Após descer os restantes das escadas, sem dar ouvidos a mais nada e a mais ninguém, chegou Jonas à recepção do térreo e ainda que de longe, se deparou com um carro bastante amassado, com fumaça saindo aparentemente de seu motor. O automóvel, estava obstruindo a passagem pela porta de saída do prédio, além disso, ele observou que haviam pessoas ali, provavelmente a bastante tempo. O mais intrigante, é que algumas delas estavam imóveis, sem tomar nenhuma atitude para saírem daquele lugar ou daquela situação, o estado daquelas pessoas o fez pensar a respeito de como a mente humana é facilmente abalada por situações atípicas, com isso, ele se questionava se essas pessoas realmente sabiam o que estava acontecendo.
Com o propósito de não parar para mais ninguém, ele foi em direção a saída e a cada passo que dava, via que aquele carro não estava obstruindo a passagem das pessoas por completo, havia um certo espaço para as mesmas passarem, porém, o desespero as impedia de perceber tal coisa. Ao passar por aquela brecha, ele viu um adolescente que aparentava ter entre 15 e 17 anos de idade, preso no banco da frente do carro, gritando e chorando, como se tivesse perdido alguém. Jonas, tentou fingir que não estava vendo, entretanto, sua consciência o fez olhar para aquela situação e antes que pudesse sentir qualquer empatia ou vontade de ajudá-lo, ele se lembrou de sua esposa ao perceber que o garoto segurava (com a única mão que tinha livre) uma peça de roupa, que aparentava ser um vestido com estampas floridas, semelhante ao estilo de roupa que ela usava.
O fato de se lembrar dela, preencheu toda sua mente e consciência, o "ajudando" a se desvencilhar daquela situação, que de certa forma o privava de continuar mantendo o seu foco em Clara, custe o que custar, doa a quem doer. Ao sair daquela situação, ele ouviu gritos de desespero, provavelmente daquele mesmo adolescente: — Minha mãe… Ela sumiu na minha frente! ALGUEM ME AJUDA! No mesmo instante, ele se lembrou de seus pais, principalmente de sua mãe por conta do grito de desespero daquele garoto. E mais uma vez, Jonas se deparou com um dilema: Ir à casa de seus pais, que era mais próximo de onde estava? Ou continuar sua busca por sua esposa, ainda sem rumo ou direção concreta?
Pesou o fato, de Clara provavelmente estar bem longe da cidade ou até mesmo da terra, com isso, ele resolveu ir ao encontro de seus pais, também sem muita garantia, porém, com mais chances de sucesso, ainda que também mínimas, tendo em vista que eles eram cristãos fervorosos. A casa de seus pais, ficava a aproximadamente 20 minutos de caminhada do local onde ele estava. Pensado em colocar os fones de ouvidos para o ajudar a não parar por nada (caso ouvisse alguma coisa), ele chegou a pegá-los no seu bolso e plugá-los em seu celular, porém, ao olhar para ambos ele desistiu, não pelo fato de que seria difícil soltar os fios embaraçados, mas sim, porque poderia gastar a bateria de seu celular que já estava em 11 %, o que seria útil e necessário caso o sinal de sua operadora voltasse em algum momento.
Com seu celular na mão, após guardar os fones de ouvidos, Jonas esbarrou em um jovem, que corria chorando enquanto segurava uma lata de spray nas mãos, com isso, seu celular quase caiu no chão, mas seus reflexos da época de goleiro de futebol na infância e adolescência, não deixaram isso acontecer, ele se envergou e pegou o aparelho. Ao assumir a postura normal, isto é, ao ficar de pé, ele avistou um muro recém pichado, aparentemente por aquele jovem com quem havia esbarrado, devido a tinta de spray ainda estar escorrendo. A pichação, era na verdade uma mensagem que dizia: "Mateus 24. 41-42." Jonas, ao ler o que estava diante de seus olhos, ainda com o celular em mãos, procurou o versículo no aplicativo da bíblia que dizia: "41 .Estando duas moendo no moinho, será levada uma, e deixada outra. 42. Vigiai, pois, porque não sabeis a que hora há de vir o vosso Senhor.".
Isso soou como uma confirmação daquilo que ele já imaginava, uma pequena angústia tomou conta de sua alma e um arrepio inexplicável atingiu todo seu corpo. Mesmo assim, ele seguiu andando rumo ao seu destino, mesmo que no modo automático, pois, em sua mente se passavam muitas coisas das quais ouvia mas não praticava, e ao parar de pensar nessas coisas e de certa forma "voltar a si", percebeu que já estava na rua da casa de seus pais e mesmo de longe, conseguiu avistar que a porta da garagem estava aberta. Se aproximando um pouco mais, notou que a dianteira do carro de seus pais estava na calçada, com isso, começou a correr sem se permitir sentir esperança, pois, mediante ao momento em que estava e sabedor dos fatos, para ele bastava uma resposta, estando eles lá ou não. Ao se aproximar do portão, ele viu que não havia ninguém dentro do carro e ao averiguar melhor, percebeu também, que não haviam peças de roupas em nenhum dos bancos. Jonas, ainda não tinha a total certeza de que seus pais haviam sido arrebatados, com isso, resolveu entrar na casa, não só para ver se estavam ou não lá, mas também para limpar o sangue de sua cabeça, comer alguma coisa, pegar sua mochila no seu antigo quarto (se é que ela ainda estaria lá) e abastecê-la para seguir seu destino com o máximo de recursos possíveis e cabíveis.
Enquanto caminhava até a porta, ele percebeu que poderia também, pegar o carro de seus pais para facilitar sua viagem rumo ao "paradeiro" de Clara e retornou em direção ao veículo rapidamente, pois a garagem estava aberta, expondo-o, o que poderia atrair pessoas com a mesma intenção, isto é, ter um veículo para se locomover em meio ao caos das ruas. Ao tentar abrir o carro, este estava trancado e a chave não estava na ignição, com isso, Jonas, chegou à conclusão de que a única coisa lógica que poderia ter acontecido, é que alguém estava para sair, mas, por algum motivo desistiu, retirou a chave da ignição e saiu do carro. Essa atitude era típica de seu pai, isto é, ele sempre se esquecia de alguma coisa, voltava em casa para buscar e tinha como mania desligar o carro e levar a chave consigo. Isso "animou" Jonas, o fez correr de forma esperançosa em direção a casa na expectativa de ver seu pai e ao tocar na porta, percebeu que estava entreaberta, facilitando sua entrada. Ao entrar, se deparou com o belo sofá de seus pais logo na entrada e surpreendentemente, quem estava lá diante de seus olhos não era seu pai, mas sim, a sua mãe.
Agora as coisas começam a esquentar e reflexões sobre apostásia permearão os próximos capítulos.