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A Crônica do Contador de Histórias

Após uma vida de poucas conquistas e repleta de arrependimentos, Vanitas recebe uma segunda chance ao reencarnar como um bebê em um mundo onde magia e espadas fazem parte do cotidiano. Determinado a deixar seu passado para trás, ele abraça essa nova chance, vivendo com uma trupe itinerante de artistas da corte. Entre apresentações e jornadas por novas terras, Vanitas aprimora seu talento nato para o alaúde, mas é na magia que seu verdadeiro poder desperta. Sob a tutela da poderosa Arcanista Marceline, ele mergulha nos segredos da simpatia, a arte mágica que, desde o início, acendeu seu desejo de invocar o vento. No entanto, o destino de Vanitas toma um rumo inesperado quando cruza caminho com o enigmático grupo Sombraim, cujos segredos ocultos trazem à tona verdades sombrias sobre o mundo e sobre sua própria reencarnação. Em busca de respostas, Vanitas parte em uma jornada por terras desconhecidas, onde cada nova descoberta o arrasta ainda mais profundamente para os segredos esquecidos da história. Ao longo do caminho ele encontra aliados improváveis, constrói amizades inquebráveis e se apaixona... mas o que realmente aguarda em seu destino é algo que supera tudo isso. Com a chance de mudar o mundo em suas mãos, Vanitas precisa decidir entre seguir o caminho das revelações ou se perder nos laços do amor e da amizade. O peso dessa escolha pode mudar para sempre o curso de sua vida — e a de todos ao seu redor.

porep · Fantasy
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88 Chs

LXXIV. FOLES PT.1

— Você esta diferente — observou Leif.

Alastor concordou com um grunhido.

— Eu me sinto diferente — admiti. — Bem, mas diferente.

Nós três íamos levantando poeira na estrada para Torrente. Era um dia quente e ensolarado, e não tínhamos motivo para pressa.

— Você parece... calmo — continuou Leif, passando a mão no cabelo. — Eu gostaria de me sentir tão calmo quanto você parece.

— Eu gostaria de me sentir tão calmo quanto pareço — resmunguei.

Leif se recusou a desistir:

— Você parece mais sólido — declarou, com uma careta. — Não. Parece... compacto.

— Compacto? — repeti. A tensão me obrigou a rir, o que me deixou mais relaxado. — Como é que alguém pode parecer compacto?

— Compacto, sei lá — fez ele, dando de ombros. — Feito uma mola enroscada.

— É o jeito de ele andar — disse Alastor, rompendo seu costumeiro silêncio pensativo. — Empertigado, com a cabeça erguida, os ombros levantados. — Fez um gesto vago para ilustrar suas colocações. — Quando ele pisa, o pé inteiro se apoia no chão. Não só a ponta, como se ele quisesse correr, ou o calcanhar, como se hesitasse. Ele anda com solidez, reivindicando o pedaço de chão para si.

Senti um embaraço momentâneo e tentei me observar, o que é sempre um esforço inútil.

Leif deu uma olhadela de esguelha para Alas:

— Alguém vem passando um bocado de tempo com o Ventriloquista, não é?

Alastor deu de ombros, sugerindo uma vaga concordância, e atirou uma pedra nas árvores à beira da estrada.

— Quem é esse Ventriloquista que vocês vivem mencionando? — indaguei, em parte para afastar a atenção de mim. — Estou quase morrendo de curiosidade terminal, sabiam?

— Se alguém pudesse morrer disso, seria você — comentou Alastor.

— Ele passa quase o tempo todo no Arquivo — disse Leif, hesitante, sabendo estar tocando num assunto delicado. — Seria difícil apresentá-lo a ele, já que... você sabe...

Chegamos à Ponte de Pedra, o antigo arco de pedras cinzentas que se elevava sobre o rio Ometh, entre a Academia e Torrente. Com mais de 60 metros de uma margem à outra e ultrapassando 18 metros no ponto mais alto do arco, a Ponte de Pedra tinha mais histórias e lendas do que qualquer outro marco da Academia.

— Cuspa para dar sorte — disse Alastor ao começarmos a subida por um lado, e seguiu seu próprio conselho. Leif o acompanhou, dando uma cusparada pela lateral com exuberância infantil.

Eu quase disse "sorte não tem nada a ver com isso", usando as palavras de Mestre Armin, severamente repetidas milhares de vezes na Iátrica. Saboreei-as por um minuto na ponta da língua, hesitei e, em vez de proferi-las, cuspi.

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A Foles ficava no coração de Torrente e suas portas da frente davam para a praça central da cidade, Calçada de Pedra. Havia bancos, algumas árvores floridas e uma fonte de mármore que borrifava água na estátua de um sátiro em perseguição a um grupo de ninfas seminuas, cuja tentativa de fuga parecia simbólica, se tanto. Pessoas bem-vestidas circulavam pela praça, quase um terço delas segurando algum tipo de instrumento musical. Contei pelo menos sete alaúdes. 

Ao nos aproximarmos da Foles, o porteiro levou a mão a seu chapéu de aba larga e se curvou numa saudação. Tinha pelo menos dois metros de altura, era musculoso e intensamente bronzeado.

— Será um iyane, meu jovem senhor. — Sorriu, e Alastor entregou-lhe uma moeda. Virou-se então para mim, com o mesmo sorriso ensolarado. Olhando para o estojo do alaúde que eu segurava, levantou uma sobrancelha.

— É bom ver uma cara nova. Conhece as regras?

Fiz que sim coma cabeça e lhe entreguei um iyane.

O homem se virou para o interior da taberna e apontou:

— Está vendo o bar? — indagou.

Era difícil não ver 15 metros sinuosos de mogno que se estendiam em curva até o fundo do salão.

— Viu onde aquela ponta vira em direção ao palco? — tornou a perguntar.

Fiz que sim.

— Está vendo o homem na banqueta? Se resolver tentar conseguir sua gaita-de-foles, é com ele que deve falar. Seu nome é Radagon.

Ambos desviamos o olhar do salão ao mesmo tempo. Suspendi mais o alaúde no ombro.

— Obrigado... — comecei, mas fiz uma pausa, sem saber seu nome.

— Droch — fez ele, tornando a dar seu sorriso tranquilo.

Fui tomado por um impulso repentino e estendi a mão.

— Droch significa "beber". Você me permite oferecer-lhe uma bebida mais tarde?

Ele passou um bom segundo olhando para mim, antes de dar uma risada. Foi um som alegre e incontido, que lhe saltou direto do peito. Deu-me um aperto de mão caloroso e respondeu:

— Ora, eu bem que aceitaria.

Soltou minha mão e olhou para trás de mim.

— Foi você que trouxe este aqui, Leif?

— Na verdade, foi ele que me trouxe — respondeu Leif, parecendo desconcertado por meu diálogo com o porteiro e segurança, embora eu não entendesse por quê. — Acho que ninguém pode realmente levá-lo a lugar nenhum — completou, entregando um iyane a Droch.

— Nisso eu posso acreditar — retrucou o homem. — Há alguma coisa nele que me agrada. Tem um certo jeito de elfo. Espero que toque para nós esta noite.

— Também espero — disse eu, e entramos.