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Capítulo - 04

O restaurante estava cheio, ou seja, teríamos trabalho de sobra.

Eu corria para lá e para cá obedecendo as ordens de Valenccio, assim como meus colegas de trabalho. Porém, de alguma forma eu sentia que ele estava pegando um pouco mais pesado comigo.

No meu intervalo respondi as mensagens de minha mãe, que por sinal não eram poucas, e me concentrei em fazer exatamente nada. Uma dor martelava minha cabeça desde cedo, ela ia e vinha com pequenas pausas me deixando irritada. Tentei afastar a ideia de que a mesma poderia estar relacionada ao aneurisma, afinal não fazia muito tempo desde que eu fui à consulta para saber como eu estava.

Ouvi a porta dos fundos se abrir com o costumeiro estalido que ela fazia. Permaneci de olhos fechados nem um pouco interessada em quem havia se aproximado.

— Por que não come lá dentro com os outros? — A voz de Lorenzo corta meu sossego.

Quando abro os olhos ele está de braços cruzados na minha frente bloqueando o sol fraco.

— Porque preciso respirar um pouco de ar fresco — respondi como que em modo automático. Eu ainda não havia esquecido de como ele me tratou naquele dia.

— Pensei que gostasse do ambiente da cozinha.

— Eu não disse que não gostava.

— É meio deprimente — comentou.

— Não te chamei para ficar aqui comigo — rebati.

Ele inclinou a cabeça para o lado esquerdo. Uma pontada de dor nas minhas têmporas me fez estreitar os olhos.

— Por que você está sempre na defensiva?

Só podia ser brincadeira.

— Eu na defensiva? — Ri cética. — É você que me ataca desde que eu cheguei aqui.

Lorenzo virou o rosto.

— Isso não é verdade.

— É claro, você não admitiria. — Suspirei e me levantei certa de que não teria mais meu momento de descanso.

— Espera — ele pediu e me virei. — Quero propor algo para você.

Franzi as sobrancelhas, curiosa.

— Como "desculpas"? — caçoei.

Lorenzo descruzou os braços e se aproximou um passo de mim.

— Algo para me desculpar. Notei que seu prato brasileiro fez sucesso, — É claro que notou, ele até ficou furioso com isso. — por isso decidi que incluirei um cardápio estrangeiro no Romano's, assim vai ficar mais fácil atingir um público maior, e quero que você seja a responsável por esse cardápio. O que você me diz?

Minha mente, que era abalada pela dor de cabeça, tentou processar o que ele estava dizendo e o que estava me propondo. E então eu me lembrei de que esse seria o pedido de desculpas dele, algo que ele estava me "dando" para se redimir e não porque me achava capaz de conquistar esse "presente" através do meu trabalho e habilidade.

— Quer me colocar como responsável desse cardápio para se desculpar? — indaguei.

— Sim, é o que estou dizendo.

— Então não vai fazer isso porque me acha capaz de fazê-lo e sim porque quer aliviar a sua consciência? — As palavras saiam em disparada da minha boca, sem que eu as medisse ou repensasse. A dor na minha cabeça já não me permitia raciocinar e agir corretamente.

— Sim. — Assentiu, depois se deu conta. — Quero dizer, não. Eu sei do que você é capaz, Camila...

— Me colocaria em tal posição se o motivo não fosse para você se desculpar?

Lorenzo franziu o cenho fazendo seus olhos verdes assumirem uma sombra.

— Colocaria, mas não nesse momento — respondeu como se aquilo fosse tão óbvio.

— Então só resolveu acelerar o processo?

Ele balançou a cabeça.

— Eu, sinceramente, não estou entendendo porque você está agindo desse modo — disparou ele. A dor pareceu se intensificar. — Estou propondo uma grande oportunidade para você!

— Não porque mereço, mas sim porque você quer se livrar da culpa por me insultar!

— Mio Dio, ragazza*! Não é o que estou fazendo — exclamou.

Minha visão ficou turva de repente, seguido de vários pontinhos pretos.

— Não é o que você acha que está fazendo — repliquei baixo antes de sentir o escuro me embalar.

A primeira coisa que vi quando abri meus olhos foi um lugar branco, luzes vermelhas vindas de algum lugar, um rosto estranho e depois um rosto familiar.

Em seguida ouvi barulhos diferentes, ruídos altos, sons de objetos pequenos e máquinas. Alguma coisa empurrava ar para os meus pulmões me obrigando a continuar respirando, assim como uma dorzinha no meu braço esquerdo.

E, por algum motivo, o rosto do meu pai me veio à mente antes de eu não ver, ouvir ou sentir qualquer coisa.

Eu estava bem consciente quando a enfermeira me perguntou se um rapaz chamado Lorenzo Romano podia entrar no meu quarto. Respondi imediatamente que não e ela assentiu.

Eu não queria que ele soubesse da minha saúde, por qualquer que seja o motivo... eu não queria.

Estava sozinha no quarto, presa a alguns fios e coberta com roupas hospitalares. Fiz uma avaliação rápida de como eu estava, além de internada.

A dor na cabeça havia diminuído, eu estava com sede e um pouco confusa. Não me lembrava de muita coisa das últimas semanas. Me lembrava de momentos na pensão e outros no restaurante. Entretanto, alguns não se ligavam aos posteriores, como se tivessem sido cortados e emendados.

Me convenci de que era consequência do trauma sofrido. Trauma esse que deixaria minha mãe super preocupada e brava ao mesmo tempo. Ela seria capaz de pegar o primeiro avião com voo para Roma sem pensar duas vezes, e quando chegasse me daria uma bronca enorme por eu estar longe dos cuidados médicos dela.

Dei uma risada ao imaginar.

Tive que fazer exames dos quais eu repetia todos os meses, eu já estava até acostumada. No intervalo entre os exames e o resultado deles pedi a enfermeira que me desse o meu celular, porque senti necessidade de falar com meu pai.

Ele atendeu na segunda vez que tentei ligar.

— Camila?

— Oi, pai. — Sorri.

Meu pai não era muito de falar, ao contrário da minha mãe. Ele era advogado e levava a vida exatamente como agia em sua profissão. Havíamos discutido antes de eu viajar para a Itália, segundo ele eu ainda estava sob sua proteção. Mas quando entrei no avião ele me mandou uma mensagem dizendo que me amava mais do que tudo.

Talvez a necessidade de falar com ele fosse em razão da nossa discursão, e também porque eu não conseguia ficar brigada com ele.

Eu me senti bem depois de falar ao telefone com meu pai. Quando desliguei a mesma enfermeira apareceu na porta com papéis em mãos e um sorriso piedoso no rosto.

Então eu soube o que viria a seguir.

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Tradução das palavras com asterisco*

Mio Dio - meu Deus

Ragazza - moça; menina.

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