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Capítulo 17: Meu Lado, Seu Lado

Parte 1

O garoto que havia gritado virou-se e correu pelas ruas vazias, sua figura pequena desaparecendo nas sombras e na chuva torrencial. O som de seus pés batendo na lama se misturava ao rugido contínuo da tempestade.

Um dos guardas da Guarda do Corvo, um homem alto com uma cicatriz atravessando o rosto, ergueu sua espada e preparou-se para seguir o garoto. "Espere! Não devemos deixar que ele escape!"

Pallas, com uma voz firme e autoritária, impediu-o. "Não, não estamos aqui hoje para matar ninguém. Deixe-o ir."

O guarda hesitou, sua postura ainda tensa, mas obedeceu, guardando a espada. Pallas virou-se para o grupo e, com um tom de comando, gritou para o vazio da cidade:

"Escutem! Somos da Guarda do Corvo e não estamos aqui para causar mal! Viemos em busca da marquesa. Se alguém estiver ouvindo, que se mostre!"

O silêncio que se seguiu parecia ainda mais pesado, interrompido apenas pelo som incessante da chuva que batia no chão e nas paredes das construções em ruínas. O ambiente parecia respirar uma tensão palpável, como se a própria cidade estivesse esperando por uma resposta.

Após alguns momentos, Pallas e Don deram sinal para que os outros seguissem em frente. Eles se moveram com cautela, avançando pelas ruas estreitas, até chegar a uma das ruínas mais imponentes da cidade. A construção, uma antiga edificação de estilo grego, destacava-se entre os destroços, mesmo em seu estado deteriorado. Colunas de mármore quebradas, agora cobertas de musgo e água da chuva, sustentavam o que restava de um teto em grande parte desmoronado. Fragmentos de estátuas e pedaços de frisos adornavam o chão, formando uma trilha.

O grupo se aproximou da entrada da edificação, uma grande abertura onde antes havia um majestoso portão. O interior da construção era uma vasta sala, com pisos de pedra lisa cobertos por uma espessa camada de água acumulada. A luz das lamparinas da Guarda refletia nas poças e fazia sombras dançarem nas paredes danificadas.

Pallas avançou para o centro da sala, a água espirrando sob suas botas, e olhou ao redor, examinando os detalhes que ainda restavam da decoração antiga. O ambiente estava envolto em um silêncio respeitoso, como se o lugar esperasse pela chegada de um visitante importante.

A marca de uma tapeçaria antiga, agora desfeita, ainda era visível nas paredes, oferecendo uma visão de um passado de opulência. O teto, sustentado por colunas robustas, parecia a qualquer momento desabar completamente, tornando a atmosfera ainda mais carregada de uma sensação de fragilidade e decadência.

Pallas ergueu a voz novamente, quebrando o silêncio. "Estamos aqui para falar com a marquesa! Se alguém estiver presente, manifeste-se agora!"

A resposta veio como um eco das paredes vazias, uma voz fraca e distante que parecia surgir de dentro da própria edificação. "Eu sou a marquesa. O que querem?"

Pallas e seus homens avançaram cautelosamente pela vasta sala até encontrarem a origem da voz. A sala lateral estava mergulhada em uma penumbra ainda mais profunda, iluminada apenas pelas fracas lamparinas que carregavam. O ambiente estava coberto de sombras que dançavam nas paredes, criadas pelo tremeluzir das luzes.

Ao entrarem, foram recebidos pela visão de uma figura impressionante, apesar de sua condição debilitada. A marquesa estava reclinada em uma cadeira de encosto alto, com almofadas de veludo vermelho desgastado. Seu rosto estava coberto por faixas de tecido, apenas seus olhos penetrantes e desafiadores estavam visíveis. A pele exposta parecia quase derretida e translúcida, além de marcada por veias escuras, dando-lhe uma aparência extremamente fragilizada.

Ela observava os intrusos com um olhar que, apesar de sua condição, transmitia uma confiança indomável. À medida que os olhos de Pallas e de seus homens se ajustavam à escuridão, puderam ver um grupo de outros idosos, todos igualmente debilitados, assentados em cadeiras e almofadas espalhadas pela sala. Além deles, havia alguns adultos e jovens, com expressões de ódio e preocupação, observando a cena com cautela.

A marquesa, com uma voz que misturava fraqueza e autoridade, falou: "A Guarda do Corvo não é bem-vinda neste lado."

Pallas, mantendo uma postura firme apesar da situação, respondeu: "Viemos devido a um problema urgente. Há um de vocês que está causando mortes do outro lado, no nosso lado."

A marquesa franziu a testa, seu olhar se tornando ainda mais penetrante. "Não estou ciente de tal problema. Há muito tempo que ninguém da nossa parte se aventura para o outro lado. Você mesmo sabe disso."

Pallas manteve a expressão séria. "Eu sei. No entanto, infelizmente, alguém conseguiu atravessar e está causando um grande transtorno. Precisamos eliminá-lo antes que mais danos sejam feitos."

A marquesa pareceu ponderar a informação, seu olhar ainda fixo e cheio de uma energia que contradizia seu estado físico debilitado. "Se o que você diz é verdade, então este problema precisa ser resolvido rapidamente. Mas eu não posso permitir que a Guarda do Corvo entre sem mais nem menos. Devem haver garantias de que este ato será feito com a devida consideração pelas nossas regras."

Pallas fez uma leve inclinação com a cabeça. "Entendemos a gravidade da situação. Nosso objetivo é garantir a segurança de ambos os lados, e faremos isso com o máximo de cuidado possível. Podemos contar com sua cooperação para localizar e lidar com este indivíduo?"

Enquanto Pallas aguardava uma resposta da marquesa, um dos jovens, visivelmente angustiado e com um olhar forte de desconfiança, interrompeu: "Por que devemos ajudar vocês? Por que deveríamos acreditar que vocês realmente querem ajudar os dois lados?"

O jovem fez um gesto amplo, que parecia indicar a condição precária em que se encontravam. A marquesa virou sua atenção para o jovem, mas seu olhar estava imperturbável, quase como se estivesse se preparando para algo.

Pallas manteve a calma, sua voz firme e controlada. "Marquesa, uma hora você terá que contar a verdade sobre o que está acontecendo aqui."

A marquesa fez um leve movimento com a cabeça, indicando que estava ciente, mas não ofereceu mais detalhes. Seu olhar permanecia fixo e impassível, um reflexo do desgaste e da experiência que carregava.

Pallas continuou, sua voz cheia de determinação: "Marquesa, há quanto tempo você quer que os jovens saiam daqui?"

A marquesa não respondeu imediatamente, seus olhos continuavam a observar a cena com uma intensidade que parecia pesar em cada palavra não dita. Finalmente, ela apenas inclinou a cabeça ligeiramente, como se a pergunta não fosse novidade para ela.

Vendo que a marquesa não iria responder, Pallas propôs uma solução. "Eu tenho uma proposta. Nos ajude a descobrir como esse monstro conseguiu atravessar para o outro lado, para resolvermos esse problema. Em troca, nós ajudaremos a curar os jovens e a levá-los para o outro lado, onde poderão encontrar com certeza, uma vida melhor e mais segura."

A marquesa olhou para Pallas, seus olhos brilhando com ceticismo. O ambiente parecia estar em um equilíbrio delicado, a tensão no ar tornando cada palavra ainda mais significativa.

Finalmente, a marquesa falou, sua voz fraca mas firme: "Você está fazendo uma oferta justa. Se por algum milagre puder realmente cumprir com o que promete, então aceito sua proposta. Mas lembre-se, sua palavra é tudo o que temos para confiar neste momento. Não falhe conosco."

Pallas fez uma reverência respeitosa. "Nós faremos o nosso melhor para resolver esta situação e cumprir com o que prometemos. Agradeço por sua confiança."

A marquesa fez um leve gesto com a mão, sinalizando que a reunião estava encerrada. Ela então voltou a se recostar em sua cadeira, seus olhos fechados.

Parte 2

A chuva incessante continuava a martelar a pequena cidade portuária, seu ritmo implacável servindo de fundo para a manhã. O céu estava pesado com nuvens, lançando uma luz cinza e apagada sobre a paisagem. Ed e William saíram do dormitório, suas botas afundando na lama. O ar estava cortante, cheio do cheiro de terra molhada e o ocasional clarão distante de relâmpagos.

"Vamos para o campo." disse William, sua voz firme apesar da tempestade. Seu manto estava grudadas no corpo, encharcadas pela chuva, mas sua atitude permanecia resoluta.

Ed assentiu, puxando seu manto com mais força. "Certo. Vamos fazer isso."

Eles caminharam pelas ruas encharcadas, suas figuras mal visíveis através da densa chuva. Chegando a um pequeno campo aberto no meio da cidade, William parou. O terreno estava um lamaçal, com poças se formando irregularmente. A tempestade tornava o campo um lugar traiçoeiro, mas era o cenário perfeito para o que William tinha em mente.

"Bom, Eddy. Não há tempo para novos aprendizados agora. Vamos reforçar o que já sabe." William disse, enquanto se preparava para o treinamento.

"Hoje, vamos focar na técnica e na resistência."

Ed ajustou a cimitarras em suas mãos, sua postura determinada. William, com sua espada curta em punho, começou a se movimentar, esboçando o padrão de ataque que Ed conhecia bem. A chuva caía sem parar, tornando o campo um verdadeiro desafio para a prática.

"Prepare-se." William ordenou, enquanto assumia uma posição de ataque.

"Vamos manter o ritmo. A lama pode ser um obstáculo, mas é também uma chance para aperfeiçoar sua técnica."

Ed balançou as cimitarras, começando a se mover conforme as instruções de William. As lâminas cortavam o ar, seus movimentos ajustados ao terreno escorregadio. A técnica já conhecida, mas a dificuldade da lama tornava a prática mais exigente.

William avançou, atacando com sua espada curta. Os golpes foram rápidos e precisos, exigindo que Ed defendesse e contra-atacasse com agilidade. A chuva que caía torrencialmente misturava-se com o suor e a determinação, tornando o treinamento ainda mais intenso.

"Não hesite!" William gritou, enquanto desferia um ataque rápido.

"A lama pode desacelerar seus movimentos, mas você deve manter a fluidez!"

Ed bloqueou o golpe de William com suas cimitarras, a força do impacto fazendo-o escorregar um pouco. Ajustou a postura e lançou um contra-ataque, seus movimentos precisos apesar da dificuldade.

"Bom trabalho." William elogiou, observando a reação de Ed.

"Continue assim. A prática vai te fazer mais forte."

Enquanto Ed começava a guardar suas cimitarras, o som de passos apressados se aproximou. Wilde apareceu no campo, seu rosto encharcado pela chuva, mas com um olhar de satisfação.

"Ed, Billy." Wilde chamou, acenando para eles. "Ed, você melhorou muito. Pallas quer conversar com a gente agora. Ele disse que é urgente."

William levantou uma sobrancelha e se dirigiu a Ed. "Parece que teremos uma boa conversa. Eddy, continue com o treinamento."

Ed parou por um momento, entendendo o recado. "Entendido, pai. Vou continuar aqui."

Ed estava prestes a retomar seu treino quando viu Helena se aproximar. Ela estava com o cabelo preso em um coque improvisado e vestia um manto curto que estavam molhadas da chuva, mas seu olhar era determinado.

"Você vai continuar treinando sozinho?" Helena perguntou, com uma mistura de curiosidade e interesse.

Ed, surpreso com a abordagem, deu-lhe um leve sorriso. "Sim, vou. Mas você pode se juntar a mim, se quiser."

Helena assentiu, um brilho de determinação nos olhos. "Ótimo. Acho que um pouco de treino não vai fazer mal a ninguém."

Ela se aproximou e tirou uma pequena espada de sua cintura, ajustando a postura com um olhar focado. Ed ergueu suas cimitarras, preparando-se para a nova sessão de treino.

"Vamos começar?" Helena sugeriu, o entusiasmo evidente em sua voz.

"Claro." Ed respondeu, erguendo suas cimitarras e assumindo uma posição de combate.

"Você está pronta?"

Sem mais delongas, Helena avançou com uma combinação rápida de golpes, testando a defesa de Ed. Ele bloqueou os ataques com habilidade, movendo-se de lado para desviar dos golpes. A chuva continuava a cair, tornando o campo escorregadio, mas ambos pareciam imunes ao incômodo do clima.

Helena fez uma finta, tentando desviar a atenção de Ed e atingir uma abertura em sua defesa. Ed reagiu rapidamente, rodopiando e cortando o ar com suas cimitarras para neutralizar o ataque.

"Bom reflexo!" Helena elogiou, enquanto fazia uma pausa para recuperar o fôlego.

"Você é melhor do que eu esperava."

Ed sorriu, suado, mas satisfeito. "Você também não é nada mal."

Enquanto eles continuavam a lutar, Liam observava de longe, escondido sob a sombra de uma grande rocha.

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