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O Sábio Ancestral, encontrado em uma vila simples, fora abandonado à própria sorte logo após o nascimento. Aos dezoito, caminhou buscando o sentido da vida. Completando trinta e dois, localizou a terra inóspita e a transformou em santa. Quando completou cinquenta e nove, viu a semelhança da beleza e da morte. No seu aniversário de cem anos, espalhou a fé de Noomá e Seth, Suroh e Sibaun, pelos quatro cantos do Continente de Vanaheim.

— Bibliografia da História da Magia, escrita por Leon Sarin, da Casa Sarin de Valingrado do Norte.

Após vinte anos de pescaria na fronteira da Baía do Luar, a semana anterior à Illuminus Luna passou sem agitação. Os peixes eram o único caos, causando um frenesi em direção a isca improvisada. Como formigas em direção ao açúcar, disputavam avidamente aquelas minhocas. O velho cego ficara feliz com toda a agitação do cardume, exibindo um sorriso torpe.

Nessa semana, a pescaria tomou o rumo contrário. As chuvas do Illuminus Luna perturbaram a calmaria do rio, então, o velho cego não conseguiu ter um bom lucro na pescaria. Incomodado, sentira uma vontade edaz.

O frio era incomum. Nas últimas décadas, nunca a temperatura caíra tanto quanto nesta noite de lua cheia. Não o incomodava o frio, mas, a sensação de ser "tocado" por esse clima o inundara.

Sentiu as gotas da chuva tocando sua pele, os rios agitados, e escutou o canto das cigarras. A sonância trazida pela chuva o remeteu aos tempos passados, inundados em glórias e desgraças. Aprofundou-se em pensamentos, chegando a esquecer o que viera fazer do lado de fora da sua cabana.

Desde a saída de casa em tenra idade com apenas uma espada nas costas e uma bolsa de poções, que lhe foram dadas por seus pais, até quando completou dezoito e correu o mundo. As aventuras dentro das Ruínas do Imperador Luna da Escritura Celestial, ou dentro do Porto do Tigre Branco. Talvez, até o caos na Catedral Sagrada de Noomá, ao pensar agora, tenha sido um acontecimento interessante. O tempo correu tranquilamente - mas, para ele, foi rápido demais.

Muitas coisas, o tempo levara impiedosamente. No entanto, entre memórias, algumas nunca iriam se esvair. Ainda recordara de seus irmãos de guerra e, principalmente, de seu fiel acompanhante.

Uma vez, teve um lobo o acompanhando. Era seus olhos e grande companheiro de vida e morte. De nome Lancelot, agia como o completo oposto das lendas sobre o exímio guerreiro. Escondia-se com o rabo entre as pernas sempre que escutava o barulho do trotar dos cavalos, ou relampejar das tortuosas guerras.

O lobo partiu há alguns anos, porém, as memórias de todo tempo juntos martelava sua mente, junto com a dor de cabeça por beber demais.

A melancolia o tomou, deixando-o cabisbaixo e frágil, contrário a sua fisionomia.

Era alto, considerado um gigante desde pequeno. Muitas vezes fora comparado com uma sequóia. Exibia feições simples e músculos bem desenvolvidos, destacados pela fina túnica branca, encharcada pela chuva. De tão curvado, a penumbra das lâmpadas suspensas atuariam como conforto as dificuldades que sofreria se estivesse em Notre-Dame.

Cambaleando, o velho cego seguia refletindo sobre o passado. Escorando por diversas vezes nos enormes bambus, destruiu alguns no processo. Cada movimento continha cada vez mais rigidez, e a dor de cabeça piorava a cada instante, junto a ferimentos leves causados pelas quedas.

"Essa maldita dor de cabeça..." Inconformado, chutou uma pedra, apenas para tropeçar e cair mais uma vez. — Ugh! Caralho! — Resmungou, com o humor cada vez pior.

Os trovões estreitaram o caminho. Diversos buracos foram criados por causa do impacto, ocasionando na aparição de diversas poças de água. Mesmo a passos lentos, caiu algumas vezes. Sem equilíbrio nos passos, berrou ofensas aos céus por horas sem cansar.

Olhou ao redor, procurando um lugar para pescar. Nenhum dos efeitos colaterais da Illuminus Luna o importava; não poderia importar. Ainda havia de se alimentar. Se comesse apenas arroz novamente, não seria o bastante. A morte o tocaria da maneira mais comum e, ao mesmo tempo, mais idiota para alguém como ele.

— Ontem, a pesca foi terrível! — Exclamou o velho, sua voz ressoando como um violino desafinado. — Será que consigo algo hoje?

Pegando uma cabaça cheia de álcool, tomou um grande gole enquanto divagava. As expressões faciais mudam como os ares da vida, deixando a mente seguir fluindo para a época em que tinha glória e companheiros. Talvez não fosse merecedor de nada; nem do passado visto, ou de um futuro duvidoso.

O sonho chegou ao fim, e a solidão o acompanhava.

De tempos em tempos, seu corpo tremia. Parecia que uma leve brisa o levaria com a mesma facilidade que um pedaço de pano. Seu corpo era forte, mas a falta de vontade o deixara ranzinza. A má vontade era acompanhada da rigidez com a qual fora tratado na segunda metade da vida.

"Algo vai acontecer hoje". Pensou, inconformado. "Odeio chuva."

Era o décimo primeiro dia da Illuminus Luna e as tempestades ficavam cada vez mais fortes. O solo tinha amolecido e a lama preenchia os cantos mais isolados. O céu exibia um belo luar e estrelas anormalmente reluzentes.

Reluzente demais para seu humor; e a chuva ainda caía. Respirou fundo. Diminuiu a velocidade dos passos, mas, mesmo assim, sentiu certa dificuldade para se equilibrar.

Cansado, irritado, e amaldiçoando o mundo, parecia que a qualquer momento iria receber o tão indesejado beijo da morte. As rugas ganharam um indesejado espaço. O velho cego parecia pesar menos que um saco de folhas, mesmo sendo tão alto quanto uma sequóia, o deixando com uma aparência ainda mais fraca.

Alguns dizem que passou dos cem anos; outros, insistem que o desgaste o faz parecer velho. No fim, ninguém sabia exatamente quantos anos o velho cego tinha – nem ele mesmo.

Respirou pesadamente, escutando as reclamações de seu estômago. Precisava capturar alguma coisa, mas, tinha apenas os frutos do mar como opção. - há muito tempo,

Conhecia bem o lugar, seja sentindo-se sujo ao encostar na lama, ou pelo cheiro de terra molhada e grama, que permeia o lugar desde que chegou. Decidiu subir no topo da colina, mesmo achando que parecia uma má ideia. Apontou a vara de pescar para frente e a usou de bengala, em uma tentativa de situar-se para não cair novamente.

Falhou miseravelmente.

Antes de chegar a colina, caiu seis vezes. Entre tropeços e ter seus pés afundados em poças aleatórias, os machucados aumentaram consideravelmente. Não se revoltou, ou sequer mudou a expressão. Sabia que poderia evitar todos estes problemas se usasse magia, mas, como se recusava, não tinha a quem culpar além de si mesmo.

"Culpa… bem, essa deve ser a única palavra que se adequa a mim." Ironizou, rindo de si mesmo. Gritou em seguida, soando inexplicavelmente triste.

A raiva tornava-se melancolia. Um processo que repetia todos os dias durante vinte anos. A cada passo, pensava: "Onde está aquela vitória prometida dentro da profecia?". A cada segundo, parecia mais velho - e cansado.

Agachou, pegando uma pequena pedra aleatória. Depois de brincar um pouco ao jogá-la para o alto algumas vezes, arremessou-a no rio, atento a cada som. A pedra ricocheteou nove vezes antes de ser engolida pela raiva das águas.

Ele entendeu - e mais uma vez amaldiçoou os céus. Porém, desta vez, ficou com uma pulga atrás da orelha.

As águas do rio estavam iguais aos últimos dias - talvez, mais poderosas ainda. Aquela mesma impressão de que algo importante ocorreria crescia no mesmo ritmo das forças da natureza.

— Queria que fosse efeito do álcool. — Aumentando o tom de voz, seu monólogo parecia um protesto contra a vida. — Por que os céus não podem deixar esse velho curtir a aposentadoria em paz? Não peço muito, apenas meu álcool e uma pescaria calma! Tomaram-me tudo! Deixem-me os peixes!

O velho cego ficou resmungando e bebendo até o álcool chegar ao fim, piorando seu humor - além do possível. Agachou, bateu a cabaça três vezes no chão e se levantou. A cabaça estava cheia novamente, mas o álcool tinha com um gosto diferente.

Era amargo.

"Definitivamente é um mal sinal". Suspirou em contemplação. A chuva do dia anterior o deixou ensopado até o último fio de cabelo, e agora, quase destruiu a pequena cabana onde morava.

"O bambu é resistente. Deve durar essa Illuminus Luna".

Quando a isca ficou pronta no anzol, cambaleou algumas vezes para trás e para frente, sempre parecendo que iria cair – porém, nunca caiu. O fio da vara de pescar alcançou o rio, mas, não seguiu o ritmo furioso das águas e da chuva. A calmaria presente no velho – apesar de seus resmungos e reclamações – contrastava completamente com o ambiente terrífico.

A melancolia com a qual estava tão familiarizado o deixara estabilizado.

Como não havia maneira de saber o dia e a noite, este tipo de noção desapareceu. O velho cego parara de cambalear incontáveis horas atrás. Mesmo refletindo, não tinha ideia de quantos dias se passara – de qualquer jeito, não era importante e estava irritado em demasia para considerar algo.

"Quantos dias foram? A Illuminus Lunar deveria ter terminado." Pensou, preocupado. "Talvez devesse ir para Porto Real no Oeste ou para as terras áridas do Sul? Ou até mesmo para o Leste?" Divagou por um instante antes de balançar a cabeça em sinal de negação, voltando a si. "Vou ficar aqui mesmo. Pode chover, mas, pelo menos, tenho paz."

Em nenhum momento o frio parecia o incomodar. Desde que parou de cambalear, a presença e postura exibida era semelhante a estátua de buda na Fronteira Continental.

Até a raiva e mal humor, expressados tão claramente, desapareceram.

A premonição ficara incontrolável, deixando-o tão firme quanto no passado.

— Finalmente, alguma coisa! — exclamou, sentindo o tremor nas mãos. — É meio leve, mas, deve dar para comer com arroz. — Por um momento, nada mais importava.

Abrindo os olhos, revelara uma expressão séria junto a um par de íris cinzenta e opaca. A empolgação desapareceu em segundos. Um brilho cinzento apareceu abaixo de seus pés. Firmando-se na colina, as vibrações que liberava causavam rachaduras no terreno ao redor. "Isso é muito bizarro" pensou, curioso, ao perceber que não era um peixe.

Jogou a melancolia para fora, junto a irritação e a fome. Tudo que restara era um velho médico.

Pondo força nos braços, trouxe o fio da vara de pescar para cima. "Ok. Agora resta saber de onde é." Pensou, não estranhando a situação. Quando o fio chegou, trouxe consigo uma cesta de bambu com algo enrolado em um cobertor; era um recém-nascido, sendo mais exato.

"O frio vai prejudicar ainda mais esse pequeno corpo". Refletiu com calma. "Como ele veio parar aqui? Será que o jogaram da Baía do Luar?" Estava curioso, pois, não havia maneira fácil para alguém chegar pela Baía do Luar, conhecida por dois lugares principais: Colina do Suicídio e Mar de sangue.

"Se os pais dessa criança tem o poder para circular pela Baía, por que jogá-lo pelo rio? Apenas sorte ele não ter morrido." Idealizou a situação por um momento antes de ignorar totalmente. "No fim, nada disso importa. Não é a primeira nem a última vez que uma criança renegada é encontrada no rio" Apesar de curioso, era meramente isso. Com o passar dos anos, inevitavelmente deixou de se preocupar com o mundo e as pessoas.

"Entreguei tudo que tinha ao mundo e o mundo me traiu da forma mais podre. Por que deveria me importar?" Relembrando o passado, a ideia de jogar o garoto de volta ao rio apareceu. "Esse garoto está à beira da morte, fará alguma diferença se eu tentar ou não o curar?" Imediatamente, se arrependeu do pensamento, criando um conflito interno. Seu corpo tremeu, e a tristeza foi refletida em sua presença.

"Tê-lo aqui pode ser considerado o destino". Pela centésima vez nos últimos dias, suspirou. Fixando a ideia, liberou uma aura cinzenta que cobriu a área entre ele e a cabana. Um sussurro e o mundo parou. As chuvas deixaram de cair e pararam no ar. O movimento do rio paralisou, deixando o silêncio tomar conta totalmente.

Arte do Céu: Deslocamento Espacial

Seis círculos mágicos com diversos símbolos tribais apareceram ao redor do velho. Eram pequenos, com um raio de mais ou menos cinco metros cada, que permaneciam bem próximos ao velho. A aura cinza ondulava em uma dança natural com o ambiente. Em questão de segundos, os círculos pararam, formando um hexágono e liberando mais da mesma aura cinzenta. Instantes depois, desapareceram da colina e surgiram dentro da cabana.

Observando a casa - que tinha apenas um cômodo - percebeu a bagunça que estava. Soprando - literalmente - afastou todos os livros e roupas, deixando somente uma cama feita com vários pedaços de pano e uma caixa de ervas medicinais.

— Primeiro, vamos ver de que raça você é, meu pequeno. — Disse, colocando a criança na cama e tirando o pano. Junto a criança, havia um colar, que estava escondido no cesto.

Por não conseguir enxergar, não sabia o que era o colar - que reconheceu pelo tato - e não tinha tempo de verificar com sua prana.

A utilizou para "Enxergar" a criança. Conceitualmente, conseguiu perceber as características físicas. Nada muito impressionante, dado as características únicas de sua aura.

Como estava apressado, capturou somente os pontos básicos. — Cabelos brancos, olhos verdes, pele clara… — Sentiu-se confuso. — Não conheço nenhum clã humano que tenha um cabelo branco tão... prateado como esse. Será que ele é um Luna? — Conversando consigo mesmo, tentava entender a situação do garoto.

A criança estava magra - talvez não pesasse nem um quilo. Os poucos fios brancos estavam opacos e ela não emitia um som sequer. No entanto, mesmo não tendo a vis��o, sentia instintivamente o olhar da criança.

Um olhar de curiosidade, vivo, e mesmo com tudo, não tinha medo.

"Essa criança é interessante. No fim, espero que valha a pena." Sorrindo, cerrou os olhos e dissipou toda a aura cinza. Em seguida, sussurrou algumas palavras audíveis apenas para si mesmo, fazendo outra aura surgir, só que verde esmeralda.

"Ó mãe Yggdrasil, progenitora da vida e raíz da magia. Da prana que criastes, hei de seguir a tua pujança. Empresta-me tuas forças..."

A aura que havia espalhado é a chamada prana. O velho cego tinha uma alta afinidade com a prana da vida, representada pela cor verde esmeralda. Utilizando-a, conseguia uma forma de enxergar o mundo e cuidar das pessoas. Não era uma peculiaridade disponível para todos que utilizam a prana da vida. Registrados no Registro Mundial de Versalhes, existem somente os druidas e o velho cego.

Sorrindo levemente, terminou de conjurar:

"Prana é vida; a vida, é existência; a existência é o retorno e compreensão do universo; o universo é prana, e tudo retorna ao início"

Arte da Vida: Reconstrução.

Seis círculos mágicos eneagonais apareceram, semelhante aos de alguns segundos atrás. Porém, desta vez eram verdes. Um cheiro de orvalho invadiu a cabana. Flores e ramos de árvores, desde raízes à terra, começaram a nascer em torno dos dois, como no "Conto da Terra Sagrada", escrito por Azariel Sarin, durante as guerras da Segunda Era.

— Faz um tempo desde a última vez. — Claramente desgastado, deu um sorriso fraco antes de retirar uma gota de sangue do recém-nascido. — Primeiro, preciso saber a qual raça ele pertence.

Era um procedimento padrão da medicina por todo continente. Todas as raças, sejam elas pensantes ou não, tinham constituições diferentes - algumas compartilham semelhanças, como os Luna e os Sagrados.

Excluindo a maioria óbvia, o velho cego focou-se nas dezesseis raças inteligentes. Dentre estes, doze eram parecidos com a humanidade de sangue único e todos conseguiam assumir a forma humana padrão.

"Bem, não são todas que conseguem assumir a forma assim que nascem… posso reduzir para sete…" Criando um furo na testa da criança, utilizou a prana da vida para trazer o sangue da forma mais cuidadosa possível.

A gota de sangue subiu, flutuando, até as mãos do Velho cego. Analisando com sua prana, suspirou, arrependido ao lembrar-se de algo distante. — Se tivesse minha visão, seria muito mais simples.

Sua prana rodeou a criança, o possibilitando a análise das veias e a situação interna. Essa era a sua maneira de "ver" o mundo. Transmitida pela prana, as imagens da criança apareceram na sua mente em detalhes, desde as veias até os olhos curiosos.

"Ele tem os mesmos olhos verdes que ela tinha..." Pensou, entrando em nostalgia. Demorou algum tempo antes de continuar verificando a criança.

Respirou fundo. Movimentando-se dentro de segundos, abriu a caixa de ervas medicinais e, automaticamente, foi nas agulhas presas no topo da caixa, que era semelhante a um baú. Sorrindo, a postura da coluna ficou correta e, mesmo cansado, aparentava ser décadas mais novo. Seus mais de dois metros foram revelados esplendorosamente.

— Ele deve ser um Luna ou Celestial. — Refletiu, não parando os movimentos para montar os preparativos do tratamento. — Não dá para saber exatamente. As veias de ambos se diferenciam para o recebimento de prana apenas aos três anos. É uma sorte que o tratamento para os Luna e Celestiais seja o mesmo. Ainda sim, esse garoto...

Suspirou. Não importava o ângulo, a criança tinha tantos problemas de nascimento que, mesmo sem pensar, entendeu o motivo pelo qual ela foi abandonada na Baía do Luar.

— Deficiência óssea, meridianos essenciais rasgados, deficiência de prana, deficiência ocular, doenças cardiovasculares congênitas, anemia... como essa criança está viva? — Franziu as sobrancelhas. Entendeu que, pelos meios normais, essa criança não poderia usar magia, mesmo que conseguisse ficar viva.

"Apenas o velho Heylel poderia curá-lo; além de mim, claro." Pôs a mão no peito, sentindo a dúvida novamente. "Posso curá-lo, até mesmo melhor que o velho Heylel, mas... vale a pena? Talvez eu realmente deva jogá-lo de volta ao rio..."

Mais uma vez, balançou a cabeça negativamente. Soltou um sorriso irônico. "Devia ter acreditado na velha da família Silith. Mas, nunca poderia imaginar isso... que a dúvida viria… e dessa forma. Uma decisão que vai mudar minha vida… vai ser uma aposta baseada em um par de olhos verdes."

"Irônico… a minha vida é realmente irônica."

Em meio aos conflitos internos, suspirou mais uma vez. Com isso, jogou todos estes pensamentos de lado. Concentrou toda a prana nos dedos e uma chama verde surgiu entre suas sobrancelhas. — Primeiro, vamos retirar a água dos pulmões. "Bem, pelo menos, conseguir uma maneira sem prejudicar as outras dezenas de doenças presentes."

Ponderando, inúmeras maneiras de retirar a água que o garoto ingeriu apareceram em mente, no entanto, todas elas acabariam piorando outras situações.

— Deve ter uma maneira. — Franzindo, as rugas tornaram-se mais evidentes. — A acupuntura está fora. Infusão também. Vômito está completamente fora de questão. Desmaterializar a água com prana pode afetar os ossos e meridianos (...)

Os segundos flutuavam lentamente. Sentindo-se pressionado, recuperou um pouco do sentimento de quando era ativo na comunidade médica. Aproveitando-se desse momento, adquiriu uma postura competitiva e pôs o orgulho em jogo.

Mais de dez minutos passaram enquanto a prana da vida se espalhava. Uma árvore crescera mais de um metro e as raízes corriam pelas paredes, enrolando-se no bambu. Um mar de folhas dançava com os ventos, ignorando a tempestade do lado de fora.

Sentindo o toque das folhas, lembrou-se de algo e sorriu. — Como que eu não pensei nisso antes? Quem se importa com o futuro? Se é para apostar, vamos com tudo! Quero salvar essa criança, não importando se vai dar certo ou não.

Com um movimento suave, toda a prana da vida no ambiente foi direcionada para o ponto entre a sobrancelha. Usando a mão esquerda, desenhou alguns símbolos antigos, parecidos com ideogramas ancestrais, em pleno ar, formando diversas frases compreendidas apenas por ele. Os símbolos adquiriram, além da cor verde, um cinza borrado, mistificando a cena por diversas camadas.

Passaram-se alguns minutos antes que terminasse. A quantidade era terrorífica, chegando na casa das centenas - o que sugava totalmente a energia mental e a prana do velho cego.

Utilizando outro movimento de mãos, os símbolos percorreram seu corpo e o da criança como tatuagens - um misto de tribal com florido, fazendo uma alusão as oliveiras. Estes permaneceram por um momento antes de invadirem internamente e fixarem-se na estrutura óssea.

No mesmo momento que o processo de fusão terminou, uma bola verde – do tamanho de uma pílula comum – saiu da testa do velho cego e entrou na criança, envolvendo-a em um semi-casulo verde transparente.

Em uma velocidade totalmente incomparável, o corpo começou a regenerar. A água simplesmente foi expelida em forma de suor e a anemia desapareceu, sem causar nenhuma consequência negativa. O efeito pôde ser considerado como divino - mas, nada além do esperado pelo velho cego.

No instante seguinte, a criança adquiriu uma coloração um pouco mais normal. O velho cego aparentava felicidade por cima de todo o cansaço.

— No fim, não consegui curar as doenças congênitas, mas, com o tempo, resolverei isso. Talvez uns dezessete anos… no máximo, vinte. Não há doença que não consiga curar.

Escutou algo, e virou-se, com um belo sorriso no rosto - Quiçá o mais sincero das últimas décadas.

Escutando a criança - que finalmente reagira - soltar pequenos sons pacificamente, sentiu realização e, bem no fundo, apegado ao pequeno dos olhos curiosos.

Em um impulso, decidiu nomeá-lo.

— Esse garoto... apesar de ser um Luna (suponho eu), não conheço a descendência real, então, vou escolher um nome. — Ponderando, decidiu dar-lhe o próprio sobrenome, porém, a indecisão estava na escolha do primeiro nome.

— Blake? Não, o mundo não foi justo com ele. Colin? Não cai bem... Dylan? Seria de mal gosto. Nicholas? Talvez, mas não sei que tipo de ideologia o garoto vai seguir. — Pensativo, mergulhou em nostalgia quando finalmente se decidiu. "Se é para ser…"

— Elijah... seu nome vai ser Elijah.

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