Do outro lado de Netern

Vektor Drenn começa sua jornada no outro lado de Netern saindo pelo portal que se abriu no chão. O portal se fecha imediatamente após ele sair por completo. O corpo dele segue numa trajetória vertical para cima estando de ponta-cabeça, até sentir o efeito da gravidade, e então cair de cabeça no chão.

"Ai!! Droga, eu ainda vou quebrar meu pescoço qualquer dia desses..."

Após levemente massagear seu pescoço e acariciar a própria cabeça, ele lentamente se levanta e então se encontra numa estranha floresta, semelhante àquela que cerca o Planalto do Amanhecer. No entanto, está em uma planície, e o céu que cobre o cenário é naturalmente cinza ao invés do laranja da tarde em seu mundo.

"Talvez a atmosfera seja um pouco diferente por aqui... Bem, eu consigo respirar sem problema algum, e é isso que importa. Pois bem, a entrada foi um sucesso, então acho melhor começar a andar agora."

O garoto caminha sem rumo pela floresta. Pelo caminho, ele é capaz de encontrar alguns monstros, aparentemente fracos e irracionais. Sem querer desperdiçar tempo ou energia, ele evita ao máximo fazer barulho ou chamar atenção.

"Como esperado, este lugar é um habitat natural de monstros... Se é assim, será que há mesmo alguma civilização humana por aqui? Se não tiver, estarei com sérios problemas..."

Não demora muito porém para ele finalmente chegar ao fim da floresta, podendo ver dali uma humilde porém bela vila. Ele não tem muito tempo para admirar a vista, no entanto, pois logo ouve passos vindo dentre as árvores.

Vektor vira o rosto na direção dos passos, porém imediatamente trava no lugar ao ver a ponta da lâmina de uma espada diante de seu rosto. Uma garota morena e de cabelos curtos está segurando essa espada. Essa mesma garota friamente se mantém fixada olhando para Vektor.

"O que diabos é você? Uma nova espécie de monstro humanoide?"

Assustado, Vektor rapidamente levanta suas mãos em rendição.

"P- Peraí, é um engano! Eu sou um humano, eu juro!"

"Vejo que sabe falar também... O que estava fazendo olhando para nosso território? Por acaso estava pensando em começar uma invasão?"

"I- Invasão é uma palavra muito forte... Eu iria, bem... fazer turismo, eu acho...?"

"Infelizmente pra você, território humano não está aberto para monstros selvagens."

"Mas eu sou humano! Eu disse antes, não disse?!"

"Nenhuma palavra que saia da sua boca poderá te salvar. Nenhum humano entra nesta floresta sem meu conhecimento prévio."

"Eu juro que posso explicar!"

"Huh... Te desafio a me provar então."

"Deixa eu só pegar minha identidade aqui no bolso..."

Vektor lentamente abaixa as mãos, e então rapidamente empunha a Slasher Platinum, a removendo de sua bainha ao mesmo tempo que acerta a espada da garota.

"...!"

Vektor aproveita o instante de distração da garota para se afastar saltando para trás enquanto se posiciona para combate. A garota rapidamente recupera sua compostura e também se posiciona.

A desconhecida guerreira avança na direção de Vektor e começa a atacar com sua espada. Apesar de habilidosa, a garota não chega perto da velocidade e precisão de Kder ou Maken. Sem entender como, Vektor consegue desviar de todos os ataques.

"(Hm? Desde quando meus reflexos ficaram tão bons? Memória muscular? Bem, de um jeito ou de outro, eu nunca perderia tão cedo...)"

"(Ele é rápido... Demais para um simples monstro. Nem mesmo um humano teria essa agilidade sem no mínimo anos de treinamento...)

Kh... Sendo assim!"

Sem nenhum aviso prévio, a garota desfere um chute, que consegue atingir a barriga do desavisado Vektor. A partir daí, ela começa a alternar seu estilo de luta continuamente entre artes de espada e combate corpo-a-corpo, confundindo Vektor e fazendo-o se sentir cada vez mais encurralado.

"(N- Nesse ritmo... Eu vou perder...!)"

Nesse momento de desespero, ele desfere um único contra-ataque com sua espada, um simples corte flamejante.

"...?!"

Incrédula e espantada, a garota cessa seu ataque e recua com um salto para trás.

"Você... acabou de... soltar chamas pela sua espada...?!"

"Hm? A- Ah, sim...! Me desculpa, agi por impulso, não te ataquei assim de propósito!"

"N- Não precisa se desculpar... Só me responde uma coisa. Que tecnologia é essa que você acabou de usar?"

"Tecnologia? Nenhuma, eu acho. Esta espada só funciona deste jeito mesmo. Isto canaliza meu poder pela lâmina e..."

"Seu poder...?"

"Sim, eu herdei este poder de controlar o fogo da minha família. Apesar de eu ainda não saber controlar muito bem..."

"(Essa descrição... E essa aparência... Não me diga que...!)

V... Você é...?"

"(Ela finalmente se dispôs a conversar...)

Meu nome é Vektor Drenn. Eu vim do outro lado de Netern."

"Não acredito nisso... Um Drenn... Um de verdade?!"

"(Déjà vu... Por que isso acontece toda vez que eu cito meu nome completo...?)"

Depois dessa interação, a garota guia Vektor pela trilha até a vila, passando um ar bem mais acolhedor e amigável do que foi mostrado há poucos minutos atrás:

"Mais uma vez, peço desculpas pelo meu tratamento desrespeitoso. Eu deveria ter te dado tempo para se explicar desde o começo."

"Nah, qualquer outra pessoa faria o mesmo no seu lugar. Eu que deveria ter me apresentado mais cedo."

"Por falar nisso, ainda nem cheguei a me apresentar. Meu nome é Hisami, e eu sou a guardiã da Ilha dos Ancestrais. É um prazer conhecê-lo, Vektor Drenn."

"O prazer é meu. Ah, e pode me chamar só de Vektor."

Hisami possui uma aparência semelhante à de Vektor, porém é um pouco mais alta e tem um olhar mais afiado, além de seu cabelo mais liso e caído. O garoto percebe essas semelhanças e contrastes, sentindo-se um pouco injustiçado:

"(O designer da humanidade pode ser meio cruel vez ou outra...)"

"O que foi?"

"A- Ah, não é nada!"

"Estamos perto da entrada da vila. Vamos em frente!"

Após caminharem por mais alguns minutos, os dois chegam na vila, que consegue ser de duas a três vezes maior que o Vilarejo dos Haidora. Os dois continuam caminhando até chegarem na casa de Hisami, uma construção razoavelmente grande, comparável à casa de Mestre Noogard.

Hisami entra na casa enquanto diz:

"Pai, estou em casa!"

"Chegou cedo hoje, filha. Aconteceu alguma coisa?"

"Eu encontrei um Etykiran na floresta!"

"Ha ha, mas e aquela história de que eles não passavam de conto de fadas?"

"Eu tô falando sério! E é um Drenn, ainda por cima! Se não acredita, saiba que está logo atrás da porta!"

"Se é assim, então deixe ele entrar. Deixar os outros esperando na porta é falta de educação."

Hisami abre a porta novamente deixando Vektor entrar.

"Sinta-se em casa."

"Obrigado, mas eu não devo ficar aqui por muito tempo. Tenho uma missão urgente pra cumprir."

"Não sei que missão é essa, mas meu pai é provavelmente a pessoa que mais pode te ajudar agora."

Sem perder muito tempo, Vektor segue Hisami até o corredor, onde encontra o pai dela, um homem relativamente baixo e com rosto sereno, que o recebe educadamente:

"Olá, garoto! Posso saber o seu nome?"

"Vektor Drenn, é um prazer."

"Você veio do outro lado de Netern, estou certo?"

"Sim, tenho algo muito importante pra fazer aqui."

"Mas não sabe como vai fazer isso, não é mesmo?"

"Sim..."

"Como esperado... Hisami, prepare seu melhor equipamento. Eu irei conversar com o Vektor no jardim enquanto isso."

Hisami acena positivamente com a cabeça e seu pai guia Vektor até o humilde jardim deles. Ao chegarem lá, o pai dela é direto:

"Você... veio atrás de seu poder ancestral, certo?"

"Sim, isso mesmo."

"Bem como eu esperava... A verdade é que, quando eu era o guardião da ilha antes da minha filha, um menino que na época era só uma criancinha veio até aqui por esse mesmo motivo. Algo muito terrível deve ter ocorrido no seu mundo para justificar a sua vinda."

"Tem razão. Minha mãe foi pega de refém junto com outros conhecidos meus. A única forma de eu salvar eles é me tornando mais forte. Foi por isso que eu vim parar aqui. O senhor sabe como eu posso fazer isso?"

"Bem, o método exato eu não sei... Na verdade, a única coisa que eu sei é como começar."

"Só isso já será bem útil. Agradeço desde já, eu não teria ideia alguma sobre aonde deveria ir se não fosse pelo senhor."

"Ha ha, não é nada, este é só o meu trabalho."

"A propósito, tem algo que me deixou curioso."

"E o que seria?"

"É verdade que sua filha não acreditava na existência dos Etykirans?"

"Ah, isso? Ha ha, era só uma fase recente dela. Ela passou a vida toda esperando conhecer um pessoalmente, mas nos últimos dias ela passou a dizer que não acreditava mais nisso, acho que como forma de superar o desejo de infância."

"Acho que agora que ela conheceu um de verdade, ela pode ter ficado decepcionada, eu duvido que eu tenho atingido as expectativas dela."

"Eu não acho que seja o caso. Eu não via os olhos dela brilhando daquele jeito faz algum tempinho."

"Talvez ela ficaria mais empolgada se conhecesse o espadachim lendário que eu conheço, ou então aquele esquisito que brinca de robôs enquanto faz roleplay."

"Hahaha, mas que descrições bizarras são essas?! Seu mundo parece ser um lugar bastante divertido!"

"N- Não acho que 'divertido' seja a palavra adequada...

(Déjà vu...!)"

"Bem, ao menos não é um lugar monótono e chato como aqui. Não há muita coisa pra se fazer, e ter que tomar cuidado com monstros selvagens é um completo tédio."

"S- Sinto muito..."

"Não ligue pra isso! Mais importante, preciso te dar instruções para a sua jornada. Quero que preste bastante atenção."

"Beleza, sou todo ouvidos."

"Nossa ilha, a Ilha dos Ancestrais, tem esse nome graças ao grande templo amaldiçoado que se encontra por aqui: o Templo Ancestral. O templo é protegido por um selo, que se quebra temporariamente ao entrar em contato com energia Etykiran."

"Um templo que apenas eu consigo abrir..."

"Se você veio atrás do poder ancestral selado neste mundo, lá é o primeiro local a se visitar."

"Então é assim..."

"Hisami irá acompanha-lo até o templo. Mas é melhor fazerem isso amanhã."

"Eh?! Por quê?!"

"Já está anoitecendo. Sair agora seria muito mais arriscado. Além da dificuldade pra enxergar, vocês também teriam que lidar com ataques de monstros com mais frequência."

"...O senhor tem um ponto."

"Você pode passar a noite aqui conosco. Irei preparar os suprimentos pra você levar na sua busca."

"Muito obrigado, será de grande ajuda."

Vektor passa o resto do dia na casa de Hisami descansando e se preparando para sua jornada de fato. O ambiente aconchegante o lembra dos dias que passou na casa dos Noogard durante sua jornada na Ilha de Netern. De certa forma, esta jornada não parece tão diferente assim da anterior, pelo menos até agora...

Manhã de 15 de dezembro. O céu da manhã tem uma coloração acinzentada próxima ao branco, em contraste com o céu azul do mundo de Vektor.

Após acordarem, Vektor e Hisami se preparam completamente e então saem da vila. Foi uma estadia curta, mas é hora de partir, pois mais da metade de seu tempo limite já se esgotou. Agora restam apenas cerca de 9 horas para Vektor ser invocado de volta para seu mundo.

Com Vektor carregando a Slasher Platinum e uma mochila cheia de comida e acessórios, e Hisami estando equipada com uma versátil combinação de armas e armaduras, os dois enfim começam a busca pelo poder ancestral dos Drenn...

"Ei, Hisami, esqueci de perguntar... Por quanto tempo a gente vai precisar caminhar até chegar ao templo?"

"Hmmm... A trilha é de 10 km, então... Acho que cerca de 2 horas de caminhada, talvez."

"...

(...Quê?)

QUÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊÊ?!!??!??!!!"