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À Beira do Caos

Na manhã seguinte, o dia começou como qualquer outro, mas, para mim, havia algo fora do lugar.

Desde que eu tinha ouvido sobre os rumores de Yuki e Kazuki, minha mente não conseguia descansar. Era como se tudo ao meu redor estivesse ligeiramente distorcido. A escola, a escrita, até meus amigos... tudo parecia distante, sem foco.

Durante o caminho até a escola, eu andava ao lado de Seiji, Rintarou e Kaori. Enquanto eles conversavam, meus pensamentos vagavam, longe dali. A cada passo, o peso da incerteza sobre Yuki e Kazuki me puxava para dentro de um vórtice de confusão. Minhas respostas eram automáticas, uma risada ocasional, uma concordância vaga.

Não havia espaço em minha mente para a leveza das conversas triviais.

Entrei na sala e Yuki já estava lá. A princípio, ela parecia a mesma de sempre, mas havia algo que não conseguia identificar. Não era nada físico; talvez fosse a forma como ela estava sentada, como se uma parede invisível a separasse do resto da turma.

Ou talvez fosse só minha mente distorcendo tudo ao meu redor.

"Yuki e Kazuki estão namorando!"

A frase ecoava na minha cabeça como um ruído de fundo impossível de silenciar.

Sentei-me na minha cadeira, mas era como se o ar na sala estivesse mais denso. As vozes dos alunos eram abafadas, misturadas em um zumbido constante, enquanto o ambiente ao redor parecia embaçado, desfocado. Mesmo cercado de pessoas, tudo parecia vazio, distante, como se eu estivesse em uma bolha que me separava do mundo.

Meus olhos percorriam os rostos familiares de Rintarou, Seiji, Akira, Takeshi e Mai, mas seus sorrisos e tentativas de me animar pareciam não alcançar o espaço onde eu estava. Era como se eu estivesse assistindo a uma cena de longe, desconectado de tudo e de todos.

Eu respondia mecanicamente, ria quando esperavam que eu risse, mas sentia que estava fora de sincronia.

Durante a aula, minhas mãos estavam sobre o meu caderno, mas minha mente estava em outro lugar. Os rabiscos desorganizados eram a única evidência de que eu havia tentado me concentrar. As palavras do professor vinham e iam, mas nada se fixava.

Tudo sempre voltava ao mesmo ponto: Kazuki. Yuki. Juntos?

Minha frustração também transbordava para a escrita. Agora, a página em branco era um inimigo.

A caneta, que antes parecia uma extensão da minha mão, pesava como se fosse feita de chumbo. Tentei escrever algo, qualquer coisa, mas as palavras não vinham. E quando vinham, eram desconexas, sem vida.

Minhas ideias, antes tão claras, agora se embaralhavam, perdendo-se antes mesmo de eu conseguir organizá-las.

Eu olhava para o papel por horas, esperando que algo surgisse. Mas tudo que conseguia era o silêncio. Mesmo quando eu escrevia no meu computador, o cursor piscando na tela parecia zombar de mim, enquanto a página em branco gritava a minha incapacidade.

A escrita, que antes era o lugar onde eu me encontrava, agora era o lugar onde eu me perdia. As histórias que costumavam me acalmar, agora apenas amplificavam meu caos interno.

Era como se algo dentro de mim tivesse se quebrado, e, por mais que tentasse, não conseguia juntar as peças. Cada tentativa de escrever parecia um fracasso. As palavras me escapavam, assim como tudo o que eu achava que entendia sobre mim mesmo.

A escrita estava desmoronando. O Concurso de Inverno estava se aproximando, e eu sabia que precisava me preparar. Mas, como eu podia, se não conseguia nem me concentrar?

— Shin, o que tá rolando? — Seiji perguntou durante o intervalo, na escola, a preocupação clara em sua voz. — Você não tá com a gente ultimamente. Tá tudo bem com você?

Eu hesitei, meus olhos fixos no chão. Não era algo que eles entenderiam facilmente. E, mesmo que entendessem, eu não tinha coragem de colocar em palavras. Eu apenas sacudi a cabeça, tentando afastar os pensamentos, mas eles continuavam lá, me consumindo.

No fundo, eu sabia que estava agindo diferente. As coisas mais simples, como conversar ou rir, exigiam esforço.

Tentei jogar jogos para me distrair, como sempre fazia, mas nada funcionava. Mesmo jogando, a imagem de Yuki e Kazuki juntos continuava a me perseguir. Era como uma sombra que não me deixava em paz.

Os dias se arrastavam, e eu me sentia mais isolado. Não porque meus amigos tivessem se afastado, mas porque eu mesmo estava criando essa distância.

Durante uma aula, Rintarou me cutucou.

— Ei, você tá bem, Shin? — ele perguntou, seu tom sério como sempre.

Eu apenas murmurei uma resposta vaga. Sabia que eles estavam preocupados, mas a verdade era que eu não conseguia me concentrar em nada além daquela incerteza que me corroía.

E Yuki... ela parecia mais distante, mais reservada. Cada vez que eu a olhava, queria perguntar se o rumor era verdade, mas as palavras nunca saíam.

Talvez eu apenas estivesse com medo de que ela confirmasse que os boatos eram reais.

Kaori percebeu minha falta de foco durante a reunião do clube. Seus olhos se fixaram em mim por um momento, silenciosos, como se esperasse que eu dissesse algo. Mas eu não tinha nada a dizer. Ela sabia disso, e apenas suspirou, deixando o silêncio falar por si.

No final da tarde, enquanto eu voltava para casa, meus passos pesados e minha cabeça cheia de pensamentos, ouvi uma voz familiar.

— Ei, Shin! Espera aí! — Kaori se aproximou, apressada, com seu habitual sorriso animado. — Tá tudo bem? Você parece mais perdido do que de costume.

Eu dei de ombros, sem muita energia para inventar uma desculpa.

— Vem comigo — ela disse, sem me dar muita escolha, segurando minha mão e me puxando em direção à loja de doces próxima à escola.

— Eu não sei se tô no clima... — tentei protestar, mas ela me cortou.

— Apenas confia em mim! — ela disse, puxando-me com firmeza.

Entramos em uma confeitaria e, apesar da minha relutância inicial, o cheiro de açúcar e bolos frescos fez algo dentro de mim relaxar, mesmo que só um pouco. Pedimos dois doces, e Kaori me entregou o prato com um sorriso.

— Agora, me diz o que tá acontecendo. Você tá diferente, todo mundo percebeu.

Eu olhei para a fatia de bolo na minha frente, mexendo nele com o garfo, sem apetite.

— Não é nada demais. Só… algumas coisas me incomodando.

Kaori me olhou com paciência, mas também com aquela insistência que eu conhecia bem.

— É o rumor, não é? Sobre Yuki e Kazuki?

Fiquei surpreso por ela ter adivinhado tão rápido, mas ao mesmo tempo, parecia óbvio. Todos na escola já sabiam dos rumores. A diferença era que, enquanto os outros pareciam tratar como um simples boato, aquilo me corroía por dentro.

— Eu sei que parece bobo... — comecei, mas ela balançou a cabeça.

— Não é bobo se tá te afetando assim — ela respondeu suavemente. — Mas, Shin, você não pode deixar isso te consumir. Rumores são só... rumores. Você tem que focar no que é real, no que você pode controlar.

Eu sabia que ela tinha razão, mas as palavras não pareciam se fixar completamente.

O problema era que, para mim, o rumor parecia muito real.

Na manhã seguinte, entrei na sala, ainda me sentindo pesado. Meu olhar vagou até Kazuki, que estava, como sempre, cercado por amigos, rindo de algo. A despreocupação em sua expressão era quase irritante. Como ele conseguia agir assim? Não parecia incomodado, nem um pouco afetado pelos rumores. Ele sabia que estavam falando sobre ele e Yuki... então, por que ele estava tão tranquilo?

Por um momento, desejei poder ser como ele. Ser capaz de ignorar os rumores, as dúvidas, tudo. Kazuki sempre foi assim, autoconfiante, como se nada pudesse abalá-lo. Mas eu não conseguia parar de pensar... será que ele estava fingindo? Ou será que ele sabia algo que eu não sabia?

Essa dúvida me corroía. E enquanto eu o observava, mais uma vez me perguntei: se o rumor fosse verdade, por que ele não parecia se importar?

Esse pensamento me acompanhou pelo resto do dia, um peso que eu não conseguia tirar de cima de mim.

Em casa, tentei mais uma vez fugir dos pensamentos, mergulhando nos jogos. Mas mesmo o controle em minhas mãos parecia pesado. O reflexo de Yuki passava pela minha mente, misturado com a figura de Kazuki, e eu simplesmente não conseguia me concentrar em nada. A tela piscava à minha frente, mas eu não estava realmente lá.

Deitei-me na cama, encarando o teto. As perguntas voltaram, mais fortes, mais sufocantes. O que eu realmente sentia por Yuki? Minha cabeça latejava. E se o rumor fosse verdade? O que isso mudaria? O que isso faria comigo?

Eu precisava parar. Precisava parar de pensar nisso. Mas não conseguia. Cada vez que eu tentava ignorar, as dúvidas vinham de novo. Mais fortes. Me cercavam, me afogavam.

Medo. Eu estava com medo. Medo de descobrir que era verdade. Medo de perder algo que eu nunca sequer tive. Medo de Yuki. De Kazuki. De mim mesmo.

Enquanto a noite avançava, percebi que continuar fugindo não resolveria nada. Eu precisava de respostas, de clareza. Mas não sabia como chegar lá. Yuki, Kazuki, Ryuuji, o Concurso... tudo estava à deriva.

E, enquanto isso, eu permanecia perdido.

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