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02

Só ocorreu na primeira vez que foi sozinho que pudesse ser atacado por um leão da montanha, um lobo desgarrado de sua matilha, ou se tivesse muito azar, como sentia medo  por um urso, um urso negro. E como se azar fosse uma resposta de uma charada a mente de Darwin projetou uma criatura mais perigosa que um animal com garras, que pode atacar em bando e ainda por cima pode atingir mais de dois metro de pé, foi além do possível e cogitou o irreal. Desenhou um humanoide tão alto quanto uma pequena árvore, cheia de músculos e pouco cérebro, um tacape enorme pendendo de uma das mãos, com uma par de caninos sobressaindo da mandíbula e pra fora da boca,  com uma protuberante barriga que não se encaixava com os braços vertendo veias e fibras. Um orc. Sabia que pro fim da colheita e no cair do solstício de inverno uma ou outra dessas criaturas aparecia em busca de caça, e muito raramente se aproximava da aldeia. Lembrou que seu pai hoje um mineiro, o primeiro a entra e o ultimo a sair, já fora um guarda, mas não se acostumará a vida pacata e ao salario estável. Não era do seu feitio ser um caçador de escravos fujões ou um capataz dos camponeses a serviços dos nobres da região, que de fato um soldado.

 

"Nunca vou trocar a espada pela chibata" era o que dizia toda vez que respondia ao filho a mesma pergunta corriqueira: "Por que trocará de trabalho?" e a resposta vinha simples, como se esperasse a questão: "É uma oferta justa trocar uma arma por outra" Dizia descendo a picareta contra rocha atrás de ouro, joias ou qualquer mineiro precioso.

 

Essa frase parecia estranha a Darwin todas as vezes, os escravos iam com desgostos as minas, os mais esperançosos atrás de um achado que pudesse mudar o rumo de suas vidas ou famílias, os condenados de uma fortuna para diluir um pouco de sua sentença, e o seu pai contra tudo e todos pelo prazer de um bom trabalho. Parecia não se importar com a sua vida, nem com a do filho, ou como essa pequena alegria poderia acabar com um corriqueiro  desabamento ou com o bloqueio de um túnel de ar mal projetado. Só havia a frase ecoando em sua mente toda vez que seu pai lhe dava um beijo de despedida na testa, embora estivesse ficando velho pra isso.

 

"Quando você achar o que ama meu filho nunca solte, não deixa que seja como areia escoando entre os seus dedos, mesmo que pareça ser como o vento não deixe passar, não desista, simplesmente agarre com todas as suas forças. Mas se for uma mulher, tome cuidado, pela certa você dará sua vida e será recompensado com felicidade, já a errada você venderá sua alma e ainda não terá feito o suficiente. – Soltou o homem enfiando mais um trago do destilado goela a baixo."

 

 

Ao lado de uma Ava mais exatamente três galhos abaixo dela, Darwin não era tão ousado para ficar tão próximo a copa e se havia uma coisa que seu pai tinha lhe ensinado era saber reconhecer os limites e aquele era um deles. A vista do sol transpondo as montanhas negras, derrubando luz sobre a floresta e expulsando vagorosamente a densa sombra sobre a aldeia, enquanto se fundia ao verde no longínquo distante, era de tirar o fôlego. Os olhos subiam pro céu denso azul, negro, onde o sol fazia perder alguns tons e as estrelas. Isso o fazia perceber sua pequinês, o quanto seus horizontes eram limitados pelo que ainda não podia e não conseguia ver, ou conceber em seus pensamentos, mas não se imagina longe de onde nascerá, podia ver seus filhos e netos crescendo e seguindo os seus passos se quisessem, ele por si mesmo não deixaria a aldeia, o seu ponto seguro. Seu lar.

 

- Eu nunca vou me cansar de vir aqui e ver o amanhecer. – Proferiu Ava o arrancado de seu devaneio, se encostando no último ramo da copa. Um galho fino, verde, e desfolhado que mal sustentava uma pena, que ela ousava escorar suas costas. – Só me arrependo de não ter te ouvido antes.

 

Darwin não ousou olhar pra cima, o vestido era com uma cortina ao sabor da brisa que podia revelar mais do queria ver e tudo que desejava. Por fim venceu a vontade e manteve os olhos fixos no horizonte.

 

- Você pode repensar a ideia de casamento. – Tentou ele sendo mais sutil do que desejava escondendo o comigo que se perdeu em algum canto da frase. – Já tive certo uma vez.

 

Ava fixou as ires densas nele, como se fitasse as folhas marrons despencado das arvores cedo demais. Por um longo segundo, os cenhos franziram e a bochecha se contraiu para dentro. Ele soube que ela não estava irritada, não de fato irritada mais pensando sobre.

 

Uma parte dele duvidava que ela o escolheria. Existiam pretendentes mais bonitos, talentosos e mais ricos não só em toda aldeia mais em toda a região. E ainda havia os caçadores que não precisam de dinheiro para manter suas vidas, caçando pra sobreviver, curtindo couro e trocando por moedas ou mantimentos, do que precisassem, e ainda alguns eram contratados como batedores para perscrutar uma nova área de plantio ou perseguir escravos fugidos a muito tempo, ou alguém que sumiu sem pagar suas dividas.

 

Seria uma boa se ela se casasse com um deles, seria independente e não era raro encontra nesse ramo de profissão mulheres, seria o melhor pra Ava ficar com um deles e não com Darwin um simples camponês.

 

- Tem alguém caçando! – Gritou a garota por cima da brisa levemente gelada. – Mas errou o alvo e o cervo está  fugindo. - Apontou para um descampado ao leste.

 

- Deve ser o Izion que está aprendendo a caçar e a curtir couro com o Dissel. – Seguindo o dedo de Ava encontrou não um filhote mais um adulto com uma bela galhada preenchendo a cabeça. Um belo espécime. - Dissel nunca erra um alvo, já o vi ganhar uma posta de arremesso de faca completamente bêbado, e o melhor a mais de trinta passos de distância.

 

O homem mesmo de longe parecia alto, esguio, e a jaqueta marrom acinzentada parecia se fundir nas sombras das árvores, enquanto a calça escura se ajusta as rápidas passadas. O cervo foi para um lado e ele correu pro outro. Atrás deles duas formas vermelhas se projetam em meio a relva verde que os destaca, os tacapes pendiam as costas, em bainhadas de couro cru, e uma boleadeira preenche as mãos de um deles.