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Capítulo 1

Em uma tarde ensolarada, encontrei-me em uma lanchonete, desfrutando de um momento de descontração com meu amigo Renan. Enquanto saboreávamos nossos lanches, ele fez uma declaração que me fez revirar os olhos.

- Então é isso – exclamou ele. – Você vai amanhã!

Eu já sabia o que ele estava se referindo. Renan havia conseguido uma entrevista de emprego para mim, e estava insistindo para que eu aproveitasse essa oportunidade.

- Eu entendo seus motivos, Dan – ele continuou. – Mas está na hora de buscar novos objetivos...

Suspirei, resignado.

- Está bem – respondi. – Vamos para casa. Já está anoitecendo.

Após pagar a conta, deixamos a lanchonete e começamos a caminhar pela calçada. A noite caía lentamente enquanto continuávamos nosso trajeto.

Meu sonho sempre foi me tornar um escritor, um daqueles autores renomados que autografam livros para os fãs em bibliotecas e veem suas obras literárias sendo adaptadas para o cinema. No entanto, as coisas não estavam indo conforme o planejado. Quando publiquei meu livro, Sombras Além do Abismo, as vendas foram decepcionantes, quase constrangedoras. Eu me perguntava se o problema estava na minha escrita ou na minha incapacidade de desenvolver uma história cativante.

Renan estava determinado a me ajudar a sair dessa situação difícil. Ele me apoiou nos últimos dias, saindo para distrair a mente e agora estava tentando me fazer conseguir um emprego. Não que eu tivesse algo contra trabalhar em um lugar comum, mas sim contra a ideia de desistir do meu sonho. No entanto, às vezes, precisamos dar passos diferentes e mudar o rumo de nossas vidas. Por isso, acabei concordando em ir para uma entrevista no dia seguinte, cedo pela manhã.

Voltando para casa, me despedi do Renan no portão e entrei. Meus pais já estavam na terra dos sonhos, e tudo estava mergulhado em escuridão. Afundei no sofá da sala e fiquei lá, perdido em pensamentos. Sentimentos conflitantes me invadiam: alegria e empolgação pelo amanhã, mas também uma tristeza avassaladora por ter que abandonar meu sonho. Era um turbilhão de emoções, uma montanha-russa entre felicidade e tristeza.

Já de noite, exausto, me levantei do sofá surrado que havia me acomodado por alguns minutos. O tecido áspero roçava

na minha pele, lembrando-me constantemente da minha situação atual. Suspirei cansado, deixando escapar o peso das batalhas diárias travadas dentro e fora de mim.

A luz tênue da lua espiava pelas frestas da cortina, lançando feixes prateados na sala desgastada. Caminhei lentamente em direção ao meu quarto, arrastando os pés descalços pelo tapete macio e desbotado, que parecia compartilhar do meu cansaço invisível.

Naquele momento fugaz antes de entrar no quarto, o tempo parecia suspenso. Eu era apenas um indivíduo desesperado em busca de um lugar para descansar minha alma exausta. Olhei ao redor e encontrei as marcas do tempo nas paredes desbotadas, nas fotografias empoeiradas e nas prateleiras vazias que não sustentavam mais meus sonhos.

As sombras dançavam pelo ambiente, misturando-se aos meus pensame'ntos mais profundos. Naquele quarto modesto e solitário, eu despejava minha frustração e minhas esperanças em pilhas de manuscritos rejeitados e folhas amassadas. Cada palavra escrita era um grito silencioso por uma chance, por uma voz que ecoasse nas mentes dos leitores. Mas, até então, meus esforços literários pareciam perder-se em um mar de indiferença.

A desistência rondava meus pensamentos, deixando um gosto amargo em cada aspecto da minha existência. A indústria editorial transformara-se em um labirinto impenetrável, onde apenas alguns poucos tinham a oportunidade de serem ouvidos. Eu me sentia à margem, um estranho no mundo dos livros, sem um lugar nas estantes das livrarias ou nas prateleiras dos leitores.

Era como se eu fosse apenas um personagem secundário na minha própria vida, destinado a vagar pelas páginas invisíveis da sociedade, onde minhas habilidades eram subestimadas e minhas ambições eram desprezadas. O rosto desconhecido do desemprego, como uma névoa densa, obscurecia meu caminho, tornando minha jornada solitária e sombria.

Apesar de todas as adversidades, eu ainda me apegava à escrita como minha bússola interna, minha única conexão com um mundo que muitas vezes parecia me rejeitar. Cada palavra, cada frase, cada personagem que criava era uma chama que se recusava a se apagar. Era minha voz, minha esperança, meu refúgio em meio à tempestade. Mas mesmo com tudo isso, eu estava prestes a desistir de meu sonho.

Quando finalmente me acomodei na cama naquela noite, o peso dos sonhos adormecidos pesava sobre meus ombros. Os lençóis macios acariciavam meu corpo cansado, oferecendo uma ilusão fugaz de conforto e paz. Mas, por trás das pálpebras cerradas, minha mente inquieta continuava a lutar, envolta em uma dança frenética de anseios e incertezas.

E assim, entreguei-me ao sono, mergulhando em um mundo de possibilidades imaginárias, onde os sonhos me envolviam como um amante ardente.

Logo amanheceu, e os primeiros raios de sol infiltraram-se pelas frestas da janela, pintando o quarto com tons dourados de esperança. Lentamente, os contornos da realidade emergiram diante dos meus olhos ainda sonolentos. Estiquei meus membros entorpecidos, afastando a preguiça que me envolvia. Era hora de enfrentar um novo dia, um novo conjunto de desafios.

Me levantei, com um pequeno sentimento de empolgação, e fui apenas em direção ao banheiro, que se localizava no cômodo a frente de meu quarto, mas assim que abri a porta senti algo incomum, uma sensação estranha começou a se insinuar em meu íntimo. O silêncio. Onde estavam os murmúrios familiares, os ruídos suaves que costumavam preencher a casa nas manhãs tranquilas? Uma onda de inquietação percorreu meu corpo, mas eu escolhi ignorá-la. Talvez meus pais estivessem apenas descansando até um pouco mais tarde do que o comum.

Abri a porta do banheiro, e a luz fria do amanhecer inundou o ambiente, destacando as paredes cobertas por azulejos brancos imaculados. As gotas de água escorrendo pelo chuveiro há muito tempo silenciado ressoavam como uma melodia nostálgica em minha mente. Mas o som da vida que costumava ecoar ali estava ausente, deixando apenas um vácuo silencioso.

Enquanto eu seguia em frente, uma sombra de apreensão começou a se formar em minha consciência. Eu sabia que algo estava errado, não estava a ouvir o canto dos pássaros igual ouvirá por todas as manhãs, ou barulhos de automóveis que circulavam pela rua. Logo saí do banheiro e avancei em direção à cozinha, que se localizava ao início do corredor bem próximo, onde o aroma reconfortante do café recém-coado normalmente permeava o ar.

No entanto, ao adentrar aquele espaço que costumava ser o coração pulsante da nossa casa, fui confrontado por uma visão desconcertante. A mesa de madeira maciça estava imaculadamente vazia, os copos e xícaras que me lembrará que estavam aproximadamente meia dúzia dos mesmos a mesa na noite anterior, permaneciam ali todos de boca para baixo.

Toda essa situação já se tornava algo inteiramente estranho, com certeza algo estava ou já havia acontecido. Meus pais jamais saem sem me avisar, principalmente quando estou dormindo, e as chances disso são ainda mais baixas pela cozinha estar totalmente limpa e arrumada

Geralmente uma das primeiras coisas que fazem logo pela manhã seria um café, jamais havia visto eles saírem sem nem mesmo fazerem isso, então fui logo em direção ao quarto deles, imaginando que estavam apenas descansando por um tempo maior do que o habitual. Voltei para o mesmo corredor de que havia vindo, mas dessa vez pela direção oposta até seu final, onde se localizava uma porta de entrada para o quarto de meus pais. Abri a porta de madeira, que rangeu um pouco.

- O que houve para ainda estarem dormindo? – Perguntei, sem resposta.

O silêncio envolvia o quarto como um véu misterioso, enquanto a escuridão persistia graças às janelas fechadas. Estendi minha mão em direção ao interruptor cuidadosamente, posicionado à esquerda da porta, e com um único movimento, rompi a penumbra. As luzes se acenderam e iluminaram cada canto daquele cômodo. Era um quarto vazio, com a cama um pouco bagunçada, como se quem houvesse dormido na mesma pela noite anterior tivesse apenas ido embora sem arrumá-la. No entanto, tive uma sutil intuição de que meus pais haviam esquecido de arrumar por terem saído às pressas ou algo parecido, assim como provavelmente saíram de casa em um horário fora do padrão.

Com passos determinados, adentrei meu quarto e alcancei o celular, descansando sobre a cama. Rapidamente, disquei o número de minha mãe, buscando um raio de esperança em sua voz reconfortante. Enquanto a chamada prosseguia, um som perturbador emergiu da sala, interrompendo o curso do telefonema. Apesar de sentir uma pitada de apreensão, não consegui resistir à curiosidade que me puxava em direção àquele ruído intrigante. Corajosamente, segui em frente, abandonando o aconchego do meu quarto.

Ao adentrar a sala, deparei-me com a bolsa conhecida de minha mãe, um item inseparável que ela sempre carregava consigo ao sair de casa e junto com essa visão finalmente consigo distinguir qual o misterioso barulho, um toque de telefone. A preocupação tomou conta de mim, pois sabia, sem sombra de dúvida, que ela jamais sairia sem seu celular. Meu coração acelerou enquanto observava atentamente aquela cena intrigante.

Movido por um misto de apreensão e esperança, desvendei o zíper da bolsa, revelando seu conteúdo oculto. Com mãos trêmulas, adentrei o bolso escuro, em busca da origem daquele som que se entrelaçava com minha crescente preocupação. E então, como se guiado por uma força maior, meus dedos encontraram o objeto que clamava por atenção. Realmente, o que estava em minhas mãos era o item que eu mais temia que fosse, o celular de minha mãe.

Entrei em desespero, nada se conectava ou fazia sentido. Minha mãe jamais sairia sem sua bolsa ou seu celular, e meu pai muito menos sem tomar seu café, além de sua cama estar arrumada logo de manhã tão cedo. Minhas emoções de agonia eram imensas assim como os calafrios que começará a sentir. Onde eles poderiam estar? O que houve com eles? Várias perguntas que eu necessitava de uma resposta imediata, porém não havia nada nem ninguém que poderia que poderia dá-las a mim.

Tudo fica cada vez mais estranho, o silêncio ensurdecedor é interrompido por minha respiração ofegante se tornando cada vez mais alta, meu coração acelera descontroladamente, como se estivesse em uma corrida desesperada contra o tempo. Minhas mãos tremem e suam frio, enquanto uma onda de calor percorre todo o meu corpo, como se eu estivesse em chamas. Uma sensação de aperto sufocante envolve meu peito, como se uma mão invisível estivesse esmagando minha respiração, e a sala ao meu redor começa a girar em um frenesi desorientador.

Eu me via perdido em um turbilhão de pensamentos e emoções confusas. Os móveis, antes familiares, tornam-se ameaçadores, suas formas distorcidas parecendo se mover e se contorcer, como se estivessem prontos para me engolir. As paredes parecem fechar-se sobre mim, e a perspectiva de escapar desvanece-se como um sonho impossível.

Minha visão embaça totalmente, e me sentia como uma pessoa em cima de uma corda bamba, estava prestes a despencar no chão. Caio ao chão, mas por algum milagre permaneço de joelhos, com os punhos cerrados para não desmoronar ao chão completamente e minha cabeça próxima ao mesmo. Minha respiração inteiramente ofegante e extremamente alta, com uma dificuldade imensa como se todo o oxigênio simplesmente deixasse de existir naquele momento, e eu estava lutando para achar algum resquício dele. Isso durou por tanto tempo que, caso me dissessem que se passou uma hora comigo naquele estado, eu acreditaria totalmente. Algo muito estranho havia acontecido, e eu não sabia o que fazer.

Aos poucos minha respiração foi se retornando ao normal, parecia efetuá-la com mais facilidade aos poucos e todas as sensações horríveis que estava a sentir pouco tempo atras, também estavam. Minha visão, que estava mais embaçada do que um pedaço de vidro na friagem, retornava-se aos poucos.

Já conseguindo me levantar, ainda que com algumas tropicadas, meu olhar voltou-se para a porta da sala, a qual estava fechada e com as chaves penduradas descuidadamente em sua fechadura. Fui em sua direção, deixando meu celular sobre o rack da sala. Destranquei-a rapidamente, indo até a garagem. Ali pude ver o carro ainda imóvel, assim como o portão basculante que também aparentava estar trancado. Entrei para dentro e fui atras das chaves do carro, a qual encontrei jogada em cima do armário da cozinha. Com as mãos trêmulas, agarrei-as, retornando à garagem. Com um gesto firme, destravei o automóvel e abri a porta do motorista com uma dose extra de força, como se estivesse buscando respostas no próprio ato de adentrá-lo. Porém não havia nada de diferente no interior do carro, mas também não tinha uma ideia do que estava querendo encontrar ali, apenas correndo em busca de alguma resposta para todas as minhas perguntas.

O pânico começava a me envolver, e eu me via perdido, sem saber qual caminho seguir ou onde encontrar meus pais, sem qualquer indício do que teria ocorrido naquela manhã fatídica. Poderia eles terem me abandonado aqui? Parecia inimaginável, pois seus pertences ainda estavam presentes: o celular e a bolsa da minha mãe, testemunhas silenciosas de sua partida. Além disso, o carro permanecia estacionado na garagem, desmentindo qualquer suposição precipitada.

Com uma torrente de pânico e desespero, irrompi pela porta de casa, descrente de que aquela realidade pudesse ser verdadeira. Encaminhando-me à cozinha em busca de algum alívio, detive-me perante o filtro de água. Ao lado, um copo de vidro aguardava pacientemente. Sem hesitar, servi-me de uma porção de água fria, buscando acalmar meus nervos em turbulência. E a bebi avidamente.

Eu não tinha a menor ideia do que estava acontecendo, mas sabia que precisava agir. Deveria ir atrás deles? Não, nem sequer sabia onde encontrá-los. Mesmo sendo uma cidadezinha no interior, eu não fazia ideia de onde eles poderiam estar naquele momento. Talvez fosse mais fácil ficar em casa e esperar que eles viessem até mim, afinal, já sabiam onde eu estaria.

Após tomar o copo de água, senti minha mente clarear um pouco. Imediatamente, fui em busca do meu celular, que havia deixado sobre o móvel da sala. Peguei-o e verifiquei a hora: eram 9h37 da manhã. Desbloqueei o telefone e liguei para o meu pai, mas, desta vez, não ouvi o toque vindo da sala, e sim do quarto dos meus pais, lá nos fundos. Dirigi-me até lá e, com mais calma, pude notar que o celular dele estava caído ao chão, ainda conectado ao carregador na tomada. Parecia estar totalmente carregado, então pude ter uma única certeza nesse momento: a energia ainda estava funcionando, e como as chamadas efetuadas por mim estavam sendo recebidas com sucesso pelos celulares de meus pais, seria correto afirmar que ainda havia sinal de celular na região.

Sem ter certeza do que fazer, por algum motivo inexplicável, decidi começar a ligar para todas as pessoas da minha lista de contatos. Isso incluía parentes como tios e primos, assim como amigos e até pessoas com quem eu não conversava há muito tempo. Inclusive para Renan, meu amigo que estava junto a mim na tarde do dia anterior. Porém, nada. Não obtive resposta alguma. Ninguém atendia minhas ligações e nem mesmo respondia às mensagens que enviava entre as chamadas. Ao navegar pelas redes sociais, percebi que estavam repletas de postagens antigas, publicadas antes da noite anterior. Era evidente que a internet ainda estava funcionando nesta região.

Minha primeira decisão: ficar por aqui, esperar por meus pais, algum conhecido ou algo do tipo. Não fazia ideia do que estava acontecendo, porém era certo de que eu precisaria fazer algo.