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Mamãe

A sala da coordenação já estava se tornando um cômodo de visitas para aqueles dois híbridos. Não fora uma e nem duas vezes que Nicolas e Milles iam para aquele lugar depois de terem brigado. Contudo, era surpreendente terem sido chamados para uma coversa particular justamente em um sábado, quando dali alguns minutos o time de Montreal fosse viajar para jogar.

Toda essa estranha cena perdia para o olhar intenso que a mulher lançava para Nicolas, que nem ousava retribuir o olhar.

Milles não conseguia não se sentir desconfortável naquele silêncio absoluto, como se aqueles dois conversassem telepaticamente o excluindo. Deveria dizer alguma coisa? Por que ela parecia tão brava?

Por fim, a coordenadora suspirava pesado levantando-se da cadeira dando a volta na mesa para se encostar na mesma, permanecendo de frente aos meninos.

— Muito bem, por onde devo começar? Ah, acho que sei — Murmurava ela coçando o queixo, arregalando os olhos ameaçadoramente para Nicolas. — Que merda você tem na cabeça pra fazer a escola de motel, Nicolas?

Arregalando os olhos e boquiaberto, Milles chegara a petrificar na cadeira quando a coordenadora falara com o ômega daquela maneira. Ou se surpreendia ainda mais em notar o dito cujo sorrir ladino e retribuir o olhar da mulher como se a desafiasse.

— Pensei que continuaria a insistir na bizarrice de uma briga. Sério que acreditaram nessa besteira de arrancar um cano da ducha pra brigar, sendo que estamos bem?

— Então eu deveria ligar pro diretor e dizer que na verdade foram dois estudantes que fizeram sexo ao ponto de trazer prejuízos pra escola?

Mordendo os lábios, Milles cruzava os braços se encolhendo na cadeira sem ousar dizer uma única palavra naquela discussão. A coordenadora de cabelos escuros cacheados tinha uma aura tão intensa e feroz parecida com a do capitão.

— Já fui suspenso, você lidou com a situação... Precisamos mesmo ter essa conversa?

— É claro. Além disso... — Lentamente a mulher virou a cabeça na direção de Milles, que sobressaltou na cadeira ainda sem ousar dizer alguma coisa. — Com ele? Justamente com ele?

— Fico tão chocado quanto você de saber que desci meu nível.

— Epa, como assim desceu de nível? — Resmungava o alfa franzindo a testa para Nicolas. — Não lembro de você reclamando na hora.

Nicolas revirara os olhos quando a coordenadora arqueara a sobrancelha em sua direção.

— Tá bom. Transei com um Mckenzie no vestiário da escola, porque um cara do time falou bosta e eu fiquei puto.

— Adoraria que as coisas se resolvessem desse jeito. Estou brava, vou dormir com alguém. Estou cansada, vou dormir com alguém. Estou com fome, vou ali dormir com alguém. — Insinuava a mulher exasperada. — Nicolas, eu estou fazendo o meu melhor pra segurar as pontas nessa escola e você não está colaborando.

— Não é como se eu quisesse que as coisas acabassem assim! — Reclamava o ômega se ajeitando na cadeira fazendo uma careta — Eu tô tentando assumir a responsabilidade por aqui.

— Assumir responsabilidade do quê? — Perguntara a mulher tornando a espreitar os olhos para o ômega. Dando-se conta de ter falado demais, Nicolas comprimia os lábios balançando a cabeça se negando a dizer. Porém, o olhar furioso da coordenadora era mais horripilante quando acompanhada da voz sussurrada e lenta. — Nicolas Howard, o que você fez?

Nicolas nada dissera além de apontar o queixo em direção de Milles. O alfa que permanecia quieto sem compreender a interação entre eles sentira uma súbita necessidade de fugir. Fugir pela própria vida. A coordenadora virou-se para ele com aqueles mesmos olhos cerrados para Milles, tão afiadas quanto uma faca de açougueiro.

— O que vocês fizeram?

— Professora não fizemos nada demais.

— Cala a boca que tu não vai tapear ela — Reclamava Nicolas em um suspiro. — Eu mordi ele.

Milles vira a cor sumir do rosto da coordenadora, e ele sentira que talvez sua própria face também tivesse pálida. Por que raios Nicolas estava falando aquelas coisas para um dos professores? Ainda mais uma coordenadora? Estaria ficando maluco?

A mulher negava com a cabeça, e Nicolas estendera o braço puxando a gola da camisa de Milles o suficiente para mostrar o ombro direito onde havia a mordida. Agora que era comprovada a ligação entre eles, a mulher se sentara sobre a mesa fechando os olhos.

— Agora estamos ferrados. Definitivamente estamos ferrados.

— Não se ninguém descobrir.

— Você fica quieto — Resmungava a mulher entredentes para Nicolas.

— Ahn... Acho que estou sem entender o que tá rolando aqui. — Sussurrara o alfa inclinando-se na direção de Nicolas.

Nicolas apoiou-se no braço da cadeira olhando seriamente para Milles, sussurrando de volta.

— Mamãe.

— Mamãe?

Nicolas assentira lentamente, virando-se para a coordenadora que acariciava as têmporas. Levara dois minutos para o alfa arregalar os olhos e arrumar a postura na cadeira se sentindo subitamente nervoso. O que para o seu capitão fora uma cena divertida de ser assistida.

Como não sabia daquilo? Seus pais não faziam parte do conselho por doarem dinheiro à escola? Deveriam saber que a coordenadora seria a mãe de Nicolas. Quanta besteira, ele estaria ficando cego por acaso? Os dois tinham temperamentos idênticos.

— Eu não sabia...

— É claro que não sabia. Faço questão de esconder isso, pra ninguém me encher o saco.

— Quietos vocês dois. — Pedia a mulher depois de soltar um longo suspiro. — Muito bem, não adianta chorar pelo leite derramado. Apenas me digam que não ficaram atados ontem a noite.

— Não, estamos livres.

— Ótimo. — Mordendo o lábio inferior, a coordenadora cruzara as pernas olhando diretamente para Milles — Os dois estão terminantemente proibidos de fazerem qualquer coisa sexual dentro da escola. Vou acobertar dessa vez porque é emergencial e vou fingir demência.

— E se eu precisar dele? Tipo, o que aconteceu ontem foi mais ou menos por esse motivo...

— Prefiro que façam isso em casa. — Dizia a mulher suspirando. — A sua família sabe de alguma coisa?

Milles apenas balançara a cabeça negando, ainda aturdido pela recém descoberta. Pelo amor de Pelé, a coordenadora tinha a mesma presença ameaçadora que Nicolas, e Milles estava apavorado de estar conhecendo ela daquela maneira.

Era a sua sogra?

Deveria chamá-la assim?

Afinal, estava em um tipo de relacionamento com Nicolas. Ou não?

— Já que sua família não sabe, Milles, então abro as portas da minha casa para esconder vocês. Mas saibam que estou colocando o meu emprego em risco.

— Vou ser cuidadoso, eu prometo. — Acalmara Nicolas.

Talvez o que fosse ainda mais impressionante não seria apenas a descoberta do parentesco de Nicolas, mas do tom acalentador em sua voz. Estaria aquele ômega tentando acalmar a própria mãe?

— Uau, você sabe falar sem rosnar. Estou impressionado.

— Se eu não estivesse desse jeito, eu já tinha te matado à tempos.

— Então tudo o que eu preciso fazer é não te deixar andar pra manter minha vida a salvo?

— Não sou paga pra aguentar isso — Suspirava a mulher descendo da mesa. — E usem camisinhas, se eu souber que você engravidou Nicolas... Sabe o que te aguarda.

— Já disse que ele não ficou atado em mim!

Batidas na porta encerraram a conversa, e ao surgir a figura do professor Marcos temeroso.

— Licença, queria conversar com o Howard... Ele já está liberado?

A coordenadora suspirava baixo concordando com a cabeça, estendendo o braço para ajudar Nicolas a se levantar e ir até a porta. Mas rapidamente ela fechara a porta, virando a cabeça sobre o ombro fitando ameaçadoramente Milles.

Pela primeira vez na vida o alfa se sentia pressionado por algum adulto. Chegava a engolir em seco receoso de que a mãe da sua alma gêmea pudesse ter tido uma péssima primeira impressão. Bem.. A conhecia desde que começara a estudar por lá, então ela saberia de suas aventuras...oh céus, ela saberia.

Saberia que Milles era conhecido por ser galinha, briguento, de nunca ter respeitado Theodore e Nicolas.

Seria um milagre ela não ter péssimas impressões a seu respeito.

— Milles, preciso te pedir um favor.

— C-Claro! — Sorria nervoso o alfa.

— Cuide do Nico. — Pedira a mulher ao se aproximar do alfa e sorrir ternamente.

— Ahn?

— Já que vocês estão nessa situação, estou te pedindo pra que cuide do meu filho. Fique do lado dele e jamais solte sua mão, em hipótese alguma.

O pedido claro e desesperado de uma mãe. Milles já tinha ouvido falar sobre Nicolas morar somente com a mãe, mas não fazia a menor ideia de como era a sua vida familiar. Quer dizer, não até então. Tão surpreendente quanto descobrir que a coordenadora era sua mãe, seria ouvir um pedido daqueles.

Súplica, preocupação e confiança. Aquela mulher estava confiando nele só por saber que Nicolas havia o mordido. Se não fosse o caso, pouco provavelmente lhe confidenciaria um pedido daqueles.

Contudo, Milles já havia provado que uma pequena parte de si protegeria Nicolas independente do pedido. Aquela mesma pequena parte que ansiara tirá-lo daquele furacão emocional no dia anterior, o obrigando a caminhar na direção de sua alma gêmea.

Definitivamente era um caminho sem volta.

— Eu prometo.