Lembranças Perdidas

Consigo perceber que ele derrama lágrimas enquanto fala isso. Ao olhar para Éder, vejo-o de cabeça baixa, apenas sério, com o que está ouvindo.

"Eu vi ele tirar a vida de Joseph e, no momento em que fui até ele, encontrei saindo da floresta os outros seis Espectros. Alguns estavam machucados, com dificuldade para andar, e no mesmo instante em que todos apareceram, utilizei minha afinidade com a gravidade para massacrar todos no chão. Mas o combate anterior tinha me deixado bastante debilitado, e, no momento em que fiz todos caírem no chão, a merda dos meus machucados me fez diminuir a intensidade da gravidade, permitindo que um deles se levantasse. Lembro perfeitamente do momento: sua máscara tinha sido quebrada, seus olhos eram sem vida, seu cabelo branco e sua pele pálida; esse era seu semblante, alguém frio. Ele sacou sua espada e estava a um passo de me cortar ao meio."

Éder, que já estava agoniado com o que estava escutando, põe sua mão direita sobre o resto do seu braço. Parece que, mesmo fazendo brincadeiras e piadas com isso, ele ainda tem um gatilho sobre assuntos de cortar o corpo.

"Quando Scott apareceu e ficou na frente do golpe de sua espada, sofreu um corte extremamente fundo no peito. Scott era um dos meus melhores amigos e um dos Guardas Reais. O homem não se conteve ao ver meu amigo cair no chão, morto. Então, ele veio até mim e fez um corte profundo em minha barriga. Estava deitado no chão, já aceitando a derrota, ele estava a um passo de tirar minha vida quando...".

Visão de Hugo (5 anos atrás):

Acabei de ver tudo desmoronar, acabei de perder o meu mestre, meu melhor amigo... E acabei de ver um dos meus companheiros se voltar contra o rei.

"Não mate ele ainda. Quero vê-lo sofrer. Deixe-o vivo."

Levantando-se do chão e vindo até o homem de semblante morto, era Lawrence. Ele não queria que eu morresse agora. O homem olhou para trás.

"Não vejo motivos para fazer isso, Leão. Ele faz parte da resistência; qualquer resquício deve ser eliminado, seja pessoa ou até uma mera formiga."

Enquanto eu estava agonizando de dor no chão, para ele era como se essa situação acontecesse diariamente. Consigo sentir que ele segura sua espada firme enquanto fala. Parece ser uma pessoa séria. Agora que estou percebendo, ele é o único que tem sua máscara intacta.

"Não me entenda mal, dragão. O poder dele pode ser perigoso, mas eu duvido que ele consiga usar novamente depois de hoje. Descanse um pouco, ele não vai mais voltar ao reino, e mesmo que volte, o rei mandaria matá-lo ao perceber a humilhação que os seus preciosos guardas tiveram."

O homem pensa um pouco sobre isso, guarda sua espada e começa a voltar para onde estavam os outros, que apenas observam. Lawrence logo faz o mesmo, sem olhar para trás, e todos somem, restando apenas eu e o corpo de Scott.

Visão de Lucas:

"Hugo, e como você chegou até aqui?".

Ele respira fundo com essa pergunta, mas decide respondê-la.

"Enquanto estava no chão, um homem passava por ali e viu a minha situação. Ele me levou para esta cidade. Desde então, não saio deste lugar. Ninguém sabe sobre o meu passado. Acham que eu fui só mais um alvo de um urso e que meu amigo acabou morrendo por causa de um deles. Eu enterrei Scott logo após me recuperar. Ele foi uma boa pessoa."

Éder, emocionado com a história, logo o abraça.

"Não precisa se preocupar, Hugo. Está tudo bem agora, certo, Lucas?".

Enquanto ele diz isso, me chama para dar um abraço nele, e Hugo, percebendo isso, me puxa e nos abraça.

"Concordo com Éder. Mas acho que não precisamos ficar com esses abraços chatos."

Ao falar isso, Hugo nos solta e dá uma gargalhada.

"Bem, garotos, queria deixar bem claro o que vamos enfrentar. Este mundo é cheio de mistérios, sempre vai existir alguém superior, não importa o que façamos."

Logo após dizer isso, ele se levanta e estala as costas.

"Enfim, quero que vocês dois leiam esses livros. Por acaso, Lucas, aqui está o seu livro."

Ele se levanta, pega três livros, e um deles era o meu.

"Você pegou ele?"

Corro até ele para pegar o livro, extremamente feliz. Não posso perdê-lo. Ele é extremamente importante para eu entender sobre as afinidades do mundo.

"Encontrei ele quando fui até a caverna. Leia-o também, pode ser essencial."

Achei que teria que ir lá pegar, que bom que não vou precisar. Ele passa por mim e entrega o outro livro a Éder. Mesmo de relance, vejo um sorriso diferente vindo de Éder. O que será que houve?

"Garotos, eu vou sair agora. Preciso fazer algo. Leiam esses livros, vai ser essencial para vocês entenderem sobre a afinidade."

"Tudo certo. Até daqui a pouco."

Éder responde, novamente com um belo sorriso. Esse cara é estranho.

Subo as escadas e vou direto para o meu quarto. O corredor que me leva até ele é totalmente feito de madeira. O último quarto do corredor é o meu; antes do meu, é o de Éder, e o primeiro é o de Hugo.

Ao abrir meu quarto, sinto um ar bom. Não sei explicar em palavras, é um sentimento de conforto. Ele é pequeno, mas não me preocupo com isso. Passei, basicamente, a minha vida toda dentro de uma casa minúscula. A minha cama fica no canto do quarto, e na parede tem algumas estantes onde coloco os livros.

No presente momento, com tudo que aconteceu comigo, eu só quero dormir um pouco. Depois, vou ler os livros. Me jogo na cama e sinto a suave sensação de sua maciez. Cada segundo aqui é mais um motivo para eu dormir.

Desde criança, nunca usava o travesseiro para apoiar minha cabeça; eu sempre dormia abraçado com ele, sempre achei mais confortável. Com o passar do tempo, comecei a ter o hábito de dormir assim.

Enfim, vou descansar um pouco. Eu preciso. Passei por tanta coisa; não tem nada de errado.