Eu não deveria ter seguido ela, mas a curiosidade me devorava. Na noite em que a estranha mulher fugiu, vi Cassandra, uma das líderes da cidade-arena, partindo em sua perseguição. A adrenalina pulsava em minhas veias quando percebi que a mulher correndo com a espada na verdade era a gladiadora conhecida como Glutona!
Eu estava possuído pelo desejo de descobrir a verdade. No impulso, aluguei um lagarto e acompanhei toda aquela correria de longe. Quando percebi, já estava no meio de um incêndio que quase me matou, mas consegui contornar as chamas por estar mais afastado. Deus parece proteger os jornalistas!
Por sorte, vi um ponto preto correndo nas colinas distantes, então corri na mesma direção. Dias se passaram, e ainda assim persisti, mesmo sem um rastro claro. Minha determinação, alimentada pela curiosidade, rendeu os frutos que eu esperava.
Encontrei a Glutona – ou seria melhor a chamar de Ana? – treinando com uma pequena garota, era difícil determinar sua idade, mas chuto algo entre 13 e 16… enfim! As habilidades de Ana com aquela maldita espada eram hipnotizantes! Um espetáculo! Dá pra entender o motivo de ter feito tanto sucesso na arena.
Sabe o que me encantou ainda mais? Vê-la conjurar uma esfera de mana gigantesca, uma demonstração de poder que eu nunca tinha testemunhado no abismo. Apesar que aparentemente ela também não, já que caiu em agonia pelo esgotamento de mana.
Achei que tudo acabaria ali, ela realmente parecia estar morrendo, no entanto, se levantou. Mas algo estava errado. Eu podia ver a sanidade de Ana escapando, já tinha estudado o suficiente esse tipo de gente para sentir isso instintivamente. Parecia que algo a estava devorando, me arrepiei só de olhar… Mesmo assim, continuei observando, fascinado e horrorizado ao mesmo tempo.
E ali, mais uma surpresa. Ela simplesmente se jogou no mundo escuro! A tensão da espera era insuportável. Cada segundo parecia uma eternidade. Contra todas as expectativas, a garota e o lobo foram logo em seguida. Sendo sincero, nem lembrava que eles estavam ali, mas tenho que deixar claro que admiro a coragem de ambos.
É muito estranho, meu senso comum diz que estão mortos, mas por algum motivo, eu sabia que ela iria conseguir sair de lá. A Glutona era um enigma, uma escrava, uma gladiadora, uma fugitiva. Uma história viva que eu estava determinado a contar. E no fundo, sabia que essa jornada era apenas o começo de algo muito maior.
Bom, no fim voltei à cidade com a mente perturbada pela curiosidade insaciável, tendo mais perguntas do que respostas. Cada detalhe daquela noite em que Ana fugiu me assombrava, e por dias, não consegui dormir.
Quem era ela realmente? Que tipo de coisa passou para ficar assim?
As perguntas me atormentavam.
Em um ataque de ansiedade pela falta de resposta, decidi fazer algo inédito: juntar um grupo de guerreiros para sair dessa porcaria de abismo. Claro, na verdade queria apenas poder completar esse relatório sobre o bizarro caso. Achei que era uma ideia que não ia vingar, então apesar de convidar todo tipo de gente continuamente, não tinha muitas esperanças.
Pra minha surpresa, minha persistência intrigou os líderes Tenébrios, e em pouco tempo conseguiram alguns gladiadores. Mercenários do submundo, atraídos pela promessa de aventura e recompensas, decidiram se juntar também. O total ficou em pouco mais de cem pessoas, a maior incursão já feita nesse mundo escuro. As expectativas eram altíssimas. A sensação de estar prestes a desbravar o desconhecido me preenchia de uma mistura de medo e excitação.
Mostrei o caminho para todos, aquele caminho que havia seguido anteriormente com tanto cuidado. Todo mundo hesitou, mas assim que um homem mais corajoso passou pela fumaça, todos foram atrás. O mundo escuro, uma vastidão sem fim de… nada!
Essa escuridão pode realmente deixar alguém louco!
Seguimos por meses em uma única direção, sabíamos que assim chegaríamos em algum lugar em algum momento. Cada dia era um inferno. Os insetos malditos, implacáveis, ceifavam vidas constantemente. O som de suas mandíbulas cortando a carne dos companheiros caía sobre nós como uma maldição. A cada suposto amanhecer, nossos números diminuíam, mas o fogo da determinação mantinha os sobreviventes em movimento. Digo determinação, mas vamos ser francos, não tinha mais volta… aquilo era medo da morte.
Finalmente, quando estávamos em nossos limites, dez de nós chegaram a um lugar estranho. Fazia tempo que eu não via uma estação de trem, o mundo sabe quantos anos passei em uma dessas, impossível que um abandonozinho fizesse eu não reconhecer mais. A sensação de alívio era quase palpável, mas sabíamos que o perigo não havia saído de nossos calcanhares.
Pulando uma longa e entediante explicação e resumindo de forma simples: Encontramos um incrível fio de luz solar, mas… teríamos que escalar.
A tarefa era difícil, as escadas que deviam estar lá já não existiam. De má vontade, começamos a prender as cordas de alpinismo, mas de repente uma criatura colossal atacou. A visão daquele monstro fez meu sangue gelar. Era uma luta pela sobrevivência, intensa e desesperadora.
Magias, lanças, martelos, espadas, nada parecia suficiente. Ela era implacável, cada golpe parecia ser absorvido por sua pele espessa e impenetrável. O cenário ao nosso redor se transformou em um campo de batalha caótico, gritos de dor e frustração ecoavam nas paredes da estação abandonada.
Até mesmo eu, enferrujado dos anos pacíficos de trabalho de campo, tive que dar tudo de minha com algumas manifestações básicas e minha velha espada. Eu não podia morrer naquele lugar.
Depois de uma batalha que parecia interminável, marcada por centenas de feridas e um esforço conjunto de todos os nossos sobreviventes, a criatura finalmente sucumbiu. Um machado cravado profundamente em seu crânio foi o golpe final. O monstro caiu, morto, e o silêncio voltou a reinar, perturbado apenas pelas nossas respirações ofegantes.
Por desgraça, apenas eu e um grande guerreiro conseguimos sair vivos dessa luta insana. Os corpos dos nossos companheiros jaziam ao nosso redor, uma visão desoladora que nunca esquecerei.
Nossos corpos absorveram a grande quantidade de mana circundante provinda dos mortos como loucos, uma estranha e macabra benção que nos permitiu continuar. Decidimos repousar um pouco. O guerreiro não abriu a boca, mesmo quando eu o chamava, ficando no canto dele, quieto e resoluto. Ele nem mesmo se alimentou! Apenas sentou-se poucos minutos e voltou a tentar prender as cordas de escalada. Observá-lo me deu forças para me levantar também, indo ajudá-lo.
Com muito esforço, conseguimos subir. Cada puxão nas cordas era uma batalha contra a exaustão, mas finalmente emergimos. A visão do sol me deixou extasiado; não via a luz do dia há anos. O calor reconfortante em minha pele parecia um milagre, dissipando as sombras que me perseguiam desde que entramos na escuridão.
Ao meu lado, o guerreiro suspirou profundamente. Curioso, olhei para ele enquanto removia o capacete. Para minha surpresa, era uma mulher! Tinha certo charme, mas a maior parte do rosto estava queimada. Apesar disso, seus olhos eram ferozes e determinados. A revelação me deixou sem palavras.
"Cassandra!" exclamei, reconhecendo a líder de Tenebris que estava ao meu lado. O choque de vê-la ali, tão longe de casa, era incomensurável. Ela sempre fora uma figura imponente, mas ver seu rosto marcado pelo fogo apenas intensificava a sua aura..
Ela me olhou com um sorriso amargo, os lábios distorcidos pela cicatriz. "Mercadoria não foge", murmurou a mulher, a voz firme e implacável, carregada de um desprezo calculado. Aquela frase ecoou em minha mente, um lembrete brutal da realidade que enfrentávamos. Cassandra estava aqui, e ela não deixaria que nada escapasse de seu controle.
Parece que essa investigação ainda está longe de terminar.