Capítulo: O Dilema do Despertar
O primeiro ano de casamento entre Heitor e Elara havia sido um tempo de descobertas e construção. Eles partilhavam os dias na mansão do Duque Erick, entre sorrisos e momentos de paz que surgiam após anos de lutas e batalhas. Era como se o mundo lhes concedesse uma trégua, uma chance de viverem um ao lado do outro, afastados das sombras das guerras e dos perigos.
Naquela noite, enquanto os corredores da mansão se envolviam em silêncio, Heitor permanecia acordado. Elara dormia tranquilamente ao seu lado, a expressão suave em seu rosto indicava o quão profundamente descansava. Ele a observava, imerso em pensamentos que se arrastavam em sua mente há meses. Havia algo que o atormentava, algo que ele não podia ignorar: a ideia de despertar o núcleo de mana de Elara.
Heitor conhecia bem os perigos do mundo mágico. Ele próprio era um mago de batalha e rúnico, um guerreiro que sempre soubera que a vida ao seu lado não seria fácil. Por isso, a possibilidade de ajudar Elara a desenvolver o núcleo de mana, de dar a ela o poder necessário para enfrentar qualquer ameaça, parecia inevitável. Era um pensamento reconfortante e, ao mesmo tempo, aterrador.
O despertar não era apenas um ritual; era um teste de resistência e coragem. Heitor sabia disso por experiência própria. Lembrava-se de seu próprio despertar, de como o processo havia drenado toda sua força, quase o levando à morte. A mana, quando desperta, surge como uma força indomável, que exige controle absoluto e um corpo resistente. Mesmo com seu treinamento e preparo, ele enfrentara dores e desafios que nenhum homem comum suportaria.
Enquanto observava Elara dormir, ele se perguntava se ela estaria pronta para algo assim. Seu corpo delicado suportaria o choque da mana adentrando seu sistema? Seu espírito seria forte o bastante para controlar a energia que viria à tona? E se, por qualquer motivo, ela não resistisse? O medo o congelava. Ele já perdera tantas pessoas em sua vida, mas a ideia de perdê-la era algo insuportável. Aquela dúvida silenciosa consumia sua mente, e ele sabia que o tempo para tomar uma decisão estava se esgotando.
A luz da lua adentrava o quarto, banhando Elara com um brilho prateado. Naquele momento, ela parecia tão frágil e serena, como se nada pudesse perturbá-la. Heitor respirou fundo e, pela primeira vez, pensou em verbalizar suas dúvidas. Sabia que ela entenderia, mas tinha receio de que Elara, com seu coração puro, optasse por aceitar o risco apenas para estar ao lado dele em todas as batalhas. Ele a conhecia bem o suficiente para saber que ela não hesitaria, e isso o fazia hesitar ainda mais.
"Despertar o núcleo dela seria uma dádiva ou uma maldição?", perguntava-se. Sabia que Elara se adaptaria ao mundo da magia e poderia se tornar uma grande aliada ao seu lado, mas e se ele não estivesse certo? O amor que sentia por ela trazia uma responsabilidade que pesava em seus ombros, como se seu coração já tivesse feito a escolha e lhe dissesse para não arriscar.
Quando a madrugada avançou, Heitor finalmente se levantou da cama, movendo-se com cuidado para não despertá-la. Caminhou até a janela e olhou para o céu estrelado. Ele fechou os olhos, buscando clareza em seus pensamentos. Talvez ele precisasse de mais tempo para avaliar a situação, ou talvez o momento certo ainda estivesse por vir.
"Protegerei você de todas as formas, Elara," murmurou em voz baixa. "Mesmo que para isso eu precise abrir mão de certas coisas..."
Decidiu que, por enquanto, a resposta seria esperar. Heitor sentia que precisava encontrar uma solução que garantisse a segurança dela, uma forma de prepará-la aos poucos, sem correr os mesmos riscos que ele enfrentara. Até lá, ele continuaria sendo seu protetor, seu escudo, aquele que velaria por ela em cada instante.
Retornando ao quarto, ele sentou-se ao lado dela e segurou sua mão, como se aquele simples gesto fosse uma promessa silenciosa. O mundo de Auryn era perigoso e imprevisível, mas ele faria tudo o que fosse necessário para mantê-la a salvo. O dilema do despertar continuaria a persegui-lo, mas, por enquanto, ele escolheria proteger Elara da única forma que sabia: amando-a, ao seu lado, sem expô-la a perigos desnecessários.
Assim, com o coração dividido entre o desejo de fortalecer a mulher que amava e o medo de vê-la sofrer, Heitor decidiu que a resposta viria com o tempo.