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Capítulo 27: Calmaria Antes da Tempeste

Parte 1

O céu ainda estava coberto por nuvens pesadas, mas a tempestade que antes rugia com fúria parecia ter se acalmado. A chuva agora era um sussurro suave, caindo em gotas finas e persistentes. As primeiras luzes do amanhecer ainda estavam longe, e o mundo permanecia envolto na escuridão úmida e tranquila da madrugada.

Dentro de um quarto, um silêncio sombrio reinava. Ed estava de pé ao lado da cama, seus olhos cansados e sombrios focados na figura repousando sob os lençóis. Helena estava deitada, sua pele pálida contrastando com os fios negros de seu cabelo espalhados sobre o travesseiro. Sua respiração era extremamente leve, quase imperceptível, mas estável. Ed sabia que ela não acordaria tão cedo.

Com um movimento lento e cuidadoso, Ed tirou um pedaço de papel dobrado do bolso. Ele o segurou por um momento, hesitando, seus dedos sentindo a aspereza do papel. As palavras que havia escrito ali ainda ecoavam em sua mente, ele colocou o papel dobrado sobre a mesa de cabeceira, ao lado de uma vela apagada, o som do leve contato do papel com a madeira parecendo alto demais no silêncio.

Ele olhou para Helena mais uma vez. Seu peito subia e descia de maneira quase imperceptível, cada respiração um lembrete de sua fragilidade naquele momento. Ed passou a mão pelo cabelo, desviando o olhar, como se quisesse afastar a cena da memória. Ele sabia que não poderia ficar mais tempo.

"Eu sinto muito por isso ter acontecido..." murmurou baixinho, sua voz rouca e cansada. Ele sabia que ela não podia ouvi-lo, mas as palavras precisavam ser ditas.

"A gente se vê."

Parte 2

Ed saiu do dormitório ajustando seu equipamento e verificando uma de suas cimitarras presa à cintura. O frio da madrugada fazia o metal gelar sob seus dedos, mas ele ignorava a sensação, concentrado na tarefa. Cada detalhe de seu equipamento era revisado com precisão, como uma segunda natureza. Enquanto caminhava pelo corredor úmido, seus pensamentos vagaram.

"Aonde está o Pallas, ein?" Ele se perguntava, franzindo a testa. Não o via a muito tempo. Havia uma missão, e eles deviam esperar por Pallas, mas ele estava demorando muito. Algo não estava certo.

Antes que pudesse aprofundar seus pensamentos, o som de passos atrás de si chamou sua atenção. Ed virou-se e viu William, seu pai, caminhando em sua direção. Ele também estava se equipando, ajustando sua semi-armadura e segurando uma espada curta em sua mão boa. O outro braço de William estava enfaixado, ainda se recuperando da batalha recente que havia lhe custado o membro. Ed franziu a testa, sua preocupação evidente no olhar.

"Pai... você não deveria ir..." Ed disse, a voz baixa, mas firme. Ele olhou diretamente para o braço direito perdido de William, onde agora apenas um toco enfaixado restava.

"Você ainda está se recuperando, e não faz tanto tempo que perdeu o braço."

William parou por um momento, os olhos se encontrando com os de Ed. Ele soltou um suspiro, mas seu semblante não mostrava hesitação.

"Já estou bem o suficiente." disse William, com uma expressão resoluta.

"Você acha que sou algum amador, Eddy? Já sofri ferimentos piores e voltei à luta." Ele deu um sorriso torto, o tipo de sorriso que sempre usava para disfarçar a dor.

"Posso não ter o braço todo, mas ainda sou mais rápido que muita gente com dois."

Ed balançou a cabeça, não totalmente convencido. "Não é só isso, pai. Perder um braço muda tudo. Seu equilíbrio... sua força."

William estreitou os olhos, e sua voz endureceu levemente. "Você acha que não sei disso? Passei minha vida lutando, Eddy. Já estou acostumado a me adaptar. Isso não vai me parar. E você sabe tão bem quanto eu que precisamos de cada espada disponível para matar aquela coisa."

Ed ainda hesitava. Ele sabia que seu pai era teimoso, um guerreiro que nunca recuava, mesmo quando o bom senso dizia que deveria. Mas a visão de William lutando com apenas um braço o deixava inquieto.

"Se as coisas derem errado..." Ed começou, mas William o cortou.

"Se as coisas derem errado, lidaremos com isso. Mas ficar parado aqui não vai ajudar ninguém." William olhou diretamente nos olhos de Ed, sua expressão firme, porém com um toque de afeto.

"Você fez a escolha certa da última vez. Agora, é a minha vez de decidir. Eu estou bem, Eddy. E não vou ficar de fora."

Ed suspirou, sabendo que não havia como dissuadir seu pai. A determinação nos olhos de William era algo que ele reconhecia bem. Era a mesma chama que ele via refletida em si mesmo.

"Está certo." Ed finalmente cedeu, ajustando seu equipamento uma última vez.

"Mas se você achar que não consegue continuar..."

William soltou uma risada curta e amarga. "Quando isso acontecer, a besta já estará estraçalhada no chão."

Ed deu um último olhar para o braço ferido de William, sentindo um peso no peito, mas optou por não insistir mais. Ele sabia que a decisão já estava tomada.

William parou por um instante, como se algo tivesse passado por sua mente. Ele soltou um pequeno suspiro e, sem dizer nada, enfiou a mão boa dentro de seu manto. Seus dedos procuraram algo por um momento, antes de puxar um pequeno objeto, envolto em um pano velho. Ele olhou para aquilo com um misto de nostalgia e seriedade.

Ed observou, curioso, quando William estendeu o embrulho para ele. "Aqui. Quero que você tenha isso."

Ed pegou o embrulho com cuidado, desfazendo o pano lentamente. Dentro havia uma adaga, pequena, mas claramente forjada com precisão. A lâmina era de um aço escuro, quase negro, com entalhes detalhados no cabo. Era uma peça antiga, mas ainda afiada e letal.

"Essa adaga…" Ed começou, reconhecendo a arma.

"Era do vovô."

William assentiu, os olhos sombrios por um breve instante. "Sim. Ele me deu antes de... bom, antes de tudo aquilo acontecer. Agora, estou passando para você. Quero que cuide bem dela."

Ed segurou a adaga com reverência, o peso emocional da arma em suas mãos. A lembrança de seu avô, embora vaga, parecia mais próxima agora. Ele olhou para William, tentando entender a razão do presente.

"Por que agora?" Ed perguntou, sem querer demonstrar sua surpresa.

"Por que me dar isso agora?"

William deu um meio sorriso, cansado e com melancolia. "Porque sei que você está pronto. E porque… você nunca sabe quando vai precisar de algo que possa salvar sua vida. Essa adaga já me salvou uma vez, e talvez faça o mesmo por você."

Ed ficou em silêncio por um momento, absorvendo o gesto. Ele sabia o quanto aquela adaga significava para o pai e o que representava para sua família. Era um símbolo de proteção, de legado.

"Eu... vou cuidar dela." Ed disse, sua voz séria.

"Prometo."

William deu um leve tapinha no ombro de Ed, um gesto rápido, mas cheio de significado. "Eu sei que vai, Eddy."

Antes que Ed pudesse responder ao toque no ombro de William, a figura de Wilde apareceu do corredor sombrio do dormitório. Seu rosto estava tenso, marcado pelo cansaço, mas seus passos eram leves e seguros, como sempre.

"Os corpos foram guardados." Wilde disse, com a voz rouca, como se tivesse passado horas em silêncio até aquele momento.

"Tudo está pronto. Só falta o Pallas aparecer pra decidirmos o que vamos fazer."

Ed e William trocaram um breve olhar, e Ed balançou a cabeça levemente. "Ele está demorando bastante." comentou Ed, ajeitando a adaga recém-recebida em seu cinto.

No mesmo instante, os passos pesados de Pallas e Don ecoaram pelo corredor. Pallas, com seu ar sempre calmo e atento, olhou ao redor antes de parar diante dos três, suas sobrancelhas se arqueando levemente. "Corpos?" ele perguntou direto, sua voz grave preenchendo o espaço silencioso. O tom, embora firme, trazia uma curiosidade genuína.

Don, sempre observador, ficou logo atrás, cruzando os braços enquanto esperava a resposta.

Ed limpou a garganta, tentando organizar os pensamentos. "O monstro... ele me atacou. Tivemos que lutar com ele." Ele fez uma pausa, as palavras fluindo, mas ao começar mencionar o nome de Helena, ele hesitou, os olhos se desviando.

"Nós... tivemos que lutar com ele, e..." Ele tentou continuar, mas as palavras ficaram presas na garganta.

Pallas inclinou a cabeça, os olhos fixos em Ed. Havia algo no olhar dele, uma mistura de preocupação e antecipação. "Helena?" ele disse, o tom calmo, mas carregado de significado. "O que aconteceu com ela?"

A pergunta pairou no ar, densa e cheia de peso. Ed abriu a boca para responder, mas travou, o peito apertando como se o ar estivesse preso. A imagem de Helena caída no chão em uma poça de sangue, frágil, veio à mente, e ele não conseguiu forçar as palavras a saírem.

Wilde olhou para Ed de canto, percebendo o desconforto crescente, mas ficou em silêncio, enquanto William fechava a expressão, sabendo que o filho precisava encontrar sua voz.

Pallas deu um passo à frente, a preocupação agora mais evidente em seu rosto. "Ed?" Ele o chamou, a voz suave, mas com um tom de urgência.

Pallas franziu a testa, vendo o bloqueio de Ed, e decidiu agir rápido. "Don, vá chamar mais guardas. Agora." Sua voz tinha uma firmeza incontestável. Don assentiu e saiu sem uma palavra, seus passos apressados ecoando pelo corredor enquanto desaparecia da vista.

Pallas então voltou-se para William e Ed. "Vocês dois, se preparem." Seu olhar foi direto para Wilde, como se já soubesse a quem recorrer para obter respostas rápidas e claras.

"Wilde, explique a situação com mais detalhes."

Wilde, que mantinha uma expressão de cansaço misturado com calma, acenou em concordância. "Entendido." Sem questionar, ele começou a caminhar ao lado de Pallas, pronto para descrever os eventos, enquanto os dois sumiam em direção à saída, discutindo os próximos passos.

William ficou para trás, olhando para Ed com um misto de preocupação e seriedade. "Lembra da nossa conversa?"

Ed assentiu devagar, sentindo o peso daquela pergunta, como se ela fosse muito mais do que um simples lembrete. "Lembro, sim."

William balançou a cabeça em aprovação, como se estivesse confirmando algo silenciosamente dentro de si. Seus olhos se voltaram para a lâmina que havia dado a Ed, ainda firmemente seguro em suas mãos. "Cuida bem disso." O tom era suave, mas carregado de significado, como se a simples posse daquela arma carregasse mais responsabilidades do que Ed inicialmente percebera.

Sem mais nada a dizer, William virou-se e começou a se afastar.

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