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Quem é você?

O ar dentro da fenda era pesado, carregado com o cheiro doce e metálico da energia que permeava tudo. As árvores cristalinas lançavam reflexos dançantes pelas folhas, e o som constante da cachoeira reversa parecia ecoar, mesmo enquanto o grupo se afastava.

Seungho seguia em silêncio, mantendo-se a poucos passos atrás de Kaira. Ela andava com passos firmes, mas atentos, a mão nunca longe da lâmina embainhada em sua cintura.

Atrás deles, o líder Kangwoo bufava de tempos em tempos, claramente descontente com a situação.

"Isso é uma perda de tempo," ele murmurou para um dos outros caçadores. "Ele nem deveria estar aqui. É impossível alguém entrar sem autorização."

"Então como ele entrou?" perguntou o caçador mais jovem, segurando seu tablet com força. "Os registros confirmam que o portal foi reservado exclusivamente para nós."

"Essa é a pergunta que todos queremos responder," respondeu Kangwoo, lançando um olhar desconfiado para Seungho.

Kaira quebrou o silêncio.

"Sr. Kang, você tem algum equipamento?" ela perguntou, sem se virar para Seungho.

"Não," ele respondeu secamente.

A resposta fez um dos caçadores rir. "Sem equipamento? E você ainda está vivo? Nesse portal?"

"Você fez aquilo sozinho?" Kangwoo perguntou bruscamente, gesticulando para os sinais de luta e sangue seco das criaturas atrás deles.

Seungho assentiu, mantendo o olhar fixo nele. "Sim."

"E como exatamente você conseguiu?" Kangwoo continuou, a descrença em sua voz quase se transformando em raiva. "Você não tem equipamento adequado, não há registros de você ter entrado nesse portal, e ainda assim…"

"Eu lutei," Seungho respondeu, sua voz calma, mas firme.

Kangwoo riu, um som seco e sarcástico. "Lutou? Essas criaturas são de nível intermediário, resistentes até mesmo para caçadores experientes. Você espera que eu acredite que fez isso sozinho com uma espada quebrada?"

Antes que Seungho pudesse responder, Kaira, que havia permanecido em silêncio até então, interveio.

"Não importa como ele fez," ela disse, seu tom cortante. "O fato é que ele fez. E parece que, sem ele, teríamos enfrentado essas coisas também."

"Isso não explica nada!" Kangwoo rosnou, virando-se para ela. "Como ele chegou aqui? Por que está neste portal reservado? E, mais importante, quem diabos ele pensa que é para interferir?"

Kaira não respondeu imediatamente. Em vez disso, ela voltou seu olhar para Seungho, como se estudasse cada detalhe dele. Ele estava calmo, apesar da animosidade de Kangwoo, sua postura relaxada, mas não descuidada.

"Você não parece surpreso por estar aqui," ela disse diretamente. "Se perdeu, mas lutou como se soubesse exatamente onde estava. Quem é você?"

Seungho respirou fundo, evitando as perguntas diretas. Ele sabia que qualquer coisa que dissesse só levantaria mais dúvidas. "Eu estava perdido," ele repetiu. "Encontrei essas criaturas, lutei, sobrevivi. Só quero sair daqui."

"E quem vai pagar os danos ao nosso contrato?" Kangwoo retrucou, ainda mais irritado. "Essa fenda custou milhões de moedas Astrais! Não é um playground para amadores!"

"Talvez ele esteja mentindo," sugeriu outro caçador.

Seungho soltou uma risada curta, mas não respondeu.

Enquanto caminhavam, o ambiente começou a mudar. A floresta cristalina deu lugar a uma paisagem mais aberta, onde o chão era composto de rochas lisas e polidas, quase como mármore, mas vibrantes com tons de azul e verde. No horizonte, uma estrutura maciça começou a se formar—a entrada de uma caverna, brilhando com runas douradas.

"Estamos perto do ponto de extração," anunciou Kaira, apontando para a estrutura.

Seungho estreitou os olhos, sentindo o peso do lugar aumentar. Ele conhecia bem a sensação—esse não era apenas um ponto de saída. Algo estava errado.

Antes que pudesse comentar, um estrondo ecoou pela área.

"O que foi isso?" o caçador de óculos perguntou, puxando seu arco reflexivamente.

"Formação defensiva!" ordenou Kangwoo, sua mão já na espada.

O ataque veio rápido.

Duas criaturas enormes emergiram da caverna, suas formas vagamente humanoides, mas cobertas por uma carapaça metálica que refletia a luz como espelhos. Seus movimentos eram rápidos demais para algo tão grande, e o grupo foi forçado a se dividir.

Seungho já estava em movimento antes mesmo de perceber, seus instintos assumindo o controle. Ele desviou de uma das criaturas, que golpeou o chão com força suficiente para criar uma cratera.

"Você!" gritou Kangwoo, apontando para Seungho enquanto cortava uma das pernas da criatura. "Faça algo útil!"

Seungho não respondeu. Ele apertou o punho ao redor da espada, agora quase inutilizável, e avançou.

A batalha foi caótica.

Kaira lutava ao lado de Kangwoo, suas lâminas dançando entre os golpes das criaturas. Os outros caçadores disparavam flechas e ataques mágicos, mas as criaturas pareciam resistentes, seus corpos metálicos absorvendo boa parte do impacto.

Seungho, por outro lado, não hesitou em se aproximar. Com um salto ágil, ele escalou uma das criaturas, cravando a espada em uma junta onde a carapaça era mais fina. Um grito agudo ecoou, e a criatura se debateu violentamente, tentando jogá-lo para longe.

" Habilidade Ativada: Persistência Abissal.

A energia percorreu seu corpo, mantendo-o firme enquanto ele golpeava repetidamente. Finalmente, com um som de estilhaço, a criatura caiu, seu corpo se desintegrando em partículas de luz.

Ele virou-se para a outra, que já estava ferida, e avançou novamente. Combinando sua velocidade e precisão, desferiu o golpe final, terminando a luta.

Kangwoo olhou para Seungho, incrédulo. "Como... como você fez isso?"

Seungho limpou o sangue da lâmina na perna, sem olhar para ele. "Você disse para ser útil."

O grupo inteiro estava em silêncio, claramente tentando processar o que acabara de acontecer. Kaira foi a primeira a se aproximar, limpando a poeira de suas roupas.

"Você realmente não é um civil perdido, é?" ela disse, seus olhos avaliando-o com mais cuidado.

Seungho não respondeu, apenas segurou o olhar dela por alguns instantes antes de guardar a espada.

Kaira suspirou. "Você pode nos acompanhar até o ponto de extração. Lá, veremos se conseguimos alguma informação sobre como você entrou aqui."

Seungho assentiu, sem discutir. Kaira era a única pessoa ali que não parecia prestes a esfaqueá-lo por existir, e ele preferia manter as coisas assim.

"Mas deixe-me ser clara," ela continuou. "Se tentarmos ajudar e você mentir ou causar mais problemas, não vou intervir por você de novo. Estamos entendidos?"

"Sim"

Seungho assentiu, mas sua mente já estava em outra direção. Ele lutava para processar a torrente de emoções que o cercava. O som dos passos ecoava em sua mente, misturando-se com o silencio de memórias reprimidas.

Depois de milênios no Abismo, aquele era o primeiro contato real que ele tinha com outros humanos—e o impacto disso era avassalador. Ele não sabia o que dizer ou como agir. O isolamento havia corroído parte de sua humanidade, deixando apenas um resquício de quem ele era antes. Cada voz, cada rosto carregava uma estranheza que o fazia questionar se ainda sabia como pertencer. Eles falavam como se ele fosse uma aberração, mas a verdade é que ele próprio não sabia mais quem era.

Ele fixou os olhos na figura de Kaira à frente, tentando se agarrar à calma que ela parecia exalar. Mas, no fundo, o peso do luto o sufocava. Não era apenas pela vida que ele havia perdido, mas pela parte de si mesmo que sabia que nunca recuperaria.