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O Exame

"Lembre-se, meu filho: sempre tome cuidado, as pessoas costumam nos odiar por nossa pele ser muito escura."

Raymond acordou. Sua vida naquele bairro pobre era razoavelmente difícil. Ele morava com seus pais, tios e avós.

A casa era grande, mas era muito bem ocupada: ele era filho único, mas seus tios tinham quatro filhos. O pai e a tia eram irmãos gêmeos, e viviam terreno dos pais. Além das onze pessoas, tinham dois cães.

Raymond sonhava em ser um grande herói um dia. Os Elos, que eram o nível mais alto de heróis existente eram nada mais que um sonho distante para ele.

Ray se levantou para tomar café e se arrumar para o colégio.

Seus dias consistiam em levantar às seis e ir para a aula, depois ele voltava para casa e refinava suas habilidades em casa, fazendo um treinamento intensivo para poder fazer um exame de avaliação para heróis.

Ele ainda tinha dois anos para se preparar, pois somente aos dezoito seria possível se alistar nos exames. Tudo que Ray mais desejava era poder se tornar um herói e lutar em prol do seu povo.

Naquela manhã de agosto, ele seguiu sua rotina. Às sete, ele corria para o colégio, carregando a mochila pesada nas costas. Apesar de tudo, as pessoas não o viam com maus olhos, apenas se incomodavam com aquele garoto correndo sem parar todos os dias.

Ray não ligava para o que os outros pensavam dele, se esforçava ao máximo para forjar seu corpo. Aos dezesseis anos, ele já era musculoso o suficiente para intimidar até mesmo as autoridades.

Além do físico, ele possuía duas outras vantagens: primeiro, a genética lhe proporcionava uma altura considerável, chegando a 2,07 de altura; e o poder raro com o qual nasceu, que lhe permitia manipular temperatura.

Ray tinha poucos amigos no colégio, mas ele oferecia sua proteção aos que tinha. Seu pai dizia que aquele era seu dom de heroísmo, ele defenderia aqueles que ele julgasse como fracos, e respeitava muito quem ele considerava forte.

O colégio ficava a quase quatro quilômetros de onde ele morava, ele havia decidido ficar lá, pois podia correr uma boa distância.

Suas notas altas o tornavam um grande destaque em tudo o que fazia, afinal, ele estudava e treinava muito. Ninguém na turma pegava no pé dele, pois seu físico e seu poder superavam o de qualquer aluno do colégio todo.

E ainda assim, ele repudiava usá-los para violência. Sua ideologia de proteção o impediam de atacar pessoas para machucar, ele atacava apenas para que elas se rendessem.

Logo que chegou, ele se encontrou com seu amigo, Peter. Peter era um garoto pequeno, ele tinha apenas 1,66 de altura, e isso o fazia um alvo para os garotos mais velhos. Fazia, pelo menos até o dia em que Raymond os assustou.

Peter e ele caminharam para a sala de aula juntos.

-Como vai, Peter? -Ele cumprimentou seu amigo.

-Você sabe, bem o suficiente para aguentar as duas aulas de arte de hoje.

Ray riu. Peter detestava artes.

-Tudo bem. Eu te ajudo.

-Ajuda? Cara você é ótimo em todas as matérias. Além de ser um puta esportista foda.

-Eu só me esforço pelo meu futuro.

-Cara, tu se preocupa demais com isso. Pode acabar ficando estressado demais uma hora.

Ray não ligou para aquilo. Ele era bem controlado e otimista.

-Quem sabe... Mesmo se algo der errado um dia eu vou continuar me esforçando pelo meu sonho.

-E se der certo, você não tem medo de ficar sozinho?

Ray deu um tapa no ombro de Peter e riu alto.

-Não, eu vou sempre me lembrar dos meus amigos e da minha família. Eu vou estar lá com você te apoiando nos seus sonhos!

-Caraca... -Peter ficou sem fala. -Bom, eu estaria mentindo se dissesse que você não merece ser um herói.

Os dois entraram no colégio. Algumas pessoas cumprimentavam Ray e Peter. Os dois foram até a sala de aula.

Eles se sentaram e esperaram a aula começar.

Não aconteceu nada de extraordinário naquelas duas aulas, e nem em nenhuma outra. Ao meio dia, Ray e Peter se despediram no portão do colégio, e Ray correu novamente o caminho todo para casa.

Ray costumava observar bem o caminho todo enquanto corria, pois ele às vezes via estudantes sozinhos sendo intimidados por valentões. Foi dessa maneira que ele conheceu Peter, que estava cercado por seis garotos, dois anos antes.

Ele não batia nos garotos, apenas os avisava que era melhor não fazer mais aquilo. Uma vez, ele também nocauteou um grupo de assaltantes que roubaram uma mercearia local, ganhando assim uma reputação boa no bairro onde morava.

Sua família temia que um dia alguém tentasse buscar vingança contra ele, mas seu porte e poder faziam qualquer um desistir da ideia na mesma hora em que pensavam em tal coisa. Naquele dia em particular, tudo seguia normalmente, ele não viu nada de estranho, não precisou parar assaltantes, e nem foi vítima de uma vendeta.

Ele chegou em casa após 40 minutos de corrida. Quando chegou, uma euforia estranha corria entre os seus familiares. Seu avô o abraçou assim que ele entrou em casa. Tina e Andrew, seus dois primos mais novos, corriam em volta dele. Sua mãe se aproximou dele com lágrimas nos olhos.

-Ray... -Ela estendeu a mão, e lhe entregou um envelope.

Ray leu o envelope.

"Departamento de exame para heróis"

Ray começou a chorar e abraçou sua mãe.

Ser examinado antes dos dezoito lhe daria uma oportunidade de ganhar um cargo bom rapidamente nos anos seguintes. Normalmente os exames eram feitos quando um aspirante chegava aos dezoito, mas haviam exceções.

-Eu não acredito! -Ele dizia entre as lágrimas.

Sua mãe e a tia eram os únicos adultos em casa naquela hora do dia. Ele mal podia esperar para contar ao pai e ao resto da família.

Aquela era sua chance de ouro, sua chance de tirar sua família daquele lugar. Sua chance de alcançar seu sonho.

-Vamos sair para comemorar sexta à noite! -Disse a tia.

-Mas nós vamos ter dinheiro para isso? -Ray perguntou.

-Claro que teremos! -Disse a mãe.

As crianças sorriam e badernavam, alegres. Tina e Andrew estudavam de manhã, mas estudavam em um colégio próximo.

Ele foi almoçar e se preparar para passar o dia treinando. Enquanto comia, ele leu a carta.

"Prezado Raymond Gresham, nós, do Departamento de Exame Para Aspirantes a Heróis estamos lhe convidando para nos demonstrar suas capacidades para que seja aceito como um de nós.

Compareça no departamento em até quinze (15) dias após receber esta carta.

Atenciosamente, W. 16 de agosto de 1991"

A carta tinha sido escrita três dias antes.

-Mãe... -Ele estava decidido. -Eu vou ir hoje.

-Você tem certeza? Eu sei que você escreveu várias cartas para o departamento, mas acho que ainda é cedo.

-Não. Não é cedo. Eu vou ir e vou passar.

-Nesse caso, termine de comer e se arrume para ir.

Ele não comeu rápido. Sabia que se o fizesse, não ficaria bom para o treino. Seus estudos sobre o corpo humano o ajudaram a entender isso, e o prepararam em diversos aspectos para o exame.

Depois que comeu, ele tomou um banho gelado e vestiu roupas leves. Ele queria ir correndo, mas se o fizesse não chegaria a tempo para todos os exames. Então, sua mãe lhe deu dinheiro para pagar a passagem de ônibus e comprar um lanche.

Ele se despediu dos primos, e dos cães também. Ray amava muito aqueles cães.

A viagem demorou uma hora apenas, ele chegou no departamento às 14 da tarde.

Quando entrou, as pessoas na rua o olhavam, intimidadas por seu tamanho.

'Mal posso esperar para contar ao Peter.' Ele pensou.

Não havia fila no departamento, a jovem recepcionista apenas ficou esperando que ele se aproximasse.

A sala de recepção era pequena, tinham algumas poucas cadeiras para espera, uma televisão onde passava uma novela, e as paredes tinham vários quadros pintados por algum artista que ele não conhecia, mas todos assinados com "J. G. Castro".

Haviam algumas mesas com livros e plantas distribuídas pela sala também.

-Boa tarde, meu nome é Raymond Gresham. Eu vim fazer o exame de admissão para heróis.

-Boa tarde, senhor Raymond. Pode me mostrar a carta de convite?

-Aqui está. -Ele entregou a carta. Ele a olhava nos olhos e sorria. Foi um truque que aprendera para ganhar facilmente a empatia das pessoas facilmente.

Ela leu a carta. No envelope, sua mãe assinou e colocou a data da recepção da carta. Ela devolveu a ele.

-Tudo bem. Pode me dizer sua idade, altura e peso, por favor?

-Sim, sim. Eu tenho dezesseis anos...

-Dezesseis!? -Ela exclamou, então riu. -Desculpa, é que você é bem grande.

Ele riu também.

-Eu ouço muito isso.

-Me perdoe. Bem eu vou ter deixar isso anotado. Enfim, prossiga, Ray.

Ele não disse nada com relação ao fato de ela ter lhe chamado pelo apelido. Todos o chamavam assim.

-bem, eu tenho 2,07 de altura e peso 106 quilos.

A recepcionista anotou os valores.

-Dentro do IMC, então. Muito bem, sente-se e espere, eu em alguns minutos será chamado para o exame. -Ela sorriu e apertou a mão dele. -Boa sorte.

Ele sorriu e se sentou em uma das cadeiras.

Enquanto esperava, ele encostou a cabeça na parede e ficou pensando enquanto esperava.

Quando criança, seu pai ensinou a tomar certos cuidados, pois o mesmo crescera em uma época em que o preconceito racial era comum. Apesar da gradativa redução do racismo na época, seu pai ainda era paranoico quanto ao assunto.

-Raymond! -A recepcionista chamou.

-Sim.

Ele se levantou e foi até ela.

-Entre na porta vermelha no final do corredor à direita. Se você se der bem exame, me diga seu nome de herói. Até mais, Ray.

Ele se despediu da recepcionista. Ela sorriu para ele uma última vez e piscou o olho direito.

Peter normalmente ficava com ciúme do fato de ele ser bom com as garotas. E mulheres, às vezes.

Ray caminhou até a porta vermelha. Por trás dela, estava a chance de sua vida. Por um momento, várias lembranças correram por sua mente. Diversos momentos de sua infância, de sua adolescência, e sua expectativa do seu futuro.

Ele abriu lentamente a porta, abaixou a cabeça e passou pela porta, rumo ao seu destino.