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Capítulo 29 – Weenny: Aulas para os padrinhos

Quarta aula - Tema: Primeiras cerimônias e rituais do Shádi.

— Namaskar, sejam bem-vindos! Hoje vamos começar a falar sobre as cerimônias do shádi, sobre a sua importância e o significado eu já lhes disse ontem, mas cada cerimônia terá sua própria importância e significado e eu lhes explicarei, falarei também sobre como deverão agir durante elas.

Todos sorriem satisfeitos.

— Tenho aqui comigo toda a programação dos eventos, hei de detalhar um por um. Várias refeições vão intercalar os eventos, cafés da manhã, almoços e jantares. Recomendo que vocês padrinhos procurem interagir com os convidados, conversando e direcionando-os, já que vocês são as pessoas mais próximas aos noivos, além dos pais.

Todos concordam.

— O primeiro ritual ou cerimônia é a Roka ou Sagai. É o momento em que os pais dos futuros noivos declararão publicamente a intenção mútua nesse acordo para o casamento, é comum que as famílias hindus façam um casamento arranjado, portanto chamam esse acordo de aliança entre as famílias. A Roka é o momento em que as famílias vão solicitar ao Pandith ou sacerdote que faça o estudo astrológico dos futuros noivos para ver se eles combinam, também podem iniciar as propostas em relação ao dote que os pais da menina deverão pagar aos pais do menino. O Dulhan sempre será tratado como um príncipe ou como o deus Vishnu e a Dulhana como uma princesa ou como a deusa Lakshmi. Para selar essas intenções e propostas, a família da futura noiva deverá ir até a família do futuro noivo levando presentes para ele, esses presentes devem ser específicos, grãos, frutos secos, uma roupa nova, doce indiano e uma espada, simbolizando o desejo de fartura, felicidade, reconhecimento da sua força e beleza.

Reflito por um momento, será que vão pedir dote aos meus pais? Preciso perguntar para o Eros, ou vamos passar vergonha durante a cerimônia.

Pensando nesta explicação, realmente é muito bonito o ritual.

— Dote? Pagar alguém para se casar com a filha dele? - Guilherme pergunta.

— Nem se te pagassem milhões te obrigariam a casar. – Dani debocha e ele lhe dedica um olhar zangado.

— Sim, isso é o que manda a tradição, os casamentos devem acontecer entre pessoas da mesma casta, e o pai da menina faz um acordo com o pai do menino, esse acordo é intermediado pelo Pandith, tanto a lei quanto a tradição hindu exigem que seja pago um dote, que pode ser em dinheiro, joias, propriedades e até animais, isso demonstra o valor que os noivos têm e a honra de ambas as famílias.

Os homens riem e dizem que isso devia virar moda no Brasil. Os que são comprometidos são beliscados pelas namoradas, eu apenas rio discretamente.

— Guruji, e a Dulhana quando entra nesta cerimônia? – Carol pergunta.

Eu faço um sinal negativo, tentando dizer que não irei.

— A Dulhana não deve ir nesta cerimônia, não é auspicioso que ela entre na casa ou na presença dos futuros sogros neste momento.

Me sinto aliviada, confesso.

— Mas por quê? Como assim as famílias fazem um pedido de casamento e a noiva não vê com quem os pais querem que ela se case? Sei que com a Weenny é diferente, mas o Guru está explicando sobre essa cerimônia da forma tradicional também, não é? - Inconformada, Dani diz.

— Um pai sabe o que fará bem a sua filha, para escolher um bom homem deve-se decidir com a cabeça fria e sem a influência do coração, quando há amor ou paixão envolvidas nesta escolha, a chance de um erro é muito grande, afinal esses sentimentos costumam cegar a prudência, o juízo e o discernimento.

Todas as mulheres concordam verbalmente.

Guru nos pergunta se entendemos essa primeira cerimônia, afirmamos que sim e que não temos dúvidas.

A aula prossegue.

— Agora farei a introdução a um ritual que acontecerá várias vezes durante o shádi, são as pujas ou orações. Elas podem ser realizadas em templos, ruas, casas ou outros lugares próprios para esse culto. As pessoas se reúnem em dias específicos, montam altares com as estátuas dos deuses, fazem oferendas de todos os tipos, tais como, tecidos, água, frutas, alimentos diversos, flores, incensos, dentre outros. Vestem-se com cores discretas e poucas joias, as mulheres cobrem suas cabeças com o pallu, fazem as orações, acendem o fogo sagrado, fazem pedidos aos deuses e ao terminar tocam um sino. A intenção de iniciar uma cerimônia fazendo a puja é para que um deus seja invocado e ele garanta a proteção e o sucesso para o Shádi. Neste primeiro puja o deus a ser invocado é Vishnu.

Guru nos ensina as pujas e me faz montar um altar, afinal eu já sei por que já tive essa aula, além de que normalmente os noivos tem esse dever. Nós treinamos bastante até ficar decidido que meus padrinhos poderão fazer as pujas em silêncio ou em português, pela falta de domínio com o idioma nativo.

— O próximo ritual é o Samavartanam, tem um significado complexo e eu vou tentar deixá-lo o mais fácil possível. Na vida de um hindu existem fases importantes e uma delas envolverá esse ritual. Durante a infância o filho é entregue para um sacerdote para que ele ingresse nos estudos aprendendo tudo relacionado ao Dharma, ou seja, os princípios de uma vida justa e das responsabilidades consigo mesmo, com a família, a sociedade, a humanidade e para com deus. Nesta fase o menino é chamado de Brahmacharya porque é um estudante em busca do sagrado, do conhecimento e de deus. Esta fase de graduação dura em torno de doze anos e ao término deste período ocorre o ritual que gradua este estudante, esse ritual é chamado de Samavartanam e é feito diante de seu sacerdote e do fogo sagrado. Logo depois que completa o ritual, o indivíduo será chamado de Vidya-snataka, que significa aquele que foi banhado no conhecimento. O final dessa cerimônia contará com a grande decisão que todo homem deve tomar, o caminho que deseja seguir, se quer ser um Grihastha, que é a vida do homem casado e fiel ou se prefere ser um Sannyasi, que é um monge renunciante, então terá que viver sozinho, isolado e dependente da caridade das pessoas.

Nós entendemos a longa explicação, eu imagino que em todos os mistérios do meu Eros, ainda há esse aprendizado, mas ele não me contou nada a respeito, ou talvez não pudesse imaginar que aprenderíamos sobre isso.

— Mas Guru, nosso Eros, o Dulhan, também terá que fazer esse ritual? Ele é brasileiro e nunca soubemos que ele tenha tido interesse no mundo indiano antes do noivado deles. – Claudio diz.

— É meu dever lhes ensinar sobre todas as cerimônias e também sobre o que é comum ocorrer, quando o shádi não é tão tradicional algumas cerimônias ou rituais podem ser realizados de uma forma abreviada. O Dulhan deseja cumprir essa cerimônia e ela consta no cartão de casamento, correto Dulhana? – Guru diz e concordo com a cabeça.

Será que meu Eros fez esse estudo?

— Para cumprir o ritual Samavartanam, o Brahmachari deverá permanecer no interior da casa, hotel ou salão até o meio-dia para que o conhecimento adquirido por ele, após tantos anos de estudo, não ofusque o sol. Deverá jogar fora tudo o que representa essa vida anterior e esses anos de aprendizado, ou seja, os livros, a roupa típica de um Brahmachari que inclui a ajina que é a pele de veado e o mekhala que é um cinto. Na sequência do ritual ele deverá se banhar em água perfumada, fará a barba, poderá cortar os cabelos, cortará as unhas e vestirá roupas novas, isso servirá como marca da quebra de vínculo com a vida anterior de Brahmachari, logo depois irá ao encontro do sacerdote ou Acharya e entregará presentes a ele e farão pujas juntos. O Acharya exigirá que o Dulhan faça promessas para a vida nova como Grihastha.

Atentamos para a explicação e então o Guru encerra a aula.

Almoço rapidamente e vou para a aula particular, só retorno as dez da noite. Exausta, decido tomar um banho rápido e vou para cama.

Dez de janeiro. Acordo cedo, hoje é o dia do aniversário da minha mãe, quero muito poder celebrar esse dia especial ao seu lado, mas infelizmente estou presa aqui no Rio de Janeiro pelo contrato e compromissos, mas tenho Tony e Junior como meus cúmplices, minha mãe é avessa a surpresa e festas, mesmo assim faço questão de mandar um presente e ligo para ela.

— Alô, filhona, tudo bem?

— Bom dia, mãe. Quero te desejar um feliz aniversário e dizer que eu te amo muito, você é maravilhosa e um grande exemplo para mim, essencial na minha vida, um verdadeiro presente de Deus e minha riqueza. Que Deus seja em sua vida hoje e sempre, te abençoando, cuidando de você em todos os aspectos e realizando todos os seus sonhos. – digo e sorrio.

— Obrigada, filha. Deus te abençoe também.

— Que tal você ir ao portão? – sugiro.

— Acabei de acordar, estou de pijama ainda depois eu vou. – minha mãe, a teimosa, diz.

— Melhor ir agora. Só acho. – digo e escuto risos, logo reconheço as vozes do Junior e Tony.

— Quero saber o que vocês estão aprontando. – ela diz e seu tom já vai mudando.

— Surpresa!

Tony pega o celular e diz que minha mãe está emocionada ao ver o carro que ela acaba de ganhar como presente de aniversário, reclama que mais uma vez estou sendo exagerada e que devia pensar em mim e no meu futuro e não gastar com ela, depois de se recuperar, volta ao telefone.

— Por que você foi fazer isso? Como é exagerada, não devia ter gastado tanto assim comigo...

— Então devolve ou joga no lixo. – digo e dou uma gargalhada, fazendo-a rir também.

— Malcriada! Agora é meu, não devolvo, amei! – ela diz, ainda rindo.

— Ah até que enfim se rendeu.

— Obrigada, filha.

— Seja feliz com ele, mãe. Agora preciso ir para a aula.

— Fique com Deus, te amo.

— Te amo, feliz aniversário e tenha um dia maravilhoso!

Me arrumo e vou direto para a sala de aula, imagino que vou encontrar um dos meus amigos pelo caminho, mas tudo está quieto e vazio demais.

Todos estão na sala, exceto a equipe do Guru, mas sei que não tardarão a chegar. Sento e converso com meus amigos por alguns minutos, pontualmente às sete da manhã o mestre chega, nos cumprimenta e inicia a aula.

Quinta aula - Tema: Shádi, cerimônias e rituais.

— Hoje vamos continuar a falar sobre as cerimônias e rituais do shádi, estou seguindo o cronograma e para o primeiro dia de celebração do shádi faltou falar apenas de um ritual, o Kashi Yatra que consiste no aconselhamento sobre os deveres do marido no casamento, é a continuação do ritual samavartanam, o Dulhan ouvirá os conselhos para que possa decidir qual caminho vai trilhar.

— Como assim, o Dulhan deverá escolher seu caminho? - com expressão de dúvida, Marilia pergunta.

— Se ele quer ter uma vida de casado ou não! – Filipe responde mais rápido do que o Guru.

Todos estranham o comportamento de Filipe, menos eu.

— Sim, Filipe está certo, depois do aconselhamento o Dulhan deverá dizer se está pronto para a vida de Grihastha, a vida de um homem casado, um chefe de família. – Guru diz.

— Neste momento se o noivo achar que não está pronto, então o shádi é cancelado? – Guilherme expõe sua dúvida.

— Na verdade, o shádi precisa do consentimento prévio dos noivos, o que pode ocorrer é uma brincadeira durante o Kashi Yatra na qual o Dulhan poderá fingir que não deseja se casar, então ele vestirá o cordão sagrado, usado pelos monges, e afirmará a todos que deseja ser um Sannyasi ou renunciante, caberá a família da Dulhana a convencê-lo de que a vida de Grihastha é muito melhor. – Guru ri e responde.

Todos respondem com suspiros de alívio.

Depois uns sussurram para os outros, ao mesmo tempo, mas consigo ouvir

— Eros jamais desistiria do shádi! - olho para meus amigos e sorrio.

Guru deve ter percebido que não temos perguntas e continua.

— Agora vamos continuar com o segundo dia de Shádi. No decorrer do dia serão servidas as refeições em um local propício e ocorrerão entre as cerimônias, os padrinhos e madrinhas sempre deverão estar posicionados para receber os convidados na porta do local e indicar o caminho que eles deverão seguir. É responsabilidade de vocês manter a privacidade e liberdade dos noivos para que eles possam se alimentar, ajudem quando for necessário. Esta instrução é válida para todos os momentos em que os convidados brasileiros estiverem presentes. Os noivos ficarão em um Mandap, que é a cadeira própria para os noivos e aonde todos poderão ir até eles para conversar e tirar fotos.

Fico tentando imaginar como será, acho que devo ter me distraído o suficiente para que algumas amigas me olhem de uma maneira engraçada.

— Na sequência ocorrerão os rituais Muhurat e Griha Shanti que são na verdade uma puja de preparação para a revelação dos mapas astrais dos noivos e a finalização da data e hora mais auspiciosa para o início e conclusão do vivaha. A finalidade do mapa astral ou estudo astrológico dos noivos é saber se eles combinarão levando em conta os aspectos, comportamento e se os destinos deles são semelhantes, para hindus essa informação é muito importante e decisiva para a continuidade de um casamento. Mais uma vez devo dizer que, seguindo a tradição, a Dulhana não estará presente e seu pai irá representar a sua vontade.

Alguns erguem as mãos porque tem dúvidas.

— E se por acaso esse estudo mostrar que Eros e Weenny não combinam, eles se amam muito e todos nós achamos que foram feitos um para o outro, mas como seria? – Claudio pergunta.

— Esse caso é incomum, geralmente as famílias dos pretendentes se reúnem diante do sacerdote para que esse estudo seja realizado, o shádi só será realizado se o mapa astral indicar que eles podem ser felizes, então o casamento é arranjado e os noivos só se conhecerão no dia do shádi. Também fica evidente para todos nós que o Dulhan e a Dulhana combinam perfeitamente, estamos certos de que jamais isso vai acontecer. Outro caso que pode ocorrer é descobrir que a noiva é manglik, o que significa que ela é amaldiçoada para o amor, ou seja, pode trazer má sorte ou morte para o futuro marido.

Todos se agitam com a nova informação.

— Oh meu Deus! Como se descobre isso? – Iara diz.

— O que acontece com a mulher? Ela nunca vai se casar? – Dani diz.

— Os sacerdotes fazem o estudo astrológico e quando descobrem que a noiva em potencial é manglik, o Pandith avisa aos pais da menina para que possam fazer um ritual para quebrar essa maldição. Decidem casar essa menina manglik com um animal ou uma árvore, para que essa maldição passe para o seu primeiro cônjuge, neste caso a árvore ou animal, desta forma, a menina que outrora estava condenada a ser infeliz e solitária no amor pode se casar com o marido que seu pai escolheu, agora sem o perigo de trazer má sorte para o noivo, já que este será o segundo marido.

Vejo reações de incredulidade e Guru sorri ao ver suas expressões.

— Não se preocupem, a Dulhana não é manglik.

Olho para ele surpresa, terá traçado o meu mapa astral?

Desta vez não há contestação.

— Logo depois acontecerá o Grahamuk que é o marco do início das cerimônias oficiais do shádi, é o momento auspicioso em que os noivos acendem o agni ou fogo sagrado. Agni é o deus do fogo, todas as promessas e juramentos terão agni por testemunha, para santificar e proteger cada uma delas. Pandith iniciará a cerimônia entoando mantras e pujas e os noivos o acompanharão.

Guru ensina passo a passo as posições dos padrinhos e madrinhas neste cerimonial, explica como ocorre o acendimento do agni, treinamos as pujas juntos, sempre as minhas pujas são maiores e mais elaboradas, costumo treiná-las sozinha. Nosso mestre faz questão de mostrar quais oferendas devem ser colocadas diante dos altares dos deuses.

Apenas quando aprendemos tudo, Guru prossegue.

— Uma festa se dará após o Grahamuk, os noivos, convidados e famílias dançarão a Garba, que é uma dança típica e muito alegre, na qual usam-se dois pequenos bastões coloridos, a dança acontece entre pares, homem e mulher, e eles batem os bastões e fazem os movimentos.

— Mas... Nós nem fazemos ideia de como dançar isso! - Vivian diz.

— Teremos tempo hábil para aprender isso também? - Tatiane pergunta.

— Vocês nos ensinam? - Rafael pede.

— Podem aprender no dia do shádi se quiserem, fará parte da diversão, fiquem tranquilos pois não é uma obrigação nem para os noivos e muito menos para vocês padrinhos. - Guru diz na tentativa de acalmá-los.

Eles respiram aliviados, enquanto eu percebo a minha responsabilidade crescendo a cada cerimônia, mas permaneço quieta.

Guru encerra a aula.

Vou almoçar com meus amigos, passo pouco tempo ao lado deles, o suficiente para comer uma salada, me despeço deles ainda no restaurante e corro para a aula da tarde.

Retorno para a minha suíte apenas as dez da noite, meu treinamento tem sido cansativo, mas está valendo a pena, realmente tenho muita coisa para aprender... E estou aprendendo a ser uma hindu comum, imagina se souberem que devo aprender a agir como esposa do Príncipe.

Acordo cedo e entro no banho e logo ouço o barulho das minhas amigas invadindo a minha suíte. Aviso que já vou sair e peço que elas convidem os meninos para tomarem café da manhã conosco. Aproveito esse pouco tempo na companhia deles e pergunto o que eles têm feito, ainda estão atarefados com os compromissos de trabalho e quando tem alguma folga se encontram para alguma atividade divertida ou um bom passeio.

Fazem queixas sobre a minha ausência durante todas as tardes e noites, explico que estou fazendo aulas individuais com o Guru e sua equipe, percebo que eles ficam surpresos, justifico dizendo que são muitas coisas para uma noiva aprender e eles compreendem.

Tomamos o café da manhã e seguimos juntos para a sala. Cumprimentamos nosso mestre e a equipe, sentamos e nos preparamos para o início da aula.

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