Camila estava entediada após colocar todas as suas coisas no antigo quarto. Sua mãe tinha sumido de casa e seu pai estava na delicatéssen da família, ela não tinha nada mais para fazer em casa. Talvez devesse sair e procurar um emprego... Mas essa não era um opção que lhe chamava atenção no momento, então mandou uma mensagem para Agnes.
Passou a tarde trocando mensagens e colocando suas roupas no antigo armário. O tempo todo Camila se perguntava como tinha chegado aquele ponto, virar uma desempregada e ainda por cima uma acomodada com preguiça de ir atrás de um emprego.
— O que é isso? — Camila salta da cama com o susto causado por sua irmã mais velha, Anya Oleja. — Voltou para Tifton?
Camila era a única irmã até então que não tinha voltado para a cidade depois da universidade. Anya era um ano mais velha que Camila e tinha Hope também, dez anos mais nova que a irmã do meio.
— Oi, irmã querida? — Camila ironiza, levantando-se da cama para ir abraçar a mais velha. Anya fingiu não estar animada pelo contato, ela sempre fazia drama quando encontrava Camila no Natal, a única data que ia visitar sua família. — Pois é, estou de volta... Bridget me colocou para fora.
— Eu disse para ela que não deveria ficar te sustentando, já que não toma vergonha na cara. — Camila se afasta do abraço da irmã para olhá-la assustada.
— Bridget contou que eu estava desempregada? — Anya revira os olhos com a inocência de sua irmã.
— Kaki, entenda... — Anya sorria até quando ia dar sermão. — Você não manda notícias nunca, não sabemos se está viva ou não, então sou obrigada a achar fontes não convencionais. Camila, como você acha que a mamá não vai parar atrás de você pelo menos três vezes ao ano, vivo inventando notícias suas! Você deveria ser mais responsável! Você tem 34 anos, por favor, não f...
— Reunião para dar sermão e ninguém me chamou? — Hope fica parada na porta do quarto, olhando toda aquela bagunça no quarto que um dia dividiu com Camila.
Hope era a extremamente parecida com Camila, mesmo que Any também fosse, era bem menos. Os olhos castanhos de Hope eram do mesmo tom dos de Camila, enquanto Anya tinha os olhos em um tom de verde bem clarinho.
— Pelo que parece sim. — Camila resmunga uma resposta para a mais nova, sentando-se na única cama que havia no quarto. Hope ignora Anya, se viam todos os dias mesmo, e foi abraçar Camila bem apertado. — Voltou quando?
— Esse ano, terminei meu curso e voltei. — Hope responde de forma animada. — Ao contrário de certas pessoas, eu não consigo viver longe da minha família.
A capacidade tentar um sermão ou indireta amarga com um sorriso no rosto não era só de Anya, Hope também era capaz de fazer isso.
— Você também, Sofi?
*****
Camila foi obrigada a contar toda sua situação durante o jantar, que acabou acontecendo com toda a família. O jantar foi repleto de notícias, Camila se sentiu totalmente desinformada de tudo e seu pai lhe ofereceu um emprego na delicatéssen até que conseguisse outro melhor. Não pode negar o emprego, por mais que quisesse.
Após o jantar as três irmãs sentaram na varanda da casa para passar o tempo, Camila era a única que não tinha uma fatia de torta nas mãos. As outras não entediam o porquê de a irmã do meio odiar aquela massa deliciosa e com um recreio melhor ainda, sua mãe sabia muito bem como fazer e já havia ganhado inúmeros concursos.
— Anya está casada com um cara bonitão e esperando um bebê, eu estou namorando... — Hope faz uma pausa e coloca torta na boca, falando de boca cheia. — Mas e você?
— Eu achei que Anya tinha dado uma engordadinha mesmo... — Camila comentou com um tom de brincadeira e sentiu na obrigação de falar algo de 'bom' para ela. — Parabéns, Anya, talvez essa criança fuja de casa quando tiver uns 8 anos e perceber onde veio parar.
— E você? — Anya insistiu no assunto de Camila estar com alguém e ignorou a brincadeira da irmã.
— Vai ser uma criança de sorte. — Camila quis desviar do assunto, deixando as irmãs ainda mais curiosas.
— Camila...
— Ok, eu não tinha ninguém em Miami. — Camila revira os olhos e então responde. — Mas tenho alguém em mente por aqui...
— Sério? — Hope questiona sem acreditar. — Mas você chegou ontem?!
— Sabe como é sapatão, Sofi. — Anya implica com Camila. — Quem é? Conheceu ontem ou...
— Não acho que vocês estão preparadas para saber, ainda.
— Você nunca conta nada, Camila. Por que é assim?
— Eu vou contar! — Camila insiste, um pouco irritada com insistência de suas irmãs. — Voltei ontem e nem sei se ela vai querer algo comigo, assim que tiver algo concreto, prometo contar.
— Que bonitinha...
*****
Camila acordou um pouco tarde, atrásada também, para ir trabalhar com seu pai na delicatéssen. Sua mãe estava no sofá conversando animadamente ao celular quando Camila correu para fora de casa, ela poderia ir de carro, mas nem ao menos sabia se havia gasolina nele, então resolveu ir andando, pensando que não faria mal caminhar um pouco.
Camila resolve ir pelo centro da cidade, para aproveitar o passeio e ver como as coisas estavam por ali, afinal querendo ou não moraria em Tifton novamente por um tempo. Até mesmo passou em sua cabeça que devesse passar perto do apartamento de Agnes só para que 'casualmente' talvez visse ela por ali.
A mulher passou perto do apartamento de Agnes e só naquele dia reparou no estabelecimento debaixo do apartamento de Agnes, Ariel's Bistrô. Camila logo seguiu seu caminho, alguns metros antes de chegar na loja de seu pai deu de cara com Agatha Brooke.
— Ei, Camila! — a loira baixinha fala animada e se aproxima da Oleja para lhe abraçar brevemente, afinal sabia da coisa do abraço e sabia que provavelmente nada em Camila teria mudado. — Você sumiu mesmo daqui!
— Er... Sim, estava trabalhando em Miami e agora resolvi voltar. — Camila responde como se realmente tivesse escolhido sua volta e como não era um assunto que estava feliz em falar, logo mudou o foco. — Mas e essa garotinha linda, Agatha? É da Agnes? Eu a vi na noite do...
— Ah, não, essa é a minha filha: Jasmine. — A Brooke coloca a garotinha mais à frente do corpo, Jasmine estava tão calma que nem parecia a pestinha que Agatha está acostumada.
— Olá, Jasmine. — Camila saldou da forma mais simpática que conseguiu, não era muito chegada em crianças aleatórias.
— Oi. — Jasmine respondeu sem acrescentar algum comentário maldoso, como normalmente faria. — Você conhece a tia Agnes?
Agatha Brooke quis se estapear porque Jasmine tinha escutado suas conversas com Ravena e Agnes, conversas essas que envolviam o nome de Camila.
— Conheço, somos veeeelhas amigas. — Camila responde de forma humorada só para fazer a garotinha rir.
— Vocês são namoradas?
— Jasmine! — Agatha repreende a garota com medo de Camila desconfiar que Agnes teria falado algo e a garota tivesse escutado, afinal Jasmine não poderia tirar isso de 'atrás da orelha' á toa. — Por favor, Camila, me desculpe por isso...
Agatha toca no braço Camila pedindo desculpas e então a latina parece despertar.
— Oh, ok.
— Mamá...
— Jasmine! — Agatha repreende a menina e então se vira para Camila. — Eu tenho que ir, pede meu número pra Agnes e me liga, podemos marcar algo...
— Pode deixar. — Camila apenas balbuciou isso, enquanto Agatha estava longe com sua garotinha 'faladeira'.
O que foi isso? Agnes fala de mim para suas amigas? Se sim, isso é bom, não é?
08. Você não vai comer?
Camila estava debruçada sobre o balcão da loja de seu pai, estava entediada. Há dois dias que Agnes não respondia, tudo bem, entendia que Agnes deveria estar ocupada... Ou desistido de lhe dar ideia.
— E essa cara aí? De quem comeu e não gostou. — Alejandro Oleja brincou, fazendo sua filha saltar levemente assustada.
— Hã? — Camila pergunta, voltando para a realidade.
— Está pensando em quê? — O homem insiste, se debruçando ao lado da filha.
— Ah, em nada de importante, — Camila olha para o pai e sorri brevemente — só que eu tenho que procurar um emprego como
— Kaki, não se preocupa, eu conheço muitas pessoas influentes e aqui por mais que não pareça, tem empresas de grande porte, mas você sabe... São no campo agrícola. — Alejandro deu um aperto na mão mais próxima da filha e logo se ergueu de cima do balcão. — Mesmo assim acho que consigo achar alguém para te "prender" dentro de um escritório.
— Não se preocupe com isso, papá. — Camila afaga o ombro do pai e então avista um novo cliente rodando na delicatéssen, saindo de perto de Alejandro para ir atender. — Eu vou dar meu jeito...
*****
Agnes estava de volta do hospital de onde fazia plantões como voluntária pela tarde, algumas vezes por semana. Era por volta das 5 da tarde quando Agnes entra em sua confeitaria, estava começando o maior movimento do dia. Sempre por volta daquele horário o local se enchia com pessoas voltando do trabalho e pais voltando com seus filhos da escola.
A Velazco sempre ficava na confeitaria até as 7 da noite, o horário que fechava, deixando sua filha com uma de suas funcionárias no andar de cima. A Velazco tinha 3 funcionários: Frigg, Sigrid e Elizabeth. Sigrid era quem normalmente ficava de babá para Agnes ou responsável por abrir a confeitaria, por ser a mais confiável e responsável entre as três. Frigg era a atendente, irmã de Sigrid, que ajudava as vezes no preparo dos quitutes servidos na confeitaria por mais que quase 100% era obra de Agnes pela manhã ou em dias que não ia para o hospital.
Também tem Elizabeth que faz de tudo um pouco, desde ajudar no caixa, atendendo e se necessário até entregando encomendas, mesmo que quem fizesse isso geralmente fosse um dos funcionários de meio período.
— A Sigrid deixou algumas tortas especiais pré-aquecendo. — Frigg avisa rapidamente pegando uma bola de sorvete no congelador para colocar ao lado de uma fatia de bolo. — Ariel cresceu muito, chefa. Está enorme!
É mais um apelido carinhoso do que qualquer outra coisa quando uma das funcionárias de Agnes a chamava de 'chefa'.
— Sim, ela só tem 4 anos e já joga com as crianças de 7.
— Está brincando? — Frigg pergunta, enquanto sai com um prato em mãos, quase esbarrando em Elizabeth.
— Torta tradicional na mesa 5, Frigg. — Elizabeth avisa, indo pegar um pedido de outra mesa.
— Ok, torta de maçã... — Elizabeth resmunga um sim para a loira. Agnes observa a interação das duas e como elas não se davam bem, apenas conviviam porque tinha que fazer isso.
Para que elas parassem de conviver pelo menos um pouco, Agnes tentou fazer com que uma das duas fossem a babá de Ariel, mas a garotinha não se deu bem com Elizabeth e Frigg não gosta muito de crianças, só sobrou Sigrid que é a favorita de Ariel.
— Eu te ajudo. — Agnes oferece, sorrindo para sua funcionária.
*****
Camila acorda atrásada mais uma vez, ela nunca foi de se atrásar até começar a trabalhar com seu pai, algo naquele emprego fazia parecer que não era coisa muito importante. Mesmo que não gostasse de ir trabalhar, Camila estava gostando de interagir com pessoas, algo muito atípico vindo dela.
Com bastante preguiça Camila seguiu seu caminho de todos os dias pelo centro da cidade, passando em frente o apartamento de Agnes e confeitaria por baixo, que até então a latina não sabia pertencer à Agnes Velazco. Se dependesse de Camila não entraria ali, afinal não gostava de Tortas e o slogan da 'Confeitaria Ariel' era 'a melhor torta da Georgia'.
Camila passou pela confeitaria batida, como passava todos os dias.
— Ei! Você! — Camila continuou andando, nem percebendo a garota loira que lhe chamava. — Ei, ei, ei! — Frigg quase passou por cima de Camila quando a latina parou para ver de onde viam os chamados e para quem era. — Você!
— O quê? — Camila questiona, confusa para a loira em sua frente. Frigg respira profundamente por conta da pequena corrida que teve que fazer para chegar até Camila.
— Você... Minha chefe mandou eu vir atrás de você. — Frigg aponta para a confeitaria.
— Sua chefe? — Camila questiona e acompanha a loira para a confeitaria. O cheiro de massa de torta era inconfundível dali e não agradava o estômago da latina em momento nenhum.
— Agnes Velazco. — Frigg responde à pergunta de Camila.
— Ah...
— Por favor escolha um lugar para sentar, ela foi correndo em casa por isso me mandou ir atrás de você. — Frigg oferece de forma cortês, Camila observa as duas garotas, atrás dos expositores de vidro, conversando animadamente.
— Ok, obrigada. — Camila agradece, ela avalia o local todo. Há alguns clientes no momento, são poucos por não ser horário de pico, o lugar tem uma 'vibe' daqueles bistrôs franceses e mesmo que Camila odeie o fato do lugar ser cheio da pior sobremesa do mundo para si, ela gosta de como tudo é organizado.
Camila manda uma mensagem para seu pai, avisando que vai chegar mais tarde ainda e quando se dá conta ela percebe uma fatia de torta de maça sobre a mesa, a mais tradicional das tortas. Agnes chega perto de Camila, mas a mesma nem percebe a presença ali.
— Você não vai comer? — Agnes questiona para Camila que está há alguns instantes olhando de forma estranha para a fatia de torta em sua frente. A Velazco suspira frustrada e só então Camila acorda de seu transe, segurando o estômago levemente com as mãos, como se isso pudesse fazer seu nojo passar. — Não gosta de tortas?
— Hmm... — Camila encara o rosto um tanto aborrecido de Agnes, só por ela pensar que alguém pode não gostar de suas tortas. — Eu amo tortas! — Agnes sorri e Camila acrescenta ainda mais mentiras ainda. — Mas sou diabética, não posso comer...