8 A Vida Que Eu Escolhi

Dois anos.

Tempo o suficiente para esquecer qualquer coisa, deixar qualquer sentimento que um dia poderia ou não retornar. Faziam dois anos que ela não o via, que não ouvia sua voz, que não havia tido resposta alguma, e aquilo valia também para Eloá.

Em sei precipício de emoções ela encontrou paz, pela primeira vez, talvez.

Seu coração pulsava tranquilamente, não havia arrependimentos, não havia sequer uma emoção negativa, valia a pena esquecer e seguir fielmente seus princípios, embora doessem as vezes, ela havia aceitado, mas conseguido se libertar depois.

Dois anos foi o suficiente para Agnes conseguir se livrar das garras que a prendiam, das garras que seguravam sua liberdade longe de suas mãos fracas e desesperadas.

Diante de seus olhos ela via o céu nublado, as folhas secas, o outono vibrante.

Ela riu, era engraçado como ela sempre pensava em seu passado no outono, quando o frio começava a caçoar de sua pele e vestimenta fina. Tudo era tão bagunçado, mas de certa forma tão interligado.

— Agnes.

Uma voz rouca e tão baixa a fez estremecer, era ele. Tyler. Seu coração bateu tão rápido em felicidade, um sorriso tão incomum pintou seus lábios antes sérios e desgastos em pensamento.

— Tyler. — Aos poucos se virou para encara-lo, o rapaz era alto, os olhos claros fitavam os seus escuros, os lábios reservados em um sorriso único e especialmente dela, somente dela.

As mãos do rapaz envolveram sua cintura e a puxaram para mais perto, seus lábios suavemente tocaram sua testa, um sinal de respeito. Ele era um cavalheiro, mas possuía características tão marcantes que ela o considerava inesquecível.

— Ainda está pensando naquilo? — Seus lábios se apertaram em uma linha fina em desconforto, ele sabia de tudo o que havia acontecido nos últimos dois anos, a conhecia muito bem, sabia que tudo que ela já foi por conta de sua família, e toda a alegria que antes ela carregava, aos poucos voltava com influência a sua presença e vida.

Agnes riu baixo, sua cabeça encostou em seu peito e sussurrou:

— Sim.

Ele a abraçou forte, mesmo que ele soubesse que ela não sentia mais nada por Ícaro, que não se envolvia tanto com ele quanto com Eloá, ele se sentia mal, pois não podia apagar completamente a existência daqueles que um dia a magoaram, sua pequena, mas ágil garota.

— Eu gosto de pensar em tudo, nas escolhas que fiz e que se não fossem por elas, eu não estaria aonde estou. — Aspirou o cheiro de Tyler para si, aquela fragrância cítrica.

Ele respirou fundo, seu peito subiu e desceu, e ela, com sua orelha junta ao seu peito, ouvia as batidas rápidas de seu namorado, o primeiro.

Tyler foi a única pessoa com que Agnes havia namorado nos últimos 20 anos, a primeira que esteve lá e esperou por uma chance. O único para com quem ela teve coragem de aceitar em sua vida tão falha e bagunçada.

Deixando um beijo em sua cabeça, Tyler disse:

— Sua mãe mandou uma mensagem, enquanto você estava aqui, eu respondi por você. Ela quer vê-la.

Agnes apertou suas mãos entorno do casaco grosso que Tyler usava.

— O que você respondeu?

Ele riu orgulhoso.

— Disse que iria tomar banho primeiro e depois veria isso.

Agnes abriu um sorriso, riu baixo e balançou a cabeça para os lados, ele a conhecia tão bem que chegava a ser engraçado como sabia responder como ela.

Nas pontas dos pés Agnes deixou que seu nariz deslizasse pelo casaco aberto e repousasse em seu ombro nu. Ele era tão alto. A mesma fragrância cítrica a recebeu, seus olhos se fecharam.

— Você respondeu bem. — riu baixo, lembrou-se mais uma vez dele dizendo aquilo e riu, foi engraçado para ela. — Deveríamos ir?

Tyler aumentou seu aperto sobre ela e pensou um pouco no que deveria responder.

— Ela sente a sua falta, imagino eu.

Agnes sabia que sim, ela não podia imaginar o contrário, afinal, ela não tinha filhos e nem era casada.

Porém, mesmo sabendo que sua mãe, que a sua família, sentia a sua falta, ela queria ter o poder de negar, pela primeira vez.

— Meu amor. — Ela sussurrou, a boca próxima de seu casaco grosso. — Eu quero apenas ir para o hotel, amanhã veremos eles.

Ele assentiu, deu um pequeno sorriso e a carregou para longe daquele lugar.

Em seu caminho um rapaz parou, e os dois pararam de andar, quem podia ser?

— Agnes? — Incerteza, dúvida e confusão atravessaram aquela voz masculina, uma voz familiar.

Desgrudando seu rosto do corpo de Tyler ela olhou para o rapaz à frente.

Ícaro.

Tyler apertou a mão em punho, o maxilar travado em ansiedade e raiva.

Agnes piscou.

— Olha só. — Sorriu. — Ainda está vivo.

Ele semicerrou seus olhos e enrugou sua testa.

— Tyler, esse é o Ícaro, um velho amigo a quem entreguei a uma velha amiga.

Seu namorado apenas assentiu, mas as mãos permaneceram em punhos cerrados e o maxilar travado.

Eloá não havia aparecido, ele estava sozinho.

— Não achei que voltaria para essa cidade. — Ícaro disse.

Ela deu de ombros.

— Cá estou eu depois de dois anos. Surpresa.

Ele mordeu o lábio inferior.

— Vem sempre aqui? — Perguntou ela referindo-se ao parque no qual ela vinha sempre pensar. Tantas lembranças.

Ícaro assentiu devagar.

— Quase sempre. Minha segunda casa. — A ponta de seus lábios se curvaram em um pequeno sorriso.

— Hum.

Não havia mais o que se falar, a mão esquerda de Agnes deslizou sob o braço direito de Tyler e suas mãos se tocaram. Suavemente ela o puxou e continuaram a andar, e respirando fundo ela passou reto por ele, e incrivelmente se sentiu aliviada, afinal, seu coração já não pulsava por ele.

Ele tentou falar, mas Tyler não deixou que ele se aproximasse.

— Seu tempo esgotou há dois anos. — disse para que ele o ouvisse.

Ícaro fechou os olhos com força, abaixou a cabeça e seguiu em direção a um banco do parque.

E pela primeira vez, Agnes se lembrou de algo que dissera a Ícaro.

Agnes abraçava Ícaro com carinho, seu coração batia tão forte por ele que achou que poderia morrer sem ele, e mesmo que o amasse, ela sabia que não poderia dizer isso a ele, não sendo séria.

Sua mãe a mataria.

— Ícaro. — O chamou.

Ele se afastou do abraço quente e reconfortante e olhou no fundo de seus olhos escuros.

— Não quero que se apegue a mim. Quero que dê chances a outras pessoas. Não fique apenas em um jardim com tantos outros para ver — disse ela, um sorriso tão triste, porém, ela ainda sorria, ela conseguia fazer aquilo.

Ícaro estranhou.

— Eu gosto de onde estou.

Olhando agora para aquilo, ele não gostava de onde estava e facilmente havia conseguido sair de seus braços.

Os braços de Agnes arrodearam o braço direito de Tyler, ela o abraçou com força, seu rosto descansou naquele mesmo braço que tantas vezes a segurou e tantas vezes a lançou para o alto e rodopiara seu corpo.

— Quanto tempo você teve que esperar para que eu o amasse? — sussurrou para Tyler.

Ele deu de ombros, Agnes ergueu o olhar para ele e o viu conter um sorriso repleto de felicidade.

— Eu não contei. — Ampliou o sorriso. — Eu só sei que foi divertido. — Riu baixo.

Ela se sentia da mesma forma.

Ele não havia desistido dela, mesmo que ela gritasse para que ele mantivesse afastado, mesmo que ela chorasse e implorasse, mesmo que seus pais haviam o aprovado, ela não o queria, não queria se envolver com mais ninguém.

Pobre Agnes, pobre garota que achou ser invencível, que acreditou que estar sozinha era o melhor para si e para seu coração machucado, ela estava tão enganada.

Pobre garota pisoteada e traída por quem mais amava.

Seu celular tocou, agora ele estava em seu bolso traseiro.

Deslizando sob sua calça ela o alcançou e o ergueu até os olhos, o nome de Ellen estampava a tela, sua amiga.

— Oi docinho. — Atendeu Agnes.

A voz do outro lado riu.

— Onde você está? Por que Tyler me respondeu ao invés de você?

Agnes olhou para Tyler e riu. Ele era ruim em enganar Ellen, ele não iria superar ela. Não tão cedo.

— É outono Ellen. Tive que voltar para o parque de sempre e pensar em algumas coisas.

Ellen suspirou aliviada do outro lado.

— Tudo bem. Eu e Jake estamos aqui em casa esperando vocês. Tyler disse que iriam passar aqui depois, mas sendo ele, imaginei que essa informação estaria errada.

Agnes sorriu.

— Tyler e eu voltaremos para o hotel. Espero que entenda.

Ellen riu.

— Claro que eu entendo, idiota. Eu amo você! Se cuida.

— Eu também te amo. Até mais.

Pôs o celular no bolso traseiro de sua calça jeans, e os dois seguiram rumo ao hotel, onde as juras de amor seriam ditas mais uma vez e iriam devotar a lealdade, porque mesmo sendo Agnes, ela ainda era insegura em momentos como aqueles, momentos delicados que traziam o seu pior lado e o mais frágil, mas Tyler já sabia de tudo aquilo, esteve ao seu lado naqueles dois anos, e finalmente, depois de dois meses intensivos, ele havia conseguido amolecer o restante do coração que Agnes protegia.

Ele iria amá-la mais e mais, pois não queria que ela esquecesse aquele grande detalhe. Amar não era fácil, mas podia ser divertido.

Ela sabia daquilo. Amar podia ser bom e podia não doer, desde que pudesse escolher tudo seria possível.

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