Eno simplesmente não conseguia acreditar no que estava ouvindo, ou melhor, lendo. Boa Sorte não o poupava de nenhum detalhe e mostrava tudo o que ele havia feito, por mais feio que fosse.
— Por que você não tentou me impedir? — questionou Eno.
Boa Sorte não digitou nenhuma resposta.
Falando baixinho, Eno disse em tom de ameaça:
— Se não me responder agora, seus óculos de uma figa, eu quebro você no meio.
Então, Boa Sorte começou a digitar vagarosamente:
"Eu não tenho como impedir você de fazer o que lhe sugestionam."
— E por quê? — quis saber Eno.
"Porque fui programado apenas para ajudá-lo com informações, aconselhá-lo ou alertá-lo. Fora isso, tudo o que posso fazer é filmar os acontecimentos e mostrá-los a você."
— E por que você não tenta fazer contato comigo quando eu não estou aqui? — perguntou Eno, demonstrando uma irritação crescente.
"Vou tentar lhe explicar como as coisas funcionam aqui, meu jovem. Eu sou programado para realizar determinadas ações, então eu só posso fazer o que me for ordenado. Assim como você é programado para obedecer a algumas ordens. Então, você só vai fazer o que lhe for pedido."
— Eu ainda não entendo. Como posso ser forçado a fazer coisas tão terríveis contra a minha vontade, se sou um ser humano? — disse Eno, confuso.
"Preste bem atenção, Eno. Esta informação é extremamente confidencial. A questão é que Belle Reese tem um poder sugestivo, e você é facilmente influenciável por ela. Mas tenho boas notícias para você também. Quanto mais ela usa esses poderes em você, menos efeito eles têm. Isso significa que em breve ela não poderá mais comandá-lo como uma marionete."
Admirado, mas não muito animado com seu futuro incerto, Eno insistiu:
— Então, me diga, por favor, quantas vezes mais eu terei que fazer essas coisas terríveis contra a minha vontade?
Boa Sorte ficou em silêncio, como se estivesse pensando. Após alguns minutos, ele deu a resposta que Eno precisava:
"De acordo com as minhas análises, você ainda terá que realizar mais ou menos cinco missões."
— Mais cinco missões? Você quer dizer mais cinco assassinatos! — exclamou Eno, surpreso.
"A primeira, como você bem sabe, foi eliminar o herói Super-Ultra. A segunda missão, que você também cumpriu com sucesso hoje, foi eliminar o invencível Bobina. Quanto à sequência, ainda não tenho informações precisas, mas me parece que sua missão é eliminar todos os super-heróis desta cidade."
— Como assim, todos? — perguntou Eno, desesperado.
"Posso lhe dar uma lista dos que ainda estão vivos, se quiser."
— Não tenho escolha? — disse Eno, desanimado.
"Centurião Dourado, Bravo Veloz, Aço Blake, Mestre Comando, Mister Ímã, Garota Danger e Tessala, a Princesa da Eletricidade. Bem, pode ser que eu tenha errado nas análises, mas parece que existem sete super-heróis a serem eliminados. Então, provavelmente você ainda terá sete missões até se livrar do poder de Belle Reese."
— Acho que morrerei antes disso. Com certeza, alguém vai me deter. Alguém tem que me impedir. Me diga, Boa Sorte, você realmente acha que tenho a capacidade de eliminar todos esses sete super-heróis? — perguntou Eno, sem confiança.
"Eu diria que é impossível. Mas, como estou programado para avaliar sua capacidade de realizar missões aparentemente impossíveis, e considerando que você eliminou Super-Ultra e o invencível Bobina sem muito esforço, me parece que você pode ter sucesso nas suas demais missões."
De repente, uma ideia surgiu na mente de Eno: e se aquele óculos-visor estivesse lhe dando notícias falsas?
Então, ele decidiu caminhar até a pilha de jornais e, na primeira página, leu em letras garrafais:
"Misterioso homem elimina com facilidade um dos mais queridos super-heróis de nossa cidade, o invencível Bobina."
* * *
"Belle Reese sem Tolerância"
Belle Reese queria estar feliz, precisava estar feliz, mas não se sentia assim. Deitada confortavelmente em sua cama, ficava o tempo todo pensando no que faria quando sua missão fosse concluída.
Pensava no poder que detinha em suas mãos, na quantidade de dinheiro que possuía e nas ricas propriedades que era dona. Mas, no fundo, isso não lhe trazia felicidade suficiente para querer viver para sempre com aquela vida. Ela se sentia presa, uma prisioneira de tudo que possuía.
Dia após dia, ela revisava seus planos até tarde da noite, garantindo que nada desse errado. O resultado parecia sempre o mesmo: ela seria vitoriosa.
Em nenhum momento ela duvidava disso, afinal, já havia derrotado dois dos maiores heróis, e os outros seriam fáceis demais para ela.
O que a deixava mais tranquila era saber que poderia olhar para si mesma no espelho todos os dias. Nenhuma ruga, nenhum cabelo branco ou celulite poderia afetá-la, afinal, nenhum efeito desses poderia ultrapassar os poderes do T. Rat, que coincidentemente acabara de chegar.
— Olá, Belle Reese. Qual o motivo de estar com essa cara tão triste? Alguma coisa errada? — perguntou T. Rat.
Imediatamente, Belle Reese escondeu sua tristeza.
— Não foi nada demais, T. Rat. Apenas alguns pensamentos tristes que não consigo evitar. E você, o que faz aqui a essa hora?
— Não tenho uma boa notícia para lhe dar hoje, Belle Reese. Não sei como, mas meus poderes parecem estar diminuindo a cada dia.
Belle Reese não conseguia acreditar no que estava ouvindo. Afinal, seus planos só dariam certo se não houvesse qualquer alteração.
— Você tem certeza disso? — perguntou, preocupada.
— Absoluta. Você acha que eu brincaria com uma coisa assim?
— Acredito que não, mas venha até aqui. — disse Belle Reese, convidando-o a se aproximar.
T. Rat gostava dessa parte. Ele se aproximou lentamente, apreciando a visão daqueles enormes olhos verdes que o fixavam e o dominavam. Ele adorava seu perfume, a maciez de suas mãos...
Então, ela olhou diretamente em seus olhos e fez contato. Ele estava pronto para o que viria a seguir. Ela pegou em sua mão e trouxe-a perto de seu rosto, dando-lhe um beijo leve, mas suficiente para colocá-lo sob seu controle.
T. Rat não poderia mentir, nem se quisesse. Ele não conseguiria negar nenhuma informação. E, por mais absurda que fosse a ordem, ele teria que obedecer.
— Seus poderes estão realmente diminuindo? — perguntou Belle Reese, preocupada.
— Sim, estão diminuindo a cada dia que passa. — respondeu T. Rat, sem titubear.
— E como você pode afirmar tal coisa? Pode me explicar o que o levou a pensar isso? — questionou Belle, sentindo uma pontada de desespero ao imaginar que seu plano poderia estar desmoronando.
Sem piscar, T. Rat explicou:
— Esse meu poder é como uma enorme sombra que faz parte de mim. E a cada dia, sinto como se essa sombra estivesse encolhendo ao meu redor. A redoma do tempo que envolvemos neste bairro e em suas propriedades ainda está funcionando. Mas não sei quanto tempo isso durará, nem quanto controle terei sobre ela.
— Sei que meu poder não acabará de repente, mas, com ele diminuindo desse jeito, sinto que ficaremos vulneráveis em menos de duas semanas. — continuou T. Rat.
— Isso é mais que suficiente para que nossos inimigos nos capturem. — disse Belle Reese, preocupada. — Eu só preciso de oito semanas. Será que isso é pedir muito? Por favor, venha aqui. — Ela o chamou, e T. Rat se aproximou imediatamente, sabendo o que viria a seguir.
Ele abraçou Belle Reese com força, e ela o apertou ainda mais forte entre seus seios. Então, ela o beijou demoradamente, deixando-o sem fôlego. Após o beijo, mordeu seus lábios com força e, sem soltá-lo, ordenou:
— Estou dando a você uma quantidade de neurotoxinas suficiente para dominar a vontade de mais de duas dúzias de homens. Como você é apenas um, estará sob meu controle por um longo tempo. Eu lhe ordeno que descubra o motivo dessa perda de poder e só volte quando tudo estiver sob controle novamente. Preciso de oito semanas para finalizar meu grande plano. E depois disso, tudo estará bem. Agora, se você não conseguir controlar seu poder, eu lhe ordeno que use qualquer meio necessário para se eliminar de forma rápida e indolor. Quando você acordar daqui a algumas horas, suma daqui e vá se tratar.