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Amor que traz dor

_ Não devia pelo menos.

_ Tem muitas coisas a aprender, e uma delas é que esta na minha mão.- Ele disse erguendo a mão.

_ Devia se envergonhar... O que sua outra metade diz disso?

_ Do que esta falando?

_ Falo de sua alma-gêmea. Não tem ciúmes de ti?

_ Que motivos teria para isso?

_ Me trancar aqui nesse quarto, já seria motivo suficiente e levando em conta onde estamos, pode até descobrir o que houve entre nós.

_ E o que exatamente aconteceu entre nós?

_ Oras... Nós quase...

_ Não seja tola! O que aconteceu aqui, não significou nada para mim, além do mais, não deveria julgar as pessoas por si própria. Ciúme é um sentimento medíocre. Digno de pessoas como tu.

_ Você não é humano Gabriel. Fere os sentimentos das pessoas como se não passassem de lixo. Melhor do que ninguém, devia saber que não esta acima dos outros...

_ Apesar de não estar acima de todos, aqui sou eu quem esta no comando. E se lhe servir de consolo, ainda será minha, mas onde e quando eu quiser.

_ Fala como se fosse uma condenação. Já pensou que posso gostar?

_ Há! Vai gostar sim. Mas me encarregarei de se desprezar por se deixar escravizar pelos prazeres do corpo.

_ Pensei que éramos apenas espíritos...

_ Claro que temos um corpo! Não de carne, mas temos.

_ E o que ganhará me fazendo sofrer?

_ Tem a eternidade para descobrir...

_ Não te entendo...

_ Nem é para entender, por enquanto.

Nesse momento Geisa entrou no quarto tempestivamente. Trazia uma rosa amarela nas mãos, mas quando nos viu escondeu as mãos para traz e ficou nos olhando constrangida.

_ Desculpe Gabriel... Sei que proibiu visitas, mas só queria deixar uma flor para Liza...-Ela disse virando-se para sair.

_ Não vá ainda...- Pedi.

Ela se voltou para Gabriel e o fitou esperando seu consentimento.

_ Vou deixá-las a sós, devem ter muito que conversar.- Ele disse já saindo.

_ Senta aqui.- Convidei apontando um lado na cama. Ela se aproximou e sentou, mas permanecia muda.

_ Essa flor é para mim?- Perguntei ansiosa por iniciar uma conversa.

_ É sim.- Disse me entregando.- Já estive aqui antes, mas sempre a encontrava dormindo. Resolvi lhe trazer uma flor para lhe transmitir conforto, não tinha intenção de incomodá-la.

_ Jamais me incomodou, querida.

_ Não?! Ela arregalou os olhinhos cinzentos. Parecia surpresa e não muito certa da verdade da minha afirmação.

_ Claro que não. As pessoas que amamos não são comparadas com incômodos, jamais!

_ Há...

_ O que te fez pensar assim?

_ Bem... Gabriel proibiu visitas... Nos disse que tu estavas passando por uma fase muito difícil e era melhor que não a incomodássemos.

_ Quem me incomoda de verdade é ele.

_ Porque?

_ Ele me trata mal. É como se me odiasse.

_ Compreendo... Ainda está muito confusa e é normal, mas saiba que se engana, Gabriel não a odeia.

_ Não sabe o que diz, Geisa.

_ Sei sim. Ele não pode te odiar pois é um homem muito bom.

_ Gabriel? Pode ser tudo, menos, bom.

_ Não devia falar assim...

Respirei fundo. Mas o que estava fazendo? Aquilo não eram coisas para se dizer a uma criança. Foi um erro pensar. Pelo jeito dela me fitar, logo entendi que havia lido meus pensamentos.

_ Liza, aqui não existem esses preconceitos. Só sou uma criança porque quis que me reconhecesse, além do mais, aqui, nós "crianças" sabemos e conversamos sobre tudo.

_ Perdoe minha ignorância...

_ Não tem problema, você não tem culpa. Afinal ninguém morre sabendo.

Rimos juntas.

_ Nossa! Estou com tanta saudade de casa... Queria ver nossa família novamente, saber como estão...

_ Eles estão bem... É uma pena não poder levá-la para poder visitá-los...

_ Como assim? Então é verdade? Pode ir até eles?

_ Posso sim! E os vejo sempre, mas não pensam mais em mim... Só mamãe.

_ Não é verdade, Geisa. Todos te amam.

_ Não. Não amam. Nem se lembram de mim. Sei, porque posso ler seus pensamentos.

Que argumento poderia usar contra aquela verdade? Não havia justificativa valida. Eu mesmo, quando no lar terreno, só me lembrava dela ocasionalmente.

_ E porque não pode me levar?

_ A primeira vez terá que ir com Gabriel.

_ Porque?

_ Só ele pode dizer quando estará preparada para um reencontro. Sabia que pode ser muito perigoso?

Fechei os olhos com força para me acalmar e impedir que as lágrimas rolassem.

_ Vamos combinar uma coisa? Toda vez que for visitar nossa família, depois passe aqui para me contar das novidades e como estão as coisas por lá?

_ Porque diz isso? Logo, logo poderá visitá-los também.

_ Não vou. Gabriel nunca vai permitir isso.

_ Porque não?

_ Porque ele não gosta de mim! Será que ninguém vê isso?

_ Ele não tem nada contra nada você, Liza.

_ Gostaria de acreditar nisso. Geisa, quando encontrar Antonio, peça-o para vir me visitar, preciso , que se possível, substitua Gabriel.

_ Não sabe o que esta dizendo...

_ Claro que sei! Ele esta me levando a loucura, com essa tortura de deixar-me trancada aqui!

_ Mas... Esta aqui há apenas uma semana!

_ Uma semana? Só?

_ É.

_ Mas cada minuto que passo aqui, parece uma eternidade... Sinto como se ele quisesse me destruir, me mantendo e obrigando a um confinamento. Acredito que quer se vingar por algo que lhe fiz no passado, mas não é justo! Como posso pagar por um erro que nem sei se cometi ou porque fui levada a cometer? Como saber se ele não está julgando levando em conta apenas o seu ponto de vista?

_ Acho que precisa mesmo de um tempo sozinha, afinal Gabriel, não pode lhe fazer mal.

_ Como pode afirmar isso com tanta certeza?

_ Bem... Ele é... Antes de tudo, um homem muito bom, sempre cuidou de seus pacientes com muita dedicação e... Bem, o resto terá que descobri sozinha.

_ Está bem. Por algum motivo que desconheço, já percebi que jamais vai acreditar em mim. Mas quero que guarde; ele nunca permitirá que saia daqui e muito menos que veja meus familiares. Estou condenada a ficar eternamente confinada nesse quarto. Ele me tem nas mãos, e o único remédio é mesmo me conformar com o inevitável...Há Geisa... Entendo que foi o destino que me trouxe aqui e assumo que não fui exatamente um modelo de virtudes, não merecia mesmo ter paz.

_ Mas a guerra esta partindo de ti mesmo! E o pior é que esta lutando contra nada. Porque não tenta parar de travar essa luta dentro de você e se liberte? Pare de ter medo e deixe seus sentimentos fluírem! Pare de olhar para os lados procurando negativismo em tudo ao seu redor! Essa atitude é prejudicial. Procure a verdade e então encontrará sua tão desejada paz... Mas desde já lamento muito seu modo de pensar.

_ Está bem, Geisa. Prometo que vou tentar.

_ Faça isso. Mas não se esqueça que nunca estará sozinha, se não quiser... Agora, preciso ir, já demorei tempo demais.- Ela me deu um beijo na testa e se retirou.

Apesar de suas palavras finais, me senti muito sozinha. Aconcheguei debaixo do cobertor. Estava vivendo um pesadelo. Parecia que gritava, gritava por socorro e ninguém me ouvia. Era um pesadelo tão real, que era impossível de ser ignorado. Como poderia me sentir segura, se ninguém acreditava em minhas palavras? Fechei os olhos desejando dormir e nunca mais acordar. Não queria enfrentar os olhos frios de Gabriel e nem a dura realidade de já não poder contar com as pessoas que amava. E foram com esses pensamentos sombrios que adormeci profundamente.

Acordei me sentindo estranhamente bem demais. Estava descansada. Sentia-me com as energias fortalecidas. Pronta para encarar qualquer obstáculo. Olhei em volta e tudo estava em ordem. Então porque aquela sensação que algo havia mudado? Fui tomar banho, mas ao contrário das outras vezes, não senti vontade de voltar para a cama. Troquei de roupa, tomei o suco que estava na bandeja e arrumei a cama.

Duas coisas me deixaram perplexa; Primeira, era que não me lembrava de ter posto a camisola que acabei de trocar... Senti que meu rosto queimava ao imaginar que, Gabriel podia ter me trocado enquanto dormia. E a segunda; As roupas de cama também foram trocadas... Devia ter tido um sono muito pesado, para não perceber as duas trocas. O que me levou a outra pergunta; Por quanto tempo dormi?

Alguém mexeu na porta e fiquei paralisada com a perspectiva de ver Gabriel. Nem entendi o porque da apreensão, já que havia o visto poucas horas antes.

Ele entrou e parou ao me ver de pé. Parecia cansado. Seus olhos estavam fundos e apresentavam olheiras.

Alguma coisa no jeito dele me chamou a atenção quando ele me fitava... Era como se não me visse há muito tempo, como se estivesse... Saudoso e até... Feliz! Os trajes também não eram mais os mesmos. Não usava a roupa branca. Estava de jeans e camiseta.

_ Vejo que a bela adormecida resolveu acordar!- Ele disse abrindo um sorriso que iluminou o ambiente.

Apesar de minha vontade de correr e abraçá-lo, me aconchegando em seus braços, não me deixei enganar por seus truques e reprimindo meus impulsos, agi ironicamente;

_ Não devo ter dormido o suficiente, pois acordei de mau humor e sem nenhuma vontade de aturar seu sarcasmo.

Ele riu.

_ Então que tal sair desse quarto para tomar um pouco de ar livre? Podemos até fazer um piquenique se quiser...

Aquela atitude me surpreendeu. Essa súbita mudança era no mínimo estranha... Há poucas horas atrás, ele estava dizendo que me destruiria e agora propunha um passeio?

_ A que devo tamanha gentileza? Bateu com a cabeça ou trama algo?

Ele me fitou tentando demonstrar tranqüilidade, mas senti que estava tenso.

_ Tudo bem. Se não quer ir, não vamos. Foi só uma sugestão, mas se não foi bem recebida...

_ Não! Espere! É claro que quero! Aliás, amaria.- Não podia perder a oportunidade de sair daquele quarto. Os motivos dele era o que menos importava naquele momento.

_ Assim é que se fala!

_ Me trocarei em um minuto...- Disse me dirigindo ao armário, ia abri-lo quando um punho de aço segurou meu pulso inibindo minha intenção.

_ Sua roupa já está no banheiro...

Fiquei impaciente e me soltando de suas garras, coloquei as mãos na cintura.

_ E quem as tirou daqui? Por acaso é também dever do médico, escolher as roupas de seu paciente?

_ Sua estúpida! As separei porque as outras foram para a lavanderia pois estavam com cheiro de mofo!- Disse irado e entre dentes.

_ Mas agora a pouco, me troquei e estavam todas ai.

_ Pedi para que tirassem enquanto estava no banho.

_ Porque não disse logo?- Disse indo para o banheiro.

_ Volto assim que estiver pronta.- O ouvi dizendo e logo depois o barulho da porta se fechando. Vesti o jeans e a camiseta que encontrei no banheiro, estranhando não as ter notado antes. Voltei para o quarto, onde Gabriel já esperava.

_ Pronta?- Ele perguntou com uma nota de impaciência.

_ Podemos ir quando quiser.

_ Então vamos.

Quando já ia sair do quarto, recuei ao lembrar do buraco negro. Olhei para Gabriel, que ao entender o motivo de minha hesitação, sorriu tranqüilizador.

_ Não precisa ter medo. Agora é com minha aprovação.

Venci o medo e passei, uma força maior me fez olhar para trás e me surpreendi ao perceber que meu nome fora apagado da plaqueta. Ia perguntar para Gabriel, mas mudei de idéia ao pensar no quanto àquilo era insignificante e Gabriel tinha pouca paciência para responder perguntas.

Passamos por inúmeras portas e saímos na de numero quatro. Então me veio à memória uma de minhas conversas com Gabriel, onde descobri que quatro era o tanto de encarnações que passei.

Caminhamos por corredores, portas, elevadores, até chegarmos à recepção. Quando vi Marco, minha vontade foi de correr e abraçá-lo, mas refreei meus impulsos, por desconhecer os costumes daquele lugar e temer ser mal interpretada. Assim que nos aproximamos do balcão da recepção, Gabriel entregou as chaves para Marco e esse lhe passou uma cesta.

_ Oi Marco.

_ Oi menina. Como está se sentindo?

_ Bem. Estou bem, agora.

_ Gostou muito de nossas instalações, em?

_ Não é nada mal, mas porque diz isso?

_ Oras, nunca vi ninguém demorar tanto internado aqui... E olha que estou aqui há muito tempo...

_ O que...

Nesse momento Gabriel me agarrou pelo braço e saiu me arrastando sem cerimônias, como se eu fosse propriedade dele e interrompendo bruscamente a conversa. Ainda assim, dei um tchauzinho tímido para Marco, que retribuiu com um sorriso maroto e incrivelmente encantador. Afinal podíamos vir a ser grandes amigos...

Gabriel continuou me arrastando pela estrada estreita e ladeada de arvores e flores, que sempre me surpreendiam pela perfeita disposição e harmonia.

Ele andava a passos largos. E tinha que correr para conseguir acompanhá-lo. Soltei-me de suas garras bruscamente ao perceber os olhares curiosos das pessoas que caminhavam por ali. E olhei severa para Gabriel.

_ O que pensa que está fazendo?!

_ Desculpe...

Aquele pedido de desculpas fora tão inesperado que me desarmou completamente. Olhei a minha volta e sorri.

_ Tudo bem... Sinto como se estivesse em uma prisão e finalmente pudesse sentir o gosto da liberdade...

Gabriel não fez nenhum comentário e seguimos em silencio, de mãos dadas. Andamos por muito tempo admirando a paisagem que se depreendia a nossa frente. Acabamos por sentar para fazer o piquenique. Dentro da cesta havia sucos e sanduíches.

_ Qual a média de tempo que uma pessoa fica naquele hospital?- Perguntei entre uma mordida e outra.

Gabriel parou de comer e fitou-me como se quisesse sondar minha alma.

_ Porque pergunta?

_ Curiosidade...

_ Umas quatro semanas, no máximo.

_ Curioso...- Comentei deixando o sanduíche de lado.

_ O quê?

_ Marco insinuou qualquer coisa sobre ter ficado tempo demais lá dentro... Claro que ele se enganou, só estou lá a pouco mais de uma semana...

Gabriel ficou tenso e logo vi que havia algo errado.

_ O que houve Gabriel?

Ele fitou o vazio e foi com essa expressão que respondeu;

_ Não está lá só esse tempo que mencionou, mas a mais de seis longos e intermináveis meses.

_ Só pode estar brincando! Ontem mesmo Geisa esteve comigo e comentou que estava lá há apenas uma semana. Como pode ser isso? Por acaso o tempo aqui corre mais rápido?

_ Não. O que aconteceu foi que dormiu nesse período.

_ Há meu Deus! Toda vez que dormir agora será por todo esse tempo?

Ele me fitou impaciente e irado.

_ Só quando desejar!- Foi a resposta crua dele.

Então me lembrei do último pensamento que tive antes de adormecer, e foi realmente o que desejei. Resolvi que não daria mais tanta importância ao comportamento de Gabriel, pois isso não me traria nada de bom.

Depois de terminado o piquenique, saímos a passear e conheci muitas pessoas. Cada uma falou de sua dificuldade inicial de se adaptar aquele lugar, dos seus medos, dos anseios, das saudades... Cada um de forma diferente, mas todos assim como eu, sentiram-se perdidos quando ali chegaram. Estranho, mas saber aquilo me fortaleceu. Não mais me sentia sozinha. Poderia ainda ser feliz. Como disse papai uma vez, há formas de encontrar compensações e decidi que a buscaria, não mais me entregando a alto-piedade.

Depois de muito caminhar, resolvemos de comum acordo que era hora de ir embora. Não sabia, nem conhecia, qual era o caminho de volta para o hospital, mas com certeza aquele por qual seguíamos era totalmente diferente do qual havíamos passado. Não havia as arvores, com exceção de algumas aqui e ali. No lugar delas havia muitas casas. Umas maiores, outras menores, mas todas no mesmo estilo.

_ Para onde estamos indo? Pensei que tínhamos decidido encerrar o passeio de hoje...

_ Estamos indo para casa.

_ Mas esse não é o caminho certo para o hospital.

Gabriel parou e virando-se segurou firme em meu ombro.

_ Pare de fazer tantas perguntas!

_ Mas...

_ Sem mas! Estamos indo para casa. Não voltará mais para o hospital. Portanto fique quieta e não me faça arrepender por ter lhe dado alta.

_ Quer dizer que... Estou livre!- Não conseguia conter minha alegria.

_ É.- Ele disse seco e me soltando prosseguiu. Caminhamos até chegar a uma casinha pequena. Tinha uma janela na frente, junto da porta que dava para a varanda, toda enfeitada com vasos caprichosos de rosas e orquídeas. Gostei muito da aparência exterior da casa e fiquei ansiosa por conhecê-la por dentro. Gabriel abriu a porta e deu caminho para que entrasse. Entrei seguida por ele. A sala era pequena,mas muito aconchegante. Havia uma mesa de centro ornada por um vaso com violetas e quatro assentos de um lugar. Seguimos por um corredor onde havia duas portas, uma de cada lado. Abri a da direita. Era um quarto. Também muito aconchegante. Abri o guarda-roupa e ali estavam todas as minhas roupas. Ali seria o meu quarto. Olhei para Gabriel que me observava calado, encostado na soleira da porta e sai sem nada dizer. Abri a outra porta e descobri que se tratava de outro quarto. Era maior que o meu e o guarda-roupa e a cama eram enormes. Havia também uma penteadeira. No final do corredor, ficavam o banheiro e a cozinha. Sentei na cadeira e Gabriel se adiantou, me servindo suco e sentando-se também.

_ é aqui que vou morar...

_ É.

_ Quem mais mora aqui?

_ Apenas nós.

_ Nós?

_ Eu e você.

_ Porque a cama de casal?

_ Sou muito espaçoso... E quem sabe para o dia em que se sentir muito só...

_ Não diga bobagens!

_ Nunca digo bobagens.

Fitei-o. Será que ele sabia o quanto aquele convite era tentador?

_ Está bem... E aquela penteadeira? Ao que me consta àquele móvel é totalmente feminino.

_ Mandei vir para você e não deu tempo para ajeitá-lo em seu quarto, mas agora que esta aqui, poderá cuidar disso.

_ Quanto tempo terei que ficar aqui?

_ Pelo tempo que quiser.

_ Então posso ir embora agora mesmo?

_ Pode! Mas é melhor que saiba que a única casa onde pode ficar é essa. Não terá outro teto. Mas, não se preocupe, não temos bandidos por aqui e as noites não são frias.

_ Resumindo; é aqui ou na rua.

_ Isso mesmo, mas não se iniba a essa realidade. Muitas pessoas aqui preferem a vida lá fora, sem se incomodarem com a opinião da sociedade, pois não temos o peso da critica.

_ Mesmo assim, prefiro ter um teto... Só espero não incomodar e tirar sua privacidade.

_ Claro que não. Porque tiraria minha privacidade?

_ Não sei... Talvez tenha uma amante.

_ Amante? Mas que absurdo! De onde tirou essa idéia?

_ Disse que tinha encontrado sua alma-gêmea, então pensei que talvez devessem quere viver sozinhos, e aquela cama de casal...

_ Faz muitas suposições Elisabete! Pare com isso ou me levará a loucura! Porque não toma um banho enquanto preparo o jantar?

_ Boa idéia.- Levantei decidida e retirei-me.

Tomei um banho rápido e fui me trocar. Escolhi uma camisola azul, com rendas no formato de rosas na altura dos seios. No hospital, morreria de vergonha de andar com vestes intimas, mas ali me sentia livre, à vontade... Sem o peso da timidez. Voltei para cozinha e a mesa já estava posta. Sentei e Gabriel que ainda estava de pé, preparando os últimos detalhes, olhou-me por sobre os ombros e lançou um sorriso amistoso. Não notei nenhum sinal de surpresa ou desagrado por ter me apresentado de forma tão descontraída. Agora que já estava sentado, parecia que queria que tivéssemos um bom relacionamento. Pelo menos foi o que pensei naquele momento. Mais tarde, viria a descobrir que aquela hipótese nem passou por sua cabeça. Mas, naquele momento estava me sentindo muito bem com aquela trégua inesperada. Comemos em silêncio e depois ele nos serviu de café. E então não consegui tirar os olhos dele, que por sua vez, também me observava. Com um brilho diferente no olhar. Era como se tramasse algo... Senti-me pouco à vontade com esse pensamento, principalmente por que sabia que dele podia esperar qualquer coisa.

Havia uma duvida martelando em minha cabeça desde que entrei naquela casa e acreditando que aquele era um bom momento, para quebrar o silencio e aproveitando o bom humor de Gabriel, entendi que era o momento de esclarecer aquela duvida.

_ Gabriel... Preciso lhe perguntar algo, mas não quero que se aborreça...

_ Desde que não seja pessoal...

_ Porque aqui, e não na casa de meu pai?

_ Não está satisfeita aqui? Está lhe faltando algo?

_ Não! Não é isso... Por favor, não quero que se ofenda, tem sido um excelente anfitrião, é só que... Pensei que as famílias ficassem juntas.

Ele me olhou friamente.

_ Na verdade há vários motivos, mas lhe darei somente um; Seu pai não mora sozinho, ele tem Alexa e Geisa.

_ Mas assim como Geisa, também sou filha dele.

_ Geisa esta somente esperando sua alma-gêmea, para poder mudar para sua própria casa.

_ Mas ela é apenas uma criança!

_ Acha mesmo isso?

Então me lembrei que idade ali era apenas um detalhe insignificante. Mas não deixaria esse assunto morrer assim.

_ Também não encontrei minha alma-gêmea e não estou morando com papai,porque?

_ É como disse; há vários motivos. Além do mais Geisa já é um espírito independente, já tem maturidade para cuidar de si própria e de suas tarefas nesse plano. Você ainda precisa de um guia, ou seja,eu. Seu pai e Alexa têm suas funções, e não podem ficar de babá o dia inteiro para você. Em outras palavras, seria uma pedra no sapato.

Como o odiei naquele momento.

_ E quanto a você? Também tem sua alma-gêmea e seus afazeres.

_ E daí?

_ Daí que ela pode querer ter privacidade, e vai abandonar sua tarefa?

_ Minha tarefa no momento é prepará-la para sua vida aqui. Bem que gostaria de abandonar, mas não posso.

_ Claro! Mas e quanto à outra?

_ O que quer dizer exatamente? Pode ser mais clara?

_ O que vai acontecer comigo se ela quiser me expulsar?

_ Jamais acontecerá isso .

_ Como pode ter tanta certeza?

_ Porque ela nem sabe quem sou!

_ Porque?

_ Se está tão preocupada, por que não esquenta o lugar dela enquanto não chega?

_ Você é mesmo um canalha!

_ Não precisa ser tão agradecida...

_ Quero rever papai e as pessoas que conheci.- Disse tentando ignorar a raiva que me crescia por dentro.

_ Amanhã, se quiser, poderemos ir visitá-los.

_ Quero sim.

_ Então está combinado.

Não trocamos mais palavras e fomos nos deitar. Estava extremamente cansada. Fechei os olhos, mas não consegui dormir imediatamente como pensei que aconteceria. Não conseguia pegar no sono. Meu corpo estava ali, mas meu pensamento viajava para o quarto ao lado. Meu corpo ansiava pelo de Gabriel. Meu desejo foi tomando grandes proporções naquele lugar, meu corpo pedia o dele e parecia uma grande falta estarmos tão próximos e ao mesmo tempo tão distantes. Queria com desespero senti-lo meu. Podia sentir a energia da vibração que estava no ar. Como se ele estivesse com os pensamentos ligados ao meu.

Levantei e fui até a cozinha beber água. Isso não podia estar acontecendo! Não ali! Não tinha mais um corpo carnal e até onde sabia, desejo sexual era exclusividade da carne.

Quando voltava, parei de frente para a porta do quarto dele. Vi minha mão levantar devagar em direção a maçaneta e abrir a porta, como se tivesse vontade própria. Na penumbra do quarto, uma mão forte me puxou para dentro e fechou a porta. Estava hipnotizada pelo brilho de seus olhos. Estava escuro e esse brilho era como um farol e irradiava puro desejo. O magnetismo de seu corpo era quase palpável. Sabia que ele não queria me querer... Queria me odiar... Mas era inevitável e impossível resistir àquela atração que nos empurrava de encontro um ao outro. De repente, me tomou em seus braços e sem parar de me fitar, deitou-me na cama. Estava um pouco amedrontada e sabia que não era segredo para ele. Sabia, mas não se importava. Mas o meu desejo era tão grande, que o medo deixou de ter importância. Só pensava em senti-lo e em me entregar a ele.

Gabriel puxou minha camisola, arrebentando os pequenos botões e assim que meus seios ficaram livres, vi em seu olhar uma mescla de sentimentos contraditórios como amor, ódio, desejo e repulsa... Ele não agia com carinho, era possessivo, agressivo, bruto! Parecia premeditada a falta de ternura e carinho. Quando pensei em fugir, senti seus lábios apertando os meus e sua língua invadindo minha boca com impaciência, com selvageria. Então entendi que era tarde para uma fuga bem sucedida. Ele não permitiria que saísse dali, enquanto seu desejo não fosse saciado. Senti o sangue correr em meus lábios e num impulso desesperado tentei impedi-lo de prosseguir com aquela barbárie, empurrando-o com as mãos, o que só serviu para que ficasse mais indefesa ainda, pois com uma de suas mãos prendeu-me com as mãos para cima da cabeça me deixando mais vulnerável. Começou a fazer caricias enlouquecedoras com a mão livre e com a boca por todo meu corpo me fazendo ter arrepios de prazer. Acabei começando a apreciar aquela selvageria. Ele liberou minhas mãos e comecei a fazer-lhe caricias, gritando de prazer, cravei as unhas em sua costa. Precisava urgentemente senti-lo dentro de mim. Não podia mais agüentar aquela delirante tortura. Gabriel pareceu ler meus pensamentos, pois posicionou sobre mim e penetrou-me fazendo movimentos com uma fúria selvagem. Chegamos juntos ao êxtase. Nunca senti nada igual. Não sabia que o ato de amor, podia ser tão bom, de varias formas. Ele deitou do meu lado, aliviando-me de seu peso sem dizer nada. Não ousei interromper o silêncio. Era um silencio reconfortante, que falava mais que mil palavras. O que aconteceu ali foi mágico. Após algum tempo, voltamos a nos unir, mas dessa vez ele fora muito carinhoso. Nessa noite fizemos amor até a exaustão.

Acordei sentindo um delicioso aroma de café. Sentia-me bem e feliz. E ansiosa para repetir a dose. Queria pelo menos mais um pouco daquilo que vivi aquela noite. Mas quando olhei para o lado fiquei decepcionada por Gabriel não estar mais ali. Levantei e fui direto para o banheiro onde tomei um banho. Depois de me trocar fui direto para a cozinha. Gabriel tomava uma xícara de café com olhar distante. Assim que me viu, ordenou que sentasse e serviu café com torradas. Sua indiferença, depois de termos vivido grande emoções aquela noite,me magoou muito, mas optei por não fazer comentários. Não queria lhe cobrar nada, mas também não podia deixar de notar que em sua fisionomia não havia nem um traço de afeto. Seus olhos continuavam frios, como se para ele, nada tivesse acontecido de especial. Assim que terminamos o café, juntei a louça e fui para a pia lavá-las. Gabriel permaneceu sentado me observando. Sentia seu olhar sobre meu corpo, como a me despir. A lembrança do que houve a noite passada voltou com força total, me fazendo desejá-lo com urgência como se precisasse ser possuída por ele novamente para continuar vivendo. De repente, como se adivinhasse meus pensamentos, estava atrás de mim. Podia sentir seu hálito quente em meu pescoço. Suas mãos alcançaram meus seios por baixo da blusa, fazendo caricias delirantes. Soltou meus seios e me virando de frente, colocou-me em cima da pia, arrancando meu short, junto com a calcinha e me possuindo ali mesmo. Nem parecia que havíamos nos amado a noite inteira. Nosso desejo era grande e parecia não ter fim. Assim que chegamos ao êxtase ele me soltou de forma brusca.

_ Recomponha-se para irmos à casa de seu pai.- Foram suas únicas palavras ante de sair e me deixar sozinha.

Tentei, em vão, reprimir as lágrimas que insistiam em molhar meu rosto. Na noite passada, enquanto delirava em seus braços, senti que ele era meu. Só meu. E ficara feliz, não levei em conta as barreiras que nos separavam. Dois sentimentos contraditórios se uniram, transformando minha vida em um caos. Amava-o e ele me odiava. A despeito da atração que insistia em nos unir. O ódio que sentia não faria mal algum a ele, mas o meu amor... Esse me destruiria. Não devia sentir tanto amor. Não por ele! Poderia até desfrutar de sua companhia por algum tempo, mas o resto da eternidade, ele seria de sua outra metade. E como doía pensar isso... Doía demais!

De súbito ele voltou e nem me preocupei em apagar os vestígios de meu pranto que rolou com abundancia. Ao perceber que havia chorado, deu um suspiro resignado e me encarou. Seu olhar transmitia um misto de vitória e dor. Era como se tivesse ganhado uma batalha, mas perdesse um braço na guerra. Por alguma razão, ele não estava totalmente feliz em causar dor.

_ Vamos?- Ele indagou desviando o olhar.

_ Preciso lavar o rosto.- Disse e sai correndo para o banheiro, onde fiquei até me sentir capaz de encarar Gabriel novamente.

Quando me refiz troquei de roupa e saímos. Seguimos pelas casas e paramos em frente a uma exteriormente parecida com a que morava, mas um pouco maior. Alexa estava na varanda e veio nos receber, demonstrando grande alegria.