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15 - Escurecer V

O sertão segura a respiração. E Lampião olha nos olhos do coronel, sua peixeira brilhando sobre a luz da lua. Maria Bonita sussurra uma prece silenciosa, enquanto Astracar observa, pronto para intervir se necessário.

A cena é tensa, como se o próprio sertão segurasse a respiração. Os cangaceiros e soldados, formam um círculo ao redor dos dois líderes, criando uma arena improvisada para o duelo iminente. Lampião, com sua peixeira em punho, encara o coronel com olhos determinados. Maria Bonita, com sua energia sagrada ainda pulsando, mantém-se em vigília, pronta para intervir se necessário.

O coronel, com seu chapéu empoeirado e olhos furiosos, parece mais uma extensão do sertão hostil. Ele é a personificação da opressão, da lei que não se curva à justiça do cangaço. Seu uniforme militar contrasta com a pele curtida de Lampião, com as cicatrizes que contam histórias de batalhas passadas.

Astracar, observa cada movimento. Ele sabe que esse duelo não é apenas físico; é uma batalha de almas. O sertão, com sua vastidão e segredos, é o juiz silencioso. A Lua, testemunha das tragédias e triunfos, ilumina o campo de batalha.

O vento sussurra entre os cactos, como se carregasse os desejos e anseios de todos ali presentes. Os cangaceiros, com os olhos fixos nos dois oponentes, seguram suas respirações. O destino está traçado na poeira que flutua no ar.

Lampião, com sua peixeira, e o coronel, com sua própria arma, se preparam para o embate. O sertão aguarda o desfecho, e a Lua, impassível, lança sua luz sobre o duelo. Maria Bonita, com sua fé inabalável, sussurra mais uma prece, pedindo proteção para seu amado.

E então, o primeiro golpe é desferido. A peixeira de Lampião corta o ar, e o coronel se defende com habilidade. O metal choca-se, faíscas voam, e o sertão parece vibrar com a energia da luta. O duelo é mais do que uma disputa territorial; é uma batalha pela alma do sertão, pela liberdade e pela justiça.

O sertão assiste, e os cangaceiros seguram suas respirações. O destino está nas mãos desses dois homens, e o vencedor será lembrado nas canções e lendas que ecoarão pelas veredas áridas.

O Coronel, com seu rosto marcado pelo tempo e pela dureza do sertão, relembra os dias em que era apenas um jovem soldado. Naquela época, ele ainda acreditava na justiça e na ordem. Seu uniforme era impecável, e sua postura rígida refletia a disciplina militar.

Ele serviu sob o comando de um oficial austero, um homem que não admitia desvios do caminho traçado. O Coronel aprendeu a seguir as regras, a obedecer sem questionar. Os dias eram quentes, e as noites, frias. O sertão parecia uma terra inóspita, mas o Coronel estava determinado a cumprir seu dever.

Foi durante uma patrulha noturna que ele viu pela primeira vez os cangaceiros. Eles surgiram das sombras como fantasmas, suas peixeiras brilhando à luz da Lua. O Coronel sentiu o medo se misturar com a adrenalina. Ele sabia que estava diante de uma ameaça real.

Os cangaceiros eram diferentes de tudo o que ele havia enfrentado. Eles não seguiam as regras, não se curvavam à autoridade. Eram selvagens, livres como os ventos que sopravam pelo sertão. O Coronel viu a coragem nos olhos deles, a determinação em suas vozes roucas.

Em uma emboscada, o jovem soldado enfrentou Lampião, o líder dos cangaceiros. A peixeira de Lampião cortou o ar, e o Coronel se defendeu com habilidade. Mas algo mudou naquele momento. Ele viu a paixão nos olhos de Lampião, a fúria que queimava em seu peito. Era como se o sertão tivesse se apossado dele.

O duelo foi breve, mas deixou uma marca profunda no Coronel. Ele sobreviveu, mas algo dentro dele se quebrou. Ele começou a questionar as ordens, a ver nuances de cinza em um mundo que antes era preto e branco. A semente da dúvida havia sido plantada.

Com o tempo, o Coronel ascendeu na hierarquia. Ele se tornou um líder, mas suas convicções mudaram. Ele viu a injustiça, a opressão que o Estado impunha sobre os mais fracos. E, secretamente, ele admirava a liberdade dos cangaceiros, mesmo que não pudesse admitir em voz alta.

Agora, diante de Lampião novamente, o Coronel sente o peso de suas escolhas. Ele sabe que esse duelo é mais do que uma disputa territorial. É uma batalha pela alma do sertão, pela liberdade e pela justiça. E, em seu íntimo, ele se pergunta se fez as escolhas certas ao longo do caminho.