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Blackout

INTERLÚDIO - Residência dos Wright, São Francisco (US-CA) (4 de março, 2025 D.C.)

Determinado a explicar para Esther a razão de toda aquela loucura, Jim fala com uma voz entristecida:

— A sensação que você sentiu ao matar aquele soldado foi a sensação de ter se tornado mais inteligente.

— Tá me chamando de burra, é isso!?

— Queria que fosse isso…

— Então me explica.

— Você pode não acreditar em mim, mas…

De repente, o piar de um pássaro é ouvido do outro lado da enfermaria.

— Um passarinho? — Esther pergunta.

— Vamos deixar as histórias para depois. — diz Jim caminhando em direção ao barulho.

Os seus lentos passos ecoam naquela enfermaria silenciosa e, quanto mais ele se aproxima, mais intensa fica a fetidez que já atingia suas narinas.

— Cacete…

Então, ao chegar no fundo da sala, as mãos do homem tremulam com receio do que pode estar atrás daquelas cortinas hospitalares. Ainda assim, ele as abre lentamente, revelando uma cena bizarra.

Além das cortinas, está um homem que, sentado na janela, parece ter vislumbrado seus últimos momentos há dias. Enquanto isso, pássaros se posicionam do lado de fora como se assistissem a um funeral.

— Tem um cara morto aqui, Esther.

— Um cara morto!? Você deveria ter verificado esse tipo de coisa logo quando chegamos!

— Ah, claro! Me desculpa por estar mais preocupado com você!

— Você é burro, cara!? Se ele estivesse vivo, nós dois estaríamos mortos agora!

— Cala a boca, mulher! Ele tá morto, porra!

— Idiota…

Subitamente a barriga do cadáver começa a se mover de maneira estranha, como se algo tentasse sair e, ao mesmo tempo, o barulho dos pássaros ficando ainda mais agitados pode ser ouvido.

— Mas, que merda…

Em seguida, um pardal sai da barriga do defunto, perfurando seu estômago de dentro para fora e espalhando pela sala todos os seus órgãos digestivos.

— Puta que pariu! — Jim vomita ao ver aquela cena horrorosa.

— Essa não! Ele vai sujar o meu boot de sangue!

Esther pula da cama e corre para proteger seu tênis rosa.

— O seu tênis é o que mais te preocupa, mulher!?

— Ele é meu bem mais precioso!

Após manchar as paredes da enfermaria com sangue, o pássaro bate na porta como se pedisse para sair. Então, Jim abre a porta deixando ele ir.

— Como isso é possível? — Jim questiona.

— Eu não sei…

— Aquele maluco engoliu um pássaro?

— Aquela coisa era estranha demais para ser um pássaro. — Esther afirma. — Dá uma olhada. Ele deixou algo cair, mas, acho que não consigo me abaixar pra pegar.

— Deixa que eu pego, você nem deveria estar de pé.

Ao pegar o pequeno objeto caído no chão, Jim percebe que se trata de um pen drive cheio de sangue e, que nele está colada uma fita com um nome escrito.

— Parece que esse pen drive pertencia a um cara chamado Dr. Maximus. — Jim afirma.

— Bem, eu duvido que esse seja o nome do pardal.

— Realmente… Você sabe onde tem uma sala de computadores para lermos o conteúdo dessa belezinha?

— Nem sei. Deixei a planta da mansão com a Bruna.

— Então, tudo resulta em nós procurando por ela…

— Pode crer!

— Toma essa pistola e sobe nas minhas costas.

— Por que eu não posso ficar com o fuzil!? Eu quero o fuzil!

— Tu quer o fuzil, mulher!?

— Eu quero o fuzil, me dá o fuzil!

— Para de reclamar e pega a pistola logo! Você só precisa proteger as minhas costas.

— Ah, que droga…

Então, Esther sobe nas costas de Jim e ambos saem da enfermaria.

— Ei, você conseguiu chamar alguém para nos resgatar? — Ela pergunta.

— Não. Parece que tem algo nessa mansão atrapalhando o contato com o exterior.

— Sério? Então, por que não pede ajuda aos outros soldados aqui dentro?

— Porque essa ajuda que eu tô te dando é praticamente uma traição. Eu sei muito bem qual vai ser a resposta deles pra isso. — Ao dizer estas palavras, Jim segura o fuzil com ainda mais força.

— Tem noção que você tá pondo seu emprego em risco por uma estranha? Qual o motivo pra você fazer isso?

— Acho que eu já expliquei o motivo.

— Sei… Isso não me convenceu. Seu nome é Jim, não é?

— Isso.

— O que acha de continuarmos o assunto de antes?

— Ah, claro, pode ser. — Jim respira fundo antes de começar a falar. — Foi mais ou menos uns três anos atrás quando tudo começou. Ninguém sabe como ou onde isso surgiu, só sei que pessoas começaram a matar desenfreadamente por todo o globo. A partir disso, surgiram vários boatos de que matar pessoas te tornava mais inteligente, mas, é claro que nenhuma pessoa normal levou isso a sério, até porque não tem como algo assim acontecer, simplesmente não faz sentido algum.

— Realmente não faz muito sentido, mas continua…

— Isso se espalhou como um vírus, mas era diferente. Aqueles que já eram meio doidos se sentiram cada vez mais coagidos a matar e as pessoas que precisavam matar por trabalho ou coisa assim começaram a constatar que aquilo realmente ocorria.

— Caramba...

— No fim das contas, todo mundo acabou sendo afetado e por mais que a mídia tentasse desmentir, todos sabiam que era verdade. Isso tudo fez muitos se perderem na insanidade…

Subitamente, o corpo de Esther se arrepia e congela em choque. Tudo isso porque, diferente de Bruna, ela não fazia ideia de como estava o mundo do lado de fora da mansão. Como reagir a uma história tão absurda como essa?

— Os estudiosos chamaram essa inteligência adquirida ao matar pessoas de Laplace, homenageando o matemático e, foi por causa dela que a sociedade como conhecíamos foi destruída.

— Essa história é inacreditável…

— Pode até ser, mas, você sentiu ele, não foi?

Nesse momento, Esther olha para si mesma, como se tentasse descobrir o que está diferente.

— Então, matar pessoas te deixa mais inteligente? Como que isso funciona?

— Até o momento ninguém sabe. Mas, realmente acontece.

— Tem como eu me livrar disso, Jim?

— Boa pergunta… Foi pra isso que eu entrei na Corporação EDEN.

— Sério?

— Sim, o Laplace me fez perder pessoas importantes pra mim. Comecei a trabalhar nessa empresa porque ela parecia a mais capacitada a lidar com ele.

— E deu certo?

— Na verdade, não. A EDEN parece bem mais focada em seus próprios interesses do que usar sua tecnologia pra ajudar alguém.

— Sinto muito por você, acho que empresas são sempre assim, né?

— Sim…

Em seguida, os dois ficam em silêncio por alguns minutos...

— Esther, você é uma gracinha! — diz uma voz infantil.

— O que você disse, Jim?

— Eu não disse nada.

— Então quem foi que falou isso?

— Ninguém disse nada. Tá ficando maluca?

— Olha, só por via das dúvidas. Fique sabendo que eu não curto a sua fruta, tá bom?

— Isso explica muito coisa… — Ele responde em tom de risada.

— Como assim!?

— É por isso que você tá tão desesperada pra encontrar a tal Bruna. Você tá a fim dela, não é?

— Quê? Não! — Esther cora enquanto fala. — Eu não sou tão fácil assim! Acabei de conhecer ela!

— Se você diz…

— Para de falar bobagens, tá bom?

— Tá bom, tá bom. Já parei, não precisa ficar com a cara emburrada.

— Eu não tô emburrada!

— Não, nem um pouco.

— Você é um chato, sabia? Para onde estamos indo agora?

— Tem uma sala de segurança nesse andar que só pode ser aberta com a retina de um dos moradores da mansão.

— Um scanner de retina? Que interessante…

— Sim, ela deve nos dar acesso às imagens das câmeras de segurança e a um bom armamento.

— Belezinha!

Após caminhar pelos corredores, eles ficam diante de uma grande porta de metal maciço. Bem como a porta de um cofre, ela possui um avançado sistema de segurança e é forte o bastante para barrar qualquer invasor.

— Chegamos, Esther. Já pode sair de cima de mim.

— Obrigada.

Então, Esther liga o scanner e coloca sua retina para identificação. Porém, ele pisca em vermelho, negando o acesso.

— Como assim acesso negado!? — Ela grita.

— Silêncio! Tem alguma coisa errada…

— Você jura?

De repente, todas as luzes se apagam, fazendo a escuridão daquela madrugada congelante tomar conta dos corredores da residência.

— Droga! Por que logo agora!? — Jim reclama.

— Como que uma mansão tão grande pode ficar sem luz tão fácil? Tinha que ter pelo menos um gerador ou sei lá.

— Tudo bem, acho que conseguimos lidar com isso. — diz Jim retirando uma lanterna de seu traje. — Também tem algumas luzes de emergência, então, dá pra enxergar um pouco.

— E aquele seu capacete tecnológico, ele não tinha visão noturna ou algo do tipo?

— Ele tava danificado, então deixei lá na biblioteca quando te salvei. Seria só um peso a mais para carregar.

— Saquei… Então, o que vamos fazer agora?

— Vamos voltar para a enfermaria e esperar a luz voltar, não é seguro ficar por aqui com tudo escuro desse jeito.

— O quê? Claro que não!

— Deixa eu adivinhar… Você vai dizer que precisamos encontrar a Bruna.

— Exatamente! Olha, não precisa me ajudar, tá bom? Eu só não quero deixar a minha amiga morrer.

— E você tem alguma ideia de onde procurar por ela?

— Eu…

— Viu? Você não sabe! Isso é burrice, mulher!

— Sim, realmente é burrice. Mas, eu não tenho outra opção. — Ela responde com um sorriso.

— Que droga… Nesse ritmo vou acabar fazendo tudo que você quer. — Jim assume ter ficado ligeiramente comovido.

— Assim que é bom, fofinho!

No momento em que Esther termina de falar, a lanterna se apaga subitamente, caindo no chão logo em seguida.

— Jim?

Ao longe, o som das portas abrindo e fechando em alta velocidade deixa a mulher ofegante. Enquanto isso, o barulho de algo se movendo aproxima-se cada vez mais, chegando mais perto a cada inspiração.

— Jim!

Esther pega a lanterna no chão, ligando-a rapidamente para iluminar aquele corredor.

— Mas, que porra…

No entanto, ao invés de mostrar a localização de Jim, a luz da lanterna revela uma trilha de sangue e dezenas de corpos de soldados mutilados que agora tomam conta daquele ambiente.

— Isso não tava aqui antes!

Subitamente, o corpo de Esther é lançado contra a parede por uma força de origem desconhecida.

— Aaaaaaaah! — ela grita de dor.

Ao mesmo tempo, a mulher pode ouvir os ossos de seu ombro rachando e sentir suas feridas se abrindo. Porém, ela nem ao menos tem tempo de reagir, pois seu corpo é rapidamente empurrado contra a parede no final do corredor, fazendo Esther cuspir sangue no impacto.

— Aju… — Esther tenta falar, mas, com seus pulmões sem ar, ela não consegue proferir uma palavra sequer.

Em seguida, o corpo de Esther é suspenso no ar e arremessado contra as paredes múltiplas vezes, criando fissuras internas e externas a cada choque. Além disso, de nada adiantam seus disparos e sua pistola é rapidamente derrubada.

No fim, ela é lançada no chão de um quarto escuro e, em uma ação desesperada, pega a lanterna que esteve se esforçando para segurar durante todo esse tempo para iluminar a sua frente.

Diante de Esther está um espectro negro que, apesar de sua forma humanoide, não possui um rosto ou pernas, exalando uma presença maligna. Por essa razão, ela não sabe como agir, o que fazer ou como enfrentar essa criatura, e mesmo que soubesse, Esther não teria forças para lutar. Então, a mulher fica apenas deitada aguardando o golpe final daquele monstro. Porém, o repentino som de um tiro faz o espectro mudar seu foco e ir embora.

Ao ver que a situação se acalmou, Esther suspira aliviada.

— Tudo bem, docinho? — uma voz infantil cumprimenta Esther.

— Quem tá falando!?

— Você é tão bonita! Como foi acabar nesse estado?

— Nada dá certo nessa merda! Tudo que eu tento fazer dá errado! Agora, todos que me ajudaram vão morrer!

— Você deve estar se sentindo sozinha, não é? Pode me abraçar se quiser, amorzinho.

— Te abraçar? Onde está você?

— Bem aqui!

Nesse momento, um ursinho de pelúcia marrom aparece diante de Esther.

— É melhor não se mexer muito. Eu sei que tá doendo, mas prometo que você vai ficar bem, Estherzinha. Vai ficar tudo bem…

Então, Esther abraça o ursinho com toda sua força e começa a chorar…

Agradecimentos

Bernardo de Souza Albuquerque

João Lucas Hoffman

Átila Heytor França de Moura

João Pedro Viter Menino

João Guilherme Balbino Ubara

Murilo Crisóstomo Magalhães

Ashley Diniz Chrispim de Souza

Revisado por: Pedro Tavares

*Nos ajude apoiando o projeto e tenha seu nome na página de agradecimentos...

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