2 Sombra da Lua, um Mar de Sombras - Parte 1 / Capítulo 2

Original: A Sea of Shadows, Tradução por Adriano Ribeiro

Um romance da série The Twelve Kingdoms

Por Fuyumi Ono

Parte I

Capítulo 2

Youko frequentava uma escola comum de ensino médio. Tirando o fato de ser uma escola privada para garotas, nada tinha de excepcional.

A escola foi uma escolha de ser pai. Ela havia se saído bem no ensino fundamental e, assim, mirou alto em suas aspirações. Seu conselheiro de carreira no ensino fundamental recomendou uma escola melhor. Mas seu pai não cedeu um centímetro. A escola ficava perto de casa, não era infame e nem tinha reputação controversa. Isso era o suficiente.

Primeiramente, até sua mãe estava desapontada com o nível da escola. Afinal, ela acompanhou os resultados dos exames de ensino médio de Youko. Mas seu pai logo a fez concordar com ele. Uma vez que sua mãe e seu pai concordavam em qualquer coisa, a discussão estava acabada.

Youko poderia ter se qualificado para uma escola melhor um pouco mais distante. Entre outras coisas a escola tinha uniformes muito mais legais. Mas não parecia certo fazer confusão pelo estilo de um uniforme, então ela manteve sua boca fechada e fez o que lhe foi mandado.

Como resultado, agora em seu primeiro ano, ela possuía pouco do que poderia ser chamado de "espírito escolar".

"Bom Dia!"

Um trio brilhante de vozes cumprimentou Youko quando ela entrou em sua sala de aula. As três garotas acenaram para ela do outro lado da sala.

Uma das integrantes do trio se apressou em sua direção. "Youko, você fez a tarefa de matemática, certo? Você me deixaria ver?"

Youko foi até sua mesa na janela. Ela tirou a tarefa de sua mochila. Várias meninas rapidamente se reuniram e começaram a copiar suas respostas.

"Você é uma ótima aluna, Youko. Não é à toa que você é a presidente de classe"

Youko balançou a cabeça conscientemente.

"Não, mesmo! Eu odeio dever de casa! Entra tudo por um ouvido e sai pelo outro."

"É, eu também. No momento em que eu começo a pensar, não entendo nada. É como assistir tinta secar. Caio no sono. Eu queria ser inteligente como você"

"Eu aposto que você nem mesmo teve que tentar"

"Não, não é assim mesmo"

"Você realmente gosta de estudar, né?"

"Não seja boba", Youko fingiu estar indignada com a observação. "É minha mãe. Ela está sempre pegando no meu pé".

Isso não era verdade. Sua mãe não era rigorosa com Youko quanto a seus estudos. Mas era melhor seguir o fluxo. "Ela verifica meu dever de casa todas as noites", Youko mentiu. "Eu não suporto isso".

Pelo contrário, a mãe de Youko ficava incomodada com sua diligência nos estudos. Não era que ela não se importava que a filha tirasse boas notas ou não. Simplesmente não era uma prioridade. "Se você tem tempo pra estudar o dia todo, então você tem tempo para fazer suas obrigações em casa também", essa era sua frase favorita ultimamente.

E também não era que Youko não se importasse com seus estudos. A censura de seus professores a apavorava bem mais que qualquer desafio intelectual.

"Que droga, ter seus deveres de casa examinados toda noite."

"Eu sei, eu sei. Meus pais são do mesmo jeito. Eles querem me ver estudando a todo minuto. Nenhuma pessoa normal pode estudar tanto!"

"Exatamente"

Youko concordou com a cabeça, apenas pelo alívio de não mais ser o assunto da conversa.

Atrás dela alguém disse em um sussurro alto para que fosse ouvido, "Ei, é a Sugimoto".

Os olhares de todos na sala encararam a garota que acabara de entrar. E no mesmo instante se desviaram. Uma onda de fria indiferença. Ao longo dos últimos seis meses, a excluída Sugimoto tornara-se o passa-tempo daqueles que importavam na classe. Sugimoto olhou de volta por um momento, como um cervo que encarava os faróis de um carro, e depois se arrastou até onde Youko estava parada. Ela sentou na mesa a sua esquerda.

"Bom dia, Youko", ela disse.

Ela falou educadamente. Youko começou a responder, por reflexo, então engoliu sua resposta. Uma vez, não fazia muito tempo, ela precipitadamente trocara cumprimentos com Sugimoto. Como consequência, seus colegas de classe passaram a tratá-la com desprezo.

Então ela nada disse, agiu como se Sugimoto sequer estivesse lá. As outras garotas começam a rir. Sugimoto inclinou a cabeça mas não desviou o olhar. Youko sentiu os olhos dela em si. Para esconder seu desconforto ela fingiu se envolver no tagarelar da conversa.

Ela podia se lamentar por Sugimoto, mas se fizesse oposição aos outros, ela seria a próxima a ser excluída.

"Hum...Youko?"

Youko fingiu não ouvir. Ela sabia o que ela estava fazendo era cruel, mas ela não poderia imaginar outro jeito.

Sugimoto persistiu. "Youko", ela disse.

A conversa morreu. Em uníssono, o grupo que estava ao redor da mesa de Youko focou sua atenção na garota. Youko não pôde deixar de seguir o exemplo e encarou Sugimoto.

"Você... terminou o dever de Matemática?"

A timidez na voz da garota causou no grupo outro ataque de risos.

Youko sofreu para responder apropriadamente. "Eu... mais ou menos, eu acho"

"Você poderia me deixar vê-lo, por favor?

O professor de matemática sempre designava um estudante para explicar o dever de casa da noite anterior. Youko lembrou que a vez de Sugimoto era hoje. Ela olhou ao redor do grupo. Ninguém disse nada. Eles devolveram a ela os mesmos duros olhares que davam a Sugimoto. Youko finalmente entendeu que eles estavam esperando para ver como ela iria rejeitar o pedido de Sugimoto.

Youko engoliu o duro nó em sua garganta. "Eu... Eu ainda preciso revisar os erros"

A enrolação na recusa não impressionou seus companheiros. "Ah, Youko", um deles falou, "você é tão mole".

Uma voz cheia de reprovação e censura. Youko estremeceu por dentro. O resto do grupo entrou na conversa.

"Você tem que ser mais direta que isso, Youko"

"Ela tá certa. Uma pessoa em seu lugar não pode deixar espaço para dúvidas"

"Senão você vai acabar cercada por idiotas que não podem receber não como resposta"

Youko não tinha ideia do que fazer. Ela não tinha coragem o suficiente para trair as expectativas de seus colegas abertamente. Ao mesmo tempo, ela não tinha a indiferença disciplinada para atirar na garota o tipo de palavras que eles queriam ouvir. Finalmente, ela respondeu com uma risada nervosa.

"Eu tenho certeza..."

"É verdade! Você é muito legal o tempo todo. É por isso que os ninguéns como ela estão sempre grudados em você."

"Mas eu sou a representante de classe"

"Justamente por isso você não pode arredar o pé. Afinal, você tem verdadeiras responsabilidades. Você não pode se distrair por cada peste que aparece.

"Imagino"

"Isso mesmo" Um sorriso fino e perverso mostrou-se nos lábios da garota. "Além disso, se você der a Sugimoto suas anotações, ela vai deixá-las todas sujas."

"Sim, você não iria querer isso"

O grupo se dissolveu em outra rodada de alegria viciosa. Youko se juntou às risadas. Mas não antes de perceber pelo canto do olho que a garota abaixara sua cabeça, as lágrimas descendo por suas bochechas.

É culpa dela também, ela disse a si mesma. Pessoas como ela não são maltratadas sem motivo. Sempre tem um motivo. Eles são os culpados.

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