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Tome a sua decisão Milles

O time estava reunido perto da quadra. A torcida organizada fazia o seu grito para motivar os jogadores, que fitavam alegres e surpresos por verem uma turma inteira ali torcendo para eles. Repassando as jogadas, o técnico dava suas últimas orientações ao time se dando conta de que seu capitão estava ausente.

Procurando-o em todos os cantos, não o vira.

— Cadê o Howard?

— Tô aqui.

Os rapazes olharam para trás onde o baixinho pisava na quadra com a mão enfaixada. Estariam curiosos, e até queriam saber o que poderia ter acontecido, mas algo em Nicolas deixava claro que qualquer aproximação levaria numa morte certeira. Talvez fossem seus olhos escuros e sombrios, ou a aura que o cercava.

— Certo... Está bem pra jogar? — Nicolas respondera com um aceno de cabeça silencioso. — Tudo bem. Quero que você fique colado no Jones, pra fazer seus ataques rápidos. O adversário não está acostumado com isso, usaremos ao nosso favor.

O apito do juiz soara e os jogadores se posicionaram na quadra. Ficando entre Gabriel e o outro alfa, Nicolas ajeitava a faixa entre seus dedos sentindo um peso em seus ombros. Não precisou erguer a cabeça para saber ser Milles o encarando. A sensação... Não. A mordida deixava claro que era ele.

Admitir aquilo era devastador.

— Machucou a mão é? Vai ferrar com...

— Cala a sua maldita boca. — Rosnava Nicolas furiosamente, apertando os dedos em punho tentando conter aquele sentimento.

A torcida cessou quando o apito soara e a bola fora para o ar. Nicolas nem tentara se concentrar no jogo. Quer dizer, era natural para si seguir a bola e se posicionar na quadra... O problema era a raiva que somente crescia dentro de si.

Como poderia ter deixado as coisas chegarem naquele ponto?

Ele mordeu Milles?

Criou um vínculo com ele?

Se já não fosse humilhante o suficiente seus instintos berrarem que o crápula era sua alma gêmea, tiveram a pachorra de mordê-lo? Justamente o obrigando a criar um vínculo que jamais seria desfeito?

Nicolas correra pela quadra saltando o mais alto que pudera quando Gabriel levantara a bola diretamente em suas mãos. A força que usara para marcar o ponto fora tanta, que ambos os times em quadra ficaram atordoados.

Suas pernas vibravam com a força excedida. Nicolas conseguia sentir o sangue fluindo por suas veias junto da adrenalina. Uma pequena porcentagem de sua raiva fora externada pela bola. E a sensação fora prazerosa, apesar de inesgotável.

Que merda tinha na cabeça quando beijou Milles? Se nunca tivesse feito aquilo, provavelmente não estaria vivendo aquele pesadelo. Se Milles jamais tivesse entrado na sua vida, Nicolas poderia ser apenas um capitão de um time e um melhor amigo sonolento. Não precisaria se preocupar com um alfa.

Não precisaria se esconder.

Não precisaria se controlar.

Poderia ser ele mesmo.

Por que... Tinha que morder Milles?

Balançando a cabeça para afastar os pensamentos, Nicolas enxugava o suor do rosto com o braço.

— Está bem? — Ouvira a voz de Gabriel em seu ouvido, e tudo o que pudera fazer fora concordar com a cabeça. — Fique perto de mim, capitão. Eu te acoberto.

Nicolas não tinha forças para brigar com Gabriel, apesar de saber que ele estava fazendo aquilo por Theodore. Concordando novamente o capitão permanecia perto dele, sentindo o seu cheiro envolver seu corpo escondendo a presença de um reles ômega.

Graças a ajuda do moreno, Nicolas conseguira se concentrar por alguns instantes e marcar mais pontos garantindo a ponta no placar. Na medida em que rodizio ocorria, sua cobertura fora perdida quando ficara afastado de Gabriel. A confusão retomava seus sentimentos junto da fúria.

— Que merda é essa? Dá pra se concentrar?

Olhos colados na bola.

Ignore a voz de Milles.

Por mais que ela seja excitante sussurrada e rouca, ignore.

Foi ele quem te deixou desse jeito. Foi ele quem ousara ir contra, mesmo sabendo que sofreria as consequências. Está sofrendo por culpa dele.

Ainda assim...

— Dá pra jogar comigo?

O olhar que Nicolas direcionara para Milles o calara de imediato. Não fazia a menor ideia de que tipo de rosto teria o próprio diabo, mas provavelmente seria tão apavorante quando a de Nicolas.

— Jogar com você? Ficar do teu lado já é um pesadelo.

— O quê?

— Você fede a garota ômega. — Rosnava Nicolas voltando a atenção ao jogo ao som do apito para o próximo rally.

Nicolas sentia Milles tentar acobertá-lo com o seu cheiro. Sem ter ideia se era algo consciente ou não, ele apenas fugia de Milles tentando entrar no campo de rastreio de Gabriel. Não apenas para receber o cheiro dele, mas também para formarem a dupla mais formidável do time e marcarem pontos.

Mas toda vez que sentia o cheiro de Milles na quadra, os instintos do ômega berravam para ir até ele. Sua cabeça parecia rachar ao meio, principalmente quando trombava com o alfa sem querer e sentia o cheiro de outra pessoa nele. A fúria aumentava com aquele detalhe. A vontade de brigar fisicamente com o alfa ou de culpá-lo por alguma coisa se tornavam presentes.

Que merda de sentimento era aquele?

— Hahaha, parece que o Gabriel está te traindo com o capitão, hein Milles — Brincava um dos jogadores ao celebrarem mais um ponto.

Traição.

Paralisado na quadra com os olhos arregalados, o ômega se dava conta daquele sentimento extremamente repulsivo.

Nicolas se sentia traído.

Ah...

O que era aquilo?

Parecia borbulhar dentro de si.

Os punhos cerrados e a força que acumulavam em suas pernas. Nicolas simplesmente explodira no primeiro set. Jogara tão bem que até mesmo a torcida se assustara com sua presença. A quadra parecia pegar fogo com sua presença, e Gabriel tivera se esforçar muito para acompanhar aquela agilidade.

O capitão do time parecia ser o diabo transformando aquela quadra no inferno. Usando cada gota de sua raiva em seus ataques e ignorando por completo Milles com seus cheiros. Mesmo que sua cabeça doesse, mesmo que seus instintos fossem contra ele, Nicolas não se dera por vencido.

Com o final do primeiro set, os times foram descansar alguns minutos. Nicolas bebera água sem dar coragem para o melhor amigo tentar conversar com ele. Também não se aproximara do time para ouvir o técnico. Apenas apoiou-se nos joelhos fechando os olhos brigando consigo mesmo por ter feito da própria vida um caos.

E o mesmo ritmo do primeiro set se alastrou ao segundo. Nicolas carregou todo o time em suas costas. Mesmo pingando de suor, tendo seu cheiro escapando, recebera a cobertura de Gabriel repudiando por completo o alfa que seus instintos desejavam.

Em meio ao que ficou conhecido como a partida infernal, o time de Nicolas garantira a vaga nas quartas de finais.

Respirando ofegante, o ômega fechara os olhos jogando a cabeça para trás ao final do set. Seus pulmões ardiam tentando recuperar o ar perdido. As pernas formigavam, mas a sensação era como uma droga.

— Por que está fazendo isso? — Ouvira a voz rouca de Milles lhe dizer. Nicolas não se movera, apenas respirara fundo tentando manter-se no controle. — Por que está se escondendo nele ao invés em mim?

Não respondera.

Milles bagunçava os cabelos olhando em volta antes de voltar a sussurrar com o capitão.

— Que tipo de jogo você está fazendo comigo, Nicolas? Não disse que assumiria a responsabilidade? Então por que caralhos está se escondendo no cheiro do Gabriel?

Ah... Fora possível ouvir o som da última gota caindo sobre um cálice transbordante. Nicolas abrira os olhos imediatamente e segurara a nuca de Milles agressivamente, o forçando a se curvar. Contendo a exasperação, o capitão arrastava o alfa entre os jogadores do seu time arrancando olhares curiosos, mas sem que ninguém ousasse discutir.

Arrastara Milles afundando os dedos em sua nuca quente. Queria esganá-lo. Queria entrar em uma briga física até que toda aquela angústia se esvaísse. Detestara jogar naquelas condições, apesar de ter sido gloriosa a sua vitória.

Em algum corredor vazio onde pudessem conversar, Nicolas empurrara Milles pela nuca o soltando, observando-o arrumar a postura e encará-lo furiosamente. Dando alguns passos até ficar diante dele, agarrou seu uniforme o forçando, mais uma vez, a se abaixar novamente.

Era daquela maneira que Nicolas o faria se rebaixar perante sua presença.

— O que foi, grandalhão de bosta? A cocotinha não te satisfez? Por acaso a garota é ruim de boca e você veio me procurar com o rabo entre as pernas?

Milles espreitava os olhos castanhos para o capitão, soltando um riso nasalado.

— Posso te garantir que o beijo da gata foi muito bom.

— Bancando o machão justo agora? Quando não teve coragem alguma pra me dizer que foi mordido por mim, seu covarde.

Novamente Nicolas enxergava aquela pequena ponta de dor nos olhos castanhos de Milles. Fora um tormento afastar os seus instintos de afastar aquela sombra sentimental do alfa. Não retrocederia. Ele também estava sofrendo por causa daquilo.

— Ah, agora você sabe o que fez. Que memória conveniente a sua, não é capitão? Justo agora que eu estava prestes a fingir que nada aconteceu também, e cada um poderia seguir a sua vida. — Retrucava o alfa exasperado — Mas você insiste em foder comigo! Por acaso é algum jogo seu, seu bosta?

— É claro, faz parte do meu jogo querer te morder e foder com minha vida ao atar contigo. Por que não desgraçar minha vida desse jeito? O tanto quanto você me odeia, pode apostar que é recíproco.

Milles empurrara Nicolas o suficiente para ser liberto e ganhar distância. No entanto, o ômega não estava disposto a terminar a discussão ali mesmo. Mesmo que a mordida o avisasse que o alfa buscava se acalmar, Nicolas não o deixaria esfriar a cabeça. Não quando a dele estava ficando cada vez mais bagunçada por causa dos sentimentos.

— Então, você não tem coragem pra dizer que te mordi, mas tem a cara de pau de enfiar sua língua na boca de outra pessoa e ainda vir me encher a porra do saco sobre eu ser protegido por Gabriel e não por você?

— Infelizmente não tenho como controlar certas coisas graças a você, Nicolas. O alfa que há em mim que quer te proteger, não eu.

— Faz um favor de mandar o seu alfa, e você também, irem se fuder. Quase fiquei no banco por causa da merda que você fez, Milles.

— O que eu fiz? Acho que quem não tá entendo as coisas é você, seu bosta. — Rosnava Milles, aproximando-se ameaçadoramente de Nicolas. — Porque aquela garota era bonita pra caralho, beijava bem e ainda assim não consegui continuar por causa da maldita ligação que você criou comigo. Se você sofreu com isso, é o que merece.

Certo.

Fora ele quem baixara a guarda e mordera Milles. Já havia prometido ao alfa que assumiria a responsabilidade de sua dor, apesar de na hora nem saber do que se tratava. Ele desejava tanto assim se libertar dele? Chegaria aquele ponto só pra se livrar?

Milles o odiava tanto assim?

Com um aperto no coração, Nicolas aceitava as suas consequências.

Dando um passo para trás e apontando para trás, Nicolas arqueava a sobrancelha.

— Então vá e procure por ela. Eu disse que assumiria a responsabilidade por ter tornando sua vida um inferno, não é? Então, seja lá o que essa maldita ligação for me causar toda vez que tocar outra pessoa, aceitarei calado. Já que eu mereço. Você não precisa se sentir culpado como agora. Só vá embora e não ouse olhar para trás.

Milles o encarava sem dizer absolutamente nada. E era tão estranho poder sentir que ele também estava nervoso. Maldita ligação. Maldita mordida. Maldito Nicolas.

Aquele jogo chegou longe demais.

Só não deveria ter alcançado tal ponto para admitir as coisas.

Tudo começara com uma provocação. Um jogo perigoso onde pudessem mostrar para outro o quão bons eles eram. Um jogo de ego apenas. Desde o momento em que sentira Milles ser sua alma gêmea, o jogo se perdera. Nicolas não conseguia ficar em paz, já que outra batalha estava sendo travada.

Dessa vez contra ele próprio.

Desejar ou não.

Apaixonar ou não.

Declarar Milles como seu ou não.

Aproveitando a reação aturdida de Milles, Nicolas voltara a se aproximar do mais alto. Estendendo a mão para tirar o curativo de seu ombro direito com brutalidade, o ômega o puxara pela nuca novamente o curvando em sua direção sem deixar de encarar seus olhos.

— Agora, se você ficar então terá de lidar com a realidade. Eu sou o seu ômega e você é o meu alfa, Milles Mckenzie. Qual é a sua decisão?