O Narrador:
Ainda é dia quando seguem em debandada até a Lídia, então o comandante Cy sente que todos estão seguros, para e reúne todo o exército novamente, iniciando a organização por tropas, situação que leva muitas horas para ser concluída, até que todos cheguem e se apresentem aos seus líderes.
Anoitece e os comandantes se reúnem para conversar, é nesse momento que os nobres se aproximam.
— Por que vocês fizeram isso com Ahriman? – Sirdar Ohrmazd pergunta.
— Não sabem que podem ser acusados de traição ao império? – Sirdar Melqart pergunta.
— Antes ouçam o que os guerreiros da sexta tropa têm a dizer sobre o momento em que a comandante e Princesa Shahnaz foi atingida pela lança. – comandante Cy diz.
— Temos certeza de que quando o Imperador ouvir os relatos, ele próprio nos dará razão. – comandante Dareh diz.
— Além disso, que guerreiros lutam em exaustão e fome? – comandante Jaspe pergunta.
— Qual general permitiria tal ato vergonhoso com seu exército? – comandante Gazsi pergunta.
— Somos guerreiros persas e lutamos por nosso Imperador e general com todo nosso empenho, honra e dignidade, isso jamais mudará. – comandante Simin afirma.
Assim concluem a conversa e descansam um pouco, a jornada será longa para retornarem, ainda mais famintos, serão pelo menos mais quatro dias até o Egito.
Enquanto isso, no palácio no Egito, mais cinco dias se passam e a Princesa Shahnaz começa a dar os primeiros pequeninos sinais de melhora, a febre começa a ceder um pouco mais e ela finalmente tem pequenos despertares, mas como está muito fraca, logo adormece novamente.
Então os sábios preparam infusões e recomendam caldos para que ela possa ir se fortalecendo e recuperando aos poucos, ao mesmo tempo que seu ferimento vai cicatrizando.
Assim que a Princesa desperta, uma serva lhe apoia e oferece os preparados, na verdade a obriga a beber, mesmo sem vontade ou fome e ainda que ela se sinta muito fraca.
Shahanshah observa sua herdeira de longe e sorri, finalmente a vê desperta e se alimentando, enchendo seu coração de esperanças mais uma vez.
Vendo que a situação da Princesa Shahnaz está resolvida, o Imperador manda avisar a todos os nobres que o julgamento do general Jahangir Azimi será realizado dentro de seis dias.
Princesa Shahnaz POV:
Desperto com uma péssima sensação, uma forte dor no meu peito e todo o meu corpo está extremamente débil e dolorido, não consigo me movimentar na cama e estou rodeada por muitas pessoas que parecem aflitas, mas sinto muito sono...
Agora uma serva eleva a minha cabeça para me dar uma infusão e caldos, mas me sinto fraca e tonta, mesmo assim aceito porque sei que é realmente necessário.
Quando me deita novamente sinto uma dor terrível em meu peito, que faz querer gritar, mas minha voz sai como um sussurro.
Por quatro dias a rotina permanece igual, servas me banham no leito, muitas pessoas estão sempre ao meu redor, sou alimentada o tempo todo com caldos e infusões, os curandeiros fazem suas rezas e sinto que colocam e trocam os preparados no ferimento porque me ardem.
Nos últimos dois dias o que tem mudado é que consigo fazer meus próprios esforços e tenho pedido uma alimentação mais sólida.
Recebo a visita do Imperador diariamente e ele sempre diz que quer me ver ao seu lado na sala do trono, eu lhe respondo que em breve irei.
Desejo saber do general, que desde então nunca veio me ver, mas a quem perguntarei?
Então ouço uma conversa sobre cárcere e julgamento de dois servos distantes de mim.
— Falam a respeito do que? Se aproximem e me digam. – exijo.
— Desculpe, Princesa, mas o general persa está preso desde que o filho do Imperador disse diante de toda a corte que viu quando a Princesa e ele lutavam bem próximos, a lança foi jogada por um nobre egípcio em sua direção e o general deixou que Vossa Alteza fosse atingida sem fazer nada para protegê-la. Seu julgamento será hoje e todos sabem que será condenado à morte. Agora o filho do Imperador que é o novo general e está no momento em guerra contra o Chipre. – a serva diz.
Uma fúria incontrolável me invade e exijo saber em qual momento acontecerá esse julgamento porque eu irei, mas todos dizem que eu não posso ir sob hipótese nenhuma.
— Eu irei, mesmo que seja carregada neste leito ou sozinha com minhas pernas, vocês decidem. – digo.
O Narrador:
Finalmente o exército imperial adentra o Egito, dois dias depois do esperado e segue direto para o acampamento e prontamente recebem a notícia sobre o julgamento do general, fazendo com que os comandantes se apressem em ir ao palácio.
Enquanto seus nobres de guerra vão ao palácio para dar a notícia ao Imperador e o encontram na sala do trono, são convidados a adentrar, afinal um julgamento está para começar.
— Chegaram a tempo, nobres Senhores. Tragam o prisioneiro. – o Imperador diz.
— Temos uma notícia para lhe dar, Majestade. – Sirdar Melqart diz. — Agora não, tratamos disso mais tarde. – Shahanshah diz.
Chega o general Jahangir Azimi todo sujo e maltrapilho é apresentado diante do Imperador, faz uma reverência e se põe de joelhos.
— Estamos aqui para discutir a culpa ou inocência do general Jahangir Azimi na situação que vitimou a Princesa Shahnaz. – o Imperador diz.
— Onde estão o acusador e defensor? – Sirdar Mirrikh pergunta.
— Sobre isso que queremos dizer. – Sirdar Khodadad diz.
— Devemos chamar os comandantes de tropa para esse momento, Majestade. – Sirdar Ohrmazd.
Então a porta da sala do trono se abre.
— Estamos aqui. – comandante Cy diz e todos aparecem.
— Ahriman ainda não chegou, mas farei seu relato. Ele diz que estava perto de Shahnaz e o general e que viu que estavam lutando próximos, quando um nobre egípcio jogou a lança na direção da Princesa e o general simplesmente não tomou atitude nenhuma para protegê-la. – Sirdar Firouz diz.
De repente ouvem um estrondo, é a Princesa Shahnaz chegando deitada em uma pequena cama onde os servos a carregam e depositam no meio da sala do trono.
— Não me convocam para o julgamento do qual sou o motivo principal? – a Princesa Shahnaz pergunta furiosa.
— Não é necessário, sabemos quem é o culpado por seu ferimento e quase morte. – o Imperador diz.
— Então por que não o vejo aqui de joelhos diante de Vossa Majestade para o julgamento? É meu desejo vê-lo morto por traição ao império. – a Princesa Shahnaz eleva seu tom de voz.
— Ahriman testifica que viu um nobre egípcio atirar uma lança contra você e o general observar sem ser mover para protegê-la. – Sirdar Ohrmazd diz.
— Onde está Ahriman, convoquem-no agora mesmo. – a Princesa Shahnaz exige.
— Ahriman foi morto pelos ciprianos na guerra, os comandantes e as tropas debandaram deixando-o para morrer. – Sirdar Melqart diz.
— Isso é verdade, comandante Cy? – o Imperador questiona.
— Sim, mas Vossa Majestade deve ouvir da tropa da comandante
Shahnaz a motivação para isso. Deseja? – o comandante Cy diz e pergunta.
— Que relevância isso tudo tem para o julgamento do general? – Sarosh pergunta.
— Total relevância e todos entenderão a seguir. – o comandante Jaspe diz.
Veem o Imperador concordar e quatro guerreiros adentrarem a sala do trono, aguardando permissão para falar, que é concedida em seguida.
— Vimos quando o general Jahangir estava lutando com três egípcios e realmente a comandante e Princesa Shahnaz estava ao seu lado, mas o Senhor Ahriman estava à frente deles e jogou uma lança e a atingiu, nosso general não pode fazer nada porque estava lutando para não morrer e para a Princesa não ser atingida pela retaguarda. – o soldado diz e os outros confirmam a mesma história, sendo dispensados em seguida.
— São dois motivos para nos vingarmos de Ahriman, mas o principal é o que ele fez ao nosso general e a comandante e Princesa Shahnaz. – o comandante Jaspe diz.
— O segundo é quando saímos para a guerra no Chipre, Ahriman nos deixou lutar exaustos e famintos, que general permitiria tamanha crueldade com seu exército? – o comandante Gazsi diz.
— Querem saber a verdade? Eu direi. – a Princesa Shahnaz diz e todos fixam seus olhares nela, inclusive o general.
— General Jahangir estava lutando contra três egípcios como todos falaram, eu estava bem próxima a ele duelando também, quando vi Ahriman com uma lança e jogou na direção do general e eu pulei na frente para salvar a sua vida, da mesma maneira que ele fez com o Imperador. – a Princesa Shahnaz confessa.
— Livre-o do cárcere e restitua a sua posição, eu quis dar a minha vida pela do general. – Shahnaz diz e todos se surpreendem com sua fala.
— Ouvi tudo o que tinham para dizer e tomei a minha decisão, julgo o general Jahangir Azimi inocente de todas as acusações e lhe reintegro em sua função de general do exército imperial. – Shahanshah diz.
— Quanto aos comandantes, lhes julgo inocentes da acusação de traição do império. – o Imperador diz.
— Que Ahriman seja apagado e esquecido, assim como todas as suas memórias, afinal ele foi como o seu nome a destruição para todos os que o conheceram. – Shahanshah diz.
Então o general agradece a Princesa mais uma vez e segue para a sua alcova para se banhar, Shahnaz é levada para seus aposentos para repousar e todos saem da sala do trono.
General Jahangir Azimi POV:
São longos e tristes os meus dias de cárcere, que são amenizados com as notícias sobre o despertar de Shahnaz, que eu seja punido com a morte, mas que não vá com a culpa pelo falecimento da única mulher que amei em toda a minha vida.
Meu julgamento está marcado para hoje, confesso que estou ansioso, afinal ninguém está pronto para o dia de sua morte, existem tantas coisas que quero dizer e pessoas que desejo me despedir, mas que sequer terei outra chance de ver seus rostos.
Imploro que me deem pena e pergaminho para que eu possa escrever mensagens e meus soldados conseguem arrumar escondido, improviso uma mesa usando minha perna e escrevo apenas duas mensagens, uma para Shahnaz e outra para meus pais, entrego ao meu carcereiro e peço que dê destino, mas que seja discreto.
Em seguida sou levado para a sala do trono, vejo meus soldados tristes e se lamentando por todo o caminho, assim que adentro, faço uma reverência e me ponho de joelhos, mas tudo o que acontece durante o julgamento realmente é inesperado e surpreende, desde a interrupção dos nobres, a chegada intempestiva dos comandantes, a intervenção dos soldados da sexta tropa até estrondosa chegada de Shahnaz para minha defesa, dando ordem ao Imperador para me restituir à posição de general porque ela decidiu dar sua vida em favor da minha.
Maiores provas de amor não existem, dar sua vida por mim e enfrentar o Imperador por minha vida.
Sou inocentado e restituído ao cargo de general, agradeço à Princesa e sigo para a minha alcova para tomar um banho e me arrumar decentemente, sei que ela também é levada aos seus aposentos porque precisa repousar.
Assim que me arrumo, sigo para o acampamento e sou recebido com celebração que dura a noite toda, os guerreiros realmente estão muito felizes em me ver retornando com general, o que faz com que me sinta muito apreciado e respeitado.
Retorno no final da noite para os meus aposentos e descanso finalmente tranquilo.
Princesa Shahnaz POV:
Depois da minha intervenção no julgamento do general, retorno aliviada para os meus aposentos, mas também exausta e com dor por conta de todo esforço, deito e durmo por um longo tempo e assusto quando acordo e vejo um soldado diante de mim.
Ele estende um pergaminho em minha direção e quando pego o vejo se afastar e ir embora, curiosa, abro e leio.
"Minha amada, Shahnaz,
Com algum sacrifício chegou a mim a notícia de seu despertar, aliviando o meu pesaroso e culpado coração. Suplico por seu perdão, jamais teria permitido que fizesse tamanha loucura, antes eu tivesse perecido...
Não saberia o que fazer se você tivesse me abandonado.
Agora estou diante do meu julgamento e prestes a descumprir o juramento que lhe fiz, amada da minha alma, hei de lhe abandonar porque esse será o meu último dia nesta terra, peço que não esqueça do imenso amor que lhe dedico, que levo em meu coração até meu último suspiro, irei, mas seguirei como seu prometido...
Amar-te-ei até após a morte.
Seu Jahangir"
Enrolo o pergaminho, enquanto tento disfarçar as lágrimas e escondo a mensagem rapidamente, pensando em toda a dor e aflição que meu Jahangir teve que passar em seus dias no cárcere.
Meu gesto de amor para lhe conservar a vida quase se tornou o motivo de sua morte, que ironia.
O Narrador:
Estão há cinco semanas distantes do forte em Persépolis.
Shahanshah discute com os sábios sobre as condições da Princesa Shahnaz e eles estimam que ela precisará de cerca de dez dias para se recuperar totalmente, deixando-o completamente aliviado.
Segue para a sala do trono para uma audiência com os nobres.
— Está chegando o momento de avançarmos sobre o Chipre. – o Imperador diz.
— Muito apropriado, Majestade. – Sirdar Mirrikh diz.
— Principalmente porque o último ataque fracassou. – Sirdar Melqart diz.
— É um território que desejo conquistar. – o Imperador diz.
— Todas as tropas estão prontas para avançar ao seu comando, Majestade. – o general diz.
— Vamos esperar até que a Princesa Shahnaz se recupere totalmente e então marchamos e conquistamos o Chipre. – Shahanshah diz.
Todos estão animados com essa possibilidade e ansiosos, agora que a Princesa está bem, o Imperador decide promover uma festa no palácio e todos se divertem por vários dias.
Princesa Shahnaz POV:
Servos, curandeiros e sábios passam dez dias de intensos cuidados comigo, me oferecem uma alimentação bem equilibrada para que eu possa recuperar as minhas forças, os preparados de ervas medicinais são trocados mais vezes para que possam acelerar o processo de cicatrização do meu ferimento, que está cada vez mais superficial.
Começo a caminhar pelos meus aposentos e até me exercitar levemente nos primeiros dias, aumentando a intensidade aos poucos.
No décimo dia realmente me sinto bem e pronta para seguir adiante, passo por uma nova avaliação dos sábios, que me consideram finalmente curada, agora podemos seguir.
Vou à sala do trono e os pego tratando da guerra no Chipre, participo da discussão.
— Vamos marchar quando? – Sirdar Mirrikh questiona.
— Podemos avançar amanhã mesmo para o Chipre. – digo.
— Alteza, como está passando? – Sirdar Melqart pergunta.
— Totalmente recuperada e pronta para ir à guerra. Podemos avançar. – digo.
— Shahnaz, tem certeza? – o Imperador questiona.
— Alteza, pode ficar no palácio e... – o general começa a dizer.
— Nada mudará, general. Continuo confiando em sua proteção, assim como o Imperador, a escolha de salvar a sua vida foi minha. – digo e o Imperador concorda.
— Voltará à sua tropa então? – o general pergunta.
— Sou comandante de tropa, esse é o meu lugar. – digo e vejo a surpresa nos olhos de todos.
— Prepare as tropas, general, marcharemos amanhã pela manhã. – Shahanshah diz.
Saímos da sala do trono e seguimos juntos em direção ao acampamento, caminhamos em silêncio por algum tempo, espero tomarmos uma certa distância do palácio e da cidade.
— General? – o chamo.
— Princesa Shahnaz! – o general diz.
— Olhe para mim, Jahangir. – peço.
Então ele detém sua caminhada e olha firmemente em meus olhos.
— De que me serve a vida se não é para entregar ao homem a quem pertence a minha alma? Não seria capaz de viver se você tivesse me abandonado. Quanto valeria a minha existência se eu perdesse o que me é mais precioso? Jamais seria capaz de permitir que lhe julgassem culpado por meu ato desesperado de amor e insanidade e lhe tirassem o direito de viver, sorrir, sonhar e guerrear, por mais uma vez eu teria entregado a minha vida e liberdade diante do Imperador por você, porque eu o amarei até após a morte. – digo e vejo lágrimas de emoção em seus olhos.
Jahangir observa bem o ambiente e pega em minhas mãos.
— Minha amada Shahnaz, seu amor é tudo o que preciso para viver, você é tudo para mim e jamais a abandonarei. – Jahangir diz e as beija, me fazendo sorrir e enxugar suas lágrimas.
Continuamos a caminhar e logo chegamos ao acampamento, todos celebram quando nos veem, nos juntamos aos comandantes por uns momentos para discutir com eles sobre a guerra no Chipre, então comunicamos às nossas tropas sobre a partida amanhã cedo e todos se agitam e iniciam os preparativos.
Passo o restante do dia com os guerreiros e retorno ao entardecer para o palácio, mais uma vez na companhia do general, voltamos conversando sobre a guerra, não mais sobre nós dois, então nos despedimos assim que entramos e seguimos para as nossas alcovas.
Vou ao quarto de banho, me arrumo com a ajuda das servas e descanso, a partir de amanhã os dias voltarão a ser agitados.
Desperto ainda antes do amanhecer, vejo a correria pelo palácio, visto a minha armadura e ponho logo o cinturão com a ajuda das servas, sigo para o salão do banquete e me reúno com os nobres, o Imperador e o general para essa primeira refeição do dia. Assim que terminamos, nos despedimos e seguimos para o acampamento, enquanto vemos todos os preparativos para a saída do grande Shahanshah e da nobreza.
Chegamos no acampamento e vamos adiante das tropas, o general segue comigo para a sexta tropa, mas um pouco mais adiante para se posicionar à frente de todo o exército.
Seguiremos a mesma estratégia da outra vez com a sexta tropa tomando a dianteira, a quinta na sequência e assim por diante, deixando a primeira por último.
Esperamos que o Imperador se aproxime e dê o sinal para começarmos a marchar, tempos depois o vemos passar por todo o exército com seus nobres, então o general nos dá o sinal, começamos a cavalgar, levantando uma imensa nuvem de poeira atrás de nós.
Seguimos nossa jornada de um dia inteiro e descansamos por uma noite e nos alimentamos, os soldados erguem a tenda do Imperador e nós dormimos sob as estrelas, mesmo que o grande Shahanshah mande me chamar para compartilhar de seu espaço, acho melhor me manter perto da minha tropa e recuso o convite.
Continuamos o mesmo ritmo por mais quatro dias, cavalgando intensamente por todo o dia, parando por algumas horas para descansar e nos alimentar e voltando a marchar em direção à fronteira de Lídia com o Chipre, chegamos na quinta noite e montamos o acampamento escondidos sob a escuridão.