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XI.

Seu coração acelerou se esforçando para mantê-la capaz de respirar. Ele estava tão perto… E olhando para o abismo que era aquele par de olhos escuro ela teve certeza de que era o garoto que morava na casa da esquina da sua rua. Mas não sabia se ele ainda era o mesmo Ethan que a levou para aquela casa de madeira em cima de uma árvore longe de tudo que a assustava.

Porém, ele certamente ainda era tão irritante quanto lembrava. O sorriso insuportável e a falta de limites começaram a deixar a garota incomodada.

— Óbvio. — disse em um ríspida, passando por debaixo de seu braço, para se desvencilhar daquela armadilha. — Afinal você foi uma parte bem pequena da minha vida.

A provocação fez seu rosto se fechar em uma expressão séria. Lentamente, ele virou o corpo de volta para a porta, suspirando alto, para mostrar seu desconforto. Não gostava de lembrar que foi o mais baixo entre os amigos por muito tempo.

— A última vez que te vi você era mais baixo que eu. Como esperava que eu fosse lembrar? 

A mão direita, larga e ornada com veias bem salientes, foi até a nuca do maior, tentando acalmar o estresse.

— Achei que as mulheres sempre lembravam do primeiro beijo. — disse, como se quisesse comprar aquela briga.

— Isso foi há 14 anos atrás, Ethan. Você já está bem grandinho pra ter uma quedinha de adolescente.

Amelia nunca tinha o perdoado por tê-la abandonado quando ela precisou de apoio para passar pela época mais difícil de sua vida. Nunca soube o porquê do sumiço, mas não ia ser agora que ia perguntar. Já tinha deixado isso para trás e ele não iria trazer seu foco de volta para o passado.

— Tudo isso? Pra quem não se importa, você parece ter contado cada mês.

— Escuta, Ethan. — ela começou cruzando os braços e se virando para ele. A porta do elevador se abriu e ela a travou com o pé, sem tirar os olhos dele. — O que quer que tenha acontecido, não importa mais. Já passou. Agora as coisas são diferentes. E mesmo que tenha crescido um ou dois, ou trezentos centímetros… Você ainda é subordinado a mim. Não entendo como você veio parar nesse lugar, mas vai ter que aprender as regras dele se quiser sobreviver.

Depois que terminou ela não esperou por uma resposta, apenas passou por ele com passos decididos. Ethan conseguiu sentir seu cheiro e ainda era o mesmo de 14 anos atrás. O doce cheiro de sorvete de morango com chantilly. Ele foi puxado para fora de seu transe quando Amelia parou no corredor a sua frente, levantando o dedo indicador, mostrando que queria pontuar mais uma coisa.

— E não importa o seu tamanho, Tampinha. Eu consigo te dar uma surra de olhos fechados.

Ele a viu se afastando e deu um sorriso travesso, se dando por vencido. Não iria discutir com ela. Se perguntou se deveria ter segurado esse segredo por mais um tempo, mas… Ver seu rosto se moldando naquela feição surpresa e chocada era boa demais para deixar passar.

Com seus passos pesados, ele a seguiu, enquanto ela o guiava até seu espaço particular no hotel. Ele observava como seu cabelo escuro balançava de um lado para o outro. Estava tão comprido agora… Mas ainda era o mesmo de quando a conheceu. A forma como ela caminhava… Ele conseguia ver ela se afastando do seu corpo no chão depois de deixá-lo com hematomas na calçada. No seu peito existia um mix de sentimentos, bons e ruins, que se entrelaçavam em uma tapeçaria complexa. Tinha raiva. Dela, por todos as vezes que o machucou. E dele mesmo, por não ter escolhido a sua amizade ao invés dos garotos de seu bairro. Sentia alívio por vê-la crescida, inteira, mas também sentia tristeza, pena… Ethan sabia que seu passado não devia ter sido como ele achava que seria. Ninguém com a vida e estrutura que ela tinha termina em um lugar como aquele. O último sentimento que o inundava era a vontade de se aconchegar nela, contar todos os seus anos até ali, explicar tudo o que passou e reviver o que havia sentido naquela pequena casa de madeira suspensa em uma árvore.

O homem se distraiu tanto em seus pensamentos que quase passou por Amelia parada em uma porta escura com o número 1401 bordado em metal. Ela digitou sua senha na fechadura e abriu a porta a segurando para que ele passasse por ela. Quando ele viu todos aqueles móveis modernos, pretos, com aparência de caros, ele assoviou, mostrando o quão surpreso ficou. Uma pontada em seu peito trouxe um sentimento ruim diretamente da sua infância. Não conseguia suportar vê-la com tanto poder, todas aquelas pessoas respeitando sua presença o fazia ter certa inveja.

— Olha só… Parece que ser a capanga preferida do chefe tem suas vantagens.

Em um movimento despojado ele se jogou no sofá e pousou os pés na mesa de centro, os cruzando. E dali ele pode ver o cenho de Amelia se curvando em raiva, o que o fez sorrir de canto, vendo o quão fácil era irritá-la. 

— Trabalhar tem suas vantagens, Ethan. — ela respondeu, chutando seus calçados para fora de sua mobília com a ponta do pé, como se tirasse um inseto morto do seu caminho. — Aqui os cachorros não botam as patas na mesa, Tampinha.

— É mesmo? — seu tom de voz anunciava que sua fala a desafiaria mais um pouco. Ele contraiu suas costas para colocar a pasta que carregava em cima da superfície onde seus pés estavam e logo voltou, lentamente, para trás. — Foi assim que adestrou seu poodle?

Mais uma vez ela recebeu o olhar violento da mais baixa. Odiava quando as pessoas se referiam assim a Liam. Ela tirou sua jaqueta de couro, revelando a blusa preta que desenhava seu corpo com clareza. Aquela movimentação acabou chamando a atenção dos olhos escuros de Ethan, que se iluminaram como um céu estrelado. Seu rosto ficou um pouco quente e ele foi obrigado a mirar sua visão em seus joelhos antes que ela percebesse suas bochechas mudando de cor. Enquanto seu coração voltava ao ritmo normal, ele contemplou a imagem que ficou marcada em sua memória. Ela era uma mulher agora. Uma mulher muito atraente. Sacudindo a cabeça, ele tentou afastar aqueles pensamentos.

Antes de sentar, Amelia tirou o celular do bolso de trás. Esperava que tivesse alguma mensagem de seu amigo, mas a tela de notificações a encarou, vazia.

— Quer que eu explique devagar pra você entender? — finalmente olhou para Ethan, puxando a pilha de documentos com a ponta dos dedos para fora do recipiente de papel que a abrigava.

— Vai com calma, "Senhorita Jones". — ele debochou, porém estava genuinamente confuso. — Por que te chamam assim?

— Porque esse é meu nome. — ela disse, sem rodeios. A falta de comprometimento dele só a irritava e tudo o que queria era terminar essa missão e voltar a trabalhar com seu parceiro original o mais rápido possível. A garota começou a espalhar as inúmeras folhas na mesa. Havia uma foto do prédio onde eles entrariam infiltrados. — Essa é a sede da Polícia de Nova Iorque. É lá onde estão todas as evidências cibernéticas e precisamos nos certificar de que nada saiu dos nossos HDs e apagar qualquer coisa que os leve até nossa organização ou a nossos clientes.

 — Mas como eu te conheço há mais tempo, posso te chamar de "Senhorita Hanford", não é? — Ethan ignorava completamente as instruções da morena, só queria se divertir. No momento que ela ouviu seu nome de nascença, foi obrigada a fuzilar com os olhos aquele sorriso que a provocava.

— Não. Meu nome é Amelia Jones. Você pode me chamar de Jones como todos os outros subordinados. — A garota cruzou as pernas e logo depois os braços. — Ethan, você também pode começar a levar isso a sério. 

Ele levantou uma sobrancelha e encolheu os ombros em rendição. O silêncio entre eles ficou desconfortável, enquanto ela esperava uma resposta dele, como se estivesse chamando a atenção de uma criança.

— Tá bom, tá bom… Jones. — ele repetiu, para que ela continuasse as instruções.

 — Vamos nos infiltrar no prédio administrativo da polícia. Como funcionários do governo. — ela prosseguiu depois de um suspiro impaciente. — Essa missão é pra ser calma e sem percalços. O lugar é muito vigiado, então é perigoso nos expormos. Seria muito ruim para a organização ter nossos rostos na lista de procurados. Vamos entrar, trabalhar e sair.

Ethan queria conseguir prestar atenção nos detalhes, mas ela ficava excepcionalmente mais bonita quando falava coisas das quais ele não entendia. 

— Você vai ter que usar seu charme. — explicou, com um tom debochado. — Quando passarmos pela segurança eu vou ativar um EMP para desativar o raio X, aí... você vai ter que dar em cima da Carly.

— Wow, wow, wow! — ele mostrou as palmas das mãos, sinalizando para que ela parasse de falar. — E… M o quê?

— EMP, um pulso eletromagnético. — esclareceu, como se ele não saber de algo assim fosse uma afronta a sua inteligência.

— Uau, eu achava que isso era coisa de cinema. — o homem parecia estar com dificuldades para compreender aquele fato.

— O que temos é um dispositivo pequeno, então funciona apenas em alcance curto, mas tudo o que precisamos é que a máquina de raio X esteja desligada no momento que passarmos.

— E essa mulher… Carly? — o rosto dele mostrava que ele precisava de alguma instrução mais clara.

— Ela é a oficial de segurança encarregada hoje. Enquanto a máquina estiver desativada, você faz um charminho para que ela deixe a gente passar sem nos revistar.

A cabeça de Ethan subia e descia, concordando com as instruções. Ele cruzou seus braços, fazendo a camisa que usava ranger pelo esforço que tinha que realizar para manter os tecidos juntos. E por alguns segundos a morena se viu distraída pela maneira como os músculos se moviam por baixo do pano.

— Essa é a parte fácil. — Um sorriso confiante rasgou o rosto dele. — Nenhuma mulher resiste a minha beleza.

Um sopro risonho saiu das narinas da mulher, o que fez com que o homem levantasse uma sobrancelha, mas antes que ele pudesse protestar, o celular de Amelia vibrou, alertando uma ligação. Os dois olharam para a tela, que mostrava um "L" como nome do contato e uma foto dela com o amigo juntos. Ethan não soube dizer o porquê de aquilo tê-lo deixado desconfortável. A garota apenas recusou a chamada, um pouco irritada. Não queria conversar com Liam na frente do novo parceiro, muito menos quando estava prestes a xingá-lo por não ter contato o que estava acontecendo.

— Então, a aberração conseguiu arrumar alguém que ature ela... — seu tom de voz mostrava que estava incomodado, e ele tentava mascarar com deboche. — Não sabia que tinha o coração mole assim.

— Sim. — concordou revirando os olhos. — Diferente de você que continua insuportável e ninguém aguentaria ficar perto.

A garota levantou, caminhando até sua mesa. Quando ela passou por ele, Ethan pode sentir seu cheiro mais uma vez. E a memória de seu corpo junto ao seu naquela noite fria voltou a sua mente.

— Há, um dia comigo e você não vai querer mais sair do meu lado. — ele esticou suas pernas de novo, colocando seus pés por cima dos documentos. — Todas as garotas me amam, você não seria diferente.

— Realmente, faz uma hora que eu tenho que olhar para a sua cara e tudo o que eu penso é em você... — ela simulava o tom de uma menininha apaixonada, que logo mudou para a voz grave de costume. — Mal posso esperar pela hora que eu vou socar seus dentes fora.

A conversa foi mais uma vez interrompida por Liam. Dessa vez ele estava na porta. As quatro batidas eram claras.

— Estou aqui. — ela respondeu, sem tirar os olhos da tela do computador.

A maçaneta girou, mas a porta estava trancada. Ethan se ajeitou para levantar quando ouviu os sons dos números sendo apertados.

"Ele… Sabe a senha?" — O loiro pensou, franzindo o cenho. 

Então, o parceiro original de Amelia entrou no ambiente, segurando uma pequena sacola de papel pardo. 

— Ei, Ames… Eu trouxe almoço… Eu acho que precisamos conversar, não é? — o garoto começou e quando se virou para a sala, viu o estranho jogado no sofá. Seus dedos apertaram as alças que segurava e ele assumiu uma posição defensiva. 

— E aí? — Ethan o cumprimentou com a cabeça, sem levantar o que só fez Liam ferver um pouco mais. 

— Ames? — ele a chamou, esperando ela se manifestar. 

— Oi, L. Já conhece o Tampinha?

Tampinha? — ele só ficava cada vez mais confuso. 

Quando ela o desrespeitou, o mais alto se sentiu obrigado a se colocar de pé. Limpando a garganta e estendendo a mão direita ao recém-chegado. 

— Eu sou Ethan, o atual parceiro dessa aberração.

Liam cerrou os olhos e se recusou a apertar a mão daquele homem. 

— Liam. Parceiro da Amelia. — sua voz soava ríspida.