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A Máscara do Orgulho

Já passava das três horas quando V e Astrid voltaram para casa, a grisalha exalava um forte cheiro de sangue e não parecia estar bem, durante todo o trajeto ela se manteve a uma boa distância do moreno e toda vez que ele tentava se aproximar ela se afastava, seu comportamento não era nada normal, mas V decidiu deixá-la sozinha para pensar.

Ele mesmo tinha dificuldade para processar tudo o que ouviu, dimensões paralelas, uma guerra tão antiga quanto sua própria espécie, humanos se transformando em animais, isso tudo parecia um conto de fadas, um que ele decidiu acreditar.

A casa se encontrava vazia, mas o som da torneira da cozinha os chamou a atenção, o único integrante da família presente era Gabriel, ele lavava a louça de costas para os dois, mas o cheiro de sangue o faz os olhar por cima do ombro.

-Que fedor é esse?-Ele torcia o nariz com uma cara de nojo.

-Tivemos alguns imprevistos.-V o responde vagamente, ele não poderia revelar a verdade ainda.

-Sei, vai tomar um banho sua porca!

Embora a atitude do MB sapo fossem costumeiras, algo nelas causavam um certo estranhamento no moreno, como se seu cunhado estivesse se esforçando para se manter em um personagem, ele decidiu não pensar muito sobre isso, Astrid sai para se lavar e V a acompanha.

-Ei V...-Gabriel o chama antes que ele saísse da cozinha, ele o olha por cima do ombro.-Você não devia andar por aí com a sua intangibilidade ativada, é um desperdício de mana.

Se antes V tinha alguma dúvida de que seu cunhado sabia mais do que dizia, agora ele tinha certeza, mas a pergunta era, o quanto ele sabia? E mais importante ainda, ele planejava contar o que sabia para alguém? 

É aí que alguém toca a campainha e V decide deixar as perguntas para uma outra hora, assim que a porta se abre, ele vê um rosto familiar, os olhos vermelhos como os seus, o cabelo branco preso em uma trança única vestindo uma jaqueta de couro e uma calça jeans preta, Julie, sua irmã mais velha, salta para dentro da casa e dá um forte abraço em seu irmão, por ser um pouco mais alta e possuir um porte físico invejável, V sente seus ossos sendo esmagados contra seu exoesqueleto.

-V, ainda bem que eu te achei! 

Lágrimas escorriam de seus olhos enquanto ela o apertava. Vendo a sensibilidade de sua irmã, V atravessa seus braços e limpa suas lágrimas.

-Julie, se acalma. O que aconteceu?

Ele pergunta sem muita preocupação, Julie sempre foi bastante emotiva, ela provavelmente ficou desesperada quando soube de sua luta com seu pai, mas em seus olhos V podia ver algo muito além de desespero, ele podia ver dor, a mais pura melancolia, diante disso, ele começa a levar suas emoções á sério.

-O vovô V... Ele... Ele morreu.

Quando recebem a notícia de que um ente querido faleceu, a maioria das pessoas passa pelas cinco fases do luto: Negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Como qualquer um, V se encontrava agora no primeiro e manifestou isso criando uma runa.

-Warp.

Em um sussurro a magia toma conta da pedra e é só quebrá-la para liberar seu poder, em um piscar de olhos V já não estava mais na residência dos Heddle, ele encarava agora a casa de seu avô.

Em passos trêmulos, ele adentra a mansão. Em outra ocasião, estar alí o causaria uma sensação de conforto e nostalgia, mas não desta vez, o silêncio que uma vez o fez sentir paz e calma só o deixou mais e mais apreensivo conforme ele adentrava na residência.

E então, suas últimas esperanças são destruídas, ele cai de joelhos e sente as lágrimas vindo, a luz do sol iluminava o corpo de seu avô, deitado sobre a cama de casal agora manchada por seu sangue, sua boca curvada em um largo e último sorriso pacífico, a realidade atinge V com força, e é só aí que ele se permite chorar.

Sua mente não o ajuda, ela só torna seu sofrimento ainda mais amargo quando passava as imagens de sua infância passadas com seu avô, ele só podia se perguntar porque, por que seu avô teve que morrer? Por que logo ele? De repente, a tristeza se esvai, dando lugar à raiva, seu avô sempre sofreu muito, as pessoas que ele mais amava faleceram uma a uma, e ele sempre resistiu a toda a dor de cabeça erguida, alguém foi covarde o suficiente para matar seu avô a sangue frio, e seja quem fosse, essa pessoa pagaria caro por isso.

Foi só aí que ele percebeu a mensagem, escrita acima da janela que ficava atrás da cama com o sangue de Edgar, apenas uma simples mensagem: DARKNESS TAKE YOU.

-Lorde Wallace, com certeza foi ele, esse sempre foi o bordão ridículo dele.

V escuta a voz dele, do homem que fez de sua infância um inferno, seu pai Héctor, bem alí à sua frente, como se nada tivesse acontecido entre eles. O corpo do mais novo age antes dele poder pensar e saca Orenmir de suas costas, apontando para o pescoço do mais velho.

-Nós precisamos conversar.-Héctor diz ignorando a espada em seu pescoço.

-Não temos mais nada pra falar um pro outro.

Antes mesmo de terminar essa frase, uma força invisível faz uma pressão absurda em seu corpo, o fazendo se ajoelhar, os olhos de seu pai estavam tomados pela escuridão assim como os seus.

-Surpreso? Isso não é exclusividade sua. Agora me escute, meu pai morreu por essa causa, quer que ele tenha morrido em vão? 

Apesar daquele poder só se manifestar em V quando o mesmo ficava enfurecido, Héctor parecia estar completamente calmo e sereno, isso indicava que seu nível de controle era muito maior que o dele.

-Causa? Do que você tá falando?

Ao sentir seu corpo ser liberto, V se levanta devagar, Héctor tira um pedaço de papel do bolso e o entrega. Era uma carta de Edgar.

"Héctor, sinto muito não poder dizer isso pessoalmente mas tenho pouco tempo, eles descobriram sobre o plano, ou pelo menos, parte dele. Já é tarde demais pra mim mas vocês ainda podem continuar, com minha morte e a suposta execução do V eles acharão que podem baixar a guarda, usem isso, essa é sua chance, você e o V vão conseguir, eu sei que vão. Acho que é meio tarde pra dizer isso mas, eu te amo meu filho. 

Uma última vez, Edgar."

Essa mensagem seria triste, se não fosse confusa, de que plano ele falava? Eles ainda se falavam? E por que ele achava que V e seu pai trabalharia com seu pai depois de tudo que ele havia feito?

-Está pronto pra me ouvir agora?-Os olhos do mais velho se escurecem outra vez.-Ou terei que forçá-lo a ouvir?

Sem opções, V decide ouvir, mas havia algo que deviam fazer primeiro e Héctor sabia o que era.

Horas depois...

Já havia escurecido quando os dois terminaram, a casa agora possuía uma cruz escondida no quintal onde seu antigo dono agora jazia, o único enterro digno que eles poderiam fazer sem chamar atenção. Os dois agora sentavam se à mesa de jantar frente-à-frente, era hora de pôr as cartas à mesa.

-Pois bem, vamos começar...

"No dia em que você nasceu eu fui chamado para uma assembleia na cúpula dos insecter, como sempre, eu tinha certeza que o motivo era alguma exigência absurda, que no final não teria escolha senão aceitar, e eu estava certo. Mais cedo naquele dia, os membros suplentes da cúpula se juntaram pra determinar se você seria alguma ameaça no futuro, já deve ter ouvido falar da capacidade que os escaravelhos tem de prever o futuro, essa habilidade é mais potente quando se usa em alguém que acabou de nascer, porém ele deve ter visto algo terrível porque ele começou a gritar de dor, seus olhos choravam sangue e ele se debatia, em meio aos gritos, os presentes conseguiram ouvir "Uma ameaça!? Essa criança é um demônio! Ela irá levar todos nós ao inferno!" antes do escaravelho colapsar e morrer, você mal tinha nascido, e já tinha matado alguém."

-Que visão foi essa afinal? Pra ele ter morrido ao presenciá-la deve ter sido algo bárbaro.-V estava curioso, ele nunca havia ouvido falar de visões do futuro matando pessoas.

-Não sei ao certo, a única versão que ouvi foi a de Lorde Wallace: Você, mais velho, decapitando a cabeça do próprio Lorde Wallace depois de matar todos os outros membros suplentes da cúpula.

-Os membros suplentes? Por que eu mataria os peões ao invés dos mestres?

-Esse é o X da questão, eu fiz algumas pesquisas e descobri algo interessante, em todas as reuniões das quais os tecelões participaram, nenhum dos membros originais esteve presente, nenhum dos barões, reis ou lordes, apenas os membros suplentes, isso me fez pensar em duas hipóteses, ou os membros originais nos repudiam tanto que mandam seus suplentes no lugar, ou...

-Ou os membros suplentes fazem parte de algum tipo de conspiração, uma que envolva fazer das nossas vidas um inferno.

-Exatamente, guarde essa informação, será importante depois...

"Depois de me contar essa visão ridícula, Wallace me deu uma simples e cruel escolha, ou eu o impedisse de aprender qualquer tipo de magia que fosse, ou eles o matariam, eu obviamente surtei, como eles podiam exigir algo tão horrível? Eu pensei em dizer isso a ele, mas se tivesse, talvez Rose tivesse perdido nós dois naquele dia, então escolhi a rota mais difícil. Naquela noite eu visitei seu avô desesperado, eu não sabia o que fazer, foi aí que bolamos um plano, enquanto eu boicotava as suas aulas de magia oficiais, ele lhe ensinava as mais poderosas magias tecelãs na encolha tudo isso enquanto planejamos a nossa libertação, eles nunca suspeitaram de nada, mas não pararam de tramar pra que a visão do escaravelho nunca se concretizasse, começando por Orenmir, a arma que futuramente mataria os membros suplentes, eles a confiscaram, não sei o que fizeram com ela depois, mas certamente não a destruíram."

-Orenmir está em minha posse, eu ia entregá-la aos Espadachins de Jade mas parece que eles me querem na organização.

-Os Espadachins? Isso pode nos dar uma vantagem, ouça bem, o plano que eu e seu avô tramamos por anos foi...

Horas depois...

V estava de volta a residência dos Heddle, ele trazia uma nova máscara com sigo, a famosa máscara do orgulho dourado, antes daquela dia ainda existiam resquícios de seu antigo eu mas agora Victor Valentine finalmente estava morto, agora ele era V, o mercenário mascarado que libertaria os tecelões, e faria Lorde Wallace e todos aqueles que o seguiam pagarem caro por todos os seus anos de sofrimento. Ele havia passado por todos os estágios do luto, e só lhe restava um sentimento quanto aos membros suplentes: Raiva.