"Estou muito preocupada." Ela disse, mas não parecia preocupada. Ela olhou para seu caderno e fez algumas anotações. O que ela estava escrevendo?
"Você deveria estar preocupada com você mesma." Ele disse a ela.
Ela levantou o olhar para ele. Seus olhos frios quase o fizeram tremer. Às vezes eles podiam parecer sem alma. Ignorando o comentário dele, ela continuou a fazer suas perguntas.
"Para ser considerado de sangue puro, quão próximo dos seus ancestrais você precisa ser?"
Por que ela estava curiosa sobre isso?
"O mais próximo vivo."
"Então você tem o sangue mais puro entre os vivos?"
"Entre os homens vivos, sim. O meu sangue foi de alguma utilidade para você, professora?"
Ignorando-o novamente, ela anotou algumas coisas. Ela estava começando a irritá-lo novamente, mas ele não conseguia conter sua curiosidade. Ele nunca tinha visto uma mulher tão fria. Tão composta e focada na missão.
"Você é um dragão negro." Ela disse sem olhar do caderno. "Você conhece o meu pai?"
"Todo dragão conhece o seu pai."
"Um de vocês o matou." Ela disse calmamente.
"Quem te disse isso?"
"Eu vi com meus próprios olhos."
Ele se enrijeceu e ela olhou lentamente para cima de seu caderno, segurando o olhar dele. "Um dragão negro o mastigou e cuspiu."
"Você viu isso?" Era tarde demais. As palavras já tinham saído de seus lábios.
Não. Ele sabia quem matou o pai dela e nunca se importou. Nem deveria se importar. Todo dragão queria que ele estivesse morto e desaparecido.
"Sim. Também foi um dragão negro que matou minha mãe. Queimou-a." Ela disse, com o rosto sem demonstrar nenhuma emoção. Isso o perturbou de alguma forma. Não é de se admirar que os olhos dela fossem assim se ela viu ambos os pais morrerem.
"Eu deveria me sentir mal por você?"
"Meu pai tentou fazer a paz com o seu clã."
"Sim?" Ele levantou uma sobrancelha.
"Deixa para lá." Ela suspirou e voltou a fazer anotações.
O que diabos ela estava escrevendo?
"Seu pai foi estúpido em esperar pela paz e isso o levou à morte," ele disse a ela.
Ela fez uma pausa por um momento, mas então continuou a escrever algo.
"E agora você não quer cometer o mesmo erro." Ele continuou.
Agora ele tinha a atenção dela. Ela levantou seu olhar azul sem mover a cabeça e eles cravaram em seus olhos. "Ele não cometeu nenhum erro. Apenas provou aos demais que é guerra que vocês querem e portanto guerra é o que terão."
Não se ele a esmagasse primeiro. E quando mentes como a dela e do pai dela não existissem mais, ele mataria o resto.
"E o seu pai morreu nessa guerra."
"Meu pai continuou a viver nos corações das pessoas e através de suas invenções, vive em suas esperanças e no espírito de luta delas. Ele também ainda vive nos corações de vocês através do ódio que sentem por ele." Agora ele ouviu algumas emoções na voz dela e suas palavras o atingiram. Ela estava certa. O pai dela se tornou uma parte da história, uma mudança no mundo então o nome dele continuaria vivo para sempre.
Ele debochou. Não faria diferença uma vez que todos estivessem mortos. Não restaria nenhum humano para estudar a história humana.
A fria princesa voltou a se compor e a escrever no caderno novamente.
"O que de tão importante você está escrevendo?" Ele perguntou, irritado.
Ele queria rasgar aquele caderno em pedaços.
"Estou desenhando." Ela disse sem olhar.
O quê?
"Eu não gosto de desperdiçar meu tempo, então gosto de fazer várias tarefas ao mesmo tempo."
Ah, ele pensou com desgosto. Desperdiçando o tempo dela? Com ele?
Deus. ele fechou as mãos em punhos. Ele mal podia esperar para pôr as mãos nela. Ele nunca esteve tão ansioso para matar alguém.
"Eu pensei que você veio aqui para me interrogar sobre sua irmã."
"Parei de procurar por ela. Você estava certo. Não estou segura para estar perto de uma criança e eu não quero machucar minha irmã."
Sua calma o surpreendeu quando ele disse que ela era incapaz de ser mãe. Qualquer mulher se ofenderia com tal comentário, mas não a afetou. Ela não tinha desejo de ser mãe, mas, ele fez uma pausa e deixou o cheiro dela invadir seus sentidos. Ela tinha um cheiro tão doce e feminino. Tão fértil. Então... ele apertou a mandíbula forçando o cheiro dela para fora de sua mente, sem nem querer pensar no que isso significava.
Ele olhou para ela, para o seu cabelo dourado claro, sua pele clara e seus lábios rosa opaco. Tudo sobre ela era pálido. Ao contrário das mulheres dragão, ela carecia de cor e calor. Ela era gelo em vez de fogo e o dragão de sangue quente dentro dele queria derreter essa princesa de gelo. Ele queria queimar ela com o fogo que ardia nele.
"Não acredito em você." Ele disse. Ela não desistiria de sua irmã quando nem mesmo sabia se tinha uma criança ou não e em que condições ela poderia estar.
"Ou você não quer acreditar porque não é vantajoso para você. Você pensou que sairia daqui tão facilmente." Ela balançou a cabeça para ele. "Eu passo horas aperfeiçoando a invenção do meu pai e as minhas. Elas passam por múltiplos testes até que eu saiba que posso confiar nelas."
Ele não duvidava agora que a tinha visto pessoalmente. Ele podia dizer que ela era perfeccionista. Ela tinha um olhar aguçado e não parecia alguém que se satisfazia apenas com o bom. As mãos dela já lhe diziam muito. Elas não eram mãos de princesa. Eram cicatrizadas, com feridas novas e antigas e ele não tinha certeza do que ela fez com as unhas, mas a pele ao redor delas estava descascada. A carne vermelha estava claramente visível contra a pele branca dela.
Erguendo o caderno, ela o segurou à distância e estudou seu desenho. "Terminei." Ela disse e fechou o caderno. Ela se levantou da cadeira e começou a arrumar suas coisas.
Espera! Ela estava indo embora?
"Pensei que você tentaria suas invenções?"
Ela olhou para trás, para ele. "Mudei de ideia. Você já está ferido."
Ele se levantou às pressas. "Não preciso da sua simpatia."
"Pena." Ela corrigiu. "E eu estou te dando, mesmo que você não precise ou queira."
Depois de colocar tudo em sua bolsa, ela a levantou e se virou para ele com um sorriso pretensioso que de forma alguma tentava parecer genuíno. "Às vezes sou generosa."
Malachi estava prestes a fazer ameaças, mas as conteve. Ela estava fazendo tudo isso para irritá-lo. Ele um dia sacilaria sua raiva de qualquer forma. Sendo filha de um professor odiado, ele só precisava jogá-la aos dragões para se banquetear com ela e ele faria questão de assistir e se divertir. Assim como seu pai, ela seria mastigada e cuspiada.
"Certifique-se de descansar enquanto pode. Tenho certeza de que Sua Majestade... quero dizer, o rei humano estará aqui amanhã para torturar você, Rei Malachi." Ela fez um aceno curto com a cabeça e depois se afastou.
Malachi ficou parado lá, confuso. Ele não sabia o que fazer com esse encontro. Ele estava preso e não tinha certeza se conseguiria sair e que tipos de tortura essa mulher traria na próxima vez.
Malachi quase podia ver o sorriso de satisfação dela agora. Suas mãos se fecharam em punhos. Sim, ele manteria essa imagem dela em sua mente para sair dessa caverna e queimar o mundo dela.