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As Criaturas do Vale do Abismo

Uma série de contos sobrenaturais curtos das criaturas mais fétidas e terríveis que habitam o Vale do Abismo.

Danrley_Araujo · Horror
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4 Chs

Conto III - Filho do Diabo

Baseado em fatos reais. (devido aos direitos e proteção dos envolvidos, optei por mudar nomes e localização da historia real, porém, isso não irá interferir nas diretrizes e narrativa aqui apresentadas)

Sertão nordestino, década de 40.

Em tempos de seca, uma família muito humilde passava por severas necessidades tais como: dinheiro, moradia e afins. João marido de Tereza, era um feirante humilde e muito devoto a Deus e nossa senhora. Rezava todos os dias pedindo proteção e benção a sua esposa. Tereza era uma mulher forte, dona de casa, buscava água em poço, pescava e sempre que lhe restara tempo, ajudava João em suas vendas.

Moravam apenas os dois em uma casa de sapê naquele sertão escaldante. Embora rezassem muito e pedissem aos santos e a Deus para ajudarem a sair daquela situação, os dias passavam e nada mudava.

Certo dia, João tentou buscar lugares novos para suas vendas e havia andado mais de 10km para poder armar sua barraca em um novo povoado, em busca de dias melhores. Ele vendia o que plantava em volta de sua casa. Nos primeiros dias a venda foi boa, vendeu mais do que havia conseguido em meses onde tinha seu ponto. Porém a vida prega peças, e quando estava perto de completar um mês naquele novo lugar (e planejando sua volta para buscar a amada), João foi assaltado por dois homens com armas brancas. Levaram todo seu dinheiro e produto de venda. João ficou extremamente revoltado, questionou a Deus: "Justo agora senhor?! Que estou conseguindo trabalhar, lutando para tirar Tereza daquela situação... Como o SENHOR permite isso?! O que o SENHOR tem contra minha pessoa? Eu nunca matei, roubei... apenas trabalhei!!!..." e soltou um grito de raiva naquela noite estrelada.

João se recuperou e ainda naquela noite decidiu por voltar a sua terra. Andou novamente 10km mesmo na madrugada com fome e sede, e movido pela revolta. Chegou em casa encontrou Tereza dormindo, que acordou com as batidas na porta.

- Vamos sair daqui agora! - Disse João revoltado e retirando as roupas dos aposentos.

- O que houve ? Conseguiu o dinheiro necessário? - Questionou Tereza, assustada.

- ELE está contra nós! Batalhei tanto durante esses 20 e poucos dias, vendi como nunca!... E perdi tudo para dois "cabras" armados... Onde está Deus querida?! Porque Ele permite essas coisas conosco? Vamos sair daqui, não merecemos essa vida! Vamos para a casa de meus irmãos e lá começaremos a vida novamente... Mas sem ELE!

- Eu não posso! Não conseguirei andar tanto... - Disse Tereza com um olhar baixo e olhos lacrimejantes.

- Oxi, como não? - Disse João.

Tereza passou a mão na barriga, ergueu os olhos e disse:

- Estou grávida.

João ficou ainda mais revoltado, esmurrou portas, mesas, quebrou poucos moveis que tinham conquistado com muito esforço. Saiu de casa e se embrenhou na mata que cercava sua casa, encontrou uma área limpa em meio ao arvoredo, sentou-se e ali ficou sozinho por horas questionando a Deus, culpando Deus.

Foi quando apareceu um velho. Um senhor de roupas humildes e jeito simples, estava a pé e carregava em uma das mãos uma sacola bem grande, repleta de esterco e na outra mão uma inchada. O velho vendo João sentado ali se aproximou e questionou:

- Porque choras filho ?

João de forma breve explicou-lhe tudo o que havia acontecido.

- Escute, as vezes na vida nem tudo é como nós queremos... E nem sempre o caminho mais difícil, é o correto! Atente-se. - Disse o velho com uma voz persuasiva.

João refletiu sobre aquelas palavras e disse:

- O que quer dizer com isso?

- Olhe para mim, um velho, ainda trabalho até hoje... colho esterco para vender e assim fiz minha vida. Vender esterco da dinheiro? A resposta é não! Mas eu consegui. - Contou-lhe.

- Como? Nessa minha situação e com um filho no ventre de minha esposa, aceito qualquer coisa, trabalhar com o senhor, vender para o senhor... Qualquer coisa! - Disse João desesperado.

- QUALQUER COISA? - Disse o velho

- SIM...

- Certo, certo... Lhe darei o dinheiro que precisa para sair daqui, mas terá de trabalhar como se nada houvesse acontecido. Muitas pessoas irão passar pela sua venda, será tão grande sua venda que lhe faltará hortaliças para suprir. Pode buscar sempre em minha fazenda que está a 2km ao norte. Mas em troca seu filho será um menino e receberá o nome de Cipriano, não se esqueça, quero a criança que Tereza está gerando.

Aquilo mexeu com a cabeça de João, que no meio da revolta e desespero... aceitou. O velho foi embora e João retornou para a casa e não contou nada a Tereza.

No dia seguinte ele armou sua velha barraca em frente a sua casa, e a cada 1 hora, em media de dez pessoas passavam por ali e compravam suas hortaliças. No fim do dia chegava na porteira da fazenda do velho, e já estavam lá apenas as melhores hortaliças que já vira. E Nunca mais havia visto aquele senhor.

Passado 4 meses, suas vendas cresceram de forma assustadora, forçando Tereza a montar outra barraca para ajudar. Com 5 meses compram moveis melhores, e um pequeno enxoval. Com 6 meses planejavam sair dali. Com 7 meses saíram e se mudaram para aquele mesmo povoado onde havia perdido tudo. La havia médico para cuidar do bebê e apoio de amigos e familiares. Com 9 meses a criança nasceu e recebeu o nome Luiz Cipriano. João se lembrara da divida, e no momento do parto trouxe um padre para abençoar a criança. O Padre estranhou o nome mas não negou o pedido.

Passou o tempo, João teve um sucesso enorme nesse povoado, sua barraca agora se tornou uma grande e bela quitanda , a maior da região com os melhores fornecedores de frutas, legumes, e até mesmo suco e salgados. João se tornou um dos homens mais influentes e poderosos da região. Até que certa noite, quando João estava com Luiz Cipriano no colo em sua varanda no sobrado de sua casa, avistou um cavalo branco vindo pela rua... O cavalo era certamente o mais belo e imponente que já vira. Sua cela havia diamantes e pedras valiosas cravadas, os adornos do cavalo eram de ouro. Sobre ele montava um homem, de boa aparência, com dentes de ouro, roupa social branca, de luxo e empunhava um cajado com esmeralda na ponta. O homem sobre o cavalo parou em frente a casa de João, olhou para cima e disse:

- Está lembrado de mim João?

João negou, mudo.

- Vim buscar o que me deve! - Disse o senhor em voz alta, mas calmo.

João segurou firme Luiz em seus braços e entrou correndo para a casa, trancou todas as portas e pediu para que Tereza se escondesse e jamais abrisse a porta, e orou muito. O senhor insistiu em bater seu cajado na porta da casa, mas João não abriu. Passado uma hora, João observou que estava tudo silencioso novamente e não havia mais ninguém, tomou coragem e foi até a porta, notou que havia um bilhete, abriu e leu para si:

"Eu entendo seu medo. Mas se não for ele, será você E ELE"

João foi encontrado morto, sem os olhos e boca amarrada, próximo a um rio pouco tempo depois, e até hoje não se sabe o verdadeiro motivo da causa, apenas que ele ainda era novo quando veio a óbito. Luiz é vivo até hoje e ainda toca o estabelecimento. Tereza criou mais dois filhos e veio a falecer recentemente.

Lembrando que se trata de uma historia real, e o nome e local dos envolvidos foram preservados.