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Residência dos Wright

Residência dos Wright, São Francisco (US-CA) (3 de março, 2025 D.C.)

Diante de mim, estava aquela mulher brega, Esther Wright. Seus modos e jeito de agir não são dignos de alguém da realeza, suas roupas me causam estranheza, ela está sempre bocejando ou dizendo coisas confusas, mas, ainda assim se diz dona dessa mansão.

— Escuta, gata, com certeza os outros soldados nessa mansão conseguiram ouvir esses tiros. Se tu ficar aí só me encarando, nós duas vamos acabar morrendo.

— Certo, vamos indo.

Me pegando pela mão, ela corre pelos vazios corredores da residência, onde não existem câmeras funcionais ou seguranças e algumas lâmpadas piscam como se estivessem prestes a queimar, fazendo esse lugar luxuoso parecer uma casa abandonada.

— Bem, é aqui o meu quarto. Vamos ficar seguras aqui.

Mas, por que diabos tem um corpo morto na entrada?

— Ah! Não se assuste, esse é só um cara que tentou me matar. — ela responde calmamente a minha hesitação. — Dá uma olhada nessa glock, se não fosse por ele, eu não teria conseguido essa belezinha aqui. Então, valeu a pena, né?

— Espero que sim...

— Vamos entrando!

Evitando pisar nesse pobre coitado, entro no quarto e a visão de um ambiente rosa, exageradamente chamativo, faz a minha cabeça doer por alguns segundos.

— Senta aí. Me dá só um minutinho, ok?

Enquanto me sento na cama, a mulher brega arrasta o corpo ensanguentado e coloca sua mesa de cabeceira na porta para bloquear a passagem. Em seguida, ela passa um tempo vasculhando os armários de seu quarto, como se estivesse buscando por algo.

— Escuta, você realmente não conseguiu achar nada que indicasse o seu nome ou algo assim? — Esther me questiona mais uma vez.

— Não! Por que tá perguntando isso? Não é da sua conta!

— Bem, enquanto você me ajudar, eu tenho que saber exatamente tudo sobre você. Sacou? Só me diz como você chegou até aqui.

— Eu fui conduzida por uma inteligência artificial. Ela me contou que existe um informante nessa mansão e que ele vai me dizer exatamente tudo que está acontecendo.

— Calma? Uma inteligência artificial? Cara, isso é tipo, muito maneiro! — Ela reage com uma empolgação desproporcional. — Sério, me conta tudo sobre ela, por favor! Me fala tudo que você sabe, me conta, me conta, me conta!

— Eu não sei mais nada, tá bom? Só me deixa em paz, por favor.

— Ah, você é muito chata. Olha, se você me ajudar a retomar a mansão, eu te ajudo a encontrar esse tal informante.

— Bem, o informante realmente não é você. Eu já esperava. Então, me conta, por que não me matou naquela hora?

— Você é gata pô, eu me sentiria mal por te matar. — a mulher brega diz isso como se estivesse fugindo da pergunta.

— Não se finja de imbecil, você disse algo sobre 'eu também não me lembrar'.

— Ah, então você é bem perceptiva. Escuta, eu estou em uma situação bem parecida com a sua. Acordei com uma amnésia esquisita e, apesar de conseguir me lembrar de coisas triviais, não consigo me lembrar da minha identidade.

— Ué, e como descobriu seu nome?

— Dei uma vasculhada no quarto pra ver se encontrava algum documento e foi bem entediante. Parece que eu tenho 24 anos e de alguma forma estou relacionada à realeza. Mas, mesmo sabendo que eu me chamo Esther, esse nome não soa familiar, é quase como se eu nunca tivesse o escutado na minha vida.

— Deve ser uma sensação bem ruim...

— É sim! Mas, veja pelo lado bom. Agora você vai estar comigo nessa!

— Eu?

— Se você quiser andar comigo, vai precisar de um nome. Eu não vou ficar te chamando de "Mulher Desconhecida" ou algum pseudônimo bizarro.

— Não acho que eu precise de um nome...

— Precisa sim! — após dizer isso, a mulher pensa por alguns segundos. — Que tal Kamilly? É um nome bem chique.

— Não soa muito bem.

— Nossa... tá bom, tá bom. Vamos pegar um nome mais básico então. O que você acha de Bruna?

Por mais incrível que pareça, eu gostei bastante desse nome e, mesmo não concordando muito com essa ideia, fazer o que ela quer provavelmente vai ser bom para mim no futuro.

— Vou querer esse nome. Combina bastante comigo.

— Opa! Beleza, então! — Mais uma vez, ela grita. — Eu tinha pensado em vários outros nomes legais, não esperava que você fosse querer esse logo de cara.

— Vai ter que ficar pra uma próxima vez.

— Belezinha, agora finalmente podemos começar, Bruna.

— Certo... Qual é o plano, então?

— Acho que o primeiro passo para retomar a mansão é conseguir uma planta do local.

— Uma planta? Não deve ser algo muito fácil de encontrar.

— Eu dei uma vasculhada nesse andar e vi que tinha um lugar bem parecido com um escritório, tinha até uma estante de livros e tals. Pode ser que tenha algo lá!

— Realmente, não é uma ideia ruim.

— Sim, mas, antes eu vou tomar um banho pra ficar cheirosinha! — Esther exclama como se essa fosse a coisa mais normal do mundo.

Deixando sua pistola sobre a cama, a mulher brega calmamente entra no banheiro da suíte. Sem dúvidas, essa atitude quebrou minhas expectativas, visto que eu realmente pensei que poderia levar ela a sério.

Passados alguns minutos, a água daquele banho lento e despreocupado ainda pode ser ouvida. Além disso, o fato de Esther ter deixado sua arma aqui, de forma desprecavida, é um sinal de que seria problemático me aliar a ela. Como essa mulher confia tanto assim em alguém que acabou de conhecer? Sua falta de noção e cuidado vão acabar me prejudicando. Então, após tomar a decisão de procurar sozinha pelo tal informante, pego a pistola e noto que tanto a cama quanto o cobertor estão sujos de sangue. Ignorando esse detalhe, caminho até a saída e inicio a remoção da barricada. Porém, um frio percorre toda a minha espinha, seguido de uma voz que diz:

— Eu sei o que você está pensando, Bruna. — a voz de Esther sai do banheiro e chega aos meus ouvidos. — Eu vou só pegar essa pistola que está aqui na cama e fugir, não é? Bem, eu espero que você não esteja pensando nisso. Poxa! Eu salvei a sua vida!

Como ela conseguiu prever minhas ações? Eu não fiz barulho algum enquanto tirava a mesa de cabeceira...

— Olha, você pode fazer o que quiser, ok? — ela continua falando com uma voz simpática. — Mas, eu garanto que se eu sair do banho e não te encontrar, você ganhará uma nova inimiga. Da próxima vez em que eu te ver, não vou hesitar em fazer um rombo no seu peito, pode ter certeza disso.

Essa mulher não é tão ingênua quanto pensei, não vale a pena virar inimiga dela. Sabendo disso, eu coloco a pistola de volta no lugar onde peguei, sento e espero.

Após mais alguns minutos em silêncio, Esther sai do banheiro totalmente desprovida de vestimentas e sem indício algum de vergonha.

— Que bom que você ainda está aqui! — ela grita animada enquanto corre na minha direção para me dar um abraço.

— Não, obrigada.

— É sério que você vai recusar o meu abraço? Não vai dizer que os meus peitinhos te deixaram com vergonha. — Esther ri de maneira infantil.

— Que tipo de aberração é você? Eu deveria ter te matado quando tive a chance.

— Chance? Que chance? — Ela questiona logo antes de pegar a arma deixada sobre a cama. — Vai me matar com uma arma descarregada?

Exibindo o carregador em mãos, a mulher, que antes parecia boba, parece ter sido esperta o bastante para levá-lo até o banho consigo, como se estivesse me testando desde o princípio.

Após colocar a mesma roupa feia de antes, ela me questiona:

— E essa coisa aí no seu pulso direito? É um relógio?

— Não é da sua conta.

— Hmm... Eu já esperava por essa resposta, vamos dar uma olhada nisso depois...

Esther aceita a minha vontade com muita naturalidade, algo bem inesperado tendo em vista sua personalidade.

— Vamos? Acho que já perdemos tempo demais.

— Claro! A arma fica comigo! — ela exclama mais uma vez.

Ao sairmos do quarto, caminhamos cautelosamente pelos corredores da mansão, enquanto, ao fundo, os passos daqueles que provavelmente ouviram os tiros podem ser escutados.

— Se formos silenciosas o bastante não vamos precisar nos preocupar. — Esther me instrui sussurrando.

— Certo, pelo tempo que passou, eles já devem estar se movendo para procurar em outro lugar.

Sem grandes surpresas, seguimos agachadas através dos corredores até o escritório. Isso demora mais que o esperado, já que nos perdemos algumas vezes.

— Esse lugar parece um labirinto! Quem será que construiu essa porcaria? — ela reclama em voz baixa.

— Pensei que você gostasse disso, afinal, é sua casa.

— Adorei a piadinha sem graça, Bruna. Bem, não importa... Chegamos.

Abrindo a porta, nós contemplamos o escuro local, onde uma fraca lamparina ilumina as folhas de um manuscrito sobre uma bancada. Atrás, existe uma grande janela, com as persianas fechadas, ao lado, uma estante cheia de livros, e na parede, um relógio que nem parece mais funcionar.

— Se liga, gata, eu vou sair pra procurar pelo... — ela trava por alguns instantes. — Dá uma olhada nisso aqui, Bruna...

— O que foi, hein?

A visão de um corpo caído atrás da bancada parece ter chocado Esther. O que tem de tão estranho nisso? Ela parecia uma pessoa acostumada a ver mortos.

— Por que você me chamou? É só mais um corpo, provavelmente tem vários outros espalhados pela mansão.

— Mas, essa pessoa aqui se matou, Bruna. — Esther fala como se estivesse em choque.

— Sério?

— Presta atenção na posição dele, olha essa quantidade de sangue nos olhos e no pescoço, vê o que ele tá segurando. Esse homem cortou os próprios olhos e depois enfiou a faca no próprio pescoço... Essa é uma forma dolorosa de morrer até pra quem odeia a própria vida.

— Pelo uniforme, ele deveria ser um funcionário da mansão.

— Bruna... — Ela se vira para mim com um olhar de desespero. — O que está acontecendo com esse lugar? Eu não sei se você sente o mesmo que eu, mas sinto uma sensação ruim, como se tivesse algo de errado. No início pensei que fossem só as minhas memórias, mas agora...

— Vamos manter a calma. Talvez ele fosse só um depressivo qualquer, e também, a faca ainda está ali no pescoço, mas não tem como provar que foi ele quem cortou os olhos, ele pode ter só cortado o próprio pescoço e quem arrancou os olhos dele foi outra pessoa.

Também sinto uma sensação estranha desde que entrei aqui, mas isso é irrelevante agora. Deixando aquela situação de lado, começo a procurar pelo mapa abrindo alguns dos armários daquele escritório. Porém, eu tenho uma surpresa ao abrir o segundo armário: um ursinho de pelúcia idêntico ao que eu tinha visto antes.

— Senti sua falta, docinho! — uma voz infantil me cumprimenta.

Instantaneamente, o meu corpo congela e, incapaz de me mover, posso ouvir apenas os meus batimentos acelerados, enquanto o frio toca meu corpo e o relógio na parede gira de maneira desordenada.

— Esther, isso é algum tipo de brincadeira? Escuta, é melhor você parar agora! Senão, juro que...

Uma mão sobre meu ombro me faz virar para trás.

— Senti sua falta, docinho! — Esther exclama com um sorriso.

Seus olhos estão negros e é como se deles escorresse um líquido preto até o final de seu rosto. Atrás dela, aquele funcionário morto fica de pé e, apesar da faca em seu pescoço, exibe um largo e irreal sorriso, assim como o de Esther.

— Esther, pode me explicar o que é isso?

Todos eles estão rindo de mim, suas risadas ecoam em minha mente como sinos irritantes. Essas são as múltiplas faces de um mundo invisível. O real no imaginário e o imaginário no real. Enquanto isso, nossos corpos estão lentamente desaparecendo, nossas mentes estão lentamente desaparecendo, nossos sonhos estão lentamente desaparecendo...

Agradecimentos

Bernardo de Souza Albuquerque

João Lucas Hoffman

Átila Heytor França de Moura

João Pedro Viter Menino

João Guilherme Balbino Ubara

Murilo Crisóstomo Magalhães

Ashley Diniz Chrispim de Souza

Revisado por: Pedro Tavares

*Nos ajude apoiando o projeto e tenha seu nome na página de agradecimentos...

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