Charlotte
Acordo com meu corpo dolorido, algo que eu julgava impossível. Ao olhar para o lado, vejo Dylan dormindo e, entre nós, está Aaron, repousando serenamente. Levanto-me da cama com cuidado para não os acordar e me dirijo ao guarda-roupa, onde pego um vestido e uma calcinha, vestindo-os com delicadeza.
Caminho para fora do quarto e sigo para a cozinha, com a intenção de preparar o café da manhã. Ao chegar, avisto Dion sem camisa, mexendo no fogão.
"Então, o soldado sabe cozinhar?" - Indago, aproximando-me.
"Sou um homem de mil utilidades," - ele sorri, enquanto o observo. - "Ontem foi uma loucura, ver você em pé e bem é impressionante."
"Cale a boca," - retruco, envergonhada, enquanto me sento e ele ri, servindo-me café em seguida. - "Obrigada!"
"Dylan continua dormindo?" - Balanço a cabeça afirmativamente. - "Então, como se sente ao descobrir quem ele realmente é?"
"Excitada, assustada e impressionada," - ele dá uma gargalhada. - "Não tem graça. Minhas costas estão doendo."
"Eu pensei que você não sentisse dor."
"Mas com Dylan, é impossível não sentir dor," - ele ri novamente. - "Quer morrer?"
"Não, cunhada," - sorrio. - "Bem-vinda à família, cuide bem do meu irmão."
"Farei o impossível."
"Bom dia," - olho para o lado e vejo Dylan com Aaron no colo. Levanto-me e vou até eles. - "Você não me acordou."
"Você estava tão linda dormindo," - ele se inclina e me dá um beijo, e então pego Aaron em meus braços. - "Bom dia, meu anjo," - murmuro, dando-lhe um beijo na bochecha.
"Venham comer, vocês dois," - diz Dion, e volto a me sentar, começando a amamentar meu filho, enquanto Dion arruma a mesa. - "De onde você conseguiu tanta comida enlatada?"
"Alguns meses atrás, encontrei um mercado que funcionava com um gerador de energia solar, assim os alimentos não estragam. É de lá que vêm."
"Você conhece bem essa área?" - Dion senta-se, e eu balanço a cabeça afirmativamente. - "Demorou muito para limpar a área?"
"Uma semana. Graças ao meu sangue," - tomo um gole do meu café. - "Como estão os outros?"
"Mika é nossos olhos e ouvidos, e os gêmeos se aposentaram."
"E a Maria?"
"Ela voltou para a família dela dias após seu desaparecimento. Consegui garantir que ela fosse em segurança."
"Isso é ótimo," - olho para meu filho e sorrio. - "Os dois, acostumados com aventura e ação, já aviso que aqui é só paz. Raramente aparece um zumbi."
"Estou velho e só quero paz," - diz Dion, e eu rio. - "Finalmente estou me aposentando."
"Minha única intenção é cuidar da minha família," - Dylan me abraça, e percebo que Dion nos observa.
"Se eu tivesse te conhecido antes, teria salvado minha família?" - Dion questiona, segurando minha mão.
"Com certeza," - ele aperta minha mão. - "Mas nunca é tarde para recomeçar, Dion."
"E onde eu vou recomeçar? Se voltar, serei jogado em um laboratório e nunca mais sairei de lá," - ele se levanta e começa a andar. - "Alguém como eu não tenho direito a recomeçar," - nos deixa a sós.
"Eu não queria isso," - murmuro, abaixando a cabeça.
"Não é sua culpa. Meu irmão não consegue se perdoar pelo que aconteceu com a família dele e por ter te tratado com hostilidade."
"Mas viver assim não é viver, Dylan."
"Ele tem razão, como pretende recomeçar?" - Olho para ele. - "Você tem uma amiga?"
"Vocês são os únicos seres vivos que vi depois de um ano."
"Então, dizer a ele para recomeçar foi um erro," - ele se levanta e beija minha testa. - "Vamos deixá-lo em paz," - começa a andar.
(...)
Charlotte
Dion se culpa pelo que aconteceu com a família dele, mas almeja o que Dylan possui.
Se ele deseja ter uma família, deveria buscá-la, ao invés de se torturar com o que não pode mudar.
Não consigo entender...
O dia passou lentamente, e o clima entre nós três se tornou estranho. Sinto-me culpada pelas minhas palavras impensadas.
Para não piorar a situação, pedi a Dylan que cuidasse do nosso filho enquanto eu realizava a manutenção nas cercas elétricas. Peguei minha maleta de ferramentas e saí de casa para trabalhar.
Passei um tempo fazendo a manutenção, até que ouvi passos. Ao olhar para trás, vejo Dion se aproximando.
"Você cercou uma área bem grande," - ele comenta.
"Queria mais espaço para meu filho brincar," - tiro as luvas. - "Sobre mais cedo, peço desculpas."
"Está tudo bem. Você não disse nada de mais."
"Você passou o dia me ignorando, como pode afirmar que não disse nada de mais?"
"É complicado."
"O que é complicado?" - Dion ignora minha pergunta e começa a caminhar. - "Dion," - seguro seu braço. - "Fale comigo."
"E o que eu diria?" - Ele me olha. - "Falar que estou apaixonado pela mulher do meu irmão mais novo desde o dia em que ela salvou minha vida de uma lança," - fico paralisada, e ele puxa o braço. - "Esqueça o que acabei de dizer," - começa a andar rapidamente, enquanto permaneço parada.
Dylan
Ontem, Dion fez uma declaração que me deixou sem palavras, embora eu já suspeitasse. Sem ter a chance de responder, ele me deixou sozinho na sala e retornou ao quarto.
Agora, entendo por que ele reagiu daquela forma às palavras de Charlotte.
Vi decepção em seus olhos...
Meu irmão mais velho está apaixonado pela minha mulher.
Mas para ele, isso é um castigo por deixar sua família morrer e por ser hostil com Charlotte no início.
Como devo reagir a essa revelação?
Assim como ele, também não sei o que fazer.
Após o café da manhã, o clima entre nós três ficou tenso, levando Charlotte a se afastar. Então, decidi confrontar meu irmão e incentivá-lo a revelar seus sentimentos a ela, o que certamente o chocou.
Eu sei, enlouqueci.
Dion ficou pensativo por um tempo e depois saiu de casa. Enquanto isso, brinquei com meu filho, mas minha mente estava em um turbilhão.
E se ela aceitar os sentimentos dele?
Por que essa ideia não me provoca raiva ou ciúmes? Será que estou enlouquecendo de vez?
"Dylan," - olho para o lado e vejo meu irmão. - "Ela já sabe, está feliz?"
"O que aconteceu?" - Ele me ignora e continua andando. - "Dion," - levanto-me, pego meu filho no colo e sigo atrás de Charlotte. Alguns minutos depois, a encontro parada. - "Amor!" - a chamo, e ela me olha.
"Dion, ele," - aproximo-me. - "Posso matá-lo?" - Fico perplexo com a pergunta dela.
"O que ele fez para você querer matá-lo?"
"Ele me joga uma bomba e depois sai como se nada tivesse acontecido. Não sei por que, mas isso me deixa extremamente irritada," - ela faz uma expressão emburrada, e começo a rir. - "Vejo que os irmãos têm um parafuso a menos."
"Desculpe," - a abraço. - "Como você se sente com a revelação dos sentimentos dele?"
"Você já sabia?"
"O encorajei a se abrir," - Charlotte me solta. - "Eu te amo. Você é a mulher da minha vida, mas ele é meu irmão e não quero vê-lo sofrer. Dion já passou por demais."
"O que devo fazer?"
"Escute seu coração."
"Neste momento, meu coração só deseja matá-lo," - dou uma risada. - "Não é engraçado, Dylan," - seguro seu rosto e começo a beijá-la.
"Qualquer que seja sua decisão, eu te apoiarei. Exceto se decidir matar meu irmão," - ela ri.
"Te amo, meu ex-zumbi."
"Eu sei," - afasto-me. - "Vamos para casa," - dou minha mão, ela a pega e começamos a andar. Após um tempo, chegamos. - "Vá falar com ele."
"Agora?"
"É melhor resolvermos isso rapidamente," - vejo medo em seus olhos. - "Está tudo bem, meu amor."
Charlotte
Como assim ele está apaixonado por mim?
Dion foi um babaca comigo e precisei mostrar que estava falando sério sobre o irmão dele, e que não sou o monstro que ele imaginava.
Inacreditável! Ele joga essa bomba e depois pede para esquecer.
Pior ainda é que Dylan já sabia e ainda encorajou o irmão a revelar seus sentimentos.
Não entendo Dylan.
"Escute seu coração."
Se eu seguir esse conselho, ele ficará sem irmão...
Deixo Dylan na sala e entro no quarto de Dion sem bater. Ele está deitado na cama, ignoro suas reclamações e me aproximo, sentando-me ao seu lado enquanto pondero sobre o que dizer. Preciso entender como ele começou a me amar.
"Quando começou?"
"O quê?"
"A me amar, quando começou?"
"Já disse, foi quando você me salvou de uma lança," - ele se senta na cama, e eu olho para ele. - "Dylan falou para você vir falar comigo?"
"Ele também me disse para ouvir meu coração, mas se eu fizer isso, ele ficará sem irmão."
"Eu digo que estou apaixonado e você pretende me matar?"
"Você joga essa bomba e depois some. Fiquei extremamente irritada," - digo, brava, e ele segura meu braço, puxando-me para mais perto. Bato em seu peito. - "Dion."
"Não entendo Dylan."
"Se você, que tem o mesmo sangue, não entende, imagine eu," - olho para ele, meu coração acelera ao ver seu rosto tão próximo do meu. - "Isso me irrita," - cubro seu rosto com as mãos.
"Ficou maluca?" - Ele segura minhas mãos e desvio o olhar. - "Eu irei te esquecer. Mas se minha presença te incomoda, irei embora hoje mesmo."
"E você irá para onde?"
"Para qualquer lugar, contanto que seja bem longe de você," - fico paralisada enquanto ele solta minhas mãos. - "Seu coração não tem espaço para outro, então é melhor escutá-lo."
"Você não irá embora," - seguro seu rosto. - "Mas preciso de um tempo para pensar. Não posso agir impulsivamente, senão nós três sairemos machucados."
"Entendo," - ele solta meu rosto e segura minha mão.
"Venha," - levanto-me da cama, e ele me acompanha. Saímos do quarto e vamos para a sala. - "Dion continua vivo," - digo a Dylan.
"É bom saber."
"Como assim, ainda vivo? Você ainda planeja matá-lo?"
"Você não faz ideia de quantas vezes imaginei te matando com minhas próprias mãos," - abro um sorriso malicioso.
"O que você vê nela, Dylan?"
"O mesmo que você, irmão," - Dylan me abraça por trás.