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Capítulo 1 - Zumbi

Ainda surpreso com tudo o que estava acontecendo e tentando tocar a janela azul que parecia estar flutuando diante dos seus olhos, o rapaz ouviu um grito aterrorizado soando pelo campus. O terror na voz que parecia ser uma mulher, era tão verdadeiro e tão real que o coração do rapaz acelerou novamente e a janela azul em sua retina desapareceu sem que ele percebesse.

A questão é que os poucos segundos de silêncio depois desse grito seriam os últimos momentos de calmaria por muitos dias que viriam. Como se fosse algo combinado, diversos gritos e urros ressoaram pela universidade de uma vez só.

— Ahhhhhhhhhhhh — os gritos muito mais angustiantes do que qualquer filme de terror foram só o começo.

Assim que se colocou de pé, o rapaz viu milhares de alunos correndo em disparada, procurando qualquer tipo de proteção ou abrigo de algo que ele ainda não conseguia ver. Mas apesar da confusão ele notou uma coisa em comum. Vários alunos manchados de sangue. Vários feridos. Alguns ferimentos causados pela própria multidão apavorada. Alguns alunos caíram e não se levantaram mais. Mas vários ferimentos nos estudantes eram estranhos. Arranhões e mordidas nos braços, ombros e até pernas de vários deles.

— O que está acontecendo? — ele balbuciou sem se mexer do lugar.

Por uma vidraça diretamente a sua frente a resposta apareceu. Um dos alunos dentro da sala de aula caiu do meio correria empurrado pela multidão. Enquanto ainda lutava para se levantar completamente, uma outra aluna se atirou para cima dele. E antes que ele pudesse se separar dela, a aluna fincou os dentes no pescoço do jovem. Não houve tempo para gritar. Com a traqueia esmagada e se afogando no próprio sangue, o universitário tentou afastar a garota de si, mas só conseguiu ter a parte do seu pescoço arrancada. Com desespero, terror e choque em seu olhar, por tudo o que estava acontecendo, perdeu as forças e foi empurrado para o chão com a segunda investida da garota.

Vendo tudo isso do gramado do lado de fora da vidraça, Levi não conseguia se mexer, paralisado:

Mas o que… Isso é um ataque terrorista? Mas que terrorista ataca usando os próprios dentes?

É claro que várias outras ideias surgiram em sua mente, mas diferente do que acontecia antes das mudanças abruptas no planeta, somente a elite intelectual, com QI comprovadamente elevado, deveria atender universidades. Era uma questão mundial prática que levava pouco em consideração os sentimentos da população. Com o mundo em crise, cada um deveria fazer o que era capaz, então somente os mais aptos poderiam perder tempo e fundos preciosos com educação tradicional. Então, como alguém altamente racional, ele não poderia deixar pensamentos fantasiosos guiarem suas ações.

Sem gastar ainda mais tempo, começou a correr em uma direção que ele sabia ter menos pessoas. Independente da razão daqueles ataques, ir para um lugar com menos gente significa menos chance de ser atacado. Principalmente considerando que as forças de segurança não resolveriam essa situação de imediato. A lógica por trás desse pensamento era simples. A mensagem que apareceu em sua retina há poucos minutos. Assim que se lembrou da mensagem um painel apareceu novamente diante dele:

[===Bem-vindo ao Sistema RULE

Raça: Humano Idade: 21

Altura: 1,82m Peso: 78kg

Título: [Nenhum]

Status:

Força Vital: 0,8

Vigor: 0,5

Agilidade: 0,7

Potência: 0,9

Controle: 2,1

Mana: 1

Q. Mana: 1

(Média da raça local dominante = 1)

Habilidades: [Nenhuma]

===]

— Eu sei que sou meio preguiçoso, mas ver esses números é realmente deprimente… — ele reclamou enquanto sentia o cansaço do pouco tempo em que estava correndo. Parte dele não queria aceitar um elemento tão fantasioso como uma "Janela de status" que flutuava ali, mas por mais que não quisesse era apenas lógico aceitar o que estava literalmente diante dele mesmo que não pudesse explicar, naquele momento.

E se concentrando na janela ele conseguiu ver uma outra mensagem que aparecera antes e que fazia considerar que ninguém receberia nenhuma ajuda em várias horas, ou mesmo dias, de quando os ataques começaram:

[===

1° estágio de maturação de Mana detectado na órbita da estrela ⬜⬜⬜⬜⬜⬜

Sistema RULE ativado em todos os seres vivos adaptados…

Contato possível com estrelas em estágios de até um nível de diferença…

—------

===]

— Apesar dos caracteres que eu não consigo entender, só posso acreditar que a estrela na mensagem se refere ao Sol. E se isso for verdade, todos os seres vivos na órbita do Sol estão passando pela mesma coisa. Não dá pra achar que isso está acontecendo só aqui…

Após atravessar uma rua em direção ao estacionamento do Instituto de Biologia, o rapaz passou de uma corrida para uma caminhada rápida. Depois de se afastar um pouco do centro da universidade, que obviamente tinha muito mais estudantes do que aqui e não vendo ninguém vindo na mesma direção, ele se acalmou um pouco. Com a cabeça mais no lugar ele descartou a possibilidade de terrorismo:

— Os ataques e essas mensagens acontecerem juntos não pode ser coincidência.

Enquanto, sem perceber, o jovem se afundou nos próprios pensamentos, o caos não diminuiu, aumentou. Toda a inteligência e poder de concentração dele só serviram para dificultar uma situação já complicada. Porque sem que ele notasse duas pessoas se aproximaram dele no estacionamento. Uma moça com cabelos tingidos de azul ajudava um estudante a andar em direção a um dos poucos carros que estavam estacionados. E foi justamente um gemido que o estudante fez ao mancar que despertou-o de seus pensamentos.

— Vamos! Já estamos chegando. Vou te levar pro hospital e você vai ficar bem. — a garota encorajou o amigo, praticamente o arrastando em direção ao carro. O amigo não respondeu. Aos poucos os gemidos foram sumindo e ele perdeu a consciência. O estranho foi que de alguma forma ele não despencou no chão, ao contrário, ficou em pé, mesmo que estivesse balançando para os lados por causa dos puxões da amiga. Então algo sem sentido aconteceu: os gemidos do estudante se tornaram grunhidos. Seus olhos que haviam se fechado quando perdeu a consciência se arregalaram, agora vermelhos e sem foco.

Levi vendo tudo isso acontecer sentiu o coração que estava finalmente sob controle, acelerar novamente. Ele sentiu perigo. Nos olhos do outro estudante ele viu violência e voracidade, mas mesmo sem saber como explicar, ele sabia que algo agora estava faltando naquele olhar: sanidade.

Antes que ele ou a garota pudessem reagir, o estudante avançou sobre a amiga com as mãos estendidas. Por sorte ou instinto a garota conseguiu segurar os braços do amigo que agora a estava atacando e com uma perna em seu peito, impediu que em sua loucura e fome a mordesse. Mas a posição era precária, com a perna levantada e apoiada no carro, ela não conseguiria manter a situação por muito tempo.

— Socorro! Me ajuda! — a garota gritou, olhando diretamente para a única outra pessoa no estacionamento naquele momento: Levi.

Apesar de todo o medo, e mesmo sabendo que tinha algo errado com toda aquela situação, o rapaz correu para socorrer a garota. Ele não sentiu nada do que viu nos filmes ou leu nos livros. Ele não tinha certeza do que estava fazendo ou sentiu seu corpo se mexer sozinho. Mas ainda assim ele foi. Com o coração acelerado, fez o que achou menos perigoso, pegou uma pedra grande no chão e acertou com tudo na cabeça do estudante louco. O ataque funcionou, já que o jovem que parecia estar possuído pelo demônio caiu no chão. Porém, antes que qualquer um dos outros dois pudesse sentir alívio, o endemoniado se levantou novamente e se lançou em direção a Levi, que apesar da falta de habilidades físicas conseguiu reagir rápido o suficiente para pular para trás e atingir o agressor com a pedra novamente na cabeça. Antes que o louco se levantasse novamente, disparou em direção à moça.

Nesse momento, um grupo de pessoas correu para fora do prédio pela mesma porta que a garota havia saído antes.

— Mônica! — um deles gritou — O que está acontecendo?

A garota se sentiu aliviada ao ver seus três outros amigos à salvo:

— Abel! Você está bem… — então, com a voz trêmula, continuou: — eu não sei o que aconteceu, o Júnior estava normal mas começou a me atacar do nada. Igual aos que atacaram a gente na sa....

Um grunhido interrompeu Mônica. O estudante que antes era chamado de Júnior estava de pé correndo em direção à garota novamente. Os outros amigos tiveram apenas tempo de gritar: — Cuidado! — no entanto um se moveu rápido, tão rápido que os outros mal entenderam o que ele fez. Em menos de um segundo Abel havia derrubado Júnior usando um cano como taco. O cano já estava manchado de sangue antes do golpe, mostrando que Abel usara esse cano para atacar alguém, ou algo, antes. A pancada acertou o endemoniado na cabeça novamente e, antes que ele pudesse se levantar mais uma vez, Abel cravou o cano no olho daquele que era seu amigo. Usando o cano como alavanca, colocando o próprio peso sobre ele, um som desagradável soou pelo estacionamento.

Abel ficou alguns segundos de olhos fechados. Ele sabia que não deveria pensar nisso agora, mas acabara de matar um amigo com as próprias mãos. O som de Mônica chorando soou pelo estacionamento.

— V-vamos sair daqui, antes que outros desse apareçam! — um jovem moreno pediu em tom de súplica, acordando os demais da inércia.

Os quatro amigos começar a correr na direção do carro quando:

— Ei… Ei! Você se chama Abel, certo? — Levi perguntou desconcertado — Me leve com vocês. Por favor. Qualquer lugar que não seja aqui!

O grupo de amigos parou quando ouviu o pedido. Abel olhou para o rapaz e disse sem hesitar:

— Não.

A resposta rápida surpreendeu todos e apenas o som de gritos à distância mostrava que o tempo não tinha parado.

— Ei, Abel! Não seja assim — Mônica interpelou — Ele me salvou antes de vocês chegarem.

Abel olhou para Mônica e depois para o rapaz. Porém seus olhos continuaram resolutos:

— Eu sei. Eu sei… mas nós não sabemos o que são essas coisas. Você disse que o Júnior estava normal e, do nada, te atacou, certo?

— Sim, mas…

— O Júnior foi mordido por uma dessas coisas lá na sala de aula, não foi?

Mônica abriu a boca para responder, mas parou quando compreendeu o que Abel queria dizer.

— Cara… — Abel olhou para o rapaz mais uma vez — Qual o seu nome?

O rapaz, pego de surpresa pela pergunta, respondeu, sem saber que essa seria a última vez que diria o próprio nome para alguém:

— Levi. Meu nome é Levi.

— Ok, Levi. Eu vou te dizer porque não podemos te levar — Abel disse apontando para Levi com o cano manchado pelo sangue do amigo. Um gota escorreu enquanto Abel segurava o cano erguido — Seu braço. Você está ferido no braço.

Demorou um tempo para que Levi compreendesse o que Abel queria dizer. Mas sentiu que seu coração praticamente parou quando olhou para o próprio braço. No antebraço, um único arranhão. Apesar de não parecer nada de mais, Levi podia ver sangue preto escorrendo.

Foi só então que ele sentiu.

Levi era inteligente. Muito inteligente. E mesmo sem ninguém precisar explicar ele entendeu. Algo estava se espalhando pelo seu corpo. Não era um vírus ou bactéria nem nada do tipo. Era algo que ele nunca havia sentido até recentemente: Mana.

"Isso deve ser algum tipo de mana infectada" ele pensou. Ele sabia, por instinto, que não adiantaria cortar o membro infectado fora. A Mana infectada se espalhou pelo corpo dele sem seguir vasos sanguíneos ou ordem. Ele sentia que a única coisa que isso fazia no seu corpo era criar caos no novo elemento que agora ele sentia em seu corpo.

— Ei, Abel. Não seja assim. — Levi tentou brincar. Talvez tentando não perder sua última esperança. — Isso não é a marca de Caim ou coisa do tipo. Você não sabe se isso significa que eu vou virar uma dessas coisas.

Ainda com o cano apontado para Levi, Abel suspirou:

— Não sei se é a marca de Caim ou não, cara. Mas não vou apostar a minha vida por causa da sua. — ele mandou os outros entrarem no carro e disse, tentando aliviar um pouco do remorso que estava sentindo: — Não vou deixar a história se repetir, Caim.

Próximo capítulo