No dia seguinte à chegada da família Miller à sua mansão na capital, logo pela manhã, a mesa do café da manhã foi um pouco mais animada que o habitual. James estava praticamente saltitando e cantarolando enquanto andava para a sala de jantar. Seu entusiasmo era tanto que parecia que o garoto irradiava luz para aqueles que viam. Aos olhos da condessa, ele ficava ainda mais lindo sorrindo e era bem fofo.
James obviamente estava contente desde que começou o dia, mal dormindo à noite. Seria hoje que ele iria para as ruas e veria a torre dos magos que ele tanto queria ver e sua mãe já tinha lhe dito no dia anterior que ele poderia ir. Todos na casa viram como o mais novo estava empolgado com tal passeio e não podiam deixar de comentar sobre isso. Claro, para seus familiares, era bom que ele tivesse tamanha energia para o dia.
Não somente por sair e visitar que James está entusiasmado. Ele poderia sair com Brandon, coisa que ele não fazia em Killos. Isso certamente era uma coisa a se comemorar. E embora tivesse uma escolta, não é algo que desgostasse, ele entendia que tinha que se proteger, ainda mais em um ambiente desconhecido em que poderia se perder. O mais empolgante era que ele poderia experimentar diversas coisas novas que só foram vistas nos jornais ou as notícias que via, como a Loja de Sobremesas do Chefe Vini, com seus famosos bolos e doces, ou o grupo Maquiattes, que atraiu atenção por se apresentar em uma praça no lado norte da capital.
Sua curiosidade poderia ser satisfeita, mas ainda estava sendo atiçada.
Brandon, a quem o acompanharia, estava sentado com Nott longe da casa principal e conversava com o cavaleiro. A conversa não tinha nada muito relevante como alguma informação importante, era apenas um diálogo amigável entre amigos. Brandon também aproveitou a oportunidade para informá-lo que ele poderia ter que acompanhá-lo com James à sua saída.
Bem, era melhor que fosse um cavaleiro com o qual estava mais familiarizado e Brandon também queria se divertir um pouco com Nott, afinal, ambos eram amigos. Era trabalho, mas era principalmente brincar com James durante seu passeio, não era algo formal, desde que garantisse a proteção do jovem mestre. Brandon considerava isso mais como tempo livre do que o trabalho em si, já que cuidar de James não era muito rigoroso. E logo após o café da manhã, todos tinham seus afazeres e se dispersaram. O conde e Ferion saíram para um encontro com nobres e Phillip e Johannes também. A condessa Miller disse que ia ver algumas amigas que não via há tempos e disse para James se comportar ao sair, além de que o amava. Por fim, chegou a vez do garoto de 13 anos sair.
A carruagem estava pronta e não demorou muito para as três pessoas aparecerem para entrar. Logo, o garoto saiu pela porta da frente puxando pela manga o ruivo que o seguiu obedientemente.
James estava vestindo um casaco que ia até um pouco abaixo de sua cintura e era de boa costura, com uma camisa por baixo e uma gravata que o acompanhava, junto com um ornamento. E a parte de baixo era um short que revelava as pernas brancas e as meias com detalhes coloridos. Brandon também usava algo menos formal do que usava diariamente. Ele parecia ótimo usando roupas mais simples e dava um ar mais jovial, que era harmonioso com o sorriso suave e os olhos brilhantes. Uma visão que algumas empregadas que viam se sentiram atraídas para continuarem vendo.
E, por fim, Nott, vestindo roupa simples e de plebeu, mas carregando uma bainha, o que deixava claro seu status de cavaleiro ou, ao menos, um aprendiz. No entanto, a beleza de Nott não era rude, ele era bonito o suficiente para atrair alguns suspiros, ainda mais ao verem seus músculos com os braços nús e o sorriso alegre que exibia.
James olhou para Nott com curiosidade, até balançar a cabeça ao se lembrar quem ele era. Ele deu um olhar de cima a baixo discretamente e depois se virou para encarar Brandon. Se ele se recordava bem, ele seria o amigo que Brandon está encontrando há mais de um ano. Era bom que Brandon tivesse mais amigos, mas ele se sentia um pouco ciumento.
"Terceiro Jovem Mestre." Nott o saudou em um cumprimento típico de um cavaleiro e deu um sorriso em direção de Brandon.
"Você é Nott?" James perguntou-lhe.
"Sim."
"Bom, estarei sob seus cuidados." E entrou na carruagem, puxando Brandon.
O ruivo viu tal interação e não pôde deixar de ficar um pouco confuso com isso, mas logo deixou de lado e se entrou, sendo seguido logo atrás por Nott e partindo da mansão. Os portões com o brasão da casa Miller foram abertos e a estrada apareceu pelas janelas laterais. As casas e muros que viram ao chegar no dia anterior estavam sendo vistas novamente, mas com algumas pessoas e carruagens a mais, parecia que era um bom momento para sair de casa.
O primeiro objetivo do trio era, obviamente, a que James estava mais entusiasmado, a torre dos magos, Gylles.
A torre dos magos, Gylles, ou Torre Mágica, era uma torre que remonta sua origem há mais de seiscentos anos no império Yulard. Não está desde a fundação do país, mas foi um dos principais projetos que recebeu destaque na época, por suas controvérsias entre os prós e contras que eram bem discutidos tanto pelas massas quantos pelos círculos de aristocratas.
Liderado pelo Arquimago Gylles Troit, a torre foi fundada e tinha o objetivo de estudo mágico, bem como ser responsável pelo campo de pesquisa e treinamento de novos magos. No entanto, por causa de seu fundador ser uma pessoa excêntrica e não ter boa reputação, muitos tinham dúvidas se seria um bom investimento e se não teria prejuízos para o país.
Rumores da época diziam que Gylles não levava em conta o status da outra parte e que só respeitava aqueles de que gostava ou atendiam seus padrões. Também que era um viciado em magia e um pouco louco, embora o primeiro possa ser verdadeiro, por ser muito estudioso, o último era menos confiável, pois tal arquimago tinha contato com a família imperial e havia aparecido em inúmeros banquetes e eventos, comportando-se de maneira educada e contida.
Mas, por fim, a torre foi construída com o capital privado de Gylles e apoio da família imperial, criando mais um marco na história do país.
Como ponto turístico, a torre era famosa por ser grande o suficiente que o palácio imperial na altura, atraindo muitos estrangeiros e pessoas de diversos territórios para ver tamanha construção. Há também outros motivos, como o aparecimento de alguns magos que fazem um show na entrada da torre para a população ver. Não é sempre, mas dizem que os truques são bons de se ver.
O veículo parou e o trio desceu. A primeira coisa que viram foi uma construção que chegava a tocar o céu. Branca como marfim, a Torre Mágica era enorme. Tão alta que era fácil ficar surpreso e impressionado com tamanha visão. Eles ficaram sem palavras e não reagiram. Não se sabia quantos andares tal edifício poderia conter, mas eles nem chegavam a especular um número menor que trinta, e isso já era uma extraordinário. Em termos modernos, podia-se dizer que a Torre Mágica era um arranha-céu de uma grande corporação centrada em magia e seus funcionários sendo magos.
"Incrível." James foi o primeiro a reagir. Suas palavras saíram naturalmente e um sorriso chegava a ser desenhado em seu rosto. Os olhos logo brilharam de antecipação para chegar mais perto.
Os olhos de Brandon estavam impressionados iguais aos de Nott e James, mas ele estava mais contido que James. Diferente de James, que é um mago e tem uma paixão por magia, ele estava surpreso por um prédio ter tal tamanho. E Nott também compartilhava esse sentimento.
"Será que nós conseguimos ver um show?" James perguntou andando em frente.
Brandon saiu de seu torpor, e prestou atenção ao portão. "Não acho, James."
A torre era grande e preenchia uma grande área, mas o que estava na frente deles eram os portões para entrar e estavam muitos somente com transeuntes e algumas pessoas que paravam para olhar. Com certeza, aqueles que paravam eram iguais a eles, que vieram visitar. No entanto, não havia ninguém fazendo magia ou que iria fazer, pois haveria uma multidão em volta da pessoa.
"Parece que não." Os lábios do garoto franziram. "Também não podemos entrar."
Aqueles que podem entrar na torre são somente aqueles registrados. Todos os magos que pertencem a Torre Mágica são magos patrocinados por famílias nobres, ricas ou que possuem um professor, sendo um discípulo, onde passam cinco anos estudando antes de serem considerados "formados", ou seja, um mago. E a maioria dos formandos permaneciam na torre, para pesquisas ou aprendizagem, e o resto iriam para as casas das famílias nobres que patrocinaram ou sairiam, cada um com seu destino.
O professor de James, Below Willow, foi um dos que decidiu sair. Ele teve um professor que o ensinou e foi seu discípulo, mas decidiu sair da torre após a morte dele. Agora, ele ensina o jovem Miller e alguns outros. Ele também conta histórias de como é dentro da torre, aumentando a curiosidade de James.
"Nós já sabíamos disso, não é? É por isso que nosso destino é outro."
"Ainda sim, é uma pena." Lamentou virando para o ruivo. Brandon riu de seu rosto fofo.
"Vamos, vamos." Brandon procurou ao seu redor, vendo uma rua que tinha uma quantia maior de pessoas andando. "Por ali."
A rua que o trio andou estava mais movimentada que a que ficava em frente a da torre, porque conforme avançavam viam muitas lojas de artigos mágicos, até comidas que soltavam faíscas e luz. Era muito estranho e parecia um novo mundo, mas isso comprovou o destino deles, o Bairro dos Encantos.
O Bairro dos Encantos é um conjunto de ruas que ficam em frente à torre e são formados por magos que vivem tanto dentro quanto fora da torre. Ele reúne diversas especialidades e setores, sendo considerado o mundo mágico do império Yulard, por ter se desenvolvido ao longo dos séculos. Além de sua fama, é também conhecido como o lugar que pode encontrar e conseguir tudo o que quiser, desde que esteja relacionado à magia. Ele é constituído em lojas através das ruas, com barracas espalhadas por elas e todas vendendo algo diferente, incluindo talismãs, ferramentas ou pergaminhos que contém feitiços, sendo geralmente básicos, como bola d'água, escudo e sinalizador. Há também alguns que são de magia de salão, ou seja, para shows em locais privados com um pouco de magia.
James andava a frente e Brandon e Nott estavam atrás dele. O cavaleiro olhava para seu jovem mestre fixo, sem se distrair com as maravilhas que via pela rua. James, por outro lado, encarava tudo com olhos brilhantes, era até possível ver o brilho das estrelas em seus olhos castanhos, ou comparar com os raios do sol, por estar tão resplandecente. O garoto estava tão animado que estava praticamente escrito entusiasmo em sua testa em néon e piscando. E Brandon via tudo com um pouco de curiosidade, mas como estava em público, sua expressão estava um pouco neutra, mas suavizando quando via o amigo ou a criança que cuida.
James parou, vendo um colar que gostou. Brandon logo chegou e Nott também. O velho senhor que estava sentado no chão com um pano e mostrando suas mercadorias os observava atento, mas logo perguntou.
"Você gostou?" As rugas dos olhos foram mostradas ao sorrir. "Esse é um colar feito com madeira da árvore de Linden, com um petrácio e um pouco de ferro. Ele contém um feitiço de proteção, um escudo que dura por cinco minutos."
O homem velho explicou. O colar está na forma de um círculo mágico com leves runas escritas na borda, quase difíceis de distinguir, mas o artesanato era bom. Sua estrutura era feita de uma madeira semelhante ao carvalho, mas havia fragmentos brancos espalhados que eram um sinal de sua resistência e de sua origem. O petrácio que o homem disse estava no centro do círculo, sendo enredado com o ferro e conectado às laterais. Era uma pedra negra em forma redonda, pequena, mas que é usada em objetos mágicos comuns por sua capacidade de reter mana bem.
Era um colar bem feito, onde se podia ver o cuidado e trabalho do artesão.
"Quanto custa, senhor?" James indagou. O colar já estava em seus dedos e a textura surpreendentemente era lisa.
O homem deu uma olhada estratégica em suas roupas que, embora pareçam comuns, eram bem feitas. "Uma prata pequena."
James acenou e se virou para Brandon que o fitou também. Ele tirou a bolsa de seu bolso e entregou ao velho uma moeda de prata, cujo mordeu e acenou com a cabeça, confirmando que era verdadeira. Logo, eles saíram e James estava com seu novo objeto em seu pescoço se exibindo com um sorriso para Nott e Brandon.
"Olha como ficou bem em mim." Uma cara orgulhosa com um beicinho no rosto era mostrada. "Não ficou?"
"Ficou bem." Brandon confirmou e Nott assentiu.
Nem um dos dois estava mentindo, muito menos falando da boca para fora apenas para lisonjear. A madeira marrom combinava com os olhos castanhos e a pedra negra tinha uma harmonia com o casaco escuro, somente o ferro não havia nenhuma combinação com a roupa que James estava usando, mas isso não retirava o fato dele ser bonito. Era algo que foi comprado, mas combinava perfeitamente, o que era surpreendente.
Eles continuaram pela rua. James parava às vezes e comprava algo, até Brandon comprava também, com seu próprio dinheiro. Brandon comprou para Nott uma braçadeira para usar durante os treinos, ela era feita de couro com detalhes de ferro como reforço e um feitiço para aumentar a durabilidade e resistência. O preço estava bom e era algo que servia como um presente para o cavaleiro. Nott o aceitou com um pouco de vergonha e até suas bochechas coraram um pouquinho.
James via aquilo com um pouco de ciúmes e com os olhos semicerrados.
Perto de onde estavam, um sino de uma porta soou com o barulho do cliente saindo. O som foi um pouco alto para atrair a atenção de alguns pedestres e de James. O garoto de cabelos roxos olhou para a direção e viu na vitrine biscoitos colocados com uma placa escrito "Biscoitos Surpresa!", o que o fez arregalar os olhos e segurar rapidamente a mão de Brandon e o puxar.
Biscoitos surpresas foram anunciados nos jornais de magia e havia até alguns que ganhavam notícia por algo surpreendente. James sempre lia quando aparecia um e sempre quis saber como era comer um. Por isso, ele estava surpreso que conseguiu encontrar.
"Vem, vem. Rápido." Ele caminhou a passos rápidos e parou em frente à loja de nome 'Padaria da Sue'.
"O quê?"
"Biscoitos surpresa, rápido." Chamou de novo, entrando na loja e indo logo ao balcão pedir. "Quinze biscoitos surpresas, por favor."
Uma moça de cabelos pretos e olhos castanhos com um avental branco estava parada limpando o balcão quando o garoto se aproximou e fez o pedido. Ela sorriu para ele. "É para já."
Rapidamente, a mulher pegou os biscoitos e colocou em um saco e entregou ao garoto, erguendo a cabeça para ver os dois homens parando atrás do garoto. Ela caiu em torpor por ver um ruivo lindo que parecia indiferente, mas não diminuía a beleza, e um cavaleiro bonito que seus músculos e um leve sorriso que fazia o coração falhar uma batida. Brandon achou que ela estava esperando o dinheiro e rapidamente entregou as moedas de cobre grande, saindo da loja logo em seguida, não reparando que as bochechas da mulher estavam um pouco vermelhas.
"O que é isso?" Nott indagou. Ele não resistiu perguntar, pois parecia um biscoito comum, mas o jovem mestre estava bastante empolgado com eles.
James o olhou e respondeu. "São biscoitos surpresas. Eles são biscoitos e contém uma surpresa. Pode ser um sabor incomum ou um feitiço aleatório, como o que faz cuspir um leve fogo ao respirar, mas que não machuca. Resumindo é um biscoito encantado que te surpreende. Seus efeitos passam rapidamente, de trinta segundos a um minuto. São inofensivos. Toma." Entregou um a cada um.
O garoto pegou um para si e mordeu, logo ao engolir, surpreendentemente, seu cabelo mudou de cor de roxo para preto. Ele encarou o biscoito e tentou fazer sentir algum efeito, mas não ocorreu-lhe nada. Ele fitou Brandon que estava encarando ele, ou, mais precisamente, o cabelo que mudou de cor.
"O que aconteceu? Algo mudou? Eu não sinto nada." Até tocou em cima de sua cabeça, mas não sentiu nada.
"James, seu cabelo está preto. Ele mudou de cor." O ruivo disse. "Mas continua fofo." Sorriu para ele.
O jovem Miller arregalou os olhos e puxou uma mecha para ver e viu que era preto. Logo, encarou o biscoito de novo e depois viu o cabelo voltar ao normal. A mudança de cor parecia uma tinta, como se pintasse de preto e depois lavasse com água. Ele decidiu guardar em seu bolso esse em específico, porque seria legal chegar em casa e encontrar sua mãe com uma cor de cabelo diferente.
"Coma também." Indicou os dois.
Brandon suspirou fundo e mordeu um pedaço, mas não ocorreu nada. Ele não sentiu, muito menos teve algo que surpreendente. O efeito do biscoito não era incomum, era um de sabor. "O meu tem gosto de canela." Falou para os dois.
James ouviu isso e ficou um pouco decepcionado. Ele estava esperando algo grande ou que, ao menos, fosse igual ao dele. Ele fitou Nott, com a esperança de que, dessa vez, algo bom pudesse acontecer.
Nott respirou fundo, com um pouco de ansiedade com o que poderia acontecer com o dele, e mordeu. O gosto era comum, era até gostoso para ele. E sentiu um pouco de alívio por não sentir nenhuma mudança, mas era cedo demais para sentir isso. Assim que ele relaxou, suas bochechas incharam, como um esquilo, só que maior e parecia bom de se apertar. Sua cabeça parecia um pouco pesada e ao comparar as bochechas com a cabeça ficava desproporcional e era engraçado, arrancando risos de James e de Brandon, por que era hilário.
O cavaleiro tocou suas bochechas e parecia que elas cabiam em sua palma inteira, mas era um pouco menor. Ele apertou e sentiu a elasticidade que aumentou com o feitiço, além de não sentir que cresceu. Era ainda mais engraçado porque ele tocava e apertava, parecendo que uma criança inocente brincava com o próprio rosto, o que era um contraste com seu físico adulto masculino em forma.
Logo, suas bochechas voltaram ao normal e Nott ficou receoso ao continuar comendo, mas terminou mesmo assim. Era comida e isso não se desperdiçava, além de ser gostoso. Somente tinha que ignorar suas bochechas que faziam cosplay de esquilos ao comer e as risadas dos dois que estavam junto com ele.
Ainda restavam doze e seriam divididos entre os três, rendendo risadas enquanto passeavam por aquela rua.