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As Últimas Horas de Alice

Alice estava sozinha em um restaurante tranquilo.

Seu coração batia acelerado. Ela ajustou os óculos e deu um gole no café, esperando que a bebida quente acalmasse seus nervos. Os minutos passavam. Dúvidas começaram a invadir seus pensamentos.

[Ela... não me deu um bolo, certo?]

Alice olhou para o relógio pela quarta vez. Seu encontro estava 15 minutos atrasado.

Imediatamente, ela começou a teorizar. Talvez o link dos Mapas Toggle estivesse errado de alguma forma. Talvez ela tivesse lido a mensagem da garota errado e aquela mensagem "sim, vamos fazer isso" fosse na verdade um "não, vai se foder, sua estranha". Era muita coisa para interpretar mal, claro, mas talvez tivesse acontecido. Talvez um meteoro tivesse caído na Terra e enquanto Alice estava aqui, remoendo em seu desconforto silencioso, seu encontro estava lutando pela vida.

Contra alienígenas.

Sim, talvez alienígenas tivessem invadido e, ao invés de pegar um rifle e ir defender seu planeta da escória alienígena, Alice estava aqui, bebendo café e resmungando.

Talvez.

Justo quando Alice estava prestes a perder a esperança, a porta da frente do restaurante se abriu, e uma deslumbrante beleza loira entrou.

A garota do Ember, o aplicativo de namoro mais popular do mundo.

No instante em que viu Alice, ela caminhou em direção à mesa com uma passada confiante.

"Alice, certo?" a loira perguntou.

"S-Sim, oi..."

Foi tudo o que ela conseguiu dizer. Ela já a tinha visto antes, claro, mas nunca tão de perto. A loira era ainda mais linda pessoalmente, com olhos brilhantes e um sorriso que poderia iluminar o ambiente.

"Me desculpe pelo atraso," continuou a garota, deslizando para o assento à frente de Alice. "O trânsito estava um pesadelo, e eu tive que dar algumas voltas no quarteirão para encontrar uma vaga."

Alice conseguiu dar um pequeno sorriso, seus nervos começando a se acalmar.

"Tudo bem, eu entendo. Só estou feliz que você conseguiu chegar."

Daí em diante, elas começaram a conversar.

Mas, o encontro não foi bem. De jeito nenhum.

Alice tentou falar sobre seu trabalho como desenvolvedora de software, esperando impressionar seu encontro com histórias sobre os aplicativos de última geração que ela ajudou a criar, os algoritmos complexos que ela dominou, as incontáveis horas que passou curvada sobre seu teclado, movida a nada além de cafeína e a arte do código.

Mas a linda loira à sua frente apenas encarava com um olhar vazio, seus olhos embaçando a cada termo técnico que Alice mencionava. Entre seus "sério?" e "uhum", ficava claro que ela não tinha ideia do que Alice estava falando, e menos ainda interesse em aprender.

"Então, você tem algum hobby?" a garota perguntou, enrolando uma mecha de seu cabelo loiro ao redor do dedo.

"Eu-"

Alice congelou.

Ela estava prestes a deixar a represa se romper, querendo contar para seu encontro sobre os jogos otome que ela jogava. Eram praticamente a única coisa que Alice poderia chamar de "hobby". Ela não fazia mais nada. Literalmente, toda outra parte de seu dia era apenas alguma forma de tarefa mundana. Tirar o lixo, assistir as notícias, ir para o trabalho.

Mas, ela não podia simplesmente dizer a essa garota que seu único passatempo era namorar personagens virtuais porque ela nunca teve sucesso em encontrar o amor na vida real. Era patético.

"Não," ela disse em vez disso, sua voz plana e sem vida.

O sorriso da garota vacilou, e Alice pôde ver a decepção em seus olhos. Ela olhou para o relógio, um sinal não tão sutil de que estava pronta para que esse encontro acabasse.

Como previsto, um tempo depois, a linda loira pôs um fim a essa sessão de tortura.

"Bem, foi ótimo te conhecer, Alice," ela disse, já deslizando para fora de seu assento. "Mas acabei de lembrar, eu tenho essa... coisa. Ah, sim."

Mais um encontro fracassado, mais um lembrete de que Alice provavelmente morreria sozinha.

Enquanto a loira seguia para fora do restaurante, Alice afundou na cadeira, encarando as profundezas de seu café agora frio.

Nesse ponto, ela começou a se perguntar se talvez ela fosse a alienígena afinal.

[Adicione isso à coleção,] ela pensou amargamente. [Mais uma tentativa fracassada de conexão humana.]

Parece que sua virgindade permaneceria intacta essa noite, as teias de aranha entre suas pernas destinadas a nunca serem limpas.

Com um suspiro, Alice tomou o resto de seu café e juntou suas coisas.

Eh, quem precisava de romance na vida real de qualquer forma? Era apenas autoflagelação do mundo moderno.

Então, ela saiu, dizendo a si mesma o tempo todo que sexo e amor eram supervalorizados, na verdade.

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De volta em casa, Alice ligou seu PC.

Ela navegou até sua pasta de jogos e clicou em sua obsessão atual: Corações Negros.

Enquanto o jogo carregava, Alice se recostou em sua cadeira, um pequeno sorriso se formando em seus lábios. Claro, o jogo era comercializado como um otome típico, com um elenco de interesses amorosos masculinos charmosos para a protagonista feminina escolher.

Mas Alice sabia melhor.

Ela não estava aqui pelos garotos padrão e sem graça. Não, ela estava aqui pela VERDADEIRA história, o subtexto lésbico suculento entre a protagonista e sua suposta rival.

Alice acelerou pelas cenas masculinas, clicando pelo diálogo com quase nenhum olhar. Ela estava em uma missão, e essa missão era chegar nas partes boas.

E então, lá estava. Uma cena picante particularmente entre a protagonista e sua rival.

"Eu te odeio, Sylvia!"

"Ah, claro. Só porque você queria ser eu!"

[AAAAH!] O coração de Alice estava em chamas.

Os rostos das meninas estavam a meros centímetros de distância enquanto trocavam farpas e, na opinião de Alice, um desejo mal disfarçado.

Alice soltou um guincho, suas bochechas corando enquanto ela absorvia cada momento delicioso.

Mas justo quando as coisas estavam ficando boas, o telefone dela tocou, estilhaçando o clima como um tijolo através de uma janela.

Alice gemeu, reconhecendo o toque do telefone instantaneamente. Era sua mãe, provavelmente ligando para lembrá-la de alguma obrigação familiar ou para insinuar, sutilmente (ou não tão sutilmente), que ela deveria se estabelecer com um rapaz decente e começar a ter netos.

Com um suspiro, Alice atendeu o telefone, preparando-se para o inevitável.

"Alô?" ela disse, tentando manter a irritação fora de sua voz.

"Alice, querida!" a voz de sua mãe veio pelo alto-falante. "Eu só estava ligando para lembrar você sobre a igreja amanhã. Você vai, certo?"

Alice reprimiu outro gemido.

Claro. Mais uma tentativa de sua família profundamente religiosa de de alguma forma fazer a homossexualidade dela desaparecer, de convencê-la de que ela estava apenas confusa, que tudo de que ela precisava era de um bom homem e uma dose saudável de Jesus para colocá-la no caminho certo (o trocadilho é muito intencional).

"Mãe, eu-eu não sei," Alice disse, esfregando a têmpora com a mão livre. "Eu tenho muito trabalho para colocar em dia, e-"

"Que nada!" sua mãe a interrompeu, seu tom não admitindo argumentos. "Você pode reservar algumas horas para o Senhor, não pode? E quem sabe, talvez você conheça um rapaz legal lá. O filho dos Robinsons acabou de voltar de sua viagem missionária, e ouvi dizer que ele está solteiro..."

Alice desligou do resto do sermão de sua mãe, seus olhos voltando para o jogo pausado na tela de seu computador. As duas meninas estavam congeladas em um momento de tensão elétrica, seus lábios tão próximos que quase se tocavam.

[Deus, eu queria que fosse eu,] Alice pensou, uma pontada de desejo torcendo em seu peito.

"... então te vejo amanhã, cedo!" sua mãe terminou, trazendo Alice de volta à conversa.

"Sim, claro, mãe," Alice disse, derrotada. "Eu estarei lá."

Ela desligou, jogando seu telefone na mesa com um estrondo. Ela sabia que provavelmente deveria se sentir culpada por mentir, por planejar inventar alguma desculpa de última hora para não ir à igreja. Mas honestamente, ela estava apenas cansada. Cansada de fingir, cansada de se esconder, cansada de ser alguém que ela não era só para agradar sua família.

Com um suspiro, Alice despausou o jogo, deixando-se perder mais uma vez naquele outro mundo.

Talvez um dia, ela encontrasse esse tipo de amor na vida real. Mas por enquanto, ela tinha seus jogos, suas namoradas virtuais e seu próprio cantinho na internet onde podia ser ela mesma.

E talvez, só talvez, isso fosse suficiente.

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No dia seguinte, Alice passou pelos movimentos de sua rotina mundana habitual.

Ela saiu da cama, seu cabelo uma bagunça embaraçada, e cambaleou até a cozinha para fazer café. Enquanto o café era preparado, ela navegava pelo celular, com os olhos turvos e apenas meio acordada.

[Vamos ver que novo inferno o mundo preparou para hoje,] ela pensou, tocando no aplicativo de notícias.

Ela passou os olhos pelas manchetes, seus olhos vidrando na usual parada de escândalos políticos, fofocas de celebridades e profecias do fim do mundo.

"Eu estou te dizendo, cara," um mendigo gritou para uma câmera. "Os caminhões estão vindo para nós, cara! OS CAMINHÕES ESTÃO VINDO PARA NÓS!"

Um artigo chamou a atenção de Alice.

"Acidentes relacionados a caminhões aumentam mais de 2000%," a manchete gritava, acompanhada por uma foto granulada de um veículo amassado e algum coitado na frente dele, borrado.

[Nossa,] Alice pensou com a testa franzida. [Isso é loucura.]

Mas antes que ela pudesse mergulhar mais fundo no artigo, a cafeteira soltou um bipe agudo, sinalizando que seu elixir matinal estava pronto. Alice deixou o celular de lado e se serviu de uma caneca, inspirando o aroma rico com um suspiro de contentamento.

[Ah, doce néctar dos deuses,] ela pensou, dando um gole. [O que eu faria sem você?]

Com sua dose de cafeína garantida, Alice começou a se preparar para o dia. Ela tomou banho, escovou os dentes e vestiu algumas roupas, sem se esforçar muito na aparência. Afinal, não é como se alguém no trabalho fosse notar ou se importar.

Alice era, no fim das contas, uma pessoa dolorosamente genérica. O tipo que você poderia chamar de "fabricada". Branca, com cabelos pretos e olhos castanhos, 152 cm, e com o tipo de rosto que alguém imediatamente associaria a alguém que trabalha atrás de uma mesa de alguma forma.

Logo, ela estava na porta, com sua bolsa de mensageiro pendurada no ombro e seus fones de ouvido firmemente no lugar. Ela caminhou até a estação de trem, sua mente já processando as tarefas e prazos do dia.

Ao sair da estação de trem e começar a caminhada curta para seu escritório, Alice ouviu uma confusão atrás dela.

Ela virou, seus olhos se arregalando ao ver um caminhão de entregas descendo a rua.

E, parecia que aquele caminhão estava indo direto para ela.

[Oh, merda,] foi tudo o que ela teve tempo de pensar antes do caminhão atingi-la, lançando-a pelo ar como uma boneca de pano.

E então, tudo ficou preto.

Quando Alice abriu os olhos novamente, ela estava em um lugar completamente diferente. Uma vasta extensão branca se estendia à sua frente, como uma folha de papel infinita esperando para ser preenchida.

[Onde... onde eu estou?] ela pensou, sua mente turva e desorientada. [Isso é... céu? Inferno? Purgatório?]

Mas antes que ela pudesse pensar mais, uma voz ecoou.

"Olá, Alice. Bem-vinda ao Programa de Seleção de Outra Vida."

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Nota do Autor:

Alguns avisos:

1. Caso você não tenha visto na sinopse, personagens futanari são uma coisa no novo mundo de Alice. Este é um romance yuri/futa. A protagonista, ela mesma, NÃO vai ser uma, embora várias interesses amorosos serão.

2. Esta história tem incesto. E não de uma forma "olha, o incesto é tão horrível" também, então sim.

3. Asteriscos (*) no título de um capítulo indicam cenas de sexo, só para você não ser surpreendido por uma no trabalho ou algo do tipo.

Sem mais delongas, aproveite!

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