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Capítulo 34 - Eu sou Zefre

As férias começaram e já fazia 1 semana desde seu início. Até agora eu nada fiz além de ficar em casa estudando e treinando minhas técnicas de luta na floresta atrás da minha casa.

Diferente dos outros, eu não nasci com manipulação ou algum dom que me fizesse ser destaque. Tudo o que tenho é a inteligência e minhas técnicas em diversos estilos de luta. Desde novo me interessei pelos estilos em geral, e como não tinha nascido com nenhum poder, me dediquei a aprender cada um deles.

Comecei primeiro com Muay Thai. A primeira vista parecia ser o mais fácil entre os outros, mas acabou sendo o mais cansativo e difícil. Talvez por ser meu primeiro estilo e primeira vez, tenha sido mais complicado me acostumar e me adaptar ao novo jeito com o qual me comportaria.

Aos 15 anos eu já era o melhor em cada estilo que aprendi. Muay Thai, Jiu-jitsu, Caratê, Capoeira, Kung fu, MMA. Claro que são poucos e ainda existem mais estilos, mas esses são os que me atraíram e me fizeram querer aprender. Atualmente ainda estou aprendendo e treinando meu Taekwondo, acredito que não falta muito para eu estar 100% nele também.

Diariamente vou o mais fundo possível na floresta para que eu possa treinar em paz, afinal, não é fácil destruir árvores, rochas com 5 vezes mais do meu tamanho e deixar tudo passar despercebido. Sem contar que mais escondido nela também há uma cachoeira com uma água bem transparente e com seu fundo cheio de pedrinhas. Sem contar que a água é muito gelada, e um belo banho junto de 20 minutos de meditação me fazem recuperar meu vigor e melhorar ainda mais minhas características.

Hoje treinei apenas meu Taekwondo, é meu estilo favorito entre todos. O uso das pernas, os movimentos realizados e a combinação, é tudo tão incrível que eu sempre me perco nos pensamentos quando estou treinando e fortalecendo meus chutes.

- Está na hora de voltar - digo ao vento enquanto observo o céu e vejo que já estava escuro.

Ponho minha calça preta e coloco minha camisa apoiada em meu ombro. Eu estava completamente molhado, minha camisa estava podre com meu suor, e eu havia tomado banho na cachoeira de cueca, então estava apenas eu e a calça, protegendo minhas partes íntimas.

Caminho por volta de 30 minutos até chegar em minha casa e finalmente poder comer algo. Durante meus treinos eu não como nada, me mantenho de barriga vazia por horas e foco totalmente no que faço.

Entro pela porta dos fundos, que dá acesso à cozinha. Minha casa não é muito grande, é o suficiente para duas pessoas viverem, ou uma, como é praticamente o caso aqui.

Meus pais se separaram quando eu tinha 6 anos. Ele era alguém bem importante e forte, sempre admirei ele, mas ao ver que seu filho nasceu desprovido de poder ou dom, ele nos abandonou.

Por mais que agora eu não tenha contato com ele a anos, sinto falta, ele era presente em minha vida, e agora eu praticamente vivo sozinho. Minha mãe anda sempre "ocupada", não sei com o que, dificilmente ele está em casa, de 30 dias, se ela passar 4 em casa ainda é muito.

Faltam 7 semanas para as atividades na academia voltarem, e todo dia lembro minha mãe que haverá uma reunião, e que séria muito importante que ela comparecesse, pelo menos uma vez na vida.

Vou até o banheiro e ponho minha roupa no cesto, ando pelado até meu quarto e visto uma cueca box. Como estou sempre sozinho, me sinto a vontade de livre em casa. Vou até à cozinha e começo a preparar algo para comer. Geralmente sempre faço omeletes e uma vitamina de qualquer fruta que tiver em casa, dessa vez só tem laranjas mesmo.

Enquanto ando de um lado para o outro, vejo que já são quase 19 horas e decido ligar para minha mãe, para saber se ela irar jantar em casa.

- Alô, mãe? - Pergunto, esperando que seja ela e não um dos idiotas que ela fica.

- Ela está, ocupada no momento... mais devagar.

Sinto que não devo perguntar com o que exatamente ela esteja ocupada, apenas suspiro e volto ao objetivo.

- Só quero saber se ela jantará em casa hoje.

- Ah! sim. Quer dizer, não, passaremos a noite ocupados.

E sem perder nem mais um único segundo, aquele idiota desliga o telefone. Já podia esperar isso, como sempre, será apenas eu nessa casa mesmo.

Passam-se algumas horas e estou na sala jantando e assistindo o que passa na televisão, geralmente nada de bom, mas hoje estava passando um dos filmes que meu pai havia feito durante sua carreira como ator. Fico admirando suas cenas e seu jeito de atuar, ele realmente era bom nisso, e também um ótimo herói no nosso planeta.

Eu queria ser como ele, construir minha história, meu legado, ser alguém que as pessoas pudessem admirar e se inspirar, mas é impossível fazer isso sendo um inútil sem dons.

Começo a tremer e sem perceber, sinto lágrimas escorrendo pelo meu rosto. Levanto-me e vou até à cozinha, coloco o prato no balcão ao lado da pia e depois vou até o banheiro. Pego um pote laranja de comprimidos e coloco 5 deles em minha mão, logo em seguida os ponho na boca e abro a torneira e bebo um pouco da água.

- Está tudo bem... você consegue, você é capaz - digo a mim mesmo, enquanto me olho no espelho.

Desde que meu pai se foi, tenho tido crises de insegurança e insuficiência. Toda vez que penso nos meus objetivos e no que quero conquistar, tudo surge como se fosse uma multidão sem fim ao meu redor, me falando ser impossível e que não sou capaz. Normalmente choro e começo a me tremer, às vezes me machuco fisicamente para substituir uma dor por outra.

Caminho até meu quarto, abro a porta, entro e me deito em minha cama. Colocando meu braço direito por cima de meus olhos, para que não pudesse incomodar minha visão, naquele momento, dormir me tiraria dessa crise.

Adormeço rápido e como num passe de mágica, a noite acaba e logo é de manhã, e lá vamos nós novamente para nossa rotina. Durante toda as férias faço isso, treino dia após dia, me dedico ao máximo para que eu possa ser cada dia melhor do que o dia anterior.

Os dias vão se passando e logo se completa 6 semanas e pela primeira vez, desde que voltei para casa, minha mãe aparece com sinal de vida.

- Pensei que não fosse voltar - Falo ao ver ela entrar e ir direto para a cozinha.

- Sabe que estou sempre ocupada - Ela me responde, olhando para a geladeira e pegando uma lata de cerveja.

- Sei... bem ocupada mesmo né.

Ela me olha como se fosse me estrangular ali mesmo.

- Está insinuado algo?

- Você me entendeu. Na próxima vez, vê se atende o telefone, se não for, não deixa algum babaca que você estiver chupando atender.

Ela joga a lata de cerveja na parede e vem até mim, gritando. Vejo que não gostou do que eu disse, mesmo que eu tenha dito a verdade.

- Você pense muito bem antes de falar essas coisas para mim! - Responde enquanto aponta bem para meu rosto - Sou sua mãe caralho! Me trate com respeito, você vive de baixo da porra do meu teto!

- Respeito? Estou falando alguma mentira para você? Até onde eu saiba você passa dias e noites com babacas que pagam tudo para você e em troca você faz sexo com eles - Olho bem nos olhos dela antes de terminar - Estou mentindo? Ma-mãe.

Ela me encara por alguns segundos. Sei que ouvir isso do seu próprio filho deve doer, mas falar isso para minha mãe, eu acredito que doeu mais em mim do que nela. Eu não a odeio, eu só queria passar mais tempo com ela, ter momentos em família. Ela é minha única família.

- Foi você - ela me responde, olhando para baixo e apertando suas mãos - Minha vida se tornou isso a partir do momento em que você nasceu! Seu pai me deixou por sua culpa, você foi um erro! Eu deveria ter abortado você quando ele me aconselhou...

Choque, quebrado. Essas duas palavras resumem meu estado agora, mesmo que talvez ela tenha dito isso por conta do momento, eu vejo em seus olhos que existe verdade em suas palavras. Então eu sempre fui um fardo? Um erro? Sempre fui o arrependimento dela? Então fui o motivo do pai ter nos deixado...

Ela muda sua expressão e percebe o que acaba de falar e em seguida se arrepende de tudo. Segurando meus ombros e chorando ela me pede desculpas e perdão, mas tudo o que havia na minha mente eram suas palavras de segundos atrás, martelando como uma multidão me julgando sem parar e sem formas de eu escapar.

Ando rapidamente na direção da porta dos fundos e abro ela tão rápido quanto cheguei até ela. Corro para dentro da floresta enquanto lágrimas saem de meus olhos e caem pelo caminho.

E minha mãe estava do lado de fora de casa, chorando e se abraçando, talvez estivesse arrependida, mas aquelas palavras foram como um gatilho de uma arma acionando e prestes a atirar na minha cabeça.

Corro sem olhar para trás e sem nem ver para onde estava indo, apenas corro sem parar e quando finalmente paro, estou na cachoeira. Me ajoelho em sua beirada e olho o reflexo da lua na água, juntamente do meu reflexo. Naquele momento, enquanto observo meu rosto na água, me vejo como a criança que destruiu a vida dos meus pais.

- Por quê? Por quê??

Pergunto-me enquanto grito e derramo mais e mais lágrimas, sem parar, sem cansar. Tudo o que desejava naquele momento, era que tudo acabasse, apenas acabasse.