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Você é o cara

O corpo de um adolescente mudava o tempo todo.

O corpo de um gestante, também mudava.

E assim, Theodore encarava a si mesmo no espelho sem saber o que pensar sobre o que via.

Aquela pessoa... Era ele mesmo? Que estranho.

Mais uma semana havia se passado, e o corpo do ômega havia mudado mais um pouco. O volume crescera um pouco mais, tornando cada vez mais real o que iria acontecer consigo dali alguns meses. Isso que ainda estava no segundo mês.

Cobrindo a barriga com a blusa de moletom, Theodore balançava a cabeça voltando a se arrumar para ir à escola. Precisava pentear os cabelos e até usar um moletom menos amassado, porém o ômega ignoraria este último já que precisava ter o cheiro de Gabriel.

Era insano a mudança brusca que sua vida tivera desde o momento que tomara conhecimento daquele... Ovinho. Apesar de não sentir enjoos e nem desejos insanos, Theodore precisava sentir o cheiro do seu alfa o tempo todo. A ideia do ninho dera certo, sendo a única coisa capaz de manter sua mente em paz.

Se tentasse dormir na sua cama como sempre fizera, tinha insônia. A preocupação tomava conta, o medo de ser incapaz de cuidar de uma criança o assombrava... Ou até pior, o medo de que a vida daquele pequeno ser humano fosse perdida por sua incapacidade de cuidar dele. O medo era tanto que Theodore passara a dormir sempre em torno de roupas com o cheiro de Gabriel, já que o alfa não podia dormir na sua casa todos os dias.

Para compensar sua ausência durante o período de descanso do ômega, nos intervalos Gabriel arrastava Theodore para algum canto da escola onde pudessem ficar juntos. Tudo o que o loiro precisava fazer era abraçá-lo por alguns minutos com o rosto escondido em seu pescoço.

Graças aquela nova etapa de sua vida, Theodore ficara mais sonolento durante as aulas. Algumas delas ele até deitava a cabeça e dormia, escondido atrás de algum livro, pois, não conseguia aguentar a sonolência. A fome crescera também sempre chamando por doces.

Alguns amigos do primeiro ano chegavam a questionar o que havia mudado no ômega, pois parecia mais cansado e distraído. Theodore desconversava dizendo ser o período das provas e das regionais, mas somente os mais próximos saberiam a verdade. E ainda havia onde piorar.

Depois do ocorrido com o Nicolas, os ômegas da escola Montreal se tornaram o centro das atenções. Murmúrios e cochichos já faziam parte da rotina de Theodore, a diferença era que haviam mais pessoas se tornando alvo do falatório. E para deixar as coisas ainda mais fervorosas, o resultado do concurso de beleza seria dado naquele dia.

Por esse motivo Theodore tinha se arrumar, segundo as instruções de Lilian.

Com a mochila nas costas e um pedaço de pão com manteiga na boca, Theodore deixava a casa. Assim que erguera a cabeça encontrara Gabriel parado debaixo do salgueiro-chorão o esperando como fazia todos os dias desde a descoberta.

Ele ainda não havia contado para a família dele sobre a tal notícia. Nem Theodore contara para seu pai, apesar de que teria de passar o final de semana no sitio para falar sobre o terno que comprara. Mas agora com a gravidez, Theodore se sentia incapaz de ficar longe por tempo demais de Gabriel. E não teria como levá-lo junto.

Ah... As coias pareciam formar um nó em sua cabeça.

— Bom dia, Theo!

Abrindo um sorriso leve, Theodore fora até o alfa ficando ao seu lado.

— Bom dia Gabriel.

— O que foi? Parece desanimado. — Gabriel o olhava curioso, parecendo tão brilhante quanto o próprio sol. Abrindo um sorriso fraco, o ômega balançava a cabeça.

— Deve ser sono. Vamos, se não iremos nos atrasar.

O desânimo aumentara enquanto seguiam caminho. Não por culpa de Gabriel, na verdade era sempre bom ver o alfa. Mas Theodore queria...

Fugir.

Quando os meninos chegaram na escola foram direto para dentro do prédio fugir do vento gélido do final de outono. Os corredores estavam com bandeirinhas temáticas da festa junina estampadas com o brasão do time de vôlei. Os alunos logo esqueciam-se da confusão armada na semana anterior para focarem nos ensaios da quadrilha e preparo de apresentações de algumas turmas. Afinal de contas, dançar contava nota.

Cumprimentaram os demais alunos do primeiro ano, conversaram até dar o sinal e cada um seguir para a sua sala. Theodore ficara com a cabeça deitada na carteira observando seu melhor amigo chegar na sala e xingar Gabriel como de costume.

Tudo parecia tão normal.

Mas as coisas haviam mudado.

Suspirando o ômega virou a cabeça passando a olhar a janela.

Como ele estaria dali a cinco meses? Poderia caminhar pelos corredores da escola sem ser alvo de rumores? Teria Gabriel ainda interessado em si, mesmo que seu corpo já não fosse o mesmo?

Theodore se sentiria feliz quando segurasse a criança em seus braços?

Um gosto amargo subira em sua boca.

Que angustiante. Não queria pensar daquela maneira.

Com a sala de aula fechada devido ao frio, o ambiente ficara quentinho suficiente para Theodore dormir. Perdera duas aulas daquele jeito, mas nenhum professor ousara acordá-lo já que era melhor dormirem do que ficarem de conversas paralelas durante a aula.

No intervalo, Theodore se juntara a Nicolas e Milles que estavam dentro de uma sala pequena e vazia, que fora deixada aberta para o ensaio de um pequeno grupo de dança. Sentando na cadeira olhando o lanche em suas mãos não sentia vontade alguma de comer. Se o fizesse, provavelmente passaria mal. No final das contas embalara o lanche novamente e deixara sobre a carteira passando a prestar atenção na conversa dos amigos.

— O que pretende fazer então? Já pensou em alguma coisa?

— Queria arrumar um trampo para ajuda a sogra, mas Jake já me avisou pra desistir dessa ideia. — Dizia Milles comendo um amendoim de um pacote.

— Por quê? — Questionava Gabriel curioso.

— Meu pai disse que ia dificultar as coisas pra mim. Provavelmente na hora que eu falar meu sobrenome ninguém vá me contratar.

Gabriel fazia uma careta assombrada.

— Como assim, não é como se sua família fosse da máfia.

— Não me pergunte, nunca tive interesse nesse assunto. Meu primo só disse que pra ele foi a mesma coisa, não teve o que fazer além de ir pra outra cidade se estabelecer.

— Não arredo o pé daqui, já deixo avisado — Resmungava Nicolas virando a página de algum gibi da Turma da Mônica.

— Vocês vão ter que pensar em algo, Milles se forma esse ano. — Avisava Theodore encolhendo-se no moletom — Se ele entrar pra faculdade já vão ficar separados de qualquer forma. E um dos times que está de olho nele é de outra cidade.

Nicolas erguera os olhos cansados pro amigo e bufara em resposta.

— Não me importo de abandonar a escola.

— Também não precisa exagerar, tampinha. — Respondia Milles deixando um amendoim na boca de Nicolas. — Pensaremos em alguma coisa, não é como se precisássemos estar grudados um no outro.

— Gosto de manter meu poste na rédea curta.

Theodore e Gabriel entreolharam-se e riram em seguida. A proximidade daqueles dois se estreitavam entre tapas e beijos. Pelo menos aquilo era capaz de alegrar o ômega loiro.

A conversa entre os quatro duraram mais alguns minutos até que Milles e Nicolas saíssem para ir comprar algo para beberem. Deixados para trás, Gabriel olhava para o ômega percebendo sua atenção se esvair lentamente, tendo aquela sombra ocupando seus olhos.

Comprimira os lábios quando olhara em volta da sala buscando algum assunto que pudesse ter com Theodore. Qualquer coisa que fizessem sair daquele silêncio e trazer de volta o brilho em seus olhos. Fora então que encontrara um violão encostado no canto.

Levantando-se para ir até o instrumento, Gabriel o pegou e se sentara sobre uma carteira ajeitando o violão em seu colo. Imediatamente tivera a atenção de Theodore, que se ajeitava na cadeira parecendo acordar de um cochilo.

— Toca violão?

— Aprendi com alguns primos por parte de pai. Eles moram na capital e a gente se via sempre nos almoços de família.

— Ah...

Enquanto afinava o violão, Gabriel não olhara para o ômega. Ainda assim ele questionara.

— Está assustado? — Theodore o fitara um tanto quanto surpreso, permanecendo em silêncio sem saber o que responder. Gabriel interpretara aquilo como incompreensão de suas palavras. — Quero dizer, você não fala muito desde que descobriu a gravidez.

— O que eu poderia dizer? Parece que esse corpo não me pertence mais. Mudando depressa e me deixando estranho.

Gabriel olhara Theodore de canto e sorria levemente. O ômega ainda sorria envergonhado, parecendo receoso em conversar com seu namorado sobre o assunto. Ele coçava a nuca, mantinha o olhar no chão corando levemente.

Como sempre acontecia quando estava envergonhado.

— Você continua sendo um cara bonito, Theo.

— Está dizendo isso só pra me animar.

— Não deixar de ser uma verdade. — Tocando alguns acordes, Gabriel sorria. — Pra mim você é a pessoa mais bonita do mundo.

— Gabriel...

O som do violão soara aos poucos, mostrando a habilidade de Gabriel em tocá-lo. Theodore arrumou-se na cadeira observando aquele alfa se destacar diante de seus olhos. Igual a vez em que se encontraram na biblioteca no começo do ano. Também de quando o vira jogar vôlei tão concentrado dando o seu melhor.

Sentado sobre uma carteira, com caixas e entulhos no fundo, uma cortina esvoaçando deixando o brilho do sol chegar até seus cabelos castanhos, Gabriel brilhava belamente na sua frente. E os acordes do violão só serviam para aumentar aquela aura tão fascinante que surgia como um desabrochar de uma flor.

Acompanhando a melodia, uma voz baixa e tímida começara a cantar exclusivamente para Theodore.

"A confiança tá fluindo,

Eu gosto do que estou sentindo

O meu sorriso não disfarça,

Quando se quer alguma coisa a gente abraça

Eu mergulho em queda livre,

Com você crio coragem.

Aceito qualquer desafio,

E qualquer coisa na bagagem".

A brisa que passavam pelas janelas balançavam os cabelos castanhos como um efeito digno de cinema. Graças aquela voz tímida que começava a cantar, Theodore se tornara incapaz de piscar ou de desviar o olhar. Tudo o que fazia era acompanhar aquele alfa olhando sua boca que cantava tão docemente.

Ah ele sorria para si. O sorriso mais belo que Theodore já vira, sincero sendo direcionado diretamente pro seu coração. Na medida em que trocavam olhares, Gabriel perdia um pouco da timidez continuando a cantar a música para o loiro.

"Eu confio em você,

De olhos fechados posso ver,

Honestidade, em um ser humano.

Tá difícil de encontrar,

Hoje em dia igual a ti.

Considere-se a pessoa mais linda do mundo...

O sorriso mais lindo...

O olhar mais sincero...

O meu porto seguro...

A pessoa mais linda do mundo"

Os olhos de Theodore começaram a arder quando lacrimejara. Precisara desviar o olhar quando o fervor tomara sua face. Rindo baixo cobrindo parte do rosto, o ômega era incapaz de olhar para Gabriel. Percebendo isso, o alfa levantou-se da carteira caminhando lentamente em sua direção sem deixar de cantar.

"A confiança tá fluindo,

Eu gosto do que estou sentindo

O meu sorriso não disfarça,

Quando se quer alguma coisa a gente abraça.

Eu mergulho em queda livre,

Com você crio coragem.

Aceito qualquer desafio,

E qualquer coisa na bagagem.

Eu confio em você,

De olhos fechados posso ver,

Honestidade, em um ser humano,

Tá difícil de encontrar,

Hoje em dia igual a ti.

Considere-se a pessoa mais linda do mundo...

O sorriso mais lindo...

O olhar mais sincero...

O meu porto seguro...

A pessoa mais linda do mundo"

Pouco a pouco Gabriel deixava a timidez de lado para cantar confiante para Theodore. E quando o ômega retribuía seu olhar, o alfa alargava o sorriso em uma explosão de sentimentos. Era difícil tentar fugir daquele momento, pois Theodore queria olhá-lo mais e mais.

Só que a vergonha estava estampada em sua face, sentia suas bochechas queimarem e os olhos marejarem sem fim. Quando baixara a cabeça impedindo Gabriel de vê-lo mais, as lágrimas caíam de seus olhos. Theodore puxara a manga do moletom para enxugá-las depressa, mas a quantidade vencera.

Além disso, Gabriel parara diante de si ajoelhado ainda tocando o violão e o olhando diretamente recapturando sua atenção.

"Você, você, você é o cara

Você, você, você é o cara

Você, você, você é o cara

A pessoa mais linda do mundo...

Você, você, você é o cara

Você, você, você é o cara

Você, você, você é o cara

A pessoa mais linda do mundo"

Com o final da melodia, Gabriel apoiou-se no violão estendendo a mão para enxugar as lágrimas traiçoeiras que escorriam no rosto de Theodore. O calor de sua mão era aconchegante para o ômega, que a segurou esfregando suas bochechas na sua palma.

— E agora, como se sente? — Perguntara o alfa.

Rindo baixo, Theodore mostrava as presinhas no sorriso que certamente seria capaz de matar aquele alfa do coração.

— Me sinto a pessoa mais linda do mundo.