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A merda que chamo de vida.

 As gotas frias que caem do céu não limpam o sangue em minhas roupas.

 Minhas costelas já não doem. Nem sei se estão quebradas ou não.

 Duvido muito.

 O desgraçado loiro me chutando está falando algo, mas tudo me está silencioso, ele significa nada pra mim. Não sinto nem desgosto pelo sorriso sádico em sua face. 

 Só quero que essa merda acabe logo.

 Olho pro lado. Uma janela azul está me encarando enquanto a leio:

 "Proteja o mendigo que será espancado até a morte. (Não cause danos ao agressor, ou seu nível será rebaixado.) A recompensa é 30xp"

 "Por que minhas missões precisam ser essas merdas? Eu pareço a porra de um herói?!"

 Ordeno mentalmente que a janela me mostre meu nível e habilidade:

 "Nível atual: 1 (30/300xp). Sua habilidade é endurecer"

 "Agh, poder de merda, sistema de merda."

 O pé daquele arrombado esmaga meu rosto em uma bicuda. Quebraria o nariz de uma pessoa normal.

 Suspiro e olho pras nuvens.

 — Tá me ouvindo, filho da puta?!

 Meu estômago é revirado pelo seu maldito chute. Sangue escorre por minha boca e mancha ainda mais a camisa social que estou vestindo.

 "Legal, mais sangue pra limpar depois..."

 Ele cospe em mim. Não sei dizer se me acertou, ou se foi apenas mais uma gota dessa chuva fria.

 O resto de aborto some da minha vista antes que eu perceba.

 Me levanto, passo as mãos em minha camisa e calça, na esperança de tirar o máximo dos rastros dessa "briga".

 — Sabia que a camisa preta viria a calhar.

 Olho para o que restou minha mala, totalmente amassada pelos golpes.

 O mendigo já havia fugido há tempos, seus passos rápidos puderam ser ouvidos no momento em que o primeiro soco atingiu minha bochecha.

 Cuspo em minha mão. Sai um pouco de sangue.

 — Esse arrombado nem sabe dar a merda de um soco.

 Mudo meu foco para a janela que me seguia como assombração.

 "Missão concluída, recompensa obtida."

 Reviro meus olhos e suspiro.

 — Viva, eu acho.

 Fecho a janela, pego minha mala e sigo para um banheiro qualquer.

 — Maravilha, só roupa branca. Pelo menos não estão sujas de sangue... Ainda.

 Depois de me trocar, busco abrigo nos restos de maleta que carrego e finalmente alcanço meu destino.

 "Organização Dos Heróis Autônomos. O início pra qualquer iludido que busca dinheiro fácil, ou fama. Onde se reúnem os inúteis que não estão sendo agenciados."

 As paredes de marfim não me encheram os olhos, um sorriso forçado se desenha em meus lábios, o que realmente sinto é quase imperceptível. O único indício da vontade de vomitar que tenho ao olhar para algum desgraçado aqui dentro são meus olhos semelhantes aos de um cadáver.

 Continuo andando pelos corredores brilhantes e cheios de enfeites estúpidos

 Uma voz de trovão ecoa pela entrada central.

 — Finalmente chegou, senhor...

 O ambiente é como uma arena, quatro pilastras bem espalhadas pelos cantos mais distantes do local. Piso quadriculado em tom dourado, as luzes parecem se refletir.

 — Draco, Thomas Draco.

 Seu olhar gela por alguns instantes, então ele limpa a garganta.

 — Entendo, ahn... Que pulemos as introduções e comecemos os testes práticos.

 "É, pelo menos esse sobrenome serve pra alguma coisa. Valeu, irmãozinho."

 Há mais duas pessoas além de mim, uma mulher jovem e um homem velho, mas não vale a pena destacar suas características, pessoas são só estátuas frias que se movem conforme o desejo e ganância, não que eu seja diferente.

 Passando os olhos pelo ambiente, reconheço um certo loiro. Ele não valia a pena de prestar atenção na face, mas aquele cabelo é difícil de  não notar, com certeza o imbecil quer chamar atenção.

 "Não estou surpreso daquele bosta estar aqui. A maioria dos 'heróis' são a escória da humanidade."

  Me mantenho em pé e observo os outros serem testados. É algo bem simples, basta enfrentar uma besta de Rank - e. Quase qualquer um consegue.

 No fim, pego meu pequeno bloco de notas na mala e rabisco algumas estratégias e informações sobre a besta enfrentada.

 "Um Defunto pútrido... que merda hein? Pra alguém falhar em matar essa coisa ela precisa estar tentando muito."

 Os movimentos da participante feminina foram exagerados, mas ela não deixou muitas aberturas, apesar de parecer mais um show de circo do que uma luta.

 "Daria 4/10. É bom pra distrações e controle de grupo, mas muito ineficaz, até uma coisa fraca dessas demorou de morrer."

 Faço as anotações no caderno e observo o velho.

 Ele faz poucos movimentos, seu corpo está meio duro, um cinquentão, talvez? O importante é que ele quebrou o pescoço do defunto.

 "Daria 7/10. A besta não está morta, precisa esmagar a cabeça. E ele é muito lento, mas se o objetivo for capturar vivo, e alguém puder distrair os alvos... Ele seria bem útil."

 Sou chamado, então guardo meu bloco de notas, e me dirijo ao centro da arena.

 Enquanto estico meus músculos cansados antes do teste, erguem as barreiras e a besta é invocada.

 "Certo... Defunto Pútrido... A fraqueza é o fundo da cabeça... E graças a merda do sistema, vou precisar quebrar o pescoço..."

 A janela se abre.

 "Devia fingir surpresa?"

 Passo meus olhos desinteressados pela tela:

 "Enfrente o monstro de Rank - c, Minotauro. Danos letais não devem ser causados na besta pelo usuário."

 "Tá, tá... Pera, Minotauro?"

 A figura sombria e imponente se ergue em minha frente, criatura de dois metros com grandes chifres e cascos. O temido machado duplo em suas "mãos", e bola e espinho na ponta do rabo.

 "Espera... Danos letais? Então... Eu posso destroçar ele desde que não mate?"

 Um sorriso cruel e sincero se desenha pela primeira vez em meus lábios

 — Vamos nos divertir um pouco!

Continua...