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Capítulo 1 A vida nos surpreende a cada dia...

"Bom às vezes a vida é dura, mas eu tenho muito coisa para agradecer."

A Cabana

Dêvora estava em seu quarto a fitar o reflexo no espelho, - o qual ocupava todo o espaço interior da porta - dois enormes olhos castanhos estampavam sua face, cabelos castanhos escuros escorriam pelo seus ombros até as costelas sem nenhum sinal de ondulações sua pele levemente bronzeada devido a exposição ao sol do litoral, seu corpo esguio não tinha nenhuma curva atraente, diferente da garota que a esperava impaciente na sala, mas Dêvora não dava muita importância a beleza física.

Márcia pensava totalmente diferente, para ela a beleza é um fator essencial para se descobrir que lugar você ocupa na "Cadeia Alimentar Capitalista", ela sempre dizia que para ser popular deve merecer o cargo - Dêvora nunca gostou dessa comparação, ser popular nunca foi e nunca seria um emprego - e isso incluía ser bonita. Dêvora achava esse pensamento fútil e desnecessário, mas não discutia isso com sua amiga, seria uma perda de tempo. Porém concordava que Márcia merecia esse papel, seus cabelos negros em corte Chanel dava-lhe um ar sofisticado, sua pele de porcelana era invejável.

– Dê! Anda logo! - gritou Márcia, impaciente.

Como de costume, as duas iam passear na área de esportes de Marataízes - Marataízes é uma cidadezinha situada no litoral do Espírito Santo, uma cidade pequena e pacata - era o local do qual Dêvora amava ir, um dos poucos lugares que poderia usufruir de seu skate. A tarde estava linda, a brisa parecia querer acariciar a sua pele, o som das ondas soava como musica aos seus ouvidos, estar ali, tão perto do mar a fazia bem, Dêvora fechou os olhos e permitiu perder-se em meio à paisagem, mesmo de olhos fechados conseguia discernir todos os detalhes da praia.

A área de esportes ficava na praia, um dos fatores que fazia Dêvora amar ir naquele lugar. Muitos Maratimbas já não dava o valor devido aquele canto da cidade, muitos se acostumaram a passar por ali e não reparar na beleza extraordinária que aquela praia exalava, mas Dêvora não, desde muito nova gostava de sair no fim da tarde para caminhar e observar o vai e vem das ondas, ouvir o vento cantarolar aos seus ouvidos e sentir a areia massagear seus pés.

Dêvora havia se distraído tanto com seus pensamentos, que não perceberá a movimentação incessante de veículos na rua e muito menos que havia parado de andar antes de chegar a calçada, não era sua intenção ser atropelada, mas a sensação de estar conectada natureza era tão forte que ela não falava por si, viajava em um mundo só seu e a única coisa que conseguiu tira-la de seu transe foi uma imensa dor no quadril.

– Você esta bem?- Perguntou Márcia, aflita.

– Ai! Que dor... - tudo girava, mal conseguia se levantar.

– Está tudo bem? - perguntou um rapaz de cabelos negros, ele balança uma de suas mãos a frente do nariz de Dêvora.

– O que a-aconteceu?

– Você acabou de ser atropelada por uma bicicleta. - explicou o rapaz.

– Quantas vezes tenho que falar com você, - Márcia a repreendeu. - Você viaja muito em seu mundinho.

– Ela está ferida? -perguntou o rapaz.

– Não! Só foram algumas escoriações. - respondeu Márcia.

– Quem me atropelou? -questionou procurando entender o ocorrido.

– Não sabemos, o rapaz fugiu assustado, - respondeu Márcia. -Tem que lavar isso antes que infeccione!

O rapaz de cabelos negros andava de um lado ao outro, sem saber o que fazer, então ele virou-se para Dêvora em um rápido movimento de braços a sustentou e levou-a para casa mais próxima, Dêvora ficou em estático sem conseguir pronunciar uma palavra se quer, e muito menos insulta-lo, como queria poder fazer, as palavras entalaram em sua garganta. Ele era extremamente belo, seus olhos mais pareciam dois enormes rubis sob a luz do sol, seus cabelos tão escuros quanto à noite negra sem lua, ele mordiscava o lábio inferior, estava pensativo, suas mãos eram frias, - talvez pelo nervosismo. Ele deixou-a em cima de uma mureta que pertencia a uma pequena casa azul, a casa dos Rodrigues, ele foi até a casinha para pedir ajuda, a senhora Rodrigues o atendeu com hospitalidade, os dois sumiram deixando Dêvora e Márcia sozinhas.

– Nossa! Você viu aquilo? -começou Márcia. -Ele é tão sexy e tão atraente. Como você sentiu sendo carregada pelos seus fortes braços?

– Ah! Meu Deus, Márcia. Poupe-me de seus chiliques de patricinha.

– Você acha que eu não percebi seu olhar de admiração para ele?

As bochechas de Dêvora ruborizaram instantaneamente, ela não sabia o que fazer tinha sido tão transparente, será que ele também perceberá? Espero que não! Pensou ela. O rapaz esbelto caminhava em sua direção lhe tirando daquela situação constrangedora e colocando-a em outra ele trazia em suas mãos uma garrafa com água e alguns curativos, ele inclinou sobre a coxa de Dêvora e começou a tratar ferimento por ferimento evitando machucar mais, Márcia fitou-a com ar de curiosidade e acusação, como se dissesse eu sei no que está pensando, mas na verdade Dêvora não estava mais ali, sua mente não estava preocupada com o que Márcia iria insinuar ou no que o rapaz ia pensar delas, sinceramente estava mais preocupada na desculpa que daria a Margarete, ela ia enlouquecer ao ver seus ferimentos, mesmo que não fossem graves. Dizia ela: Meninas bem educadas não vivem se ralando por ai! Dêvora não escaparia a mais um de seus sermões.

– Prontinho! Não teremos que amputar. -disse o rapaz.

_ Faz piadas porque não é você quem foi atropelado.

– Dêvora Fernandes! - repreendeu Márcia. - Não seja mal educada. Ele está sendo gentil!

– Não seja por isso, muito obrigada!

*.*

Dêvora desceu abruptamente da mureta, pegou seu skate e saiu sem olhar para trás. Márcia era ótima em corrigir erros dos outros, principalmente os de Dêvora, ela conhecia muito bem o temperamento explosivo da amiga, ainda mais quando estava em seus dias "ruins", mas hoje ela não queria ser assim, soltou um suspiro e seguiu a amiga.

Hoje ela tinha os seus motivos para estar estressada, e Márcia não podia culpa-la, desde muito nova Dêvora pressentia quando coisas ruins iam acontecer e agora não era diferente, ela sentia o que estava por vim, só não sabia o que era. Isso que muitos chamariam de dom era o seu maior carma, lhe trazia variações de humor drásticas o que não a ajudava muito a se relacionar com outras pessoas, a não ser Margarete e ela.

As duas voltaram para casa de Margarete sem se quer falar uma frase inteira, Márcia sabia que Dêvora estava inquieta, mas apreciava o fato de sua amiga preservar o seu espaço e não ficar lhe questionando o porquê de estar distante naquele dia.

*.*

Dêvora sentia que havia algo de errado, os olhos azul-céu de Márcia carregavam um ar angustiado, sua face de porcelana havia dado lugar a uma face de mármore, temia que seus pressentimentos estivessem ligados a ela, mas Dêvora conhecia tão bem sua amiga quanto ela a conhecia, que sabia que se ela ainda não havia lhe contado o que estava acontecendo era porque Dêvora não podia ajuda-la.

Márcia despediu-se deixando Dêvora com a fera Margarete, porém ela estava muito ocupada demais terminando as suas encomendas que nem reparou na presença de Dêvora, Dêvora foi diretamente para o quarto após um banho bem ardido.

*.*

Depois de uma longa caminhada com Margarete, Dêvora precisava descansar fisicamente e mentalmente, Mar passou a trajetória inteira da praia a até a sua casa, falando o quanto Dêvora era impulsiva e irracional, que nunca arranjaria um namorado decente, - todas as discussões que Mar iniciasse terminavam nesse ponto, poderia começar com as notas de Dêvora, mas sempre terminava nesse ponto_ se continuasse se esfolando no chão, Eu não preciso de um namorado, protestou, E mesmo se quisesse arranjar um, seria um rapaz que compreenderia os meus gostos, mas Margarete não aceitava sua linha de raciocínio, Que espécie de menina que não quer namorar, dizia ela, então ela começava seu longo sermão de que uma menina decente nascia para arranjar um bom rapaz para se casar. Dêvora não contestava porque sabia que no fim das contas perderia aquela batalha.

Dêvora se jogou na cama e apanhou o celular, havia duas mensagens de texto, uma da operadora telefônica com mais uma de suas mensagens promocionais e a outra era de Márcia:

Amg, papai chegou hoje do Canadá e veio me buscar para ir com ele, desculpa, mas sabíamos que um dia isso aconteceria, queria poder te falar pessoalmente, porém já estamos indo.

Amo-te, Dê! B. F. F

Obs.: até o próximo verão corujinha.

*.*