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A Transmissão

No quintal de uma das pequenas casas que se acumulavam numa região suburbana de Rivertown, duas garotas fazem um alarde em seu quintal. À frente daquela pequena área coberta de grama, enfiam coisas no porta-malas de um carro... Ou o que parecia um carro, já que se assemelhava mais a uma lataria caindo aos pedaços.

— Mia! Pegou as tendas?

— Tendas, confere!

— Cobertores?

— Confere!

— Poderia parar de marcar itens nessa lista, e vir me ajudar?

— Mas foi você quem perguntou... – Ela fazia um biquinho.

Mia era uma jovem adolescente, de cabelos preto-esverdeados curtos, que mais comportava como uma criança. Sendo, na maior parte do tempo divertida e extrovertida, a garota só pensava no quão refrescante seria nadar naquela cachoeira novamente.

— Ah… – ela refletia sobre as águas cristalinas em sua mente – Talvez eu devesse adicionar os eventos em outra lista! Nadar, fazer fogueira, trilhar... hehe

Sua irmã mais velha, Lilly, suspirava enquanto a via abraçando sua planilha. Foi algo que ela ganhou de presente de uma colega de escola, e agora anotava tudo que podia. A garota, que já estava enjoada de ver planilhas digitais, quase tinha um gatilho PTSD ao ver aquele objeto sendo amado.

O plano das duas? Acampar. E por que estavam apressadas? Bem, elas teriam que acampar exatamente hoje, nem mais cedo nem mais tarde... e estavam atrasadas.

Não só porque Lilly programou suas férias de trabalho junto às do colégio de sua irmã, mas também porque acampar naquela exata semana fazia parte da tradição. Com seus pais, elas faziam isso todo ano, e agora que se foram, é ainda mais importante manter como sempre foi.

— Acho que já está tudo pronto.

— Não, acho que faltam os...

— Marshmallows! – Ambas falam juntas, e começam a rir de repente.

O objetivo delas era o Parque Nacional de Rivertown: Uma linda reserva ambiental, aberta ao público nessa época. Lá, havia uma montanha de memórias que as duas adoravam desenterrar sempre que tinham oportunidade.

Desde a tão sonhada cachoeira que Mia adorava (Apenas nessa época do ano. Depois, Mia se esquecia completamente dela) Até mesmo as centenas de espécies de animais que Lilly adorava observar, e plantas, que adorava estudar.

— Não se preocupe, eu vou pegá-los. Mamãe dizia que não há acampamento sem os docinhos molengas! – Lilly apertava o passo, enquanto corria dando pulinhos para dentro da casa. Mesmo sendo a irmã mais "séria", até ela ficava animada para esse evento.

Há menos de meio ano, ambas se envolveram em uma situação complicada. Um caminhão se chocou com o carro de seus pais, enquanto iam trabalhar, causando um acidente infeliz e tirando suas vidas. Logo após isso, Mia acabou indo morar com sua irmã em seu pequeno apartamento, ficando sob tutela dela.

As garotas não sabiam muito bem como lidariam com essa viagem, desta vez sozinhas. Mas talvez acabasse sendo uma forma de fortalecer os próprios laços, enquanto aceitavam melhor a forma que estavam vivendo agora.

Enquanto a jovem moça vasculhava a cozinha como um bandido procurando coisas valiosas, Mia dava pequenas voltas ao redor do carro, com as mãos para trás. Até que algo chama a sua atenção.

— O que foi... isso?

Mia entra numa espécie de transe, sem saber se o que acabou de ver era real ou não. Também não sabia o que sentir vendo aquilo. Curiosidade? Um certo medo? Admiração? Ela não sabia, apenas tinha ciência de que havia sido estranho.

Sua irmã chega, com pacotes de doce que se pareciam com sacos de pancadas, um em cada braço. Ela rapidamente os coloca nos bancos traseiros do veículo, enquanto chamava apressada por sua irmã.

— Mia, vamos lo-... Mia, tá tudo bem?

— Hãn? Ah, sim, tô sim. Por que a pergunta?

— Nada, só achei estranho você encarando o céu assim. Fica tranquila, não acho que vá chover na viagem.

Se Lilly diz que não vai chover, provavelmente vai. Ela é a inimiga da meteorologia.

— Boba, não é nada disso. Eu achei ter visto algo no céu, uma luz passando bem rápido.

— Uma estrela cadente?

— Acho que não... era bem forte e azul...

— Azul? Não estava vendo coisas?

— Eu não tava! Eu... acho?

— Tá, uma estrela cadente azul! Vamos logo! Dirigir à noite já é perigoso, se demorarmos até de madrugada fica ainda pior! – Lilly, já sem paciência, pega a garota pelo braço, puxando-a para dentro do carro.

Então, Mia acaba saindo de seu estranho transe, e ambas entram no veículo, para irem em direção ao acampamento…

Mal sabiam que essa seria a viagem que mudaria suas vidas.

×××

A humanidade como um todo vivia em paz, mesmo com seus recentes problemas... Até aquele fatídico dia, onde tudo isso mudou.

Agora, eles se sentiam constantemente ameaçados, com medo das fronteiras além da luz das estrelas. Eles, que até esse momento achavam ser a única forma de vida inteligente em todo o universo, quebraram a cara do pior modo possível.

Uma raça acabava de se mostrar como uma inimiga.

— Bom dia, boa tarde e boa noite, humanos. Eu os saúdo, neste belíssimo momento. Também me desculpo pela visita indesejada, mas infelizmente pra vocês, estou aqui para ficar. Não pretendo voltar ao meu planeta, Terrafrya, tão cedo.

Em toda e qualquer tela, monitor ou visor ao redor do planeta, todo dispositivo capaz de reproduzir imagens ou sons, agora mostrava a figura de um monstro assustador. Não se parecia com nada mais, nada menos que uma criatura gelada... Um demônio de neve.

— Não vou enrolar demais, por isso me perdoem à grosseria. Meu objetivo, como vocês devem imaginar, é a conquista completa do seu planeta. Vocês tem muitos recursos valiosos, que serão nossos, à mão beijada ou acorrentada.

Aquela voz macabra, de alguma forma conseguia ser traduzida em todo local do globo. Ecoando na mente das pessoas como um réquiem de desespero, o caos se instaurou imediatamente em centenas de sociedades pelo mundo.

Cada frase, cada palavra liberada por aquele monstro, era registrada nos livros de história.

— Para permitir que os não combatentes fujam, e até mesmo para oferecer uma chance de rendição pacífica, eu decidi revelar o local de meu primeiro ataque.

Ao redor do planeta, dezenas de bolhas importantes da sociedade assistiam aquilo, também apavorados. Países já ligavam entre si, ou entre seus comandantes, no mesmo instante pensando em como se defenderiam.

Companhias e empresas gigantescas também se desesperam, sendo elas quem controlam economicamente este mundo. Uma em particular, prestava muito mais atenção no discurso do Terrafryano.

AE, ou Associação de Exterminadores, era uma das empresas mais influentes do mundo, devido aos seus grandes progressos comerciais envolvendo os Transformados. Tendo tutela dos Sete Sóis, os mais fortes do mundo, seus líderes já sabiam que uma guerra estaria por vir, e eles talvez acabassem na linha de frente.

Também evoluída tecnologicamente, uma das primeiras ações da AE quando a transmissão se iniciou, foi verificar se não era uma invasão terrorista, um hacker, ou até mesmo um Transformado com habilidades globais.

Eles ainda não tinham certeza, mas com as informações que tinham sobre o objeto que entrou na atmosfera e o ataque que houve no local de sua queda, provavelmente aquele era realmente a "Criatura" que massacrou as tropas de reconhecimento.

— Eu atacarei a... deixe-me ver o nome... Ah sim, perdão. Atacarei a República das Cidades Gêmeas, especificamente sua capital, Lakecity.

Os executivos da AE, que estavam espalhados por uma grande mesa circular suando feito porcos, esbugalharam os olhos ao ouvir essa frase. Um calafrio intenso correu por suas espinhas, e o som de seus corações acelerados, só não era mais alto do que o choro de muitos ali.

A sede da Associação era localizada em Lakecity, e o monstro viria até ali.

Ele mataria todos eles.

Como fez com aqueles homens.

Ou até pior.

— Corram, rendam-se, se defendam, tentem negociar ou até mesmo lutem até a morte, eu realmente não me importo com a ação que queiram tomar, afinal não fará diferença. Em algumas horas, quando a noite cair sobre a cidade, eu os atacarei com tudo que tenho.

Ele nem mesmo se importa?

Quanto poder esse ser tem?

— Ah, apenas tenho mais algumas coisinhas para ressaltar. O Império Terrafryano não se importa com suas vidas, porém, caso as valorizem, apenas não nos dêem trabalho. Isso será mais que o suficiente para comprarem a sua misericórdia.

Império? Seria uma invasão em massa?

Se um deles já é tão assustador, e parece tão poderoso, quantos desses viriam? Dezenas? Centenas? Milhares?

Nunca, na história da humanidade, eles enfrentaram tamanho desespero.

— Eu, herdeiro da casa Azure, os adverto. Ajoelhem-se sem resistência ao frio inevitável,ou lutem com todo seu espírito. O resultado não mudará, afinal…

Pela primeira vez, uma única frase conseguiu abalar toda uma raça…

— Todos os seus esforços... Serão em vão.