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Fera domada

Era a primeira vez que alunos eram chamados para a diretoria por causa de uma confusão. De certo fora necessário, principalmente quando vários estudantes estariam envolvidos. A figura da diretora, uma mulher robusta com maquiagem pesada, assustava os mais jovens. O modo como ela os observavam era como se fosse capaz de analisar suas almas e descobrir todos os pecados, até das vidas passadas.

Milles também sentira medo quando a vira passar pelo corredor acompanhada das duas professores coordenadoras, e entraram na sala fechando a porta. Diferente de Nicolas e Sadie, o alfa não fora chamado. Ainda assim permanecera no corredor em frente à sala da diretora esperando.

Recriminava-se por ter permanecido no lugar quando vira Nicolas se enfurecer. De novo. Todas as vezes que aquilo acontecia, Milles se tornava incapaz de ajudar o seu ômega. Suas pernas se transformavam em chumbo o impedindo de caminhar até ele e acalmá-lo.

Apesar de que dessa vez a situação era ainda mais complicada.

Sua irmã estava envolvida. Ela quisera expor Nicolas na frente de toda a escola, o que não dera muito certo. Milles soltava um riso baixo. Quem seria capaz de ir contra aquele maldito baixinho? Quer dizer, ele nunca se deixava abater por merdas como aquela. Não importava se era um alfa, um beta ou um ômega, homem ou mulher. Nada disso importava, porque Nicolas Howard jamais permitiria que alguém ficasse acima dele lhe dando ordens.

Esse era um dos motivos pelo qual Milles se apaixonara por ele.

Desde o momento em que se morderam, quando a relação deles começara mesmo que tortuosa, Milles vira diferentes faces de Nicolas. Já o vira corar de vergonha, sorrir para si, rir consigo, se preocupar, e chorar. Desvendar cada pedaço daquele ômega era uma diversão que o alfa começara a ter desde que eles começaram aquela relação tão estranha.

Mas seu coração continuava a bater acelerado. Pois ainda não havia superado o que acontecera antes das aulas. Nunca imaginaria a capacidade de Nicolas dizer na frente de toda a escola que gostava dele.

Não.

Que o amava.

E ainda chorar.

Quando seus olhos haviam se encontrado naquele momento, Milles tivera a certeza mais profunda daquilo que já sabia. Eles haviam caído um para o outro juntos, era fato. Desde o momento em que fora beijado na quadra, o coração de Milles já pertenceria a Nicolas. Precisou todo aquele tempo e dramaticidade para sentir isso.

Com aquelas palavras, aquele olhar, aquela voz... Milles simplesmente tomara a decisão de jogar tudo para o ar. Estava se escondendo por achar ser o melhor. Não queria que Nicolas sofresse quando ele se formasse e não estivesse ali para protegê-lo. Sabia que enfrentaria um grande problema, mas por Nicolas tudo valeria a pena.

Encostando a cabeça na parede, o alfa suspirava preocupado. Fechara os olhos os apertando sem saber o que fazer. Sua irmã havia arrumado uma baita encrenca, e sabe-se lá o porquê. Dissera tantas vezes para ela não bater de frente com o capitão, tornando a situação ainda mais lamentável.

Abrindo os olhos quando a porta fora aberta, minutos depois, o alfa observava os alunos deixando a sala da diretoria. Lilian acompanhada do ômega da sua sala, e então finalmente Nicolas e Sadie. Nenhum deles falaram alguma coisa, a garota apenas o olhara antes de lhe dar as costas seguindo pelo corredor.

Assistindo a sua irmã o ignorar causara um certo desconforto. Deveria ir conversar com ela e esclarecer a situação? Ou deveria deixá-la sozinha?

— Deixa ela ir — Dissera Nicolas, como se pudesse ler os seus pensamentos. Virando-se para o baixinho, Milles percebia a seriedade transmitida naqueles buracos negros — É melhor você se preparar, grandalhão. A diretoria vai fazer uma reunião com os pais.

— Fodeu legal. Mas é algo tão grande assim ao ponto de chamar os pais?

— Sua irmã e o Thunder invadiram a sala da diretoria pra puxar a minha ficha escolar. Os imbecis nem sabiam que estavam sendo filmados pelas câmeras de seguranças. De qualquer forma, por eu ter ameaçado ela, vão querer falar com a minha mãe também.

Engolindo em seco, Milles suspirava voltando a assistir a irmã já longe no corredor. Segurando a mão do ômega, o loiro virou-se o puxando para direção contrária onde deveriam ir para o ginásio.

Porém, em passos lentos.

— Recebeu algum castigo?

— Ainda não. Vou saber só depois da reunião com os pais. — Murmurava Nicolas olhando pra baixo. — Caralho, não queria meter minha mãe nesse rolo.

— Não foi culpa sua, e ela sabe disso.

— Isso não significa que a diretora não vá brigar com ela. Ou sei lá! Vão pensar que ela tem me acobertado.

— Sua mãe não fez isso, ela te deu uma suspensão seguindo as regras da escola.

Os dois pararam de caminhar quando viram outro casal parado os esperando. O olhar tristonho de Theodore fora de encontro com eles dois, tendo Nicolas suspirado ao abrir os braços e receber o melhor amigo neles.

— Nico, como está? Hm? Tiveram algum problema?

— Eu que deveria perguntar. Você está bem? Tá sentindo alguma coisa? Não se machucou?

— Estamos bem, não há com o quê se preocupar.

— Foi mal, Theo. Minha irmã te empurrou daquele jeito poderia ter machucado você e o...

— Tudo bem, Milles. Esses dias eu também cai de bunda no chão por ter escorregado no lego da Lisa.

Gabriel abraçara o namorado por trás deixando as mãos sobre a barriga de Theodore, sorrindo como um cavaleiro.

— Nosso ovinho está bem. — Ria o alfa olhando para os dois amigos com certa preocupação. — Como se sentem agora que a relação está exposta?

Milles olhara de canto para Nicolas, que parecia repentinamente mais cansado. Como esperado, ele teria usado muita energia pra manter a cabeça erguida naquela discussão. Provavelmente ele fosse dormir por horas mais tarde. Deixando a mão sobre sua cabeça, teve os olhos cansados virando-se para si lentamente.

— Aliviado.

— Eu sei que vocês estão passando por uma situação complicada, mas o professor Marcos está esperando vocês para o treino. — Avisava Theodore.

Ir para o treino era como seguir em frente. Fariam as mesmas coisas de sempre, sem comentar absolutamente nada. Pelo menos era que Milles esperava. Ter exposto sua relação significava apenas que ele e Nicolas estavam juntos. Provavelmente irritaria o baixinho com alguma coisa, ele o xingaria e tudo voltaria ao normal.

Ninguém os tratariam diferentes.

Apesar de tudo isso, o que mais preocupava Milles não era nem o treino.

Uma história estava prestes a se repetir, e dessa vez seria ele a lidar com o problema.

Enquanto se dirigiam para o ginásio, ficando bem mais atrás do casal, Nicolas olhara de canto para Milles segurando seu braço o impedindo de continuar a caminhar. O alfa estava perdido em pensamentos tendo uma fisionomia tão séria, que nem combinava consigo. A mordida fazia o seu trabalho em avisar sobre a preocupação do alfa. Tendo os olhos castanhos sobre os seus, o ômega logo o avisara.

— Enquanto estivermos treinando, provavelmente a reunião com os pais já estará acontecendo. Se quiser, pode ficar lá em casa por um tempo.

Abrindo um sorriso de canto, o alfa bagunçava os cabelos do ômega.

— Relaxa, se eu precisar de algo você vai saber, não é?

Nicolas assentira com a cabeça tornando a caminhar na frente. Observando-o de costas, Milles se dava conta que aquele baixinho tinha uma coragem três vezes mais alta que ele. Deveria se deixar inspirar por seu ômega. Perto dele, parecia tão patético.

Quando os meninos entraram no ginásio eles se tornaram alvos de questionamentos e mais questionamentos. A curiosidade sobre quando tudo aquilo havia começado e como poderiam ter enganado a todos era o prato principal daqueles jogadores. Mesmo que o segredo à respeito da classe de Nicolas tivesse sido revelado, nenhum jogador ousara brincar com ele.

A preocupação fora engolida e o mau humor se tornara aparente. Enquanto treinavam cortes e bloqueios dividindo os meninos em dois times, Nicolas externalizara a sua raiva em força. Seus cortes eram fortes, precisos e rápidos como sempre eram quando ele tinha raiva acumulada. Gabriel suara a camisa para acompanhá-lo.

O treinador voltara a dividir os meninos em dois times para uma partida treino. Milles e Nicolas ficaram em times opostos e não demorara para que o alfa notasse ser alvo dos cortes do ômega. Inicialmente ignorara, mas com o passar da partida ele começara a ficar com raiva ao ponto de gritar.

— Ei, seu tampinha de bosta! Tá querendo arrumar briga é? Por que tá mirando em mim?

— Um poste gigante como você é como um alvo. Deveria melhorar sua recepção. Aceita o conselho.

Uma veia saltara na testa do alfa.

— Eu vou jogar essa bola na tua fuça, vai ver só!

— Então comece a levar a sério logo, to cansado de esperar você melhorar esse teu jogo.

E o bate boca logo recomeçara. Gabriel segurava a bola debaixo do braço assistindo aquilo junto dos demais meninos do time, que não pareciam tão surpresos.

— Tem certeza que eles estão juntos? Tipo... não parece.

— É assim o tempo todo, acredite. — Confirmava Gabriel com um suspiro.

— Não é como aquele ditado, amor e ódio andam de mãos dadas?

Uma segunda bola fora jogada na direção dos meninos, dispersando da conversa.

— Tão cochichando o quê aí? Entrem nessa maldita quadra pra eu acabar com a raça de vocês!

— Uau, ele tá bravo. — Dizia Sam.

— Salvem-se quem puder! A fera tá solta! — Gritava, sem emoção alguma, Boyle.

Passando por debaixo da rede segurando o queixo do ômega, Milles virara o seu rosto e selava seus lábios demoradamente. Sem se importar com a reação dos demais, que não ficaram surpresos, e muito menos com as represálias do técnico, que conversava concentrado com Theodore sobre alguma coisa.

Assim que afastou-se do ômega, Milles abria um largo sorriso em notar o rubor em suas bochechas e o silêncio.

— Isso mesmo, quietinho como um bom garoto.

Enquanto olhava para Milles retomar sua posição em quadra, o restante dos meninos suspiravam pesadamente.

— Ele foi realmente domado.

— Dominado, tá tudo dominado! — Cantava outro jogador, antes de ser alvejado por uma bola que batera em sua cabeça tão repentinamente.

Melhor do que esperavam, o time aceitara bem a relação deles. Provavelmente por acharem divertido acompanhar as brigas deles, o que mostrava não terem mudado muita coisa, e também por notarem que Nicolas fora dominado por aquele alfa.