apreensivo, como se eu fosse ficar brava ou culpa-la por ter estragado o carro. Não me surpreendo de ficar na mão mais uma vez com meu carro, é sempre assim, parece que ele faz de propósito.
— Oh, mer—ok... Não tem problema.
— Sério?
— Uh, sim. — Respondo, mesmo sem muita convecção da minha parte, Joana suspira aliviada.
— Certo, agora vou te ajudar a fechar a mala. — Ela fala divertida. Não estou no clima de piadas quando estou preocupada de ter que cancelar tudo porque não tenho um carro, mas Joana de certa forma não me atrapalha em momento algum.
*****
— Liz, sua ideia é absurda. — Maya me fala isso novamente, a terceira ou quarta vez. Estou ficando irritada, o que menos quero são julgamentos. — O que te faz pensar que vou emprestar meu carro?
— O fato de ser minha melhor amiga?
— Uh, que argumento batido. — Maya desdenha e eu jogo baixo em seguida:
— Olha, se não quiser emprestar fala logo que posso pedir o carro da Madelaine.
— Já está tão amiguinha da Becker assim? — Minha amiga questiona, ela Stelamente está se roendo de ciúmes. Não é do dia para noite que Maya vai deixar de não gostar de Madelaine Becker, isso é fato. — Oh é... Você beija a boca dela.
Acabo rindo da provocação medíocre dela.
— Maya, assim vou achar que está com ciúmes.
— Olha aqui, branquela, eu não quero que vá nessa viagem. — Maya admite e suspira. — A questão não é o carro, pode ser perigoso... Você já parou para pensar?
— Eu vou pedir o carro da Madelaine, é bem mais fácil. — Me afasto e tento sair do quarto de Maya. Ela segura meu braço e me olha sério.
— Para levar o carro vai ter que me aturar junto... — Maya me faz encará-la, está séria. — Quer fazer loucura, tudo bem; mas não vai sozinha.
— Obrigada. — Me limito a dizer apenas isso.
— Te pego na esquina da sua casa, tenta não fazer mais merda. — Maya aponta o dedo no meu rosto e logo faz uma virada dramática indo para sua cama.
Em outra situação eu riria daquela cena, mas apenas me viro e vou para casa, ainda tenho uma carta para escrever.
*****
Maya está ao volante, não seria diferente porque afinal é no carro dela que vamos viajar e ela não cede tão fácil o seu papel de motorista.
Estamos a pouco tempo ali, foi até fácil sair de casa sem ser notada. Avisei para Lyra que tinha jogo de futebol, o último do ano, e eu como líder de torcida teria que ir.
Meu pai me viu sair e fez vista grossa, mal sabia ele que eu não me ausentaria apenas por algumas horas. Deixei uma carta no meu criado mudo, por sorte apenas Joana que dormia nele; então demoraria tempo suficiente a ver aquele papel ali.
Waves aceitou ir, estou nervosa. Merda, é agora ou nunca. Quem quer que ela seja vai descobrir que Liz Rodriguez, é lésbica.
Sinto como se meu estômago fosse um imenso vazio estranho. Maya me olha, está tão ansiosa quando eu. Contei mais um pouco sobre Waves no caminho para a escola e minha amiga me achou ainda mais louca.
Sons de passos vindo me chamam atenção, olho para frente e não vem ninguém; então olho pelo retrovisor lateral. Não dá para saber quem é pelo espelho pequeno e a distância que a pessoa está.
— Tem alguém ali.
Falo e olho para minha amiga.
— Será que... — Só reparo que a pessoa, agora Stelamente uma garota por conta das roupas e cabelo, não está mais no mesmo lugar quando batidas no vidro ao meu lado me despertam e impedem Maya de falar.
Destravo a porta rapidamente, mesmo sem ver o rosto sei que é a garota. Sei que é Waves.
Maya e eu nos viramos para trás, a garota entrou de cabeça baixa; mas eu nem precisava que ela levantasse a cabeça para reconhece-la. Reparei tempo o suficiente para reconhecer aquela garota na luz baixa que estava iluminando a parte de dentro do carro.
Ela fecha a porta depois de deixar a mochila ao lado e olha para frente, para nós (Maya e eu).
— Cecília? — Tenho uma confirmação ainda maior do que eu já sabia, nem sei porque perguntei se era ela. — Oh, merda... Você é a Waves?!
Cecília me olha surpresa quando digo em voz alta a minha constatação.
— Sou.
— Caramba! — Maya apenas solta esse comentário, ela está tão surpresa que nem começa a falar feito uma louca sem parar.
Estou virada ainda olhando Cecília, assim como ela está dá mesma forma. Castillo me lança um sorrisinho nervoso e envergonhado.
Não estou nervosa com o fato dela ligar as informações e saber da minha orientação, afinal eu quase a beijei no dia anterior na praia.
— Liz, eu...
Cecília para de falar e a vejo ficar vermelha.
— O quê?
Maya abre o vidro do carro e um vento gelado passa por todo o veículo, agradeço por isso porque mesmo que eu não esteja me sentindo sufocada me sinto melhor com o ar gelado circulando ali. As gotas de chuva antes finas estavam engrossando e começavam a fazer barulho contra a lataria.
— Nada. — Cecília me responde envergonhada, ela parece nunca parar de corar dentro do carro até dado momento ao menos, é diferente.
— Nós ainda vamos?
Maya pergunta num misto de ansiedade e esperança que eu desista.
— Sim. — Respondo, olho para Cecília que não falou nada e questionou nervosa com a possibilidade de ela ter mudado de ideia. — Vamos?
— Sim, Liz.
Cecília sorri para mim e eu retribuo, um pouco boba com o quão bonita ela é. Maya solta um som de abuso, prefiro fingir que não entendo porque.
— Vamos nessa então, meninas.
*****
A chuva caia contra a lataria do carro, o som do carro baixo e tocando uma música leve. Maya está sozinha na parte da frente, estou sentada ao lado de Cecília, nem sei porque porém passei para trás.
Estamos caladas já algum tempo, estamos definitivamente fora de Miami e isso me deixa meio nervosa. Olho para Cecília que está encostada de forma confortável do outro lado, ela sorri. Quando sorrio de volta, Cecília se aproxima e meio que se encosta em boa parte do meu corpo todo.
Um calorzinho gostoso se apodera no local onde ela está me encostando.
— Liz.
O sussurro dela me faz virar para encará-la, nossos rostos ficam consideravelmente perto, o clima envolta de nós muda.
— Oi.
Cecília me lança um sorriso meio bobo quando respondo e fala parecendo uma idiota:
— Oi.
— Você está me deixando com vergonha olhando assim... — Eu admito isso num tom baixo, na verdade deixo escapar como se o que eu ao menos tivesse um "filtro" entre o cérebro e a boca.
— Desculpa.
Cecília morde o lábio inferior rapidamente reprimindo uma risada, mas mostrando seu sorrisinho mesmo assim. Eu olho para boca dela, não faria menos que isso, é como um magnetismo estranho que me puxa.
— Tudo bem. — Respondo baixinho. Desvio meus olhos para Maya que está dirigindo enquanto bate no volante no ritmo da música, é uma mania da minha amiga, acho até um pouco fofo.
— Eu não acredito que você é a garota que tem problemas com os pais. — Cecília fala sem rodeios antes, ela não eleva a voz, continua no mesmo tom de antes. Seu hálito quente batendo na minha orelha e me fazendo virar o rosto, deixando de observar Maya. — E com a sexualidade.
— Por que sou uma líder de torcida? — Pergunto com certa ironia, mas tento não fazer de uma forma que faça Cecília se sentir ofendida.
— Basicamente isso. — Ela de certa forma admite. — Mas por você ser você mesm...
— O quê? Por ser eu? — Pergunto sem entender. — Eu não sou ninguém fora da torcida.
— Eu te observo às vezes...
Cecília não termina a frase e se não fosse pelo cinto de segurança ela cairia por cima do meu corpo com tudo. Num movimento nada sutil Maya nos tira da interestadual, sem nos dar aviso prévio de que queria parar em alguma loja de conveniência ou posto de gasolina.
Maya para o carro de maneira desleixada em frente um hotel, não tem muitos carros por ali por ser tarde da noite.
— O que foi isso, Maya?
Ela apenas dá tempo de que eu pergunte e sai feito uma louca do carro. Saio do carro também e minha amiga está praticamente bufando com um taco de baseball.
DE ONDE ELA TIROU ESSE TACO?
Maya avança irritada para cima de um carro preto que está alguns metros de nós, eu logo atrás sem entender e com Cecília vindo no meu encalço tão ou mais confusa que eu.
— O que está acontecendo? — Corro para frente de Maya, fazendo-a parar por alguns instantes.
— Aquele carro está nos seguindo sabe Deus desde quando, Liz! — Maya fala e me afasta para o lado enquanto ainda estou pensando no quão louco aquilo era.
Alguém nos seguindo? Isso é loucura.
— Maya, está maluca de ir até...
Ela já tinha ido.
— Sai da porra desse carro ou...
Maya parece não ter medo do perigo e ameaça quem quer que seja que está dentro do carro com o taco em mãos.
— Não, Maya!
Cecília passou por mim feito um furacão em direção ao carro e só então chego mais perto, mesmo que esteja com medo da merda que podemos nos meter. Eu só me enfio em loucura!