Capítulo 9 - Primeira presa

Capítulo 9

A escuridão da floresta era densa, uma extensão negra pontilhada apenas pela luz fraca das estrelas que mal conseguiam atravessar as copas fechadas das árvores. O vento gelado sussurrava entre os galhos retorcidos, trazendo consigo o cheiro do musgo úmido, da terra fria e... de algo mais. Algo quente. Algo vivo.

Um par de olhos brilhantes movia-se silenciosamente na escuridão, famintos e atentos. As patas, agora maiores e mais pesadas do que antes, tocavam o solo com cuidado extremo, cada passo calculado para não trair sua presença. O predador respirava lentamente, suas narinas dilatando enquanto farejava o ar. Havia algo adiante. O faro não mentia. O cheiro de carne viva, do calor emanando de um corpo humano.

Entre as árvores, à frente, uma fogueira bruxuleava, suas chamas pequenas e tímidas, incapazes de iluminar completamente o ambiente ao redor. Ali, à beira das chamas, um homem estava sentado, imóvel, de costas para a floresta. Seu corpo estava envolto em peles grossas, as sombras da fogueira brincando ao redor dele, tornando-o uma silhueta indistinta.

O predador parou por um instante, observando. Seus olhos atentos vasculhavam o homem, procurando qualquer movimento que denunciasse que sua presença havia sido detectada. Nada. A respiração do homem era lenta, calma, como se estivesse em paz.

Com precisão, o predador abaixou ainda mais o corpo, os músculos tensos e prontos para o ataque. As orelhas captaram apenas o som da madeira estalando no fogo, nenhuma indicação de que havia sido percebido. A distância diminuía com cada passo furtivo, cada movimento milimétrico calculado. O cheiro da presa era mais forte agora. Ele estava perto, tão perto. Apenas mais alguns passos...

A tensão nos músculos do predador crescia, seus olhos fixos nas costas do homem, a única coisa que o separava de sua refeição. A lua, alta no céu, observava em silêncio, uma testemunha distante da caça que estava prestes a se concluir.

E então, num único movimento fluido e letal, o predador saltou das sombras, lançando-se em direção à presa...

De repente, o homem se virou, seus reflexos ágeis como se estivesse esperando o ataque. Antes que o predador pudesse atingi-lo, mãos firmes agarraram sua forma ágil e musculosa no ar.

"Peguei você, Ghost," disse Jon, sua voz calma e divertida, um sorriso surgindo em seus lábios enquanto segurava o lobo gigante em seus braços.

Ghost, que uma semana atrás não passava de um filhote pequeno, agora já tinha o tamanho de um cão robusto. Suas patas eram grandes, suas presas afiadas, e o corpo musculoso indicava o quão rápido ele crescia. Mesmo assim, o lobo albino não deixava de ser brincalhão, mordendo levemente a mão de Jon, sem qualquer intenção de causar dor. Era uma caça simulada, algo que os dois vinham repetindo desde que Jon o encontrara entre os filhotes.

Rindo, Jon olhou nos olhos vermelhos de Ghost, que brilhavam com uma mistura de travessura e cumplicidade. "Você quase me pegou dessa vez, hein?"

Ghost emitiu um som baixo, um rosnado suave, mas não de ameaça, e sim de brincadeira.

Enquanto brincava com Ghost, Jon observava atentamente o crescimento impressionante de seu companheiro. O lobo albino, que uma semana antes mal passava de um filhote, agora já tinha o tamanho de um cão grande e robusto. Cada vez que Jon olhava para Ghost, ele sentia que algo especial estava acontecendo entre eles, uma conexão que ia além do simples laço entre homem e animal. Desde o momento em que encontrou Ghost, Jon sentiu uma ligação inexplicável com o lobo gigante, como se, de alguma forma, estivessem destinados a seguir o mesmo caminho.

Jon acariciava o pelo macio e denso de Ghost, os dedos percorrendo as camadas grossas, enquanto sua mente voltava para a energia que ele vinha desenvolvendo em seu próprio corpo. Essa força misteriosa, que surgira desde que ele quase sucumbira à febre, era algo que Jon ainda não compreendia completamente, mas que ele vinha praticando.

Ele a sentia pulsar em seus músculos, enchendo-o de uma força incomum, melhorando seus reflexos e aumentando sua resistência. Mas a questão que o intrigava agora era: se essa energia podia fortalecê-lo, o que ela poderia fazer com Ghost?

Movido pela curiosidade, Jon decidiu testar sua teoria.

Numa das noites mais recentes, enquanto Ghost estava ao seu lado, Jon se concentrou, focando a energia em seu corpo. Ele começou devagar, tentando descobrir se poderia canalizá-la para Ghost. No início, foi uma tentativa frustrada. A energia parecia não querer fluir para fora de seu corpo. Mas Jon persistiu. Lentamente, ele visualizou o fluxo em sua mente, direcionando-o até a mão que descansava sobre o lombo de Ghost.

E então aconteceu. Jon sentiu algo mudar, uma corrente suave, quase como uma vibração passando de seu corpo para o lobo. Ghost se agitou de leve, seus olhos vermelhos brilharam com uma intensidade nova. O lobo ergueu a cabeça, respirando mais rápido por um momento, como se tivesse percebido o que Jon estava fazendo.

A sensação era estranha, mas Jon soube naquele instante que havia conseguido. Ele havia injetado parte de sua energia em Ghost.

Os dias seguintes confirmaram o resultado. Ghost, que antes era apenas um filhote, crescia a uma velocidade surpreendente. Suas patas, antes pequenas e desajeitadas, agora eram grandes e firmes. Seus movimentos, outrora travessos e infantis, agora tinham a agilidade de um predador bem treinado. Mesmo para um lobo gigante, aquilo não deveria acontecer tão rapidamente.

"Então foi isso," murmurou Jon enquanto acariciava o lombo do lobo, agora muito maior. "Você está crescendo porque está se alimentando da minha energia."

Claro que compartilhar sua energia o deixava cansado, mas ajudava seu companheiro a se desenvolver. E Jon sentia como se suas reservas se tornassem cada vez maiores com o tempo, ao ponto que ele podia usá-la constantemente.

Mas, no meio de sua análise, o sorriso que brincava em seus lábios desapareceu de repente. Seus olhos se tornaram frios, e a tranquilidade que sentia momentos antes foi substituída por uma sensação de alerta.

Calmamente, Jon levou a mão até o punho de sua espada, seus dedos deslizando até o cabo enquanto seu olhar se endurecia. Ao mesmo tempo, Ghost, como se tivesse percebido a mudança no comportamento de Jon, parou de circular. Seu corpo tenso, os pelos se arrepiaram, e um rosnado grave e ameaçador saiu de sua garganta. O lobo, que até então estava relaxado ao lado de Jon, agora estava em alerta máximo, as orelhas apontadas para a escuridão da floresta.

Jon resmungou, os olhos varrendo a floresta ao redor. "Parece que nós temos companhia."

O som sutil, mas inconfundível, de galhos se quebrando sob o peso de passos pesados veio logo em seguida, confirmando suas suspeitas. Ghost rosnou mais forte, a postura defensiva, pronto para atacar se necessário. Jon se levantou lentamente, mantendo a mão firme na espada, seus sentidos aguçados, enquanto os estalos e o som de folhas sendo amassadas se aproximavam.

E então, saindo das sombras entre as árvores, Jon viu a silhueta de cinco homens se aproximando. As chamas da fogueira lançaram sombras longas e distorcidas sobre eles, fazendo-os parecer ainda mais ameaçadores. Seus rostos não eram visíveis à distância, mas a maneira como caminhavam, sem pressa, mas com uma confiança fria, indicava que não estavam ali por acaso.

Limpando a lâmina de sua espada na roupa de um dos ladrões caídos, Jon deu uma última olhada ao redor, certificando-se de que nenhum dos homens ainda representava uma ameaça. As chamas da fogueira bruxuleavam ao vento, lançando sombras dançantes sobre os corpos, e o cheiro metálico de sangue começava a se espalhar pelo ar.

Com um gesto tranquilo, ele embainhou sua espada, o som metálico suave ressoando no silêncio que se seguiu ao combate. Ghost estava ao seu lado, ainda atento, mas sua respiração pesada indicava que o lobo estava relaxando. Jon abaixou-se e passou a mão pelo pelo branco de Ghost, um raro sorriso surgindo em seu rosto.

"Você foi ótimo, Ghost. Sua primeira presa," disse ele, com um toque de orgulho na voz. Ghost olhou para Jon com seus olhos vermelhos brilhantes, e, por um momento, rosnou suavemente, como se compreendesse o elogio.

Foi então que Jon percebeu as primeiras luzes do amanhecer rompendo o horizonte. O sol começava a se erguer lentamente, espalhando uma luz fraca pelo céu. O ar da manhã estava fresco, mas o cheiro de sangue começava a se intensificar ao redor do campo de batalha.

Jon se levantou, jogando um último olhar aos ladrões derrotados, e olhou para Ghost. "Parece que é hora de partir, amigo. O dia começou, e isso aqui vai ficar fedendo com tanto sangue."

Ghost, como se concordasse, deu alguns passos para longe dos corpos, erguendo o focinho para farejar o ar. Jon colocou a mão sobre o punho da espada novamente, seus olhos voltados para a floresta adiante. Eles ainda tinham um longo caminho pela frente, e Jon sabia que, com Ghost ao seu lado, estaria preparado para o que viesse. Juntos, eles partiram em direção à luz do amanhecer, deixando o campo ensanguentado para trás, desaparecendo entre as árvores.