Enquanto isso, a perseguição dos Ghouls sobre o trio continuava. Os canibais não conseguiam alcançar de fato nenhum deles, mas também não ficavam para trás: o primeiro que se desconcentrasse levaria a pior. A ordem era: Ethan em um canto, Lucy no outro e David no meio.
Dos escombros do prédio, os Ghouls machos pegavam destroços enormes e até pedaços de carros quebrados com suas forças descomunais, enquanto as fêmeas que não estavam em perseguição, cerca de duas apenas, respiram fundo para usarem seus gritos. Os objetos são arremessados e os pedaços de construção estavam a maior parte indo em Ethan e David, enquanto as partes de carro em Lucy. O garoto olha para trás e se assusta, no puro instinto, grita:
- Cuidado! – E logo em seguida ele salta, porém, com o uso de suas botas, que agora estavam sugando sua energia vital em troca do garoto ter mais vantagens, ele acaba saltando mais alto que os destroços, e eles só acertam o chão, estilhaçando-se, e o menino quase tropeça ao aterrissar, mas é retomado à corrida por Lucy, que o segura pelo braço.
David concentra sua criocinese e joga as mãos para trás, criando um escudo de gelo para proteger ele e Lucy, e os destroços e pedaços de carro se quebram junto da barreira após se chocarem. Já Lucy retira um pouco mais de sangue do corte no braço e respira fundo, fazendo mais uma bala de sangue. Ela então salta ao mesmo tempo em que se virava, jogando-se de costas enquanto concentra sua mira.
A ruiva então dispara o projétil, e ele vai a uma velocidade absurda, acertando em cheio um dos Ghouls que estava na perseguição bem em sua boca e atravessando sua nuca, fazendo um buraco na saída e, de quebra, ainda acertando outro que estava logo atrás, mas dessa vez só acertando sua cabeça e deixando-o inconsciente por um tempo.
Enquanto a ruiva caía, David estende o braço e segura Lucy pelas costas, impedindo-a de cair no chão para assim continuar sua corrida.
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Mary ficava escondida, somente preparada para atacar. Ela não sentia energia nenhuma e não ouvia nenhum barulho. Ela então suspira e começa a sussurrar sozinha.
- O que eu tô fazendo? Eu sou uma molenga mesmo.
Mary pensava o porquê de ela estar fazendo aquilo, por que ela estava interferindo em um assunto que tinha mais haver com a vila dos Cicatrizes do que com os Heróis. Por que ela estava confiando em pessoas que até alguns dias só a menosprezavam e ainda confiando alguém como o Ethan a elas, mesmo que por pouco tempo. Ela não sabia responder se havia amolecido o suficiente ou se as pessoas é que descobriram como passar por sua frieza, mas ela não exatamente achava ruim aquilo. Não gostava da ideia de se apegar muito, pois sabia que iria sofrer se houvesse uma perda, mas ela mesma parecia querer mais afeto.
Ela acaba lembrando que, no começo, na primeira vez que trabalhou com os Cicatrizes, ela foi muito bem recebida, Lucy inclusive chegou a tentar se enturmar com ela, mas Mary não permitiu que ela se aprofundasse nisso. O irmão de David, Ryan, foi quem mais insistiu em se aproximar de Mary: sentava para conversar e falava o quanto seu irmão era cabeça-dura, a assassina até mesmo chegou a sorrir com uma piada dele.
Ela gostou tanto que, na hora de sua partida, a albina sentiu um enorme aperto no coração antes de se despedir e abandoná-lo para permitir que os reféns escapassem com vida. Mary viu mais um amigo morrer. A albina pensava sobre isso e se perguntava:
- E se eu tivesse feito diferente?
Até que ela sente dois Ghouls perto dali, porém, em vez de estarem procurando pela presa, eles estavam conversando.
- Vamos, Rebecca, temos que ajudar na caça. – Victor dizia.
- Que seja, eu não vou ganhar a refeição de novo... – Rebecca dizia, encostada na parede com os braços cruzados e uma expressão que misturava raiva e tristeza.
- Rebecca, deixa de ser birrenta, você entregou nossa posição. – Victor responde, tentando puxar a garota pelo braço. – Foi merecido.
- Uau, desculpa por praticamente me sacrificar para que soubéssemos o que nos aguardava naquela vila. – Ela o faz largar seu braço e o cruza novamente. Rebecca então sussurra para si mesma. – Não importa se somos da mesma espécie... Ainda estou abaixo de todos ali...
- O quê? – Victor pergunta, como se tivesse escutado parte do sussurro.
- Deixa pra lá... Eu tô sozinha mesmo, nem você me quer do seu lado. – Rebecca aperta os lábios com força para não chorar, mas não consegue e, após dizer isso, sai correndo dali, porém não para se juntar a perseguição, e sim para o lado oposto, porque estava triste.
- Rebe- Rebecca, espera. – Victor vai atrás dela. Mary conseguiu escutar tudo enquanto escondida, nisso ela começa a pensar em algo.
- Para de me seguir! – Rebecca diz para o garoto ghoul e até joga alguns pedaços de construções no caminho para atrasá-lo. Tudo isso enquanto ela lacrimejava.
- Rebecca! Espera... Eu não queria... Espera! – Victor tentava alcançá-la, livrando-se dos escombros até com facilidade, mas, quando menos percebeu, já a tinha perdido de vista.
- Me deixa em paz, Victor! – Ela grita uma última vez, encostando-se na parede de um estabelecimento e, enquanto se abraçava, ela lacrimejava. Enquanto isso, Victor continuava a procurando-a.
A ghoul pensava e dizia para si mesma que, mesmo sendo da mesma espécie, naquela "família" de canibais ainda havia diferenças, rejeições e preconceito. Na prática, eram iguais aos humanos. Aquela situação de ser humilhada parecia familiar para ela, mas não sabia de onde era essa memória. Estava tão concentrada em seu choro e tristeza que nem prestou atenção em um movimento bem sua frente.
Mary se aproxima muito rapidamente, chega bem perto do rosto de Rebecca e bloqueia a boca dela com a mão. A ghoul fica assustada por um momento, a primeira vez que Mary viu outra expressão de um canibal além dos sorrisos sádicos já comuns para ela.
- Own, estou quase com peninha. – Mary diz antes de enfiar a faca militar que estava segurando embaixo da boca de Rebecca, passando por toda a sua cabeça e atravessando o outro lado. Isso impede a canibal de gritar e também a deixa inconsciente por ter atravessado seu cérebro.
- Rebecca, Rebecca! – Victor era escutado se aproximando. Mary olha para os lados e pega um pouco de pó de cimento que havia ali perto, e quando ele virou a esquerda, viu, mesmo que por um segundo, Rebecca caída nos braços de uma figura feminina. Antes que ele pudesse sequer falar algo, a albina jogou o pó em seu rosto e em seguida deu um forte chute no peito de Victor, jogando-o para trás.
Por um momento, o ghoul fica impressionado, pois ele nunca havia recebido um golpe tão forte de alguém antes, considerando que ele próprio era mais forte que um humano normal. Fazia tempo que ele não cuspia sangue ou sentia um osso seu quebrando.
Victor limpa seus olhos após se recompor e tossir um pouco de sangue. Ele olha com uma expressão de raiva, porém não havia mais ninguém lá. O garoto olha em volta e fica desesperado, seus olhos se tornam negros e suas garras aparentes.
- Aparece, larga ela! Me leva no lugar dela! – Victor tentava gritar para o céu, mas nenhuma resposta foi escutada. Ele então começa a tentar sentir algum cheiro de sangue, principalmente o de Rebecca, mas não conseguia por algum motivo. O ghoul enfim começa a correr desesperadamente à procura de sua amada.
Mary estava em um prédio em ruínas próximo com a garota canibal nos braços. De algum modo, a albina deu um jeito de tampar o corte que fez embaixo da boca dela para o sangue não vazar, mas ainda deixou a faca dela fincada na cabeça da ghoul para caso ela se regenerasse e acordasse: Mary só mexeria na faca e cortaria o cérebro dela novamente.
A albina escuta gritos muito altos vindo da direção do prédio que derrubaram.
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Voltando à perseguição dos ghouls pelo trio, parecia não ter fim. Mesmo que Ethan conseguisse desviar dos escombros e buracos no caminho com facilidade, ele ainda estava se acostumando com os coturnos, então ocasionalmente ele tropeçava e era retomado à corrida após realizar uma acrobacia rápida no ar e aterrissar perfeitamente. Felizmente não estava descontrolado.
Lucy não poderia ficar repetindo as balas de sangue com a mesma manobra de antes, pois logo os canibais entenderiam um padrão e complicaria a vida do trio. David precisaria de tempo se quisesse realizar um golpe de gelo mais poderoso, assim como para fazer uma parede mais resistente.
Ethan acaba se lembrando de um detalhe, gritando para a dupla ao seu lado.
- As ghouls mulheres gritam! – Ele fala com tudo que podia.
- O quê?! – O casal volta a pergunta, estavam mais concentrados em como iriam despistar aqueles ghouls.
E, por causa disso, as fêmeas do bando soltam seus gritos ensurdecedores, Ethan se antecipa e protege seus ouvidos, mas ainda assim estavam extremamente altos.
- AAAAAAHHHHHH!! – Os dois gritam de dor, enquanto Ethan somente gemia por cobrir seus ouvidos a tempo.
David sente uma dor latejante em seus ouvidos e sua cabeça pelos gritos, começa a rodar, estava ficando zonzo e perdendo velocidade. Tanto que, quando ele menos esperou, um ghoul conseguiu agarrar sua blusa por trás. Felizmente, David tentou se concentrar e focar o máximo que conseguia, e poucos instantes depois que o canibal agarrou a vestimenta do singular, sua mão foi congelada e, após o gelo preencher toda a mão do ghoul, ela se despedaça. Cerca de um segundo para voltar a se concentrar e mais um para usar seu poder.
Lucy acabou tomando uma medida arriscada. Ela retira por um instante seu comunicador e simplesmente enfia com tudo os dedos em seus ouvidos e estoura seus tímpanos à força para ela não ficar tão zonza enquanto corria. Seus ouvidos sangravam e a dor ainda perdurava, mas a ruiva preferia essa dor do que a dor que os gritos das fêmeas causavam à cabeça.
Enquanto tudo isso ocorria, as ghouls se preparavam para soltar mais um grito e David acaba tendo uma ideia. Ele começa a fazer linguagem de sinais para Lucy, e eles diziam: "disperse nosso rastro, eu vou tirar a visão deles."
Leva alguns segundos para a ruiva entender, estava difícil se concentrar, estavam correndo a toda velocidade com gritos agudos em seus ouvidos, mas ela entende. Lucy começa então a usar seu poder e levitar todo o sangue que estava nas roupas e corpo do trio, enquanto isso David segura Ethan e o coloca em suas costas. O garoto fica confuso, mas, por estar desesperado, agarra com força no singular.
- Se segura firme mesmo! – David começa a canalizar o gelo em suas mãos e parecia criar uma esfera de vapor gelado concentrada. Lucy então começa a contar nos dedos: três, dois, um.
Ao mesmo tempo, David e Lucy dispersam vapor gelado e sangue para os lados. A nuvem fria cobre a rua toda em que eles estavam correndo, que já era larga, e agora os ghouls estavam sentindo cheiro de sangue em todo canto. Os machos que estavam em perseguição acabam até mesmo trombando uns nos outros por não estarem achando suas benditas presas. O cheiro de sangue para todo lado, mais os barulhos de passos dos próprios ghouls, estava deixando-os sem direção.
- Onde eles foram?! – Henri grita e espera que alguém respondesse.
- Não consigo achar eles! – Leon responde, nervoso, pois estava todo confuso.
Enquanto todos os canibais ficavam perdidos, em um sobrado a algumas quadras de onde eles estavam, os três estavam lá dentro, escondidos e ofegantes. David e Lucy estavam conseguindo recuperar a respiração normal, porém Ethan estava hiperventilando, abraçando-se e com uma expressão de medo constante.
- Ethan... – Lucy tenta tocar no ombro do menino, que recua, assustado. Ela se aproxima, devagar e sem estresse. – Calma... Já passou, já estamos seguros.
- Mas... E a Mary? Será que eles a pegaram? E se pegaram, ela vai conseguir escapar? Ela vai voltar, né? – Ele dizia com um olhar ainda assustado, um menino traumatizado.
- Calma... Calminha, ela vai nos encontrar. – Lucy encosta gentilmente a mão no ombro de Ethan, controlando seu fluxo sanguíneo, acalmando o coração do menino e aliviando sua tensão. O garoto vai voltando a respirar novamente, e, conforme a adrenalina vai passando, as lágrimas vão caindo de seus olhos, e ele encosta na parede ao lado por estar cansado.
David coloca a mão no ombro de Ethan e sorri conforme ofegava.
- Vai ficar tudo bem, garoto, relaxa. – O menino inclusive acha engraçado o sorriso de David, pois ele ficava com covinhas na bochecha quando fazia essa expressão. Lucy aproveita para soltar um pouco seu cabelo, arrumando-o.
Ethan se acalma melhor. Como ele não sentia energia de singulares próximos fora David e Lucy, ele só se preocupa mesmo se Mary os encontraria, porque, de certa forma, ele confiava que viva ela sairia, afinal era mestra dele.
O trio se senta por alguns minutos, se hidrata, não ouve mais gritos de ghouls, nem passos, e o menino não sentia energias se aproximando. Lucy sussurra para David enquanto Ethan estava distraído.
- Ele mal consegue usar o poder dele nessa situação. Eu sinto pena dele porque... É só uma criança, catorze anos e ele já tem olheiras maiores que as minhas. – Lucy dizia, de certa forma, preocupada.
- Bom, não é exatamente culpa da Mary. Mesmo que colocar uma criança nessas situações seja desumano... Ele meio que quis isso, talvez ele não queira ser abandonado. Então dessa vez eu entendo a Mary. – David responde, oferecendo seu ombro para Lucy deitar a cabeça.
- Abandonado... Isso me traz más recordações. – A ruiva se escora no namorado e tem algumas lembranças de seu passado. – Ah, verdade. Ethan. – Ela chama pelo garoto, que parecia querer pegar no sono, como todos ali.
- Hã...? – Ele dizia, tentando manter os olhos abertos.
- Como conseguiu correr tão rápido daquele jeito? – Lucy também estava se esforçando, seu controle de sangue infelizmente não tinha efeito sobre seu sono.
- Ah... E-eu não posso falar. – Ele diz um pouco hesitante, não sabia quais seriam as consequências de contar a verdade. O casal se olha por um tempo e afirmam juntos.
- Mary. – David diz.
- Por que não estou impressionada? Ela nunca revelou coisas sobre ela... – Assim que a ruiva termina sua frase, os três recebem um chamado em seus comunicadores. Assustados por um momento, eles clicam no objeto e escutam uma voz feminina.
- Estão com sono já? – Mary dizia, mas mantendo seu tom frio na voz. Quando escutou sua mestra, Ethan abriu um sorriso, podendo respirar tranquilamente, pois ela estava viva. – Ethan, na escuta?
- S-s-sim senhora... – Ele diz.
- Não chore, vai desidratar. – A mestra dele retorna. – Ethan, preciso de uma ajuda sua. Já sei onde estão e estou a caminho, preciso testar uma coisa.
David pensa e raciocina por alguns segundos, até perguntar para Mary.
- Você tá trazendo uma ghoul para cá? – Ele não parecia muito surpreso pela atitude da albina.
- Sem estresse, ela está contida. Eu só preciso arrancar algumas informações, pode ser vital para nosso futuro e dos Cicatrizes.
- Eu já desisti de te questionar. – Lucy responde num tom sarcástico.
- Não é a mim que devem questionar. – Porém, dessa vez, a voz de Mary parecia estar bem mais perto, nem era do comunicador de onde estava vindo a voz dela, e sim da porta do cômodo em que o trio estava. Mary havia chegado.
David toma um susto e quase se joga para trás.
- Puta merda... Avisa pelo menos. – O singular gélido dizia enquanto ofegava.
- Não podia fazer muito barulho. – Mary responde. Apesar da voz fria, ela parecia menos formal para conversar agora.
Ethan, quando vê sua mestra em sua frente novamente, lacrimeja e corre em sua direção, abraçando-a. Mary se assusta um pouco, mas aceita bem o abraço, só não chega ainda a retribui-lo. A albina coloca a mão no rosto do menino e diz com a voz de certa forma autoritária, mas calma dela:
- Não chore.
O garoto percebe que estava lacrimejando e seca suas lágrimas na gola da camiseta, pois aquela noite estava quente para se usar blusa, e depois assume uma postura ereta e acena para sua mestra.
- Sim.
- Cadê a ghoul? – Lucy pergunta.
Mary então puxa, com seu braço direito, a ghoul pela gola, revelando Rebecca para os três ali. A garota estava com uma expressão de morta praticamente, pois a faca continuava em sua cabeça, porém o sangue já estava seco. Além disso, ela estava com as mãos amarradas por correntes com uma espessura um pouco grossa, e em sua boca estava um pedaço de concreto, para impedir que ela gritasse quando acordasse. Os três acham um pouco nojento a cena, mas nada que não pudessem aguentar.
- Vamos começar o interrogatório. – Mary diz.