Escreve ao anjo da igreja de Éfeso: (…)
Conheço as tuas obras, e o teu trabalho, e a tua paciência, e que não podes sofrer os maus; e puseste à prova os que dizem ser apóstolos, e o não são, e tu os achaste mentirosos.
E sofreste, e tens paciência; e trabalhaste pelo meu nome, e não te cansaste.
Tenho, porém, contra ti que deixaste o teu primeiro amor.
Lembra-te, pois, de onde caíste, e arrepende-te, e pratica as primeiras obras; quando não, brevemente a ti virei, e tirarei do seu lugar o teu castiçal, se não te arrependeres.
Tens, porém, isto: que odeias as obras dos nicolaítas, as quais eu também odeio.
Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas: Ao que vencer, dar-lhe-ei a comer da árvore da vida, que está no meio do paraíso de Deus.
Apocalipse 2:1-7
Dana ficou preocupada. Todas as ligações que poderia ter com o Céu tinham sido até aquele momento bloqueadas. Tinham dito que cumpririam a demanda sem a ajuda de Deus, e conseguiram safar-se por uma unha negra. Neste momento, mesmo sendo apenas o primeiro local de sete, deveria já ter perdido qualquer habilidade dada a ela por Vehulah. A brecha que via à sua frente, um buraco de dimensão infinita, diretamente conectado ao Inferno, não seria protegido de qualquer outra maneira.
Inesperadamente, deu certo. Dana começou a rezar, entoando o ritual usado para invocar o escudo de David. Pedira antes a Zacarias que se afastasse, pois o seu demónio interior poderia afetar o ritual. O rapaz seguiu as ordens, distanciando-se uns dez metros. Olhou à volta a ver se havia mais alguém, e, felizmente, aquele local estava deserto. Dana mal começou a pronunciar as palavras devidas, falou por centenas de anjos. Como se uma orquestra divinal rodeasse a brecha por completo. Uma luz apareceu de cima vinda dos Céus, e um ser formado cuja luz e divindade o cobriam de tal maneira que não se via a sua forma. Ao se aproximar, um escudo começou a emergir, cobrindo o buraco por completo. Este escudo de Davi ganhava forças por cada palavra dita, até terminar a cantiga. Dana parou de falar e o brilho ancestral dissipou-se dela, espalhando-se por toda a sua volta. A igreja foi toda envolta por ele, sendo-lhe dada um ambiente mais calmo e mais pacífico. Aquilo que tinha restado dos demónios, as cinzas deixadas por eles, desvaneceram. O ser de luz escureceu, revelando a sua forma. Dana olhou para ele, e perguntou:
- Eu chamei-te?
- Sim. – Ele calou-se pouco depois, deixando um silêncio arrepiante. Dana decidiu sair dali, encontrando-se com Zacarias.
- O que é que foi aquilo? Está tudo bem agora? Por favor, diz-me que os demónios acabaram.
- Sim, esta igreja está agora nas mãos de um trono.
- De um trono?
- Sim, digamos que são seres da justiça no Céu. Como se fossem os juízes do Paraíso.
- Oh… - O rapaz nem se queria meter na confusão da hierarquia do Céu. Decidiu desviar de assunto. - Olha, encontrei isto.
Zacarias mostrou a coroa que encontrara lá a Dana, e a anja teve uma ideia. Foram a uma loja de penhores vendê-la. Agora, com o dinheiro que receberam, teriam mais do que o suficiente para se subsistirem para o resto da demanda, sendo que foram imediatamente a uma mercearia e padaria para alimentar o rapaz esfomeado, comprando mais alguns mantimentos para quando Ester acordasse.
Ao fim de dois dias de descanso, Ester finalmente acordou, ouvindo um som irritante e grave ao seu lado. Abriu lentamente os olhos e, como era de noite, conseguiu ver Zacarias a ressonar, deitado no sofá. Ela gritou para ele: "Acorda!", sendo que foi o que fez sobressaltado. Ele comentou:
- Estrela! Finalmente! Estava a ver que não te ias levantar.
- Com o teu ressonar seria impossível.
- Se foi o que te fez levantar, não tens do que te queixar. E então, como é que te sentes?
- Sinto-me cansada e um pouco dorida, mas acho que me consigo levantar. Nem acredito que uma única tentativa de salvar aquela igreja calharia tão mal. Não sei como é que vamos tratar daqueles monstros nojentos. Já desperdiçamos tanto tempo. – Ester suspirou. - E eu que queria ser rápida.
- Oh, não te preocupes. Eu e a Dana já tratamos disso. – Declarou orgulhoso.
- O quê?! Como?
- Foi complicado, mas um plano da genial Dama não poderia falhar. Ela ensinou-me a ser um exorcista e bastou molhá-los que eles se desintegraram todos. Tu sabes bem como eu e ela fazemos um casal invencível.
- Uau… nem precisaram de ajuda. Aquela otária, a fazer tudo sem mim. Tenho quase a certeza que ela teve que te convencer. – Comentou, pensando no quão inútil ela poderia ser naquela aventura, até que se lembrou. – Já agora, onde é que ela está?
- Por acaso não sei. Pensei que ela também dormia neste quarto, já que de cada vez que acordo ela simplesmente está aqui. Talvez tenha ido à casa de banho ou alguma coisa.
- Por acaso, será que os anjos também fazem as necessidades? Humm, nunca tinha pensado nisso.
- Ela deve aparecer não tarda nada, por agora deita-te mais um bocado. Não vamos partir de noite, por isso teremos que esperar de qualquer maneira. Devias descansar.
- Está bem. Boa noite Zacarias.
- Até amanhã Estrela.
Ester olhou para baixo, antes de se deitar, reparando em algo no chão. Um par de sandálias estavam lá agora com uma pequena folha de papel por cima. Ester achou estranho, pensou "Se isto fosse uma prenda de Zacarias, ele teria de certeza dito alguma coisa.". Ela pegou na folha e leu:
"De Dana. Para que não tenha que ver os teus pés tão imundos."
Com uma sensação de ambas felicidade e irritação, Ester descansou a cabeça na almofada. Após uma boa noite de sono, acordaram os dois com Dana a gritar para se levantarem. Pelos vistos, ela tinha saído do quarto para poder pensar numa maneira de se deslocarem para o próximo local. Se a demanda ocorresse da maneira que Deus quis, ela poderia simplesmente ir para o Céu e a partir daí, teletransportar-se para onde quisesse. Só que nesta situação não tinha tanta sorte. Felizmente todas as igrejas localizavam-se relativamente próximas umas das outras, logo, se fosse sozinha, conseguiria chegar a elas em poucas horas. No entanto tinha que levar os dois jovens com ela, sendo que não teria forças suficientes para os carregar por tanto tempo. Por isso decidiu usar a única habilidade que ainda tinha. Chamou um anjo para vir ter com eles e ajudá-la a levá-los.
- Mas isso não significa que um daqueles "tranus" ou lá como é que se chamavam apareceria? Porque é que não pediste ajuda a um deles? – Perguntou Zacarias.
- São tronos, e não pedi a ajuda deles, porque eles são uns chatos antissociais que preferem ficar parados num sítio a rezar, do que apreciar uma boa luta contra demónios.
- Podem parar um bocado? – Interveio Ester. – O pobre do anjo está ali à espera para se apresentar, e ainda nem o deixaram falar. – Virou-se para ele, e com um sorriso amigável perguntou. – Como é que te chamas?
O anjo permaneceu calado. Ester achou estranho, até reparar no tremelicar dele e numas pequenas gotas de suor a escorrerem-lhe pela testa. Ela perguntou:
- De certeza que ele não é um daqueles tronos?
- Não. Ele só está nervoso, está bem? Ele não está habituado a andar na Terra. Para um anjo, sair do Céu, é como sair do nosso próprio lar.
Ester lembrou-se da sua infância. Ela com cinco anos achava-se amaldiçoada. Via a vaguear por todo o lado, sombras obscuras e vivas a perseguirem todos os habitantes da sua aldeia. Demorou até se habituar à ideia de andar calmamente por entre outros.
- Acho que posso entender um pouco. Mas se ele não disser nada, não poderá ajudar. – Foi aqui que se ouviu num tom nervoso.
- Eu chamo-me Acácio.
Ficaram todos surpresos pela voz dele. Um tom educado e relaxado, apesar do ar nervoso que emitia por fora. Ester, curiosa, perguntou-lhe:
- É um prazer conhecer-te, Acácio. Eu chamo-me Ester. Agora diz-me a verdade, ela obrigou-te a vir aqui, não foi? – Dana pareceu zangada com a pergunta da rapariga, mas a sua disposição só piorou com o anuir do anjo.
- Oh! Então Acácio, não vês que estou apenas a tirar-te daquela seca do Céu? Um anjo não foi feito para ficar a vigiar as almas perdoadas e a dar glórias a Deus por toda a eternidade.
- Acho que foi exatamente para isso que fomos criados. – Afirmou Acácio.
- Acácio. - Interveio Zacarias. - Diz-me, a Dama costuma colocar-te em situações perigosas onde não queres estar? – Após receber um anuir, prosseguiu, olhando para Ester. – Eu sei como é que tu te sentes. – Ester estranhou:
- Porque é que olhaste para mim quando disseste isso? – Zacarias optou por continuar a falar, desta vez para Dana.
- Dama, eu sei que foste bem intencionada, mas quase que sinto pena dele. Não é melhor levá-lo de volta para o Céu?
- Não temos outra opção agora. Precisamos de um anjo para levar um de vocês enquanto eu levo o outro. O Acácio é o único amig… é o único anjo que me permitiu trazê-lo, está bem? – Zacarias entendeu, anuindo em silêncio. – E também faço isto por vocês. Senão, trazia-te só a ti, e deixava a Esterco no hospital.
Dadas as apresentações necessárias, o grupo preparou-se para a viagem. Dana pegou em Zacarias e Acácio pegou em Ester. Ele estremeceu de nervosismo ao pegar nela, o que estranhou a jovem, no entanto a alternativa seria pior, logo ela tentou ignorar. Viajaram por uma hora até alcançarem outra parte da Turquia, Éfeso. Voaram bem, pelo menos bem o suficiente para os jovens não vomitarem. Inicialmente, foram pegos pelos sovacos e ficaram assim por um quarto de hora, até lhes começar a doer. Depois foram agarrados pela barriga e ficaram a olhar para baixo. A paisagem a passar rapidamente pelos olhos e a constante pressão na barriga foram mais do que suficientes para os deixarem enjoados. Tiveram que manter o vómito por uma hora, no entanto puderam fazer algumas paragens pelo meio para desanuviar. Para eles demorou uma eternidade até chegarem ao chão, descendendo desta vez sobre o próprio local, algo possível devido à falta de pessoas lá.
A igreja de Éfeso estava em melhor estado do que o esperado. O chão era feito de vários pedregulhos escuros e enormes, havendo no centro um poço de pequenas pedras castanhas. À esquerda estavam dois arcos assentes em quatro colunas e à direita uma fachada de vários arcos. Exatamente à frente deles estava o sítio desejado com a parede frontal quase totalmente intacta com o que pareciam ser pequenos profetas esculturados. O resto das paredes estavam praticamente em ruínas. Ao fundo, por trás da igreja, estavam montes verdejantes com escassos edifícios visíveis. Atrás dos jovens estava aquilo que parecia ser o que restava de uma aldeia romana do tempo dos apóstolos. Tinha vários caminhos, alguns que passavam por várias habitações arruinadas e outro que levava a um coliseu. Haviam várias placas com letra irreconhecível para os jovens que a anja logo traduziu como sendo uma saudação para qualquer visitante.
Isto levou Zacarias a interrogar-se onde estariam os turistas, até que reparou na debandada de demónios a assombrar aquela área mais próxima da igreja. Tal como antes, vagueavam o local sem nenhuma razão aparente a não ser fazerem-se de obstáculos. No entanto, isto não deu resposta à pergunta do rapaz, uma vez que qualquer pessoa normal não conseguiria visualizar tais criaturas. Dana aconselhou-o a ignorar a situação, querendo acabar com aquilo o mais rápido possível.
A anja não demorou a desaparecer com Acácio, informando que procuraria um balde e alguma água para fazer outro exorcismo. Ester estranhou a atitude de Dana, para que é que poderia ser preciso um balde?
Zacarias explicou-lhe:
- Ah pois! Tu ainda não viste um exorcismo ainda. Vais adorar.
A rapariga ficou muito intrigada, querendo que a mulher alada chegasse o mais depressa possível. Infelizmente, teve que esperar uma boa meia hora, uma vez que não foi fácil para os anjos encontrarem o balde. Os jovens tiveram que se afastar do local, na tentativa de evitarem quaisquer danos pelos demónios. No entanto, quando chegaram, para lá de serem insultados pela sua lentidão por Ester, espalharam imediatamente a água. Por cima de cada um dos demónios caiu, pelo menos, uma gota de água e Zacarias pronunciou as suas palavras indicadas:
- Jesus, eu lhe peço que expulse qualquer e todos os espíritos malignos dentro e ao redor da igreja de … humm … qual é que era o nome deste local? – Perguntou, virando-se para trás.
- Não me digas que já te esqueceste? – Gritou-lhe Ester
- A Dama só disse o nome uma vez! Mas rápido, diz-me o nome!
- Claro. Era Afas… Efos… Fogo, também me esqueci.
- Ha ha! Vês. Nem tu sabes.
Dana reparou que Zacarias, em vez de fazer o que devia, estava agora a conversar com Ester, sendo que se aproximou e questionou, gritando:
- O que é que pensas que estás a fazer? Se queres discutir com essa chata, discutes a seguir ao exorcismo.
- Não é isso. Esqueci-me do nome da igreja. Qual é que era mesmo?
- É Éfeso e despacha-te que aqueles monstros ainda secam.
- Está bem. Jesus… - Zacarias quis começar o ritual, mas foi interrompido.
Um dos demónios, quando reparou que estavam todos distraídos tentou atacar o rapaz. Tinha a garra preparada para penetrar o torso do jovem, no entanto não obteve sucesso. Quando a pata da besta estava a meros centímetros do peito dele, os olhos do rapaz tornaram-se vermelhos. Conseguiu segurar no braço dele, torcendo-o. Com um poderoso pontapé empurrou o corpo do monstro para trás, deixando com ele o braço. A criatura gritou de dor, tentando, desta vez com o membro direito, apanhar a cara dele. Leviatã simplesmente desviou-se e cotovelou-o no estômago, deitando o oponente ao chão, sem forças para se levantar.
Ester nem soube como reagir e até Dana ficou surpresa. Leviatã, por outro lado, parecia querer chacinar mais inimigos. Correu como uma chita, tendo em mira os restantes demónios. Leviatã tinha os quatro membros no chão, e a boca quase a espumar de excitação, atribuindo-lhe uma atitude animalesca. Isto, claramente, que horrorizou Ester que perguntou imediatamente a Dana:
- O que é que se passa com ele?!
- Ele ainda não te disse? Para ele se tornar num exorcista teve que conseguir suportar um ritual satânico e correu um pouco mal. Pelos vistos havia um ex-pecado que estava mesmo à espera de um ritual. Felizmente, devido ao seu ódio pelo Diabo, decidiu ajudar-nos. No entanto, é impossível saber quando é que ele surgirá.
- O quê? Ser exorcista é algo sagrado que só alguém com uma forte fé por Deus consegue ser. O que é que algo tão honroso tem a ver com Satanás?
- Foi a maneira mais rápida que havia. Não podíamos esperar até que ele cumprisse vários anos como padre.
- E ele está bem? Aquilo não o magoa?
- Ele, pelo menos, não me disse nada. Depois pergunta-lhe.
- Eu não posso deixar que isto continue. Vou para lá impedi-lo.
- Espera, tu não tens qualquer chance contra ele.
Um simples aviso não era o suficiente para impedir a rapariga de ir salvar o seu melhor amigo. Saiu dali a correr, querendo impedir o amigo de se denegrir ainda mais.
Enquanto isso, Leviatã estava em completo êxtase, ainda a deitar abaixo os demónios um a um. Continuamente a saltitar e a distribuir golpes fatais contra os monstros, fazia vários corpos desfaleceram com uma simples pancada. Os demónios tentavam aproximar-se o quanto podiam e, com a quantidade absurda deles, não era difícil infligirem dano. Quando o Leviatã segurou nos dois braços de um monstro, outro apareceu-lhe por trás que, devido aos reflexos rápidos do possuidor, causou um corte superficial nas costas dele. Embora esta ferida não tenha sido muito grave, não foi a única. O corpo do rapaz estava gravemente arranhado. Quer seja nas pernas, nos braços, ou no torso, havia uma grande variedade de cortes.
Ester, ao ver o estado do amigo, tentou chamá-lo à razão:
- Para! O que é que pensas que estás a fazer?
- Ah, Ester certo? – Ester ficou abalada pela seriedade no tom de voz do possuidor. Devido à sua atitude animalesca estava à espera de uma voz mais demoníaca. Leviatã prosseguiu. - Acho que ainda não tive o prazer de te conhecer, no entanto esta não é a melhor altura para apresentações, por isso, podias afastar-te um bocado?
- Não enquanto não deixares o meu amigo recuperar a consciência.
- Olha, eu estou a tentar apreciar uma simples matança. Não me podias dar o prazer de não interromper?
- Não! Mas também não me parece que consigas continuar por muito tempo. O teu corpo está todo arranhado e… - Um monstro apareceu, querendo saltar para cima da jovem. Todavia ela afastou-se, com um saltito para a frente, balançando a clava contra a cara da criatura. Estando o monstro derrubado, Ester continuou. – … e não te vais poder manter em pé por muito tempo. Estás a sangrar por todo o lado, portanto sai do corpo do meu amigo para que possa tratar dele.
- Claro, logo tu para quereres saber da sua segurança.
- O que é que queres dizer com isso?
- Não é óbvio? Tu estás sempre a pô-lo em perigo. Não sei se sabes, mas eu tenho acesso às memórias dos corpos que possuo e sei que, se não fosses tu a obrigá-lo, este rapaz não teria a coragem de arriscar a sua vida. Foste tu que… - Tal como com Ester, uma monstruosidade apareceu a meio da conversa, este a rastejar após ter uma perna torcida por Leviatã. Segurou-lhe na perna direita e mordeu-a. Ele abanou-o para fora e esmagou-lhe a cara com o outro pé. A perna estava obviamente magoada, sendo que ele continuou com alguma mágoa na voz. – Foste tu que o obrigaste a seguir-te na invasão àquela tribo. Foste tu que o fizeste correr em direção a uma debandada de demónios e, se tu não aceitasses esta demanda, ele não teria que vir junto.
- Ei, nessa última parte, eu não tive escolha. Deus mandou-me vir numa missão.
- Também não seria a única vez que desobedecerias. Tu só queres saber dos teus próprios interesses e, confia em mim, este rapaz concorda comigo.
- Neste caso, não me interessa o que ele pensa. Ele está magoado, por isso sai já do corpo dele antes que seja eu a obrigar-te.
- Como? Vais-me acertar com a clava? – A rapariga pegou firmemente na sua arma, com intento de atingir o rapaz, no entanto Leviatã não se convenceu. - Até parece. Tinhas que ser muito estúpida. Mas, felizmente para ti, eu não sou. Eu não encontro outro corpo tão cedo, logo, quando chegar a uma situação de emergência, eu fujo daqui e devolvo-te o teu amigo.
- Eu não vou deixar que chegue a esse ponto. – Ela levantou a clava que, por coincidência, acertou num demónio. Isto fez com que ela perdesse o equilíbrio, tropeçando. Ela levantou-se, um bocadinho envergonhada, afirmando-lhe. – Esquece o que acabou de acontecer. Agora vou mesmo acertar-te com a clava.
Ela correu e, quando chegou perto, num rodopio, apontou contra a cabeça dele. Os olhos do rapaz voltaram ao normal, sendo que a rapariga, como já tinha planeado, desviou a arma, passando, por pouco, por cima da cabeça dele. Ela perguntou-lhe:
- Estás bem?
- Acho que sim. Sinto-me um pouco tonto e…
- Desculpa lá, não temos tempo. Temos que sair daqui agora! – Gritou, agarrando-lhe na mão e correndo até a Dana.
O rapaz tentou acompanhar-lhe a velocidade, apesar de ter que mancar. A perna começava a doer-lhe, reparando nas marcas de dentes que lhe deixavam uma dor lancinante que lhe ia a percorrer a perna lentamente. Quando já estavam seguros, que não foi muito longe, principalmente, devido ao susto que Leviatã causou nos demónios, Zacarias sentou-se de imediato. Tinha, não só a perna, como também o resto do corpo a doer-lhe como se tivesse acabado de enfrentar uma data de gatos selvagens. Felizmente, agora que já não estava possuído, o poder sagrado da t-shirt passava a fazer efeito. O sangue das feridas estagnou, sem deixar marcas de sangue na vestimenta, como sempre. Infelizmente, a perna ainda estava enfraquecida e, como tinha, apesar de em menor gravidade, mais feridas no torso deixou a t-shirt vestida. Esta, apesar de ter sido rasgada várias vezes, estava agora intacta, como se nada tivesse acontecido.
Ester ficou feliz que o Zacarias estivesse a recuperar-se bem e quis deixá-lo a descansar, e Dana ficou surpreendida na habilidade da rapariga de afastar o demónio. A anja, no entanto, ordenou ao rapaz:
- Zacarias, eu sei que estás magoado, mas podias rapidamente fazer o exorcismo.
- Desculpa lá beleza. Gostava de descansar um bocado. Aliás, alguns já nem devem estar molhados, não sei se o exorcismo seria tão eficaz.
- A maioria ainda está molhada, e eu consigo tratar do resto. Algumas destas criaturas já estão a conseguir ultrapassar o medo. Por isso, apressa-te. – Vendo que tal argumento não funcionou, a anja, contrariada, teve que recorrer outro método. – Por favor, queridinho.
Zacarias pareceu ganhar novas forças. Mesmo conseguindo ver claramente que ela dizia isso contrariada, conseguiu perceber o quão importante ele era para a anja. Por isso, como não queria desiludir a amada, levantou-se, pedindo a clava da amiga como apoio e disse as palavras certas:
- Jesus, eu lhe peço que expulse qualquer e todos os espíritos malignos dentro e ao redor da igreja de Éfeso.
Desta maneira, uma grande parte dos monstros foi eliminada, deixando para trás apenas sete demónios. Dana pegou na sua pena de ferro e voou até ao local, fazendo investidas seguras contra os demónios. Não demorou muito até serem todos eliminados.
Zacarias ainda estava um pouco atordoado pela dor, sentando-se novamente. Sem saber o que tinha acontecido enquanto estava possuído, perguntou à amiga:
- Ester, o que é que se passou enquanto eu fui possuído?
- Ficaste completamente maluco, destroçando inimigos uns atrás dos outros. Se eu não tivesse intervindo estarias provavelmente morto com todas as feridas que te infligiram.
- Ah, obrigado. Então eu não te fiz mal nenhum, nem te ofendi?
- Não, e mesmo que tivesses, não serias tu. Seria aquele louco do Leviatã, por isso não te preocupes.
Com isso resolvido, parecia que todos os problemas daquela segunda igreja tinham acabado. Dana, tal como antes, chamou um anjo para se tornar protetor daquele local. Um anjo apareceu de dentro do portal com um bastão na mão. Espetou-o no chão e, nada.
Ao contrário da primeira igreja, nenhuma barreira ou "purificação" do ar havia ocorrido. Os jovens começaram a pensar que talvez fosse diferente, dependendo da igreja, mas tal não era o caso. Dana perguntou-lhe o que é que se tinha passado. O anjo disse que ainda deviam haver mais demónios por ali e, não querendo perder mais tempo, abandonou o local. A anja ficou confusa e olhou por todos os lados à procura de algo que lá não devia estar. No entanto, não encontrou nada.
Ela foi perguntar a Ester se havia algum demónio interior por ali, ao que ela respondeu que não. Vasculhou pelo menos mais duas vezes aquele local, sem encontrar qualquer identidade. Decidiu juntar-se aos companheiros, sentando-se com eles e usando alguma, apesar de pouca, da água que sobrou do balde para limpar a perna de Zacarias. Reparou que seria preciso alguma espécie de ligadura para cobrir a ferida. Pegou na sua pena de ferro, considerando cortar a própria roupa. Achando a ideia imediatamente ridícula, agarrou numa parte da saia de Ester e rasgou um pedaço. Após ter sido insultada pela rapariga deu um nó com o pedaço de tecido na perna do rapaz que agradeceu.
Embora a perna parecesse ficar melhor, Dana continuava preocupada. Nenhum vestígio de demónio havia aparecido. Ela aguardou por um bocado e reparou em Acácio a descender sobre eles. O anjo perguntou:
- Então, já terminaram por aqui? É que não vejo nenhuma barreira protetora à volta da igreja.
- Conseguimos eliminar os demónios, mas, pelos vistos não todos. – Resmungou Dana. – Quando tentei assinalar um anjo aqui, ele afirmou que ainda haviam mais demónios. Mas não consigo encontrar nenhum. Podias ver se encontras algum? Não te precisas de envolver, simplesmente avisa se encontrares algum que eu trato dele.
Acácio vasculhou pela igreja, voltando até que rapidamente. Afirmou:
- Bem, também não encontrei demónios. Sem ser os humanos debaixo de terra não havia mais nenhuma presença.
- Espera aí! Humanos debaixo de terra?! Por isso é que não os encontrei. Os demónios interiores deles devem estar a interromper o rito de proteção.
- Ah, pois é, demónios interiores. Tinha-me esquecido deles. Por acaso tinha reparado nos humanos desde que aqui chegamos, poderia já ter dito alguma coisa.
- Pois, devias ter-me avisado. E, afinal de contas, como é que já sabias que estavam aqui?
- Oh! – Exclamou Acácio, surpreso por Dana não saber. - Eu consigo sentir a presença dos outros. Assim sei sempre quando alguém tem problemas no seu paraíso. Tenho quase a certeza que já te tinha dito. Não sabias mesmo?
- Claro que não! "Anjo idiota." – Murmurou para si mesma. – Ester, acho que preciso de ti.
- Hum, para quê?
- Pelos vistos existem algumas pessoas escondidas por baixo da igreja e, como os humanos não me conseguem ver, preciso que vás lá convencê-los a sair.
- Está bem. Zacarias, queres vir também, ou preferes descansar? Tu és melhor com palavras do que eu, poderia precisar de ajuda.
- Está bem, mas acho que temos um problema.
- O quê? – Perguntaram as mulheres em uníssono.
- Nós não falamos a mesma língua do que eles. Como é que estabelecemos ligação?
- Eu tenho uma ideia. – Declarou Dana.
Ela contou-lhes que sabia todas as linguagens, como qualquer anjo deveria, afirmando que traduziria tudo na hora. Zacarias denotou que tal pareceria estranho, uma vez que ela era invisível para as pessoas. Falar para o nada daria a imagem de serem malucos. A anja disse que bastava informar que se estava a falar com um anjo e, com alguma sorte, as pessoas acreditariam. Por isso, com um plano em mente, avançaram.
Entraram dentro das ruínas, ficando diretamente acima do local onde as pessoas estavam. Não havia lá nada, no entanto ninguém ficou surpreendido. Dana já tinha vasculhado o local duas vezes antes, seria impossível ela não ter reparado. Por isso, afastaram-se e procuraram por trás da igreja numa planície esverdeada. Após vinte minutos à procura, Ester deparou-se com um rochedo. Apesar de parecer pertencer aquele local, tinha o aspeto de ser demasiado pesada para mover. Embora duvidasse que fosse aí, decidiu ver se conseguia movê-la. Com um simples empurrão, o rochedo moveu-se de sítio, parecendo ser feito de esferovite. Por detrás dele havia uma passagem, pequena sendo apenas possível rastejar. Felizmente mais ao fundo da passagem era possível perceber-se que se alargava e que poderia englobar uma multidão de pessoas. Chamou os companheiros e foi a primeira a entrar. Dana seguiu-a imediatamente, sendo que Zacarias, tendo a perna ferida, teve dificuldades em entrar, demorando mais do que os outros.
A rapariga, quando parou de olhar para trás para Dana, deparou-se com o bando de pessoas. Vestiam todos, menos um, uma batina preta, sendo que o outro usava uma roxa. Ao repararem na rapariga gritaram. Mostraram-se aterrorizados e falavam entre eles. Ester teve curiosidade em saber o que tinham dito, pedindo a Dana que traduzisse. Os padres tinham dito:
- Oh meu Deus! Um deles entrou! Eu pensei que seria impossível encontrarem este local.
- Nãao! Eu sabia que pôr uma rocha não seria o suficiente. O que é que fazemos agora?
- Acalmem-se um bocado! – Afirmou um dos mais idosos de veste preta. - Esta pessoa, obviamente que não é um demónio. Só Estevão é que consegue senti-los, seria impossível para nós vê-los.
- A não ser que uma pessoa tenha sido possuída! Assim conseguiríamos todos ver.
- Ahh, tens razão! – Disse ele, entrando em pânico. – Esqueçam o que eu disse, podem todos voltar a ficar assustados.
Ester, ouvindo as várias gritarias, querias-lhe dar um fim, explicando porque estava ali. Pediu ajuda à anja, dizendo:
- Não preocupem. – Começou já com dificuldades em pronunciar a língua turca. – Eu não má nem demónio.
Um dos padres aproximou-se do de batina roxa, informando:
- Não sei se devíamos confiar nela. O demónio pode estar a tentar enganar-nos.
- Não. – Afirmou Estevão. – Eu não sinto nenhuma aura maligna à volta dela. E aliás, um demónio não teria tantas dificuldades a falar a nossa língua. Ou sabia a língua ou nem dizia nada. Vou-lhe avisar o que se passa. – Ele virou-se para ela. – Menina, não sei como é que chegaste aqui, mas devias sair. A igreja em cima de nós está repleta de demónios. Podes não os ver, mas eles irão de certeza fazer-te mal. Nós já avisamos todas as pessoas a sair daqui e aconselhamos-te a fazer o mesmo.
Ester ficou surpresa. Já suspeitava, mas, ainda assim, achava estranho eles conseguirem sentir os demónios. Por aquilo que a anja lhes disse, nenhum humano para além deles devia poder observá-los. Achou estranho também o facto de padres estarem numa igreja arruinada, ao que perguntou:
- Igreja em ruína. Os padres estão cá porquê?
- Estávamos a fazer uma procissão e decidimos passar por aqui. Descobrimos que foi uma má ideia no momento que senti auras malvadas. O que me leva ao que disse antes. Sai já daqui antes que eles te apanhem. Eles podem tomar a tua alma.
- Eu sei. Eu matei demónios. Preciso que vocês saiam.
- É impossível teres tratado dos demónios. Nem o nosso exorcista Estevão conseguiu, como é que uma rapariguinha como tu conseguiria. – Afirmou um dos padres. - E, aliás, estás aí a falar para o nada. Deves estar maluquinha.
- Não sou maluca. Eu falar com anjo. Eu com ela matei demónios e com amigo.
- Acho que te enganaste aí. Os anjos não têm sexo, não te podes referir a um deles como "ela".
Ester ficou confusa, perguntando a Dana se era verdade. Ela afirmou que sim e que, debaixo do vestido, não tinha lá nada. A rapariga teve que suster um riso ao pensar que Zacarias tentava enamorar com alguém assexual. Perguntou-lhe porque é que ainda não contou ao rapaz. Ela disse que não podia explicar naquele momento e pediu-lhe que não dissesse nada ao rapaz. Continuou então a conversa:
- Eu me enganei. Eu e o anjo matar demónios. Tudo seguro em cima. Podem sair.
- Lamento rapariga, mas mesmo que estejas a falar com um anjo, não podemos sair daqui. Ainda consigo sentir pelo menos uma aura maligna e não penso que seria boa ideia enfrentá-la. Aliás parece-me que se está a aproximar daqui. Foge enquanto puderes.
- Ainda sentir mal? – Ester achou estranho. Tinha a certeza que todos os demónios tinham sido derrotados. O que é que o padre Estevão poderia estar a sentir? Infelizmente para ela, a resposta apareceu logo a seguir.
Zacarias havia conseguido, finalmente, rastejar pela passagem curta até ali. Ainda com algumas dores, mas tentando habituar-se a elas, aproximou-se de Ester. O padre Estevão ao reparar começou logo a gritar aos seus companheiros:
- Está ali. Aquele rapaz está possuído por uma presença demónica. Fiquem todos atrás de mim, não deixarei que ele vos afete.
- Ahhh! Sai daqui, seu demónio! – Gritaram os outros padres.
Zacarias aproximou-se de Ester e Dana, perguntando-lhes a sussurrar:
- O que é que se está a passar? Porque é que eles estão todos a gritar?
- Por tua causa. – Começou por explicar a anja. – O padre Estevão, o vestido de roxo, deve ser parecido com a Ester, no sentido de conseguir pressentir demónios. Acho que conseguiu reparar no Leviatã dentro de ti, e avisou os outros padres, por isso estão aterrorizados. Vai ser difícil convencê-los a saírem daqui.
- Ou, acabou de se tornar mais fácil. – Pensou Ester.
- Como? Eles já não confiam em nós, nem sei se chegaram a confiar. Já não conseguimos pedir-lhes para sair, agora que estão aterrorizados.
- Exato. Eles estão cheios de medo de Zacarias. Devíamos usar esse temor em nosso favor. Basta levá-lo para a beira deles que eles devem fugir a sete pés.
- Espera aí, e se eles me atacarem? Já estou bem ferido, não sei se quero correr esse risco.
- Oh, estás assustado? Queres mesmo mostrar-te um medricas em frente da tua amada? – Gozou Dana.
Zacarias começava a considerar o plano, quando Ester lembrou-se de algo:
- Esperem! Acho que Zacarias tem razão. – Ester lembrou-se daquilo que Leviatã havia dito "Tu só queres saber dos teus próprios interesses". Ela sabia que o demónio tinha razão, e não queria ser mais assim. Se quisesse continuar a ter uma boa amizade com Zacarias, teria que começar a preocupar-se mais com ele. Principalmente agora com todas as situações de vida ou de morte que poderiam vir a passar. Tinha que deixá-lo tomar as suas próprias decisões, por isso declarou. – Ele não precisa de se arriscar. Pode ser difícil, mas eu devo conseguir convencer estes homens a saírem. – Zacarias pareceu iluminar-se. Apreciou o gesto e gostou que poderia contar na sua amiga. No entanto Dana pensava doutra maneira e afirmou:
- Olha miúda, é muito simpático da tua parte ficares do lado do teu amigo, mas não me parece que conseguiremos assim. Foste tu que tiveste a ideia de assustá-los e, odeio admiti-lo, mas é uma ótima ideia. Zacarias, desculpa lá, mas eu quero apressar isto e preciso de ti. Podias por favor afugentá-los?
O rapaz estava prestes a responder, no entanto Ester interrompeu-o:
- Zacarias já disse que não queria, portanto nem tentes obrigá-lo a fazer o que não quer.
- Tens assim tanta a certeza que é isso que ele quer? Zacarias, diz lá.
- Bem, vendo melhor esta situação, não me importava de assustá-los.
- Por amor de Deus! – Gritou Ester alto o suficiente para todos ouvirem, já extenuada daquela conversa. – Já mudaste de ideias? Eu estou a tentar defender-te, podias ao menos estar do meu lado.
A discussão continuou e, enquanto tal acontecia, os padres começaram a sua própria discussão:
- Espera aí, o que é que ela acabou de dizer? Pareceu-me familiar.
- Acho que disse "אוהב" e "אֱלֹקִים".
- Mas isso não é hebraico? Padre Estevão, sabe por acaso o significado de tais expressões?
- Sim. Provêm de um hebraico menos desenvolvido. Essas palavras significam respetivamente, amor e Deus. – Os padres, ao ouvirem a rapariga gritar "Por amor de Deus", na sua língua, hebraico, ficaram surpresos. – Como é que ela pode saber um hebraico tão antigo? Como é que ela sabe a língua sagrada sob a qual a Bíblia foi originalmente escrita?
- Essa é uma língua morta e ela é tão nova. Conseguir aprender uma língua tão antiga, e saber pronunciá-la tão facilmente. Talvez ela estivesse a falar a verdade.
- Ainda assim, aquele rapaz com ela deixa-me inseguro. Porque é que alguém enviado por Deus andaria com alguém com uma presença demoníaca?
- Talvez seja uma mensagem. Talvez queira-nos mostrar que devamos aprender a conviver com os outros. Nem que tenha sido corrompido pelo mal, devemos ajudá-lo a ultrapassar todos os pecados que fez.
- O mandamento do amor. Talvez Jesus queira reiterar o que nos ensinou.
- Isso explicaria a sua pele escura. Ninguém estaria à espera de uma santa preta para vir em nome do Senhor. Deus deve, mais uma vez, querer testar a nossa fé.
- Não devemos duvidar do que ela nos mostra, devemos ter fé. Ela pediu-nos para sair daqui, é o que faremos. Deus enviou-nos um problema e uma solução. Deve querer mostrar-nos que não interessa o problema, Ele estará lá para nos oferecer o Seu apoio. Então, vamos ouvir o que Ele nos diz e abandonar este esconderijo. – O padre Estevão dedicou a sua atenção agora a Ester. – Menina!
Dana avisou à rapariga que os padres queriam falar com ela, ao que ela respondeu:
- Sim.
- Nós já percebemos que vós fostes mandada por Deus. Iremos sair daqui, tal como nos pediu. Peço que me perdoe pela nossa falta de fé e por vos ter ignorado. Sairemos daqui agora. Espero que obtenhas a maçã no paraíso do Senhor.
O grupo ficou todo confuso. Eles estavam no meio de uma discussão e, assim de repente, os padres já querem sair? Eles não compreenderam, mas decidiram nem perguntar qual a razão para tal mudança. Os padres saíram dali um a um, debruçando-se ao abandonarem o local. Ester, Zacarias e Dana, rapidamente os seguiram, apanhados de surpresa por tal ação. Ester até tentou mostrar a Dana que tinha razão e que não foi necessário usar o rapaz, mas ela afirmou que foi simplesmente sorte. O rapaz é que decidiu agradecer à amiga:
- Estrela, gostava de te agradecer por me defenderes. Tiveste a tua própria ideia e foste contra ela por mim, por isso, obrigado.
- Eu até apreciava o agradecimento se tu não tivesses mudado de opiniões tão repentinamente.
- Desculpa lá, mas quando se trata da Dama não sei o que fazer.
- "Se ao menos soubesses como ela realmente é." – Murmurou a rapariga.
- Disseste alguma coisa? – Perguntou Zacarias, recebendo com resposta um não. – Bem, não é mesmo de ti defenderes-me. Houve alguma coisa que te disse? Talvez quando estava possuído?
- Não, não. Eu é que senti pena ao ver-te magoado, nada de mais.
- Ah. Está bem.
A rapariga não lhe queria contar o que Leviatã lhe tinha dito. Queria fazê-lo acreditar que aquilo foi iniciativa sua, sem necessidade de uma influência exterior. Principalmente quando quem lhe disse foi um demónio. Mas agora tal não interessava.
Os padres ao se afastaram, após lhes ser pedido para fazer tal, deram, finalmente, a chance para designar um trono à igreja. Dana, tal como já tentara antes, clamou um cântico aos Céus e invocou um trono que, desta vez, aceitou proteger o local, agora sem interrupções. Da mesma maneira que a primeira igreja, um escudo sagrado sobrepunha-se ao buraco demoníaco, e a sua missão acabara de avançar um passo. O padre Estevão pareceu até ficar surpreendido, como se ele conseguisse enxergar o que se sucedia.
Ficaram todos aliviados ao verem a igreja de Éfeso salva. Avançariam agora para o próximo local. Ester chamou Acácio que lhe pegou na cintura, tal como Dana pegou na de Zacarias. Despediram-se dos padres, que se mostravam agora de boca aberta, enquanto viam os jovens a voar.
O grupo aventureiro ia agora em direção à terceira igreja, a de Pérgamo. Ou assim pensava Dana.