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Escolhas de uma vida

Dr. Kaminski começou a passear por entre os dragões abatidos até encontrar o maior deles e sentar-se sobre ele. Passou a mão vagarosamente sobre o corpo do dragão, apenas para confirmar se estava realmente sem vida. Ficou em uma posição em que conseguia ver a reação de todos e, após um pequeno intervalo, começou a falar.

"Saibam que tudo aconteceu exatamente da maneira que contei para vocês. O que eu não contei é que eu não dormia durante os experimentos que faziam comigo. Tudo que eles aprendiam durante essas experiências, eu escutava e aprendia também. Para não enlouquecer, imaginava que conversava com eles, perguntava muitas coisas e acreditava que eles me entendiam. Quando respondiam um ao outro, eu me convencia de que estavam falando comigo. Vi e senti todas as vezes que tiravam sangue de mim, misturavam com diversos outros líquidos e colocavam tudo em mim novamente. Vi quando desenvolveram os primeiros ovos de dragão, e eu nem sequer tinha noção do que era aquilo. Eu escutava tudo e todos, mas não podia responder, pois respirava através de mangueiras intravenosas que estavam por todo o meu corpo, assim como dezenas de fios que passavam pela minha cabeça e diversos outros equipamentos que eu tinha certeza de que ainda não eram de uso público.

No início, eles disseram que eu seria um experimento único; afinal, precisavam de mim no campo de batalha como líder. Então, começaram a inserir na minha mente regras e leis, assim como estratégias militares e alguns textos de importantes documentos, sobre os quais eu nunca soube o que eram. Fui mantido durante muitos anos dentro de um quadrado cheio de líquido, e a água me rodeava dentro daquela caixa de vidro. Mas, com o passar do tempo e a tecnologia avançando cada vez mais, me mudaram para uma bolha vítrea. O líquido era outro, mais denso e mais escuro, mas passava uma sensação de conforto muito grande, e meu corpo envelhecia numa velocidade muito mais lenta do que o normal.

Vocês lembram que eu falei que a cada ano eu perguntava que ano era? Eles nunca diziam a verdade, porque para cada 10 anos da vida de cada um que haviam se passado, aparentemente apenas um ano havia se passado para mim. O experimento que faziam comigo me dava essa vantagem. Havia pessoas com mais de 80 anos trabalhando nesse projeto que me envolvia, e eu escutava muitas vezes que tinham inveja da idade que eu aparentava ter. Porque, enquanto tinham se passado 50 ou 60 anos para eles e já estavam próximos do fim de suas vidas, para mim apenas cinco ou seis anos haviam se passado.

No entanto, se soubessem o quanto eu os invejava pela liberdade que tinham, pelos momentos felizes que passavam e compartilhavam entre amigos... Meus melhores momentos naquele lugar eram quando confiavam a mim seus preciosos segredos. Pois sabiam que eu não os escutava e, caso escutasse, nunca iria sair dali, então poderiam contar todos os seus segredos para mim. Afinal, como eu contaria algo para alguém naquela prisão infinita em que me mantinham?

Então, dia após dia, mês após mês, ano após ano, fui desenvolvendo um estado de tristeza muito profunda, aguardando uma mínima oportunidade para dar um fim naquele experimento que era eu. Sem esposa, sem filhos e sem família, de que me serviria a vida se eu não podia vivê-la?

Porém, certo dia, há muitos anos, uma oportunidade apareceu, mas não pude aproveitá-la porque, de tanto escutar segredos alheios, acabei preso à vida dos outros. Um dos cientistas da época, chamado Jimmy Troy, tinha apenas um filho, o pequeno Jimmy Troy, que havia se acidentado em um tombo de bicicleta. No início, parecia algo simples, mas depois se complicou, e o pequeno Jimmy Troy ficou internado em estado crítico.

Todas as tardes, o pobre pai do garoto contava para mim a situação do filho, como se eu pudesse fazer alguma coisa, sendo que nem ao menos podia falar. Mas, de tanto ouvir sobre o tratamento que faziam comigo, sobre as deficiências e as vantagens que existiam em meu sangue e em meu corpo, acabei aprendendo e sabia exatamente o que Jimmy Troy tinha de fazer para salvar seu filho.

Foi justamente nessa época que eu desejava pôr um fim à minha vida, e pensava que, quando a situação do filho de Joe se resolvesse, eu também finalizaria a minha."

E dois dias antes do filho de Joe passar por uma importante cirurgia, eu me esforcei como nunca havia me esforçado em toda a minha vida para conseguir mover apenas os lábios e chamar a atenção de Joe. Consegui, e depois de muito esforço, Joe percebeu o que eu estava falando e, de acordo com isso, seu filho poderia ser salvo. Ele perguntou para mim o que eu queria em troca daquilo que eu havia feito por ele e, desde que não fosse a liberdade, ele faria qualquer coisa que estivesse ao seu alcance. No momento, eu achei engraçado a sua oferta, mas era justamente aquilo que eu precisava: um pequeno favor, como um pequeno botão do painel, virado para o lado errado ou desligado por alguns momentos.

Isso era tudo que eu precisava: de uma oportunidade apenas. Em breves movimentos de lábios, lhe dei a ideia do que eu queria, e, com os olhos ainda mais tristes, ele balançou a cabeça, concordando, mas que não seria ele a pôr um fim em minha vida. Tristemente, ele me falava que essa decisão cabia apenas a mim e a ninguém mais. Ele me contou o que iria fazer para criar uma falha no programa que me mantinha vivo e o que eu teria que fazer para morrer. Eu, com meio sorriso, agradeci, e então ele saiu dali chorando, e os outros de nada desconfiaram. Afinal, todos sabiam da situação que ele passava com o filho no hospital.

A chance havia chegado, e tudo que eu precisava fazer era segurar a respiração por menos de 5 segundos, e, da maneira que Joe havia configurado o sistema daquela máquina, todo o restante entraria em colapso em modo silencioso, causando assim meu descanso eterno. Mas aí eu descobri que eu gostava mais da vida dos outros do que da minha mesmo. Estava mais que ansioso, extremamente curioso em saber se o filho de Joe iria sobreviver com as dicas que eu havia lhe dado. E como eu poderia saber isso se estivesse morto?

Passei horas na dúvida e sabia que em breve o plantão de cientistas médicos seria trocado e, talvez, nunca mais eu tivesse a oportunidade que estava tendo naquele dia. Para falar a verdade, várias vezes eu contei até três, mas eu precisava ficar até dez segundos sem respirar para o sistema da máquina colapsar. Eu tinha coragem mais que suficiente para fazer isso, mas a minha vontade de saber sobre a saúde do filho de Joe era maior. Então, pela manhã, assim que Joe chegou, eu mal pude esperar pelo resultado que ele iria me contar.

Eu sei que isso é impossível porque dentro daquela bolha eu não tinha movimento algum e não era porque eu não quisesse, mas toda aquela química sobre mim inibia completamente minhas ações e reações. Mas eu sou capaz de jurar para vocês que eu pude sentir as minhas pernas tremerem quando eu o vi chegando próximo de mim com seus olhos cheios de lágrimas. Aí eu pensei: "O que adiantou eu não sacrificar a minha vida para ter que passar o resto dela aqui dentro? De que adiantou o meu esforço se eu não pude ser útil nem mesmo para salvar uma criança? Qual é a vantagem de ter todo esse conhecimento e não ter como aplicar de uma forma humanitária?"

Porque eu me sentia inteligente o suficiente para acreditar que, se eu estivesse conduzindo todos os procedimentos que ensinei a Joe, seu filho ainda estaria vivo. Joe olhava para mim, e quanto mais ele olhava, mais ele chorava, e quanto mais ele chorava, mais revoltado eu ficava. Foram segundos que pareceram uma eternidade até que, finalmente, Joe conseguiu falar: "Obrigado... Meu pequeno Jimmy sobreviveu." Como resposta, eu dei um sorriso, o primeiro desde que eu estava lá. Foi aí que Joe começou a chorar de verdade. Então, descobri que ele estava chorando desde o início e que não era pelo seu filho... Era por mim. Sem se importar com os que estavam ao seu lado, ele olhou para mim e disse: "Toda vida é importante... Principalmente a sua."

De maneira quase imperceptível, movendo meus lábios com muito esforço, consegui fazer uma pergunta: "Você realmente acredita nisso?" Com os lábios trêmulos e o rosto todo molhado de lágrimas, ele me respondeu: "Eu acredito... E o meu pequeno Jimmy também. E ele mandou um recado para você." Nesse momento, tremi ainda mais. Joe estaria se arriscando muito se descobrissem que ele havia feito qualquer menção daquele projeto, do qual eu era a peça principal.

"Pai, eu tive um sonho essa noite e vi seu amigo muito triste, querendo sumir desse mundo para sempre. Mas também sonhei que ele queria muito me ver, e a tristeza dele foi sumindo até ele dar um sorriso. O sorriso mais lindo do mundo." Curioso, ainda consegui formular meia pergunta... "Eu também perguntei para o meu pequeno Jimmy o porquê desse sorriso ser o mais lindo do mundo, e sabe o que ele me disse? Porque era o primeiro... Mas que não seria o último... E que um dia ele gostaria de conhecê-lo pessoalmente."

Então, entendi o motivo das lágrimas de Joe, e desde esse dia nunca mais vi Macarly Joe. Não sei se o mataram ou simplesmente o afastaram do serviço, já que ele também era bem velho, mas isso foi algo que nunca esqueci. A partir daí, nunca mais quis morrer, porque comecei a acreditar que, assim como Joe e o filho dele, minha vida também era importante, e que se alguém quisesse tirá-la de mim, que tentasse, pois eu iria resistir. Foi uma promessa que fiz a mim mesmo naquele dia dentro daquela bolha vítrea.

E agora que estou aqui fora, quero me manter vivo, assim como a essa promessa de sobreviver, não importando a situação. Seja homem ou dragão, não vou deixar que me matem. Assim como vou aceitar se não me quiserem próximo de vocês. Podem não acreditar, mas no momento vocês são o que eu tenho de mais próximo de família. E todos têm idade de ser, no mínimo, meus bisnetos. Mas se me aceitarem, serão como meus irmãos ou filhos, e farei de tudo para que ninguém toque ou machuque vocês.

Não importa a quantidade de dragões que eu tenha que lutar, nem quantos inimigos eu tenha que derrotar. Mas se permitirem que eu faça de vocês minha família, não vou deixar que tirem vocês de mim... Isso eu prometo.

E então, o que me dizem... Ainda confiam em mim?

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